Acórdão nº 0779/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Setembro de 2014
Magistrado Responsável | FRANCISCO ROTHES |
Data da Resolução | 24 de Setembro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 1371/06.0BELSB 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada “A……………., S.A.” (a seguir Contribuinte, Impugnante ou Recorrente) recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pelo Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial por aquela deduzida contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) que lhe foi efectuada, com referência ao ano de 2001, após a Administração tributária (AT) ter corrigido a matéria tributável declarada por não ter aceitado como custo fiscal do exercício uma verba de € 1.870.492,11.
1.2 O recurso foi admitido, com subida imediata e nos próprios autos e a Recorrente apresentou a motivação do recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor: « A) Conforme resulta da matéria provada da douta sentença recorrida, a recorrente, por escritura de 23 de Novembro de 2001, adquiriu o prédio rústico 1988 da freguesia ………., pelo preço de 225.000.000$00.
B) Conforme resulta da matéria provada da douta sentença recorrida, a recorrente, por escritura de 23 de Novembro de 2001, adquiriu o prédio rústico 1987 da freguesia ……….., pelo preço de 225.000.000$00.
C) Conforme resulta da matéria provada da douta sentença recorrida, a recorrente, por escritura de 26 de Dezembro de 2001, vendeu os prédios rústicos 1988 e 1987 da freguesia …………., pelo preço de 75.000.000$00.
D) Tal como resulta do facto n.º 2 da matéria provada, em Novembro de 2001, no exercício da sua actividade, que se pretende que seja lucrativa, a A………. comprou dois terrenos rústicos por 450 mil contos. No mês seguinte vendeu os mesmos terrenos por 75 mil contos, resultando uma perda sem motivo aparente e sem justificação aceitável, de 375 mil contos (ou seja, €1.870.492,11).
E) Quer na douta sentença recorrida quer no relatório inspectivo se qualifica a referida quantia de € 1.870.492,11 como perda, nos termos do artigo 23.º do CIRC.
F) Sucede, porém, que para efeitos do artigo 23.º do CIRC, custos ou perdas são os encargos indispensáveis para a realização dos proveitos.
G) Assim, tendo em conta que a verba de € 1.870.492,11 corresponde à diferença entre o custo da compra dos terrenos e o proveito das vendas, tal significa que a referida verba não pode ser qualificada como um custo ou perda.
H) Pelo contrário, a referida verba terá de ser qualificada como um prejuízo fiscal.
I) Natureza de prejuízo fiscal da referida verba cuja correcção fiscal com fundamento no artigo 23.º do CIRC é ilegal.
J) Com efeito, resultando a referida verba de € 1.870.492,11 da diferença entre custos e proveitos obtidos mediante escrituras públicas cuja validade não foi posta em causa no relatório de inspecção, a exclusão de tal prejuízo fiscal apenas poderia ser efectuada mediante a aplicação do regime do artigo 63.º do CPPT.
L) De acordo com o referido artigo 63.º do CPPT, não produzem efeitos fiscais os negócios juridicamente válidos com os quais são reduzidos ou eliminados os lucros tributáveis das empresas.
M) Daí que a correcção fiscal da verba de € 1.870.492,11 é ilegal por violação do regime do artigo 63.º do CPPT.
N) Mas se assim não se entender, sempre se dirá o seguinte: O) As compras dos prédios rústicos 1988 e 1987, ambos da freguesia …………, geraram proveitos na esfera da recorrente na quantia de Esc.75.000.000$00.
P) Assim, existindo proveitos associados às perdas, as mesmas são aceites fiscalmente.
Q) Nem a letra nem o espírito do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC permitem excluir a perda contabilizada pela recorrente e não aceite pela Administração Fiscal.
R) Aliás, para situação análoga, qual seja, a das perdas com a transmissão onerosa de partes de capital, o legislador consagrou o n.º 7 do artigo 23.º do CIRC para existir fundamento legal para a exclusão das referidas perdas, com a transmissão de partes de capital.
S) A douta decisão recorrida fez incorrecta interpretação e aplicação do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC e dos n.ºs 1 e 2 do artigo 63.º do CPPT.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a douta sentença recorrida, anulando-se a liquidação de IRC de 2001».
1.3 A Fazenda Pública não contra alegou o recurso.
1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso, com a seguinte fundamentação (As notas que no original estavam em rodapé serão transcritas no texto, entre parêntesis rectos.
): «A questão controvertida consiste em saber se para desconsiderar as menos valias em causa haveria que lançar mão do procedimento do artigo 63.º do CPPT respeitante à utilização de normas antiabuso e se as mesmas são indispensáveis para a manutenção da fonte produtora e obtenção dos proveitos.
Como muito bem assinala a sentença recorrida não há que lançar mão do procedimento atinente à utilização de normas antiabuso porquanto a administração tributária não põe em causa os negócios jurídicos de compra e venda dos imóveis, aceitando a realidade das operações económicas escrituradas. De facto, a administração tributária, apenas, não aceita a perda em causa como custo fiscal, pela não verificação do requisito da indispensabilidade.
Nos termos do estatuído no artigo 23.º do CIRC consideram-se como custos fiscais ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.
Para que os custos enumerados no artigo 23.º do CIRC sejam considerados dedutíveis para efeitos fiscais é necessário, pois, que se verifiquem dois requisitos cumulativos, a saber: 1. Que sejam comprovados através de documentos emitidos nos termos legais; 2. Que sejam indispensáveis para a realização dos proveitos.
Os custos sindicados não foram fiscalmente aceites, no termos do estatuído no artigo 23.º do CIRC, por não estar demonstrada a sua indispensabilidade para a obtenção dos proveitos ou manutenção da fonte produtora, uma vez que houve uma diferença de 600%, para menos, entre os preços de compra e os de venda.
Para aferir da indispensabilidade dos custos há que ter em conta o intuito objectivo que levou a recorrente a proceder como procedeu com a compra e venda dos imóveis, sendo certo que tal intuito não se identifica com o concreto ânimo de quem tomou tal decisão.
Efectivamente, o intuito objectivo é determinado a posteriori, tendo como referência todas as circunstâncias conhecidas no momento da decisão e nunca as posteriores.
Se a decisão teve na sua génese tão só o interesse da empresa, o prosseguimento do seu objecto social, tal como os seus sócios e gestores, bem ou mal não interessa, ao tempo o interpretaram, o custo não pode...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO