Acórdão nº 0845/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelJOSÉ VELOSO
Data da Resolução22 de Abril de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. Relatório 1. A…………., identificado nos autos, interpõe recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra [TAF], datada de 06.02.2012, que julgou improcedente este «recurso contencioso de anulação» [RCA].

    No RCA o recorrente contencioso pedia a anulação do despacho de 18.05.2001, proferido no âmbito do processo de obras nº26/2000 pelo Vereador da Câmara Municipal de Ovar [CMO] B…………., nos termos do qual, e com fundamento na Informação Jurídica de 17.05.2001, foi revogado o despacho de concessão do alvará de licença de construção 178/2001 [licença de construção de moradia - concedida ao recorrente], e foi ordenado o embargo da obra levada a cabo no lote 33, na rua …………, Esmoriz, Ovar.

    Na sentença recorrida decidiu-se nestes termos: 1. Declara-se nulo o despacho do Sr. Vereador da CMO [com competência delegada], de 26.10.2000, que licenciou a obra de construção de uma moradia no lote nº33 do loteamento objecto do alvará de licenciamento nº21/71, à rua ……….., em Esmoriz, Ovar, com base no qual foi emitido o alvará de licença de construção nº178/2001; 2. Declara-se nulo, por impossibilidade de objecto, o despacho impugnado, isto é, o despacho de 18.05.2001 do mesmo Vereador que revogou o acto supra, mas apenas na parte em que revogou esse acto, e não na parte que ordenou o embargo da obra. Em conformidade, julga-se a acção improcedente.

    O recorrente conclui assim as suas alegações: 1. A douta sentença recorrida é nula; 2. Porque se pronunciou declarando a nulidade do despacho de 26.10.2000, da CMO, que havia licenciado a construção de uma moradia no lote 33; 3. Quando o recorrente havia pedido, outrossim, a declaração de inexistência jurídica, nulidade, anulação, ou, ao menos, declaração de ineficácia, de acto administrativo diverso - o despacho de 18.05.2001; 4. Com efeito, não foi pedida nos autos a declaração de invalidade do despacho de 26.10.2000, que havia licenciado a construção de uma moradia no lote 33; 5. Assim, tendo a sentença recorrida emitido pronúncia de mérito sobre um acto administrativo diverso daquele que aqui foi concretamente impugnado; 6. Padece de nulidade, por pronúncia acerca de objecto diverso do pedido, e por conhecimento de questões não suscitadas pelo recorrente, e que extravasam, por isso, os limites da causa de pedir e do pedido [ver artigo 668º, nº1,alíneas d) e e), do CPC]; Por outro lado, mas sem prescindir, 7. Conforme decorre do disposto no artigo 134º nº1 do CPA, o acto nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos; 8. Assim, e tendo a douta sentença recorrida declarado a nulidade do despacho de 18.05.2001, nunca tal nulidade pode ser meramente parcial - no sentido de que só abrange um determinado segmento do acto nulo [no caso, a parte em que este revogou o alvará de licença de construção nº178/2001]; 9. Já não estando abrangida por essa nulidade a parte em que aquele despacho de 18.05.2001 ordenou o embargo da obra; 10. Com efeito, declarada a nulidade do acto, essa nulidade abrange o acto administrativo «in totum», pois ao regime da nulidade a lei associa a não produção de quaisquer efeitos jurídicos; 11. Aliás, uma vez que o despacho de 18.05.2001, ao ordenar o embargo da obra, teve por fundamento precisamente a revogação operada por esse despacho de 18.05.2001, do despacho de concessão do alvará de licença de construção nº178/2001 concedida ao recorrente; 12. E sendo tal despacho de 18.05.2001 nulo precisamente na parte que ordenou a revogação do despacho de concessão do alvará de licença de construção de moradia nº178/2001; 13. O consequente embargo da obra não pode, também ele, deixar de se considerar igualmente nulo; 14. Com efeito, se o embargo da obra é consequente de acto administrativo nulo, nulo será, igualmente, aquele embargo da obra - conforme decorre do disposto no artigo 133º nº 2 alínea i) do CPA; 15. Ou poderá o embargo da obra ter por base um acto administrativo nulo? 16. Com efeito, e como bem se afirma na douta sentença recorrida, «A verificação do vício de nulidade do acto a montante inquina de nulidade todos os subsequentes actos que o tinham por pressuposto [ver o artigo 132º nº2 alíneas a) e i) do CPA], por mais que respeitassem, no mais, a lei e o Direito»; 17. Logo, não se percebe como é que a nulidade do despacho de 18.05.2001 apenas o «atinja» na parte em que este revogou o alvará de licença de construção nº178/2001; 18. E já não na parte em que aquele mesmo despacho de 18.05.2001 ordenou o embargo da obra; 19. Com efeito, o decretamento do embargo da obra teve como pressuposto a revogação do anterior acto administrativo de licenciamento, e como essa revogação foi declarada nula, nulo será, consequentemente, e também, o decretamento do embargo; 20. Deste modo, ao declarar a nulidade parcial do dito acto administrativo, a douta sentença recorrida, respeitosamente, viola, entre outros, o disposto nos artigos 133º nº2 alínea i), e 134º nº1 do CPA; Acresce que, 21. Como já se salientou oportunamente, em sede de alegações escritas, deveria ter tido lugar a prévia prolação de despacho saneador, com especificação e questionário da factualidade que fosse pertinente, e a notificação das partes para indicar prova, conforme determinam os artigos 843º e 845º do CA, aplicáveis aos presentes autos; 22. Sendo certo que, conforme afirma a recorrida na sua contestação, «a matéria de facto em discussão é algo complexa»; 23. Ao prescindir expressamente desses actos processuais prévios, quando nenhuma disposição legal legitimava a sua dispensa, a sentença recorrida, salvo o devido respeito, violou o disposto naqueles preceitos legais; 24. A sentença recorrida, ao prescindir da produção de prova adicional, designadamente de prova testemunhal, sobre matéria de facto relevante para a apreciação de mérito, e alegada, oportunamente, na petição inicial, padece de erro de julgamento, por défice instrutório; 25. Atente-se, designadamente, na matéria de facto acima explicitada, oportunamente alegada na petição inicial, e reiterada em sede de alegações escritas, pelo menos alguma dela relevante para a apreciação de mérito, mas sobre a qual o recorrente não teve qualquer oportunidade de produzir prova adicional, designadamente testemunhal e/ou pericial, porque o Tribunal «a quo» não lhe concedeu essa oportunidade; 26. Tal factualidade é relevante para apreciar a conformidade do lote de terreno em questão, muros divisórios e edificação erigida, com o alvará de loteamento e, consequentemente, para aferir da validade ou invalidade do acto de licenciamento da construção; 27. E, pelo menos em relação a parte dessa factualidade, o Tribunal deveria ter concedido ao recorrente a oportunidade de produzir prova adicional, testemunhal e/ou pericial; 28. Afirma-se, na sentença recorrida, que o recorrente, ao ter alegado que seria necessário organizar base instrutória e produzir prova, contudo não indicou quais os factos controversos e que seriam relevantes para a apreciação de mérito; 29. Salvo o devido respeito, a elaboração de despacho saneador e especificação e questionário da factualidade relevante para a apreciação de mérito não compete ao recorrente, conforme decorre das supra citadas disposições legais e do disposto nos artigos 510º e 511º do CPC; 30. Logo, não competiria certamente ao recorrente a selecção dessa mesma matéria de facto, designadamente da que careceria de prova testemunhal ou pericial, a indicar pelo recorrente; 31. Outrossim, a omissão desses actos processuais prévios - saneador, especificação, questionário e produção de prova - porque capaz de influir no exame ou decisão da causa, representa, de igual modo, uma nulidade processual, com a consequente anulação do processado subsequente, designadamente da sentença aqui recorrida, nos termos do artigo 201º nº1 e nº2 do CPC; 32. O Tribunal «a quo» não deu oportunidade ao recorrente para produzir prova acerca da sobredita factualidade; 33. Baseando-se, única e exclusivamente, na documentação que consta do PA, designadamente nas medições «in loco» e à escala [tendo por referência a planta que consta do alvará de loteamento] que constarão desse PA; 34. E que terão sido efectuadas pelos serviços de topografia da CMO, ou seja, pelos serviços internos da própria recorrida [ver, por exemplo, a factualidade provada em 36 da «fundamentação de facto»]; 35. E o recorrente, não tem igual direito de produzir prova acerca da medição «in loco» do lote, ou da sua medição à escala, por técnicos da sua confiança e por si a designar oportunamente, na sequência da elaboração da especificação e questionário? 36. Porque se deu por provadas as conclusões das medições que terão sido efectuados pelos serviços internos da recorrida, sem que o recorrente tivesse oportunidade de sobre a mesma matéria produzir prova? 37. Tanto mais que o ora recorrente contraditou tal factualidade, alegando factos em sentido diverso, como acima se referiu; 38. Em face da violação daquelas disposições legais, e consequente deficit instrutório, constata-se que a sentença, por exemplo, e quanto à factualidade dada por provada em 24 da respectiva «fundamentação de facto»; 39. Não fundamentou em que documentos ou outros elementos de prova se estribou para dar por provada essa mesma factualidade, violando, por isso, o artigo 659º, nº3, do CPC, ao omitir qualquer apreciação dos elementos probatórios que terão permitido concluir pela prova dessa factualidade; 40. Além do mais, o julgamento da matéria de facto, porque estribado somente nos elementos documentais do PA, da própria recorrida, sem que ao recorrente tivesse sido dada oportunidade de produzir prova sobre factualidade que infirmava aquela que consta do PA, representa uma violação dos princípios do contraditório e igualdade das partes, consagrados, designadamente, nos artigos 3º e 3º-A do CPC; Acresce que, 41. Ao declarar a nulidade do despacho de 26.10.2000, que licenciou a construção da moradia no lote nº33, por alegadamente ser de conhecimento oficioso, a sentença...

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