Acórdão nº 0624/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 30 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelANA PAULA PORTELA
Data da Resolução30 de Abril de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

1- O MUNICÍPIO DO SEIXAL, — inconformado com o Acórdão do TCAS, fls. 524/545, que negou provimento ao recurso, na sequência da ação Administrativa Especial de Pretensão Conexa com ato administrativo, que o Ministério Público propôs no TAF de Almada, contra o Município do Seixal, e indicando como contra-interessadas B………………., S.A. (substituída pela sociedade C…………., S.A., por ter ocorrido a sua fusão) e A……………. — interpôs recurso de revista, para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do artigo 150.°, nº1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

1.1. Para tanto alegou, vindo a concluir: “1.ª Versando o presente processo sobre a interpretação do conceito de “área do terreno a lotear” ínsito no art. 4º do Regulamento do Plano Diretor Municipal (PDM) do Seixal e na subsequente aplicação dos índices urbanísticos de verde integral, de utilização bruta e de utilização líquida previstos no art. 20º do mesmo instrumento de gestão territorial, resulta inequivocamente demonstrada, nos termos da jurisprudência pacífica do STA, a relevância prática da questão em apreciação e o seu interesse objectivo, para efeitos de garantia de uniformização do direito, atenta a virtualidade de se repetir num número indeterminado de casos em que se proceda (ou já se tenha procedido) à aplicação do mesmo PDM, que ultrapassa largamente os limites da situação singular em apreço nos autos (cfr. Ac. STA de 05/11/2013, Proc 1422/13).

  1. Verificam-se, assim, claramente os pressupostos estabelecidos no art. 150° do CPTA, pelo que deve o presente recurso excepcional de revista ser admitido e, em consequência, ser apreciada a questão de fundo por esse Venerando Supremo Tribunal.

  2. O Regulamento do PDM do Seixal não proíbe expressamente a possibilidade das áreas integradas em solo rural serem cedidas para espaços verdes no âmbito de operações de loteamento.

  3. O critério adoptado no RPDM do Seixal para a aplicação dos índices urbanísticos de verde integral, de utilização líquida e de utilização bruta tem em conta a concreta localização do prédio a lotear, assim se justificando que os diferentes índices para cada UNOP atendam à totalidade da área dos prédios a lotear (já assim não seria defensável se os índices fossem iguais para todas as UNOP’s).

  4. O conceito de “área do terreno a lotear” previsto no Regulamento do PDM do Seixal abrange todo o prédio objecto da operação de loteamento; caso o prédio se situe parcialmente em área não urbanizável, os índices urbanísticos de verde integral e de utilização bruta a aplicar em cada unidade operativa de planeamento e gestão (UNOP) têm necessariamente de considerar a área total do prédio a lotear, pois é a única interpretação possível do Regulamento do PDM do Seixal no sentido de conciliar e separar a aplicação dos índices de utilização bruta e de utilização líquida.

  5. Com a consagração de dois índices diferentes, a aplicar consoante a área a lotear se situe integralmente na categoria de ÁREA DE EXPANSÃO URBANA (aplicando-se, neste caso, o Índice de Utilização Bruto) ou abranja mais categorias e classes de espaços (caso em que o Índice de Utilização Líquido é aplicável apenas à área a lotear inserida na ÁREA DE EXPANSÃO URBANA), a opção de planificação procurou assegurar uma solução equitativa no âmbito de cada uma das UNOP.

  6. Se assim se não entender, como resulta da tese perfilhada no acórdão do Tribunal a quo, que defende que a área de terreno que se situe em solo não urbanizável não pode ser considerada como área de terreno a lotear, nas situações em que a operação se concretiza em terrenos totalmente localizados em solo urbano, o índice de utilização líquida anula totalmente o índice de utilização bruta.

  7. A operação de loteamento licenciada não atribui índice de construção fora da área urbana, tal como delimitada no PDM, pelo que, ao contrário do decidido pelo Tribunal recorrido, não se verifica in casu nenhuma violação do art. 41° do RJUE.

  8. Se a própria lei prevê a possibilidade das áreas integradas em solo rural serem cedidas para espaços verdes em operações de loteamento, nomeadamente áreas integradas em REN ou na elaboração de Planos de Urbanização, não se vislumbra como pode contestar-se a interpretação e aplicação do PDM do Seixal no mesmo sentido, desde sempre perfilhada pelo Município recorrido nos actos de licenciamento de operações de loteamento.

  9. A decisão recorrida assenta numa errada interpretação e aplicação do art. 41° do RJUE, porquanto a proibição ínsita nesta norma visa evitar a constituição de lotes para construção em solos rurais; contudo, não impede, como no caso em apreço nos autos, a concretização da operação de loteamento num prédio que, apenas em resultado da aplicação das regras de um instrumento de gestão territorial, ficou parcialmente localizado fora do perímetro urbano; aquilo que importa garantir é que a parte do prédio aí localizada respeite o regime de ocupação definido no PDM.

  10. O acórdão recorrido padece de incorrecta interpretação e aplicação do direito no que respeita à interpretação do conceito de “área do terreno a lotear” ínsito no art. 4° do Regulamento do Plano Director Municipal do Seixal e à subsequente aplicação dos índices urbanísticos previstos no art. 20° do mesmo instrumento de gestão territorial; ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, os actos administrativos de licenciamento da operação de loteamento em apreço nos autos não violaram aquelas normas regulamentares, pelo que não padecem de nulidade por pretensa violação do disposto nos arts. 41° e 68°/a) do RJUE.

  11. Os índices urbanísticos a aplicar a cada uma das UNOP’s, foram definidos no RPDM do Seixal no exercício do princípio da discricionariedade de planificação da Administração.

  12. O Tribunal a quo procedeu ao reexame dos actos administrativos de licenciamento do loteamento, substituindo-se ao Município recorrido no exercício da função materialmente administrativa, perfilhando uma interpretação que reputou como mais conveniente, mas que não é inequívoca, pelo que não é susceptível de sancionar como nulos os actos administrativos praticados.

  13. A decisão recorrida invadiu a esfera dos poderes próprios da Administração, em clara violação do princípio da separação de poderes, previsto na Constituição e no art. 3° do CPTA, pelo que deve ser revogada e substituída por outra que dê provimento ao presente recurso e julgue totalmente improcedente o pedido de declaração de nulidade parcial dos actos administrativos de licenciamento do loteamento objecto dos presentes autos, assim cumprindo os desígnios do recurso de revista para uma melhor aplicação e uniformização do direito.

  14. A aplicação dos arts. 4° e 20º do Regulamento do Plano Director Municipal do Seixal, no que respeita ao conceito de “área do terreno a lotear” e ao cálculo dos índices urbanísticos de verde integral, de utilização bruta e de utilização líquida, conjugada com a aplicação do art. 41° do RJUE, perfilhadas no D. acórdão recorrido, têm subjacente uma interpretação do direito inconstitucional, que viola os princípios da separação e interdependência dos poderes e da descentralização administrativa e da autonomia do poder local, previstos nos arts. 111º, 202°, 235° e 237° da Constituição da República Portuguesa, dando causa a uma declaração de nulidade parcial dos actos administrativos sindicados nos presentes autos, a qual, por sua vez, viola os princípios da igualdade, da proporcionalidade e os limites ao direito de propriedade, ínsitos...

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