Acórdão nº 0322/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 30 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelMADEIRA DOS SANTOS
Data da Resolução30 de Outubro de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: A Universidade de Coimbra interpôs a presente revista do acórdão do TCA-Norte que, após anular o acórdão do TAF de Coimbra que considerara procedente a acção administrativa especial interposta por A…….., identificada nos autos, contra aquela Universidade para impugnação do despacho proferido pelo respectivo Reitor em 6/12/2010, julgou procedente a mesma acção, anulou o acto impugnado e impôs o prosseguimento do procedimento administrativo – de «avaliação específica» da autora, como se prevê no art. 25º do ECDU – sem o vício detectado.

A recorrente findou a sua minuta de recurso oferecendo as seguintes conclusões: 1. Vem o presente recurso de revista interposto do douto Acórdão do Venerando Tribunal Central Administrativo Norte, de 25/10/2013, na parte em que decidiu julgar procedente a acção administrativa especial por erro nos pressupostos, e consequentemente anular o acto impugnado, determinando o prosseguimento do procedimento administrativo sem o vício de que o mesmo padece - erro de facto na avaliação do currículo da Autora.

  1. O objecto do presente recurso incide exclusivamente na questão jurídica de aquilatar quais os elementos que devem ser tidos em consideração e que os candidatos à nomeação definitiva prevista no art. 25.º do ECDU podem apresentar, atendendo ao disposto no n.º 3 do mesmo preceito, para efeitos da avaliação da actividade específica desenvolvida durante o período experimental, tendo em consideração o necessário e devido respeito pelo princípio da igualdade entre os docentes candidatos à nomeação definitiva, bem como pelo princípio da transparência que deve pautar o procedimento conducente à nomeação definitiva dos docentes.

  2. Justificando-se a intervenção do STA apenas em matérias de maior importância, é de extrema necessidade a admissão do presente recurso para uma melhor aplicação do direito, dada a importância inegável da questão jurídica aqui trazida, e a necessidade imperiosa de obter uma interpretação e definir os termos em como devem ser conjugadas e interpretadas as normas dos n.º s 1 e 3 do art. 25 do ECDU, porquanto a interpretação que o Venerando Tribunal Central Administrativo Norte faz daqueles preceitos, e que se encontra plasmada no Acórdão de que se recorre, coloca sérias dúvidas e dificuldades quanto ao modo de proceder no procedimento de nomeação definitiva de docentes da carreira universitária, pelo que está assim preenchido um dos pressupostos não cumulativos de admissibilidade previstos no art.º 150.º n.º 1 do CPTA - a situação carece de urgente esclarecimento jurisprudencial por parte do STA.

  3. Em sede de recurso interposto do Acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, de 11.05.2012, a Autora defendeu que se impunha, à luz dos princípios da proporcionalidade, da justiça e da boa-fé, consagrados nos arts. 5.º n.º 2, 6.º e 6.º-A do CPA, que o artigo científico que submeteu para publicação em revista ISI, dentro do período experimental, e que só veio a ser aceite e publicado depois do termo do período experimental, fosse levado em linha de conta no âmbito da avaliação da sua actividade, o que o procedimento que culminou com o acto impugnado não fez, inquinando, assim, tal acto, de ilegalidade por vício de violação de lei em virtude de ofender os normativos citados.

  4. Diversamente entendeu e entende a aqui Recorrente: não existe qualquer violação dos princípios da proporcionalidade, da justiça e da boa-fé, porquanto a Autora bem sabia (ou deveria saber) que no procedimento interno adoptado pelo Conselho Científico da FCTUC apenas são considerados para análise da actividade desenvolvida no período experimental os artigos que constem do relatório de actividades como tendo sido já aceites pela revista. Não obstante a Autora ter elaborado o artigo científico e o mesmo ter sido submetido para publicação em revista ISI antes do termo do prazo para a entrega do Relatório de Actividade Científica e Pedagógica, e não obstante o mesmo ter sido publicado on line em 09/10/2010 (antes da deliberação final), o que é certo é que do Relatório entregue para análise do Conselho Científico, não constava a efectiva publicação do artigo científico.

  5. O Venerando Tribunal recorrido entende, no entanto, que esta não é sequer uma questão de exercício de poder discricionário da Administração e que por isso não está aqui em causa a violação dos princípios da proporcionalidade, da justiça e da boa-fé. Julga o Tribunal a quo que no caso sub judice estamos apenas perante a questão de saber se o Conselho Científico devia ou não ter considerado o artigo científico para efeitos de avaliação do mérito científico da Recorrente, concluindo a final que em causa está apenas e tão só um erro de facto na avaliação do currículo da docente.

  6. No juízo formulado pelo Tribunal a quo, o artigo elaborado pela docente estava submetido para publicação quando a mesma fez o relatório da sua actividade científica e pedagógica, foi objecto de resposta em momento anterior à elaboração dos pareceres dos relatores, e foi publicado ainda durante o período experimental, pelo que deveria ter sido considerado na apreciação do currículo.

  7. A interpretação subjacente ao Acórdão do Venerando Tribunal recorrido é manifestamente violadora do art. 25.º ECDU - na redacção anterior ao Decreto-Lei n.º 205/2009, de 31.08, na redacção que lhe foi dada por este diploma, e ainda com as alterações introduzidas pela Lei n.º 8/2012, de 13.05 - e coloca em causa os futuros procedimentos de nomeação definitiva na carreira dos docentes da Universidade de Coimbra.

  8. Infere-se do teor dos preceitos do art. 25.ºdo ECDU, designadamente do n.º1, que a Administração, neste caso a Universidade de Coimbra, pode pautar a sua actuação pelo exercício de poderes discricionários, desde que acautele os interesses dos docentes e respeite os princípios da legalidade, proporcionalidade, da justiça e da boa-fé, princípios a que está vinculada e que são transversais às relações que detém com todos os docentes universitários candidatos à nomeação definitiva, bem como aos respectivos procedimentos de nomeação.

  9. O Conselho Científico da FCTUC pode, no exercício dos poderes discricionários que lhe são conferidos pelo n.º1 do art. 25.º, adoptar os procedimentos internos que melhor prossigam os interesses da instituição e dos docentes, desde que esses procedimentos sejam uniformes a todos os procedimentos de nomeação definitiva conformes aos princípios gerais de direito.

  10. No caso concreto, por muito que fosse de valorizar, para efeitos de actividade desenvolvida durante o período experimental, o artigo científico elaborado pela Autora e efectivamente desenvolvido durante esse período, o Conselho Científico não poderia tomá-lo em consideração, pois a prática desde sempre adoptada, e que é a correcta pois respeita os princípios da igualdade e da transparência, é a de que, para efeitos de avaliação do período experimental, apenas são considerados os factos que se tenham verificado durante esse período e que constem do relatório no momento em que o mesmo é entregue pelo docente.

  11. De forma a que seja respeitada a disposição do n.º 3 do art. 25.º do ECDU, é necessário que a decisão definitiva de cessação do contrato de trabalho por tempo indeterminado esteja tomada até seis meses antes desse termo, o que implica que o relatório da actividade específica desenvolvida durante esse período seja apresentado ainda em momento anterior, por forma a que sobre o mesmo possam recair os pareceres dos relatores, a deliberação do Conselho Científico e a consequente decisão reitoral de cessação do contrato de trabalho.

  12. Por forma a que o processo de nomeação definitiva esteja devidamente instruído e concluído na altura da tomada de decisão sobre a cessação ou manutenção do contrato de trabalho, o órgão da Universidade tem que obrigatoriamente antecipar o momento da entrega do relatório para uma data necessariamente anterior ao termo do período experimental.

  13. Face ao necessário cumprimento destas exigências legais subjacentes ao n.º 3 do art. 25.º do ECDU, apenas podem ser considerados, para efeitos de apreciação da actividade desenvolvida durante o período experimental, os factos que se tenham verificado e constem expressamente do relatório de actividades no momento da sua entrega, como sucedeu no caso concreto.

  14. No caso sub judice, e independentemente de a publicação do artigo em causa não estar dependente da actuação da Autora, que não pode interferir no procedimento da resposta a dar sobre a admissibilidade ou não do trabalho para publicação, o que é certo é que aquando da elaboração do relatório de actividades não poderia confiar-se que o artigo seria aceite, porquanto a submissão de um trabalho para publicação não significa sequer que o mesmo seja aceite.

  15. Nestes termos, é razoável admitir que a Universidade de Coimbra tenha estabelecido como data limite para considerar os artigos elaborados e publicados durante o período experimental, o momento da entrega do relatório de actividades, sob pena de toda a tramitação posterior do procedimento conducente à nomeação definitiva (pareceres dos relatores, deliberação do Conselho Científico e despacho reitoral) ficar sujeita a uma instabilidade insustentável em função dos artigos que vão sendo ou não aceites pelas revistas científicas.

  16. Como deveria actuar a Administração caso um docente candidato à nomeação definitiva apresentasse um artigo científico publicado no último dia do período experimental? Repetiria todo o processo de avaliação por forma a que esse artigo fosse objecto de avaliação? Não é de todo razoável o entendimento que defenda pela admissão de uma resposta afirmativa a esta questão, pois a ser assim teríamos que adiar sine die a decisão final a tomar no procedimento de nomeação definitiva, por forma a proporcionar a todos os docentes a possibilidade de revisão da sua avaliação em função de elementos eventualmente relevantes para a...

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