Acórdão nº 00798/05.0BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 22 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelM
Data da Resolução22 de Março de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: RECORRENTE: F…, Lda.

RECORRIDO: Autoridade Tributária e Aduaneira OBJECTO DO RECURSO: Sentença proferida pelo MMº juiz do TAF de Braga que julgou totalmente improcedente a impugnação deduzida contra as liquidações adicionais de IRC no valor de € 64.734,45 referentes aos exercícios de 2001 e € 24 955,68 relativa ao exercício de 2002 CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES: 1ª Entende a Recorrente que a douta sentença do Tribunal “a quo” padece de erros de facto e de direito. Em termos de facto não deveria ser dada como provada a matéria constante do ponto nº 4 dos factos provados. Em termos de direito a douta sentença é nula por violação do disposto no artº 668º nº 1 b) e d) do CPC.

  1. De acordo com a douta sentença, as questões a resolver são as seguintes: a) Da falta (ou não) de fundamento para as correcções à matéria tributável efectuada pela Administração Fiscal; b) Da necessidade ou não da aplicação de métodos indirectos para a determinação dos custos suportados pela Recorrente para obtenção dos seus rendimentos tributáveis.

  2. Entende a Recorrente que a primeira questão se divide em duas sub-questões, que são: 1ª Saber se a Administração Fiscal (AF) reuniu um conjunto de indícios sérios e credíveis, de natureza objectiva, que levem a crer que as facturas contabilizadas pela Recorrente, emitidas pelos seus fornecedores A..., S..., e Serralharia Mecânica ..., Lda, não correspondem a transacções efectivas.

  3. E se, reunidos esses indícios, a Recorrente conseguiu fazer prova da efectividade dessas transacções.

  4. Para fundamentar a improcedência da impugnação o M. Juiz do Tribunal “a quo” limitou-se a transcrever, no ponto nº 4 da matéria provada, extensas passagens do relatório da Inspecção Tributária, as quais se encontram antecedidas da expressão “a IT detectou os seguintes factos”, sendo certo que algumas dessas passagens não foram transcritas na totalidade, o que desvirtua o verdadeiro sentido das mesmas.

  5. Analisando o aludido relatório constata-se que os factos ali narrados dizem especialmente respeito a vários fornecedores da Recorrente que, segundo a AF, não cumpriam as sua obrigações fiscais.

  6. Conclui, desde logo, a Recorrente, que a verdadeira razão para a AF ter alterado a sua matéria tributável, foi o facto dos seus fornecedores terem problemas fiscais. Todavia, e apesar disso, como melhor se verá infra, nem todas as facturas emitidas pelos referidos fornecedores foram acrescentadas à matéria tributável da Recorrente. Vejamos: 7ª Na sua fundamentação, a douta sentença refere que a acção inspectiva da Administração Fiscal constatou que relativamente a algumas despesas, as tituladas por facturas emitidas pelos fornecedores António..., S..., António..., unipessoal, Lda e Serralharia Mecânica ... Lda, a contabilidade da Recorrente não cumpria as regras de normalização contabilística, revelando omissões, erros, inexactidões e indícios fundados de que não reflectem a sua matéria tributável.

  7. Antes de mais, relativamente aos anos de 2001 e 2002 (em causa nos presentes autos) não existe qualquer factura emitida pelo empresário em nome individual António... (VD mapas das páginas 9 e 10 do Relatório).

  8. Quanto à restante fundamentação o único facto apontado à contabilidade da Recorrente, conforme Relatório, foi o “descontrolo da conta de meios monetários”. Todas as restantes questões constantes do Relatório têm essencialmente a ver com os fornecedores da Recorrente.

  9. Nos mapas das pág. 9 e 10 do Relatório constam todos os fornecedores da Recorrente “com indícios de incumprimento fiscal” (pág. 8 do Relatório – parte final) . Contudo nem todas as facturas constantes desses mapas deixaram de ser aceites pela AF, contrariamente ao que se subentende pela leitura do Relatório da IT e pela fundamentação da douta sentença. Como prova do alegado refira-se o facto do total das facturas contabilizadas pela Recorrente no ano de 2001 ser de Esc. 41.859.832$00 - € 208.795,96 (pág. 9 do Relatório) e o montante não aceite pela AF ser apenas de € 164.402,95 (Pág. 29 do Relatório). O mesmo acontecendo relativamente ao ano de 2002 em que o total das facturas contabilizadas pela Recorrente ser de € 119.221,61 (pág. 10 do Relatório) e o montante não aceite pela AF ser apenas de € 72.684,81 (Pág. 29 do Relatório) 11ª O que, desde logo, demonstra que a existência de “indícios de incumprimento fiscal” por parte de um fornecedor, só por si, não é suficiente para se considerar que as facturas emitidas por esse mesmo fornecedor não titulem transacções efectivas.

  10. Quanto à parte do Relatório que o M. Juiz transcreveu para a douta sentença, no ponto nº 4, sempre a Recorrente dirá o seguinte: O relatório da Inspecção Tributária só por si, desacompanhado de qualquer outro meio de prova, não é suficiente para se dar como provado o quer que seja. O relatório apenas carrega para os autos a posição da AF na perspectiva do funcionário que o elaborou, perspectiva essa que, no entender da Recorrente, é altamente parcial. Além disso o Relatório em causa nos presentes autos limita-se, essencialmente, a elencar uma série de indícios relacionados com os emitentes das facturas.

  11. Ora, é jurisprudência pacífica que os indícios que levam a considerar que determinadas transacções são inexistentes, são indícios de natureza objectiva e não de natureza subjectiva.

  12. No caso dos presentes autos o Tribunal “a quo” baseou-se no Relatório da Inspecção Tributária o qual assenta quase exclusivamente em factos de natureza subjectiva relacionados com situações de irregularidade fiscal por parte dos fornecedores da Recorrente.

  13. E isto porque o que levou a AF a não aceitar como custos para efeitos de IRC as facturas emitidas pelos fornecedores A..., S..., e Serralharia Mecânica ..., Lda, foi o facto de esses fornecedores estarem em situação de incumprimento fiscal. Ou seja, a AF considerou que as facturas são falsas porque os seus emitentes estavam em situação de irregularidade fiscal, designadamente em sede de IVA.

  14. Tais factos, de natureza subjectiva, são completamente alheios à Recorrente que não tinha obrigação de os conhecer.

  15. É certo que, para além da quase totalidade dos indícios serem de natureza subjectiva, a IT também faz referência a factos relacionados com a Recorrente. Entre eles destaque-se o facto de, alegadamente, a Recorrente não ter instalações com capacidade suficiente para armazenar tão grande quantidade de matérias primas.

  16. Ora, ficou devidamente provado na douta sentença que a Recorrente recorria a locais alternativos de armazenagem de materiais, nos anos de 2001 e 2002, designadamente uma garagem de 100 m2 da testemunha C… e uma cave da residência de um dos seus sócios. (facto nº 5) 19ª Apesar desse facto ter sido considerado provado, a douta sentença considerou-o irrelevante tendo em conta nada ter ficado provado quanto às “capacidades de transporte”. Sucede que as “capacidades de transporte” referidas na doutra sentença têm a ver com os meios dos fornecedores (indícios subjectivos) e não com os meios ou a dimensão da empresa Recorrente.

  17. Todavia, contrariamente à fundamentação da douta sentença, a Recorrente fez prova da existência dessas “capacidades de transporte”. Tal prova teve como suporte a inquirição das testemunhas arroladas pela Recorrente, especialmente a testemunha D... que confirmou ter visto várias vezes camiões na sede da Recorrente (porque os motoristas pensavam que ali era a oficina) sendo a própria testemunha quem lhes fornecia informações sobre a localização da oficina onde deveriam descarregar os materiais que transportavam .

  18. No entanto, e apesar disso, a Inspecção Tributária aceitou como boas as facturas de todos os outros fornecedores que não tinham situações de incumprimento fiscal. Neste caso a questão da capacidade de armazenagem ou de transporte foi posta de lado.

  19. Ora, tal atitude demonstra à evidência que toda a actuação da AF se baseou em raciocínios de natureza subjectiva relacionados com as pessoas dos emitentes das facturas.

    Até porque a Recorrente fez fornecimentos aos seus clientes, devidamente comprovados no Relatório, tendo, por esse facto, necessitado de matérias primas para o efeito.

  20. Conclui-se assim que, contrariamente ao que consta na douta sentença, a AF não reuniu um conjunto de indícios sérios e credíveis, de natureza objectiva, que levem a afirmar com segurança que as facturas emitidas pelos fornecedores supra mencionados não titulam transacções efectivas.

  21. E sendo certo que o ónus da prova, nesse aspecto, pertence à AF, nada mais a Recorrente tem de provar tendo a conta a presunção legal estabelecida no artº 75º/1 da LGT.

  22. Quanto à segunda questão. Entre outras coisas a Recorrente alegou na petição inicial o seguinte: “Se as facturas que a impugnante registou não fossem reais por as aquisições não terem sido efectuadas aos respectivos emitentes, sempre deveria a AF, ainda que mediante o recurso a métodos indirectos, estimar os custos que, de todo em todo, foram necessários para conseguir os proveitos efectivamente realizados” (Artº 86º) 26ª Na sequência dessa alegação a douta sentença refere que uma das questões a decidir era averiguar “da necessidade ou não da aplicação de métodos indirectos para a determinação dos custos suportados pela Recorrente para obtenção dos seus rendimentos tributáveis”.

  23. No entanto a douta sentença é completamente omissa quanto a essa questão. Com efeito na página 13, depois de transcrever a posição da Recorrente sobre esta questão, apenas é feita referência às taxas de rentabilidade fiscal, o que, com o devido respeito, nada tem a ver com aquilo que a Recorrente alegou.

  24. Na verdade, aquilo que deveria constar na douta sentença é se se encontravam (ou não) reunidos os pressupostos elencados nos artº 87º da LGT para a tributação da Recorrente através dos chamados métodos indirectos. E sobre tais pressupostos nem uma única palavra, 29ª É que, tal como a...

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