Acórdão nº 058/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Outubro de 2014
Magistrado Responsável | MADEIRA DOS SANTOS |
Data da Resolução | 15 de Outubro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: A Dr.ª A………………., magistrada do MºPº identificada nos autos, interpôs o presente recurso do acórdão da Secção que julgou improcedente a acção administrativa especial que ela deduzira para se declarar nula a deliberação do CSMP, de 8/4/2011, e se condenar este órgão a dispensá-la de realizar turnos aos sábados, assim respeitando as suas crenças religiosas.
A recorrente findou a sua alegação de recurso enunciando as conclusões seguintes: 1. O Acórdão recorrido padece de nulidade por contradição entre os fundamentos de facto e a decisão final (cfr. art. 668.°, nº1, al c) do CPC, ex vi dos arts. 1º e 140º do CPTA).
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Com efeito, a prova efectuada conduz a uma decisão diferente daquela que foi tomada pelo Tribunal a quo, dado ter ficado provada a importância do dia de Sábado e a relevância do culto para a Recorrente e para a sua religião (cfr. al. i), k,), 1), m), o) e p) dos factos provados).
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Se o Tribunal a quo considerou provado que «que para manter o Sábado como dia Sagrado, os adventistas devem abster-se de todo o trabalho secular», não podia depois ter afirmado, paradoxalmente, que «não vem alegado que a Autora tenha de reservar todas as horas dos dias de sábado ao cumprimento dos seus deveres religiosos», e ter decidido que «o acto impugnado não impede a Autora de cumprir os seus deveres religiosos nos dias de turno a realizar aos sábados, visto o trabalho exigido nesses dias preencher menos de um terço das suas 24 horas».
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O Acórdão recorrido padece também de erro de julgamento por não ter julgado inconstitucional a interpretação que o Recorrido fez da norma do art. 14°, n.° 1, al. a) da Lei de Liberdade Religiosa (LLR), no sentido de que só os cidadãos que laborarem em regime de flexibilidade de horário podem obter autorização para suspenderem o trabalho, por motivos religiosos, no dia de descanso semanal, nos dias de festividades e em determinados períodos do dia.
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Tal interpretação é inconstitucional na medida em que aniquila, em absoluto, a liberdade de religião e de culto, impedindo muitos cidadãos de vivenciarem as suas crenças religiosas com o respeito pelos mandamentos professados.
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No caso da Recorrente, que pertence à Igreja Adventista do Sétimo Dia, fica vedada a possibilidade de viver a sua religião com respeito pela 20ª Crença Fundamental, que consiste em santificar o Sábado, dedicando-o inteiramente a Deus, através do descanso, da meditação e do culto (cfr. al. l) e m) dos factos provados).
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A liberdade de consciência, de religião e de culto, consagrada no art. 41.° da CRP, só pode ser (validamente) restringida nos termos do preceituado no art. 18º nºs 2 e 3 da CRP e no art. 6.°, n.° 1 da LLR.
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Sucede porém, que, no caso da norma do art. 14.°, n.° 1, al. a) da LLR não estão preenchidos todos os requisitos.
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Na verdade, a CRP não sujeita a liberdade de religião e de culto a nenhum limite específico e tampouco autoriza, expressamente, a restrição deste direito por via de acto legislativo.
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Por outro lado, a condição (do exercício de um trabalho em regime de flexibilidade de horário) é desnecessária, porquanto haveria outras medidas menos gravosas para atingir o mesmo resultado (de compatibilização da liberdade religiosa com o interesse público e com as exigência laborais e empresariais).
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A condição é também desproporcional, pois não pondera devidamente os direitos e interesses em presença, que teriam de ser harmonizados, indo além do que verdadeiramente importaria para atingir o resultado pretendido.
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Se a ponderação/compatibilização tivesse sido feita, certamente a norma do art. 14°, n.° 1, al. a) da LLR teria estendido a possibilidade de obter dispensa de trabalho, por motivos religiosos, a pessoas com diferentes modalidades de horários. Por exemplo, quem tem isenção de horário pode prestar...
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