Acórdão nº 00263/10.3BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 22 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelPedro Vergueiro
Data da Resolução22 de Fevereiro de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, datada de 08-06-2017, que julgou procedente a pretensão deduzida por “L…, S.A.”, na presente instância de IMPUGNAÇÃO, relacionada com o indeferimento da reclamação graciosa, referente às liquidações adicionais de IVA e respectivos juros compensatórios, referentes ao exercício económico do ano 2005, no valor global de € 147.706,62 euros.

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 320-324), as seguintes conclusões que se reproduzem: “(…) A - Incide o presente recurso sobre a questão do erro nos pressupostos nas correções meramente aritméticas ao exercício de 2005 (correções que ascenderam a € 124.269,12, por dedução indevida de IVA relativamente aos serviços prestados pelo Banco…, S.A. - IVA constante da fatura nº 426, datada de 20/01/2005) considerada procedente pela douta sentença.

B - Por despacho de 22/03/2017 foi determinado o aproveitamento da prova realizada no processo 1306/09.9 BEVIS e a convicção do tribunal a quo relativamente aos factos provados resultou “da análise crítica e conjugada do teor dos documentos não impugnados juntos aos autos e juntos ao processo administrativo, conforme referido em cada ponto do probatório e também da posição assumida pelas partes, na parte dos factos alegados não impugnados e corroborados pelos documentos juntos. A prova testemunhal produzida em sede de diligência de inquirição de testemunhas foi apreciada livremente e também com o recurso às regras de experiência comum…”.

C - Conforme fls. 18 e seguintes da sentença; considerou a Meritíssima Juíza a quo, por referência aos factos provados 1, 2 e 3, que a impugnante pode deduzir o IVA da fatura 429, pois os serviços facturados pelo Banco ... foram utilizados para a realização de operações tributadas, procedendo, nesta parte, a impugnação.

D - É nossa convicção, contudo, estarmos perante grosseiro erro e julgamento, posto que a prova junta aos autos não permite dar como provada factualidade que o foi, e muito menos, concluir como se concluiu na sentença a quo.

E - Do probatório: 1.

“O Banco ..., S.A. enviou à Impugnante uma proposta de prestação de serviços de assessoria financeira na operação de aquisição do capital da empresa J…, SGPS, S.A.” (segue-se transcrição).

F - Na sequência de alegado protocolo de intenção de aquisição daquela sociedade a que se faz referência no articulado 13º da PI, por referência ao documento nº 7 ora, salvo melhor opinião, o documento para o qual se remete, cujo corpo se encontra em língua inglesa (à revelia, alias, do art. 134º do CPC) não permite estabelecer qualquer relação da L… com a empresa J… (a qual não é, sequer, mencionada em tal documento). A única razão para o designar como protocolo de intenção de aquisição daquela sociedade é a afirmação produzida nesse sentido, no articulado 13º da PI, nada mais.

G - A este propósito, o relatório da ação inspetiva (pág.6) dá nota do seguinte: “A aquisição das ações da J… foi concretizada pelo Sr. J… … Assim, a factura em análise, com o débito do “Sucess Fee”, traduz a concretização do acordo de aquisição do capital da J..., prevista no contrato, identificando-se assim como utilizador da assessoria financeira prestada pelo Banco ..., o Sr. Jo.... Por isso na data da contabilização da factura relativa à realização do negócio, encontrava-se claramente confirmado que o sujeito passivo que beneficiou da assessoria do Banco ... e concretizou a operação de aquisição da J..., foi o Sr. Jo... (accionista, e também Presidente do Concelho de Administração da L…) a título individual e não a L….” H - 2.

“No âmbito da prestação de serviços de assessoria financeira referido em 1., foi elaborada uma proposta, na qual consta a Avaliação Financeira da J..., SGPS, S.A., junta a fls. 117/124 do PF, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido”.

I - Uma proposta, frisamos nós, e não um contrato de mandato financeiro, como pretende a impugnante; de acordo com a qual “No caso de se vir a concretizar um acordo entre a Empresa (L…) ou seus accionistas – o sublinhado é nosso - (de acordo com o relatório de inspeção, pág. 6, na data da assinatura deste contrato os accionistas da L… eram o Sr. Jo..., a mulher e os filhos) e os accionistas do Alvo relativamente a uma Transação, o Banco terá direito a receber uma remuneração de sucesso … cujo valor será apurado através da aplicação de uma percentagem de 1,4% ao “Valor de Transacção”.

J - Pretende a impugnante (no que parece ser secundada pela douta sentença), que submeteu proposta vinculativa de aquisição do capital da J... junto do referido representante negocial da sociedade alienante. Não obstante, o documento aqui considerado (doc. 9 junto com a PI) não corporiza qualquer proposta, trata-se, outrossim, de documento que alegadamente a acompanhará, conforme se pode ler a fls. 2 do dito.

K - Decorre claramente da proposta de prestação de serviços de assessoria financeira que a aquisição da totalidade ou parte das ações representativas do capital da empresa J... ou dos seus ativos foi concebida como possível, quer na esfera da empresa, quer na esfera particular dos respetivos acionistas (que, no caso, não eram nem mais nem menos do que o sr. Jo..., presidente do Conselho de Administração da L..., e família); ou seja, não era possível, ab initio, garantir que a dita transação configuraria verdadeiramente, quer custo da empresa, quer custo pessoal dos accionistas, para efeitos da respetiva consideração como um custo da empresa.

L - Desconsiderar fiscalmente um custo efetivamente suportado, reporta-se às situações de confusão entre o património empresarial e o património pessoal dos sócios, como àquelas em que a empresa, em detrimento do seu património, pretende beneficiar terceiros. Se o encargo foi determinado por outras motivações (interesse pessoal dos sócio, administradores, credores, outras sociedades do mesmo grupo, parceiros comerciais, etc.), então tal custo não deve ser havido por indispensável. A aferição da indispensabilidade deverá, pois, assentar numa análise casuística da empresa e de cada uma das despesas ou tipos de despesas em causa.

M - Sempre que esteja em dúvida a necessidade de uma certa despesa o sujeito passivo deverá colaborar com a Administração Fiscal para fornecer elementos que ponham fim à dúvida. Se a Administração Fiscal duvida fundadamente da inserção no interesse societário de determinada despesa, passa a impender sobre o contribuinte o ónus da prova de que tal operação se insere na sua capacidade; ou seja, no que respeita à qualificação das verbas contabilizadas como custos dedutíveis, cabe ao contribuinte o ónus da prova da sua indispensabilidade para a obtenção dos proveitos ou para a manutenção da força produtora, se a AT questionar essa indispensabilidade.

N - Refere a impugnante, no articulado 21º da PI e sem referência a qualquer documento, que no dia 7/12/2004, o Banco ... lhe enviou a última versão do contrato de compra e venda da totalidade das ações representativas do capital da J.... E é também este o teor do facto provado 3.

“Em 7.12.2004, o Banco ... enviou à Impugnante a última versão do contrato de compra e venda da totalidade das ações representativas do capital da J.... – Cf. fls.91/95 do PF e cfr. depoimento de P…, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.” O - Ocorre, porém, que tal documento não consubstancia qualquer contrato, antes consubstancia “a minha (leia-se: de Jo...) melhor oferta relativamente aos pontos em aberto no contrato da J...” – note-se que intervém e assina a título individual, não em representação (sendo certo que de tal documento, datado de dezembro de 2004, apenas encontramos rasto nos autos de impugnação nº 1306/09.9 BEVIS - trata-se do doc. 11 junto com a respetiva PI; a cujo aproveitamento de prova se produziu nos presentes).

P - Da conclusão/decisão: O douto tribunal ao considerar que a impugnante pode deduzir o IVA da fatura 429, pois os serviços facturados ao Banco ... foram utilizados para a realização de operações tributadas errou no seu julgamento, pois, resultam dos autos evidências objetivas e seguras que não infirmam (antes pelo contrário) a tese da AT, de acordo com a qual o negócio para cuja conclusão foram contratados os serviços do Banco ... (e que deu origem à emissão da referenciada fatura; cujo valor foi, pela AT, desconsiderado como custo fiscal da impugnante em sede de IRC e, em consequência, cortada a dedução de IVA) estava, desde o início, pré-configurado para ser celebrado ou pela impugnante ou pelos seus acionistas.

Q - Na eminência da venda da L... ao grupo alemão Fresenius Kabi (amplamente divulgado na imprensa à época) e pretendendo manter-se ligado à parte farmacêutica, cremos que os próprios acionistas da empresa viram na aquisição da J... (cujos termos negociais conheciam de muito perto, em virtude de o acionista maioritário ser também o presidente da administração e, consequentemente, interlocutor privilegiado nas negociações), uma oportunidade de fazer repercutir custos da sua esfera pessoal na empresa.

R - A verdade é que a sentença faz uma aplicação do direito aos factos que erra quanto à decisão tomada, e que, dos autos, não sobra qualquer dúvida de que todo o circunstancialismo demonstrado pela AT deve orientar o julgador no sentido contrário da dita, ocorrendo erro de julgamento, por ter decidido o tribunal a quo em desconformidade com a realidade factual.

S - Estas conclusões, no entender na Fazenda Pública, surgem incompreensíveis à luz dos factos levados ao probatório (reforçamos, a ele jamais foi levado qualquer contrato de mandato financeiro, como não foi levado qualquer versão (última ou primeira) do contrato de compra e venda da totalidade das ações representativas do...

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