Acórdão nº 0407/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Novembro de 2014
Magistrado Responsável | FRANCISCO ROTHES |
Data da Resolução | 19 de Novembro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 289/00 do Tribunal Tributário de 1.ª instância de Coimbra 1. RELATÓRIO 1.1 A…….. (a seguir Impugnante ou Recorrente) recorreu da sentença proferida pela Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que julgou improcedente a impugnação judicial por ele deduzida contra as liquidações adicionais de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) que lhe foram efectuadas relativamente aos anos de 1993, 1994 e 1995 na sequência da fixação da matéria tributável por métodos indirectos.
1.2 O recurso foi admitido para o Supremo Tribunal Administrativo, com subida imediata e nos próprios autos e o Recorrente apresentou a motivação do recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor: « A. A mui douta sentença errou ao considerar que as liquidações não padecem do alegado vício de erro na determinação e quantificação da matéria tributável.
B. De acordo com o conteúdo do relatório, os valores presumidos situam-se nos proveitos, por “os valores declarados das vendas não serem compatíveis com os preços praticados na zona e estarem muito aquém dos considerados razoáveis”.
C. Para considerar que o preço declarado não corresponde ao real a AF invocou as seguintes razões: 1.ª) o local onde se situam as fracções e o preço praticado na zona para idênticos apartamentos aponta para preços mais altos; 2.ª) segundo as Portarias 1133C/91, de 31/10; 1026/92, de 31/10, 1103/93 de 30/10 e 975C/94, de 31/10, o valor da habitação económica por metro quadrado na Lousã conduziria a valores globais muito superiores aos 24.200.000$00 declarados (37.032.600$00).
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) o próprio impugnante declarou 12.450.000$00 de vendas em 1992 e 4.000.000$00 em 1993 quando os valores escriturados ascendem a 11.450.000$00 e 3.950.000$00, respectivamente.
D. Não são indicados os apartamentos idênticos que serviram de termo de comparação e o preço praticado para a sua venda; E. O que as portarias fornecem é o custo de construção.
F. A AF não põe em causa o custo de construção que resultou dos documentos fornecidos pelo impugnante e que é bem inferior.
G. Os elementos obtidos em concreto pela própria AF afastam os valores médios que resultam das referidas portarias.
H. Não se compreende porque a AF não recorreu às margens de lucro denunciadas nos rácios daquele sector de actividade, aplicando-as aos custos declarados.
I. Não foram carreados para o processo elementos suficientemente seguros de que o preço declarado fosse inferior ao real, e sobretudo que o preço aproximado rondasse o valor presumido pela AF.
J. A AF não demonstrou, como lhe competia, que não tivesse podido ir mais longe no apuramento da verdade fiscal ou na redução da margem de erro, havendo por isso, insuficiência instrutória K. A argumentação seguida, pela AF para o método de quantificação é insuficiente para dar a conhecer como se chegou ao valor de venda, por habitação e por garagem de 5.000.000$00 e 600.000$00, para 1992, respectivamente, com um agravamento de 10% desse valores para vendas verificadas em anos subsequentes.
L. Não há qualquer indicador do método objectivo seguido para se chegar a estes valores.
M. Não se pode sequer dizer que tenha sido utilizado um qualquer critério ou método, tudo indicando que a AF chegou àqueles valores por os considerar “razoáveis”.
N. O princípio da legalidade não permite discricionariedade na aplicação da lei quanto aos actos que afectam directamente a situação tributária dos contribuintes O. A fundamentação dos actos tributários em causa redundam na invocação de um critério, puramente subjectivo, de razoabilidade, P. As liquidações impugnadas padecem, também, do alegado vício de falta de fundamentação.
A sentença violou, entre outras, as disposições legais contidas nos 19.º, al. b), 21.º, 82.º, 87.º e 121.º do CPT, art. 125.º CPA e art. 74.º, n.º 2 da LGT.
Nestes termos e nos melhores de direito, com o sempre mui douto suprimento de V. Ex.ªs, deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida, devendo, a final ser julgada procedente a impugnação oportunamente deduzida pela ora recorrente, assim fazendo V. Ex.ªs a costumada e habitual JUSTIÇA».
1.3 A Fazenda Pública não contra alegou.
1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso, nos seguintes termos: «Parecer do Ministério Público: erro na determinação e quantificação de matéria colectável por métodos indirectos; falta de fundamentação.
Afigura-se inexistirem razões que obstem ao conhecimento do recurso.
Com efeito, é de considerar a matéria de facto que importa considerar tal como resulta da douta sentença proferida que o recorrente não põe em causa.
Ora, são as respectivas conclusões da motivação de recurso delimitam o seu âmbito e objecto — art. 684.º n.º 3 do C.P.C., subsidiariamente aplicável, nos termos do art. 2.º al. e) do C.P.P.T..
Assim, resultam para apreciação as seguintes questões de direito: – de erro na determinação e quantificação da matéria colectável; – falta de fundamentação.
Quanto à quantificação da matéria colectável que foi efectuada, é de concordar com o considerado na sentença recorrida que a julgou válida, sustentando-se no que se fundou a administração fiscal para proceder à tributação por métodos indirectos, invocando-se as normas aplicáveis, ainda que anteriores ao actualmente previsto no art. 90.º n.º 1 da L.G.T., as quais são relativas à repartição do ónus da prova.
Não repugna o entendimento de efectuar uma apreciação também em função do que resulta do princípio de repartição do ónus da prova, “uma vez concretizada a via regulamentar necessária para o efeito” — neste sentido Elisabete Louro Martins em O Ónus da Prova em Direito Fiscal, p. 175, acórdãos 84/03, do Tribunal Constitucional e do S.T.A. de 24/3/04, proferido no processo n.º 1914/03, acessível em www.dgsi.pt.
Tal o que parece ter ocorrido por aproximação aos valores constantes das Portarias que na mesma foram referidas.
Por outro lado, e quanto à exigência de fundamentação, a qual parece ser no caso especial, sustenta-se que a administração fiscal não podia proceder à tributação por métodos indirectos no que lhe pareceu “razoável”.
No entanto, face à explicitação que a propósito foi efectuada, detecta-se ter sido ainda indicado a razão de ser de um agravamento de 10% relativamente aos valores resultantes, partindo do que resulta quanto ao ano de 1992, e mais sendo referido que o contribuinte saía beneficiado — detecta-se um lapso no valor indicado a esse propósito, a fls. 130, o qual melhor constava de 2.672.600$00 (fls. 36).
Concluindo, reitera-se o parecer já anteriormente emitido, de que resulta que é de julgar o recurso improcedente».
1.5 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos.
1.6 As questões que cumpre apreciar e decidir são, como procuraremos demonstrar, as de saber se a sentença recorrida fez errado julgamento (i) quando considerou justificado o recurso aos métodos indiciários na fixação da matéria tributável, (ii) quando considerou que não se verificava o vício de falta de fundamentação da decisão do Director Distrital de Finanças proferida em sede de reclamação (revisão da matéria tributável) deduzida pelo Contribuinte contra a fixação da matéria tributável por métodos indiciários e (iii) quando considerou que não se verificavam os erros invocados pelo Impugnante na determinação e quantificação da matéria tributável.
* * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos: «[…] FACTOS PROVADOS 1 - No período compreendido entre: 01/03/1996 a 07/03/1996 e, na sequência de um pedido de revisão da declaração anual de rendimentos referente a 1994, o ora impugnante A…….. foi sujeito a acção de fiscalização, que incidiu sobre os exercícios fiscais de 1992 a 1995 e sobre os impostos de IVA e IRS, tendo este último imposto sido apurado por métodos indirectos - Relatório de Fiscalização de fls. 30 e segs. dos autos e que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
2 - No decurso da referida acção de inspecção apurou-se que o contribuinte, ora impugnante, construíra um edifício destinado a habitação e comércio, por administração directa, tendo vendido, no decurso dos anos de 1992 a 1995 inclusive, algumas fracções para habitação e garagens, sem que tivesse entregue nos Serviços de Administração Fiscal qualquer declaração de início de actividade de “construção de prédios para revenda”- citado Relatório de Inspecção.
3 - Foi ainda apurado que o impugnante, apesar de não se encontrar colectado, utilizava o número de pessoa colectiva ………. nos documentos de aquisição de materiais para o prédio em construção e não deixou de inscrever na sua declaração de IRS, dos anos de 1993, 1994 e 1995 valores de proveitos e custos que estimou aleatoriamente - citado Relatório de Inspecção.
4 - Os Serviços da Administração Fiscal tendo verificado que, o ora impugnante exercera normal e continuadamente, por diversos exercícios, a actividade de “construção de prédios para revenda” notificaram-no para, no prazo de 15 dias, proceder à regularização da sua escrita, com a cominação de não o fazendo a matéria tributável ser fixada com recurso a métodos indiciários, conforme estabelecido no artigo 38.º do CIRS - citado Relatório de Inspecção e auto de notícia de fls. 50 dos autos, que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
5 - O ora impugnante não correspondeu ao convite, feito pela AT, de regularizar a sua escrita, pelo que, entendendo a Administração Tributária não ser possível a comprovação directa e exacta dos proveitos deste (em virtude dos valores declarados das vendas das fracções serem baixos, tendo em conta o local onde se situavam e o preço praticado na zona para...
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