Acórdão nº 0881/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelDULCE NETO
Data da Resolução03 de Dezembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

A……………., S.A., com os demais sinais dos autos, interpõe recurso do despacho saneador-sentença proferido pelo Tributário de Lisboa que, no âmbito de acção administrativa especial que deduziu com vista à anulação do acto de indeferimento do recurso hierárquico interposto da decisão administrativa que lhe indeferiu o pedido formulado em procedimento para prova do preço efectivo na transmissão de imóvel, e com vista à condenação do Subdirector-geral da Direcção-Geral dos Impostos para a Área da Justiça Tributária à prática do acto administrativo devido, julgou procedente a excepção dilatória da inimpugnabilidade do acto sindicado nessa acção e, em consequência, absolveu o Réu da instância.

1.1.

Terminou a alegação de recurso com as seguintes conclusões: 1. O presente recurso jurisdicional vem interposto da sentença de fls…, datada de 9 de Setembro de 2011, proferida nos autos referidos em epígrafe, a qual julgou a excepção dilatória da inimpugnabilidade do acto administrativo impugnado e, em consequência, absolveu o Réu da instância.

  1. Em causa está o pedido formulado pela Recorrente de anulação do acto administrativo de indeferimento de um recurso hierárquico, por si interposto, da decisão que recaiu sobre o pedido de prova de preço efectivo na transmissão de um dado imóvel, acto esse praticado pelo Subdirector-geral da Direcção-geral dos Impostos para a Arca da Justiça Tributária, bem como a condenação do Réu à prática do acto administrativo devido, consubstanciado no deferimento daquele pedido.

  2. A Recorrente não se conforma com o sentido da sentença proferida pelo tribunal a quo, uma vez que não se poderá deixar de considerar a decisão do recurso hierárquico aqui em crise como um acto destacável, total e imediatamente lesivo dos seus direitos e, nessa medida, susceptível de reacção judicial autónoma.

  3. Na verdade, no contencioso tributário vigora o princípio da impugnação unitária, existindo, porém, actos que, ainda que antecedentes da decisão final, acabam por assumir uma importância especial, mormente quando conformam, de modo muito acentuado, aquela decisão final: são os designados actos destacáveis (artigo 54º do CPPT).

  4. E estes actos, caso sejam imediatamente lesivos dos direitos dos contribuintes, serão directamente impugnáveis, independentemente de norma expressa, tal como explicitamente menciona a primeira parte do artigo 54º do CPPT.

  5. Significa isto que, havendo um acto imediatamente lesivo dos direitos do contribuinte, ainda que esse acto esteja inserido num dado procedimento e seja antecedente de uma decisão final, tem o contribuinte a faculdade de o impugnar autónoma e imediatamente, não ficando limitado o seu direito de impugnar a decisão final.

  6. É, justamente o que sucede no caso em apreço: estamos perante um acto destacável, directa e imediatamente ofensivo dos direitos do sujeito passivo e, nessa medida, autonomamente impugnável.

  7. Repare-se que a decisão do pedido de prova do preço efectivo afecta, imediata e directamente, a esfera jurídica do sujeito passivo, uma vez que o procedimento não culmina somente com a liquidação - e, portanto, não é só com a liquidação do tributo que a situação tributária do sujeito passivo é afectada -, mas abrange um outro conjunto de procedimentos - impostos pela lei - que antecedem aquela liquidação, designadamente a imposição legal de alteração da declaração de rendimentos por parte do sujeito passivo em face daquela decisão.

  8. Para além do mais, estamos em presença, no artigo 58º-A do CIRC, de um dispositivo antiabuso que se destina a obviar e reprimir a subdeclaração de valores fiscais e, como tal, de uma norma cuja aplicação indiscriminada tem de ser refreada pela intervenção dos princípios da adequação e da proporcionalidade, devendo ser real e efectiva a faculdade de os sujeitos passivos poderem refutar a presunção legal de abuso, única via para garantir o devido equilíbrio daquela presunção com uma de sentido contrário - a presunção de veracidade das declarações dos contribuintes.

  9. Pelo que, em face do exposto, não poderá deixar de se concluir que estamos, sem sombra de dúvida, perante um acto imediatamente lesivo dos direitos da recorrente: a Administração fiscal, por via de um subterfúgio formal cuja proporcionalidade em face dos fins a atingir não fundamenta minimamente, está a impedir que a recorrente comprove o preço efectivamente praticado numa dada transacção de um bem imóvel, limitando, por conseguinte, o direito desta de ser tributada pelo lucro real o que, obviamente, se traduz numa lesão dos seus direitos constitucionais.

  10. O Tribunal a quo faz, por isso, uma errada interpretação do direito aplicável, nomeadamente dos artigos 58º-A e 129º do CIRC e 54º do CPPT, devendo a sentença ser, por vício de violação de lei, revogada.

  11. Quanto ao objecto do litígio, julga a recorrente dever o tribunal de recurso conhecer do objecto do pedido, por força do preceituado no artigo 149º do CPTA, não deixando de salientar, para além do demais invocado na petição inicial da acção administrativa especial, que a Administração fiscal, face a situações fácticas exactamente idênticas, não adoptou a mesma solução jurídica, nomeadamente ao permitir a outros contribuintes fazer a prova do preço efectivo através de outros meios, sem exigir qualquer acesso a contas bancárias e sem deixar de conhecer do pedido pela não apresentação dessa documentação.

  12. Deste modo, a Administração fiscal violou, de modo clamoroso, os princípios da igualdade, da verdade material e da capacidade contributiva, previstos no artigo 55º da LGT e nos artigos 13º, 101º e 104º e nº 2 do artigo 266º da Constituição da Republica Portuguesa.

    1.2.

    O Recorrido – Subdirector Geral dos Impostos – apresentou contra-alegações para sustentar a manutenção do julgado, defendendo que a decisão recorrida, ao decidir que se verificava a excepção da inimpugnabilidade do acto e ao absolvê-lo da instância com tal fundamento, fez uma correcta interpretação e aplicação da lei aos factos.

    1.3.

    Por seu turno, o Exmº Subdirector-Geral dos Impostos interpôs recurso dessa decisão do Tribunal Tributário de Lisboa no que toca à falta de fixação do valor da causa e no que toca à condenação em custas, tendo terminado as respectivas alegações com as seguintes conclusões: Da falta de fixação do valor da causa: A- Na sua contestação, a fls. …, para além de o R. ter invocado as excepções conhecidas e decididas da caducidade do direito de acção, da cumulação ilegal de pedidos e da inimpugnabilidade do acto veio, também, impugnar o valor da causa por considerar que o valor indicado pela A. de € 10.000.000,00, sem esta ter indicado como chegou a tal montante, é inadequado e excessivo.

    B- Contudo, no saneador sentença, a fls. ..., o Tribunal “a quo”, não se pronunciou sobre este incidente levantado pelo então R., tendo omitido pronúncia sobre a questão da fixação do valor da causa.

    C- Por outro lado, o art. 315º do CPC, determina no nº 1, que: “Compete ao juiz fixar o valor da causa, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes” e, no nº 2, que: “O valor da causa é fixado no despacho saneador, salvo nos processos a que refere o nº 3 do art. 308º e naqueles em que não haja lugar a despacho saneador, sendo então fixado na sentença”.

    D- Assim ao não ter fixado o valor da acção, decidindo sobre o incidente levantado pelo R., na sua contestação, a fls. ..., a decisão ora impugnada, não só cometeu uma omissão de pronúncia, que conduz à nulidade da sentença, por não ter conhecido e decidido sobre questão de que devia ter conhecido e decidido (cfr. al. d), do nº 1 do art. 668º do CPC), como também, eventualmente, pode existir uma nulidade processual, por se ter omitido uma formalidade prescrita na lei (cfr. art. 201º nº 1 do CPC), o que desde já o ora recorrente invoca, nos termos do art. 205º do CPC.

    E- Pelo que, deve o saneador sentença, a fls. ..., ser julgado nulo (cfr. al. d), do 1 do art. 668º do CPC) ou, ser declarada a nulidade processual consistente na falta de fixação do valor da causa no despacho saneador, cfr. art. 201º do CPC.

    Do pedido de reforma quanto a custas: F- Por outro lado o saneador sentença, a fls. ..., embora tenha absolvido o R. da instância, por julgar que se verificava a excepção por este invocada da inimpugnabilidade do acto veio, no entanto, a condenar o R., em custas, na proporção de metade.

    G- E ao invocar, para tanto, que tal condenação se justifica pelo facto de o então R. ser co-responsável na interposição da presente acção, em virtude do teor da notificação do acto ser susceptível de induzir em erro o destinatário do mesmo, hipótese que teria acolhimento legal no art. 450º do CPC, cometeu o Tribunal a quo”, salvo o devido respeito, uma errada interpretação e aplicação aos factos do referido artigo conjugado com o art. 446º, também do mesmo Código.

    H- Na verdade, pese embora o conteúdo da notificação do despacho do Subdirector Geral de 06-10-08, a então A., devidamente representada por mandatário judicial, não se encontrava desonerada de fazer uma apreciação e qualificação jurídica do acto, para efeitos de determinar da...

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