Acórdão nº 0807/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 06 de Agosto de 2014
Magistrado Responsável | FRANCISCO ROTHES |
Data da Resolução | 06 de Agosto de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal com o n.º 261/14.8BEALM 1. RELATÓRIO 1.1 A…………… (adiante Reclamante ou Recorrente) recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pela Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou improcedente a reclamação por ele deduzida, ao abrigo do disposto nos arts. 276.º a 278.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), da decisão do Chefe do Serviço de Finanças do Montijo, que lhe indeferiu o pedido de reconhecimento da prescrição das obrigações correspondentes à dívida exequenda, que teve origem no despacho que ordenou a devolução de incentivos financeiros concedidos ao abrigo do Decreto-Lei n.º 194/80, de 19 de Junho, à sociedade denominada «B……………….., Lda.», e respectivos juros moratórios.
1.2 Com o requerimento de interposição do recurso, o Recorrente apresentou a respectiva motivação, que resumiu em conclusões do seguinte teor (Aqui como adiante, porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão em tipo normal.
): « a) Em sede de reposição de Benefícios Financeiros, dívidas de natureza civil, cabe aplicar o regime da prescrição previsto no CC, designadamente, o prazo de 20 anos (art. 309.º do CC).
b) A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente (art. 323.º, n.º 1 do CC).
c) No entanto, a citação ou notificação para que tenha eficácia interruptiva da prescrição, tem de ser dirigida a quem contra o direito pode ser exercido e não a terceiro, entendido no sentido civilista do conceito, pois inexiste qualquer norma no âmbito do direito civil semelhante ao n.º 2 do art. 48.º da LGT. E, d) Sociedade e gerentes são pessoas jurídicas distintas, pelo que, a citação em reversão dos gerentes não interrompeu o decurso do prazo prescricional relativamente à sociedade, que continuou a decorrer.
e) Se a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (art. 327.º, n.º 1 do CC).
f) Sendo que a citação dos gerentes não interrompeu o decurso do prazo prescricional, é igualmente inoperante para efeitos do n.º 1 do art. 327.º, a ausência de trânsito em julgado da oposição apresentada por aqueles em relação à sociedade.
g) Ainda que a citação da sociedade possua eficácia interruptiva da prescrição, não foi apresentada oposição, pelo que, inexiste qualquer “ausência de trânsito em julgado”, para efeitos do n.º 1 do art. 323.º do CC.
h) Acresce que não se aplica no presente caso qualquer das causas de suspensão previstas nos arts. 318.º a 322.º do CC.
i) Resulta do Ponto D do Probatório que a sociedade foi citada na execução fiscal para cobrança de tais dívidas, em 27/11/1990, não tendo deduzido oposição, pelo que, 30 dias depois teve reinício o decurso do prazo prescricional.
j) Prazo de prescrição que, por inexistirem outras causas interruptivas ou suspensivas, se completou em 28/12/2010, pelo menos, no que respeita ao capital.
k) Pois, os juros de dívida não tributária prescrevem no prazo de 5 anos contados a partir da data em que a obrigação se tornou exigível (neste sentido, vide, o Acórdão desse STA de 12/10/2011, tirado no Recurso n.º 010/11).
l) Pelo que, não restam dúvidas de que as dívidas em causa nos presentes autos se encontram prescritas.
m) Assim, a douta Sentença recorrida ao não ter reconhecido a prescrição invocada, julgando improcedente a reclamação apresentada, preconizou uma errónea interpretação das normas jurídicas aplicáveis, padecendo de erro de julgamento e não podendo em consequência permanecer na ordem jurídica.
Nestes termos, atentos os fundamentos expendidos, nos melhores de direito, com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser julgado procedente, pelas razões expendidas, sendo reconhecida a prescrição invocada, revogada a douta Sentença do Tribunal “a quo” e, em consequência, ser anulado o despacho na origem dos presentes autos, com todas as consequências legais daí advindas».
1.3 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo.
1.4 A Fazenda Pública não contra alegou.
1.5 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso, nos seguintes termos: «[…] Em causa está a prescrição da dívida exequenda relativa à reposição de incentivos financeiros concedidos ao abrigo do DL n.º 194/80, de 19/06.
Sendo aplicável o regime da prescrição do Código Civil, o prazo é de 20 anos, nos termos do art. 309.º do CC, iniciando-se a respectiva contagem na data em que o direito puder ser exercido (art. 306.º, n.º 1 do CC).
Como é jurisprudência constante deste Supremo Tribunal, só com a declaração de caducidade dos benefícios começa a correr o direito de exigir a restituição dos incentivos concedidos. (cfr., por todos, os Acs. de 21.11.2001 – Rec. n.º 026389, de 25.03.2009 – Rec. n.º 0918/08 e de 23.01.2013 – Rec. n.º 0807/12). No caso, a declaração de caducidade teve lugar em 14.08.1987 (cfr. alínea A do probatório).
Iniciando-se nessa data a contagem do prazo prescricional, a mesma interrompeu-se com a citação da sociedade em 27.11.1990 (alínea D do probatório), nos termos do art. 323.º, n.º 1 do CC, não começando a correr novo prazo enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (art. 327.º, n.º 1 do CC).
Ainda não se verificou, pois, a prescrição da dívida exequenda, não relevando para o caso as razões invocadas na Conclusão f) nem o facto da sociedade não ter deduzido oposição porque o trânsito em julgado de que fala o art. 327.º, n.º 1 do CC também se coloca em relação ao processo de execução fiscal e não apenas em relação ao processo de oposição à execução fiscal.
Com efeito, como esclarece Jorge Lopes de Sousa, a propósito do regime do art. 327.º, n.º 1 do CC, “ao trânsito em julgado tem de fazer-se equivaler a decisão final do processo” acrescentando que, “quando a interrupção da prescrição deriva de facto associado a um processo de execução fiscal (o novo prazo da prescrição) deve contar-se a partir da decisão que lhe puser termo, considerando-se como tal também a declaração em falhas”.
Pronuncio-me, pois, em face do exposto, pela improcedência do presente recurso e, consequentemente, pela manutenção do julgado».
1.6 Dispensaram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos, atento o carácter urgente do processo.
1.7 A questão a apreciar e decidir é a de saber se a sentença recorrida fez correcto julgamento quando considerou que as obrigações correspondentes à dívida exequenda não estavam prescritas.
* * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos: « A) Em 14/08/1987 foi proferido despacho pelo Secretário de Estado para os Assuntos Fiscais, por delegação do Ministro das Finanças, com o seguinte teor “Despacho Definitivo SIII – Decreto-Lei n.º 194/80 – comprovação do regime geral – Processo n.º 3805 da empresa “B……………….., LDA.” – requerimento de 18/12/82.
Nos termos do disposto no n.º 3 do art. 43.º do Decreto-Lei n.º...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO