Acórdão nº 0718/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelJOSÉ VELOSO
Data da Resolução25 de Setembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. Relatório 1. SUCH - SERVIÇO DE UTILIZAÇÃO COMUM DOS HOSPITAIS [SUCH] e CENTRO HOSPITALAR DE SETÚBAL, E.P.E. [CHS], vêm interpor recursos de «revista» do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul [TCAS], de 26.04.2012, que negou provimento aos recursos jurisdicionais por elas intentados da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada [TAF de Almada], que tinha julgado parcialmente procedente esta acção administrativa especial [AAE] de contencioso pré-contratual, e, nessa conformidade, tinha declarado nula a adjudicação feita pelo CHS ao SUCH no âmbito da «prestação de serviços de alimentação», bem como a celebração do «Protocolo nºDCS/2498/01/2011», julgando improcedente o que demais tinha sido peticionado pela autora A…………….. [……..] - …………………, Lda. [A……………].

    O recorrente SUCH conclui as suas alegações de recurso de revista da seguinte forma: 1. O presente recurso deverá ser admitido por se encontrarem preenchidos os requisitos do artigo 150º do CPTA; 2. O acórdão do TCAS ao basear fundamentalmente as suas conclusões no acórdão do Tribunal de Contas [TC] que não transitou em julgado procedeu a uma incorrecta aplicação do direito, nomeadamente do artigo 5º do Código dos Contratos Públicos [CCP]; 3. Em síntese, e face ao exposto: o «Protocolo» integra-se no domínio da auto-satisfação de interesses a que os associados podem preferir recorrer, no uso dos seus poderes de gestão, em alternativa à aquisição externa dos bens e serviços necessários ao desenvolvimento da sua actividade; 4. Com efeito, desta última versão dos «Estatutos» extrai-se uma marcada intenção de preenchimento dos requisitos da doutrina in house, fruto da elaboração jurisprudencial do Tribunal de Justiça da União Europeia [TJUE], quando aplicada às relações contratuais entre o SUCH e os hospitais associados [como sendo o ora Requerido], para os efeitos previstos no nº2 do artigo 5º do CCP; 5. Seria contraditório, aliás, que o legislador permitisse que os hospitais criassem serviços de utilização comum e viesse, por outro lado, sujeitar a qualquer procedimento de formação de contratos públicos legalmente tipificado; 6. O Tribunal de Contas tem concedido visto à maioria dos Protocolos celebrados entre o SUCH e os seus associados, no âmbito da maioria das prestações de serviço realizadas pelo ora recorrente no âmbito da sua actividade, a saber: Processonº696/11, Processonº552/09, Processo nº1788/2011 e Processo nº1197/2011; 7. Estão reunidas as condições para se considerar existir relação in house entre os associados, incluindo o CHS e o SUCH; 8. Está suficientemente provada a existência de controlo análogo do SUCH, exercido conjuntamente pelos seus associados, para os efeitos previstos na alínea a) do nº2 do artigo 5º do CCP.

    Termina pedindo o provimento do recurso de revista.

    O recorrente CHS culmina as suas alegações de revista formulando as seguintes conclusões: O recurso de revista deve ser admitido por estas razões: 1. O acórdão recorrido, a confirmar-se, não tem consequências restritas ao protocolo celebrado entre o CHS e SUCH, pois faz periclitar os inúmeros contratos/protocolos/acordos celebrados entre o SUCH e as instituições e serviços do SNS, com fundamento no artigo 5º nº2 do CCP, ao mesmo tempo que cria uma instabilidade nos associados públicos do SUCH relativamente à forma de relacionamento com esta entidade; 2. Colocando em causa o modelo organizacional que suporta a aquisição de serviços no SNS, e, em consequência, a rentabilização do rendimento económico dos hospitais; 3. A admissão do presente recurso de revista é, portanto, fundamental para se «fechar» uma posição jurisprudencial sobre esta «questão», que se espera ser no sentido defendido pela ora recorrente; 4. A questão que se coloca agora ao STA, é, portanto, não só de manifesta relevância jurídica, mas também social, na medida em que se traduz na questão da aplicabilidade do decidido a inúmeros casos que possam vir a surgir, o que lhe retira qualquer carácter individual; O recurso de revista deve ser julgado procedente pelas seguintes razões: 1. O douto acórdão do TCAS julgou nula a adjudicação efectuada pelo CHS ao SUCH pela falta de «elemento essencial», ou seja, «pela falta de procedimento para a formação de contrato legalmente previsto»; 2. Em consequência declarou igualmente nula a celebração do Protocolo DCS/2498/O1/2011; 3. Em sede própria, o ora recorrido teve a oportunidade de expor os motivos pelos quais discorda do entendimento expresso pelo Tribunal de Contas no acórdão «70/2011, mencionado pelo acórdão recorrido, tanto mais que tal entendimento é contraditório com a mais recente posição veiculada por aquele mesmo Tribunal; 4. Com feito, a argumentação expendida pelo Tribunal de Contas no acórdão em apreço, é fortemente criticável, encontrando-se em desconformidade com o direito nacional e comunitário constituído, como se expôs no ponto «A) Da inadmissibilidade de consideração do acórdão do Tribunal de Contas» supra destas alegações, que aqui se considera integralmente reproduzido; 5. Com efeito, a celebração do Protocolo em apreço foi efectuada sem sujeição a qualquer procedimento pré-contratual legalmente tipificado no CCP - mas ao abrigo de uma norma habilitante que integra aquele mesmo CCP, o seu artigo 5º nº 2 - partindo do reconhecimento, de facto e de direito, que as relações contratuais entre os associados e o SUCH não se situam num plano idêntico ao das relações com terceiros, existindo uma manifesta especialidade que permite concluir que ao processo de formação daqueles contratos não são aplicáveis as regras da contratação pública; 6. Seria contraditório, aliás, que o legislador permitisse que os hospitais criassem serviços de utilização comum [e para cujo funcionamento contribuem, desde logo, pelo pagamento de quotas], para possibilitar uma melhor repartição de custos, que por vezes são avultados, a optimização dos recursos, e «um funcionamento mais ágil» dos associados, e viesse, por outro lado, sujeitar a qualquer procedimento de formação de contratos públicos legalmente tipificado a utilização de tais serviços; 7. Este entendimento vem de encontro: [1] primeiro, com a posição defendida pelo Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, nos Pareceres nº1/95, de 09.03.95, e 145/2001, de 07.11.2002, onde se concluiu que os serviços prestados pelo SUCH aos associados, no exercício das suas atribuições, inserem-se num «plano materialmente cooperativo», encontrando-se, assim, excluídos dos pressupostos de aplicação das normas sobre contratação pública, o que se mantém inalterado; [2] segundo, com a doutrina erigida pela jurisprudência do TJUE; [3] terceiro, com a positivação daquela doutrina no nº2 do artigo 5º do CCP, e [4] quarto, com o acolhimento expresso dos traços caracterizadores da teoria da relação in house nos Novos Estatutos do SUCH, que, em rigor, nada vieram inovar, mas apenas clarificar a questão; 8. Com efeito, analisadas as disposições mais relevantes desses Novos Estatutos, consideramos que as dúvidas suscitadas - sobre a existência de uma relação in house entre o SUCH e os seus associados, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 5º nº2 do CCP - no âmbito dos anteriores Estatutos se devem considerar ultrapassadas à luz dos Novos Estatutos desta associação; 9. Entendimento que o próprio Tribunal de Contas, até Junho de 2009 - data em que passou a recusar o visto a contratos celebrados entre o SUCH e os seus associados sem sujeição às regras da contratação pública - manteve, certamente por reconhecer a especialidade assinalada da relação entre o SUCH e os seus associados públicos; 10. Estão reunidas as condições para se considerar existir uma relação in house entre os associados, incluindo o CHS e o SUCH; 11. Desde logo, está suficientemente provada a existência de controlo análogo do SUCH, exercido conjuntamente pelos seus associados, para os efeitos previstos no artigo 5º nº2 alínea a) do CCP, quer seja pela adstringência do SUCH aos seus fins estatutários [o que determina que tenha obrigatoriamente que pautar a sua actividade sem ter em vista o lucro, sem prejuízo, evidentemente, de uma gestão racional e eficiente], quer seja pelos intensos poderes de controlo que os associados conjuntamente têm, não só sobre as decisões macro de gestão [orientações estratégicas] mas também sobre a gestão corrente da actividade do SUCH, exercendo, assim, uma influência decisiva sobre a actuação desta associação, como expressamente previsto nos Novos Estatutos; 12. O requisito do controlo análogo não é abalado pelas circunstâncias de não existir uma subordinação exclusiva da gestão do SUCH a objectivos de interesse público e de a contratação directa do SUCH pelos seus associados nem sempre conduzir a mera partilha e utilização de serviços comuns, num modelo de auto-sustentação. Vejamos; 13. A existência de Misericórdias na qualidade de associados do SUCH não põe em causa o requisito do controlo análogo, pois as Misericórdias detêm uma participação minoritária na Assembleia Geral e na composição do Conselho de Administração do SUCH; 14. Os associados do SUCH são 126, dos quais apenas 24 pertencem ao sector privado, os restantes 102 integram o sector público da economia; 15. Com efeito, as Misericórdias, para além de constituírem a significativa minoria dos associados, detêm também uma participação minoritária na Assembleia Geral e na composição do Conselho de Administração, relativamente aos associados públicos, por aplicação do mecanismo de votos previsto no artigo 15° nº7 dos Novos Estatutos do SUCH, de onde resulta que nenhuma das Misericórdias associadas do SUCH tem mais que um voto, enquanto há vinte associados públicos com dois votos [é o caso do CHS], quatro com três votos, um com quatro votos e um com cinco votos; os restantes associados públicos têm também apenas um voto; 16. Dito de outro modo, os associados públicos detêm uma maioria de decisão [votos] ainda muito superior à da...

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