Acórdão nº 0963/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução04 de Novembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 264/05.3BECBR 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada “A………, S.A.” (a seguir Impugnante ou Recorrente) recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) que lhe foi feita, com referência ao ano de 2001 na sequência de correcções à matéria tributável declarada por, na parte que ora nos interessa considerar (A Administração tributária (AT) procedeu a outras correcções com as quais a Contribuinte se conformou.

), a Administração tributária (AT) não ter aceitado como custo fiscal do exercício uma verba que decorre da redução do montante de um crédito.

1.2 O recurso foi admitido, com subida imediata e nos próprios autos e a Recorrente apresentou a motivação do recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor (Por razões de ordem prática, substituímos a numeração utilizada pela Recorrente pelas letras do alfabeto.

): «

  1. A anulação de um crédito em virtude do estabelecimento de um acordo que reduz o valor da contraprestação que seria devida por uma parte e que em termos jurídico-contratuais constitui uma alteração da prestação devida constitui um custo (redução de proveitos) ou uma variação patrimonial negativa decorrente da qual não podem deixar de decorrer, como efeito fiscal, a subtracção aos proveitos do valor correspondente ao crédito revogado.

  2. Efectivamente, ao ser irrelevado o desconto efectuado sobre o crédito original que deixou de existir, a tributação acaba por recair sobre um rendimento inexistente, não auferido e contratualmente inexigível por força do acordo que anulou o crédito anterior, razão pela qual, tal como se entendeu no Acórdão desse STA, de 9 de Maio de 2012, “a anulação do referido crédito não pode deixar de concorrer negativamente para a formação do lucro tributável”, a qual, em última instância, por interposição do princípio da justiça e da verdade material jamais poderia ser conformada pelo acréscimo ao lucro tributável do valor de € 40.040,54, como veio a ser efectuado pela AT.

  3. Assim, a actuação da recorrente ao diminuir o valor líquido das vendas nesse montante, não viola qualquer disposição legal, sendo, ademais, justificada pelos princípios concretizadores da ideia de justiça tributária.

  4. Carece assim de fundamento legal a actuação da AT ao liquidar adicionalmente um valor com base num crédito que deixou de existir em função de um contrato estabelecido entre as partes pelo qual se substitui o valor da contra-prestação devida por uma delas.

  5. Chamando a AT à colação a aplicação de um determinado regime legal, decorre do princípio do inquisitório que deve ser desenvolvido um conjunto mínimo de diligências de modo a apurar se em concreto estão, ou não, preenchidas as condições de aplicação do regime legal que a AT oficiosamente considerou aplicável em abstracto.

  6. Tendo a possível aplicação do artigo 37.º do CIRC sido suscitada pela AT em termos de em abstracto poder justificar a anulação do crédito em causa, a omissão de qualquer diligência no sentido de apurar da verificação dos pressupostos do regime que a AT considera aplicável, viola o princípio do inquisitório, da imparcialidade, da justiça e da legalidade.

    Termos em que e nos mais de direito deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, revogada a douta sentença recorrida, na parte ora impugnada, com as legais consequências».

    1.3 A Fazenda Pública não apresentou acontra-alegações.

    1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso e confirmada a sentença recorrida, com a seguinte fundamentação (As notas que estavam em rodapé no original, serão agora transcritas no texto entre parêntesis rectos.

    ): «[…] Como resulta do probatório e dos documentos para os quais remete (fls. 15 do RIT), na sequência do acordo com a B………, foi emitido o Aviso de Lançamento n.º 12078, de 31 de Dezembro de 2001, cujo descritivo é «desconto especial por acordo de pagamento», através do qual foi debitada a conta 71822 – Descontos e abatimentos vendas – prod. acab. – Merc. Intrac.» por crédito da conta de clientes de cobrança duvidosa «218521».

    Ora, como, claramente, deflui do probatório, apesar do descritivo não se trata de um desconto, ou seja, de uma redução do preço de venda, mas antes de uma anulação da dívida, uma vez que a recorrente, apenas, prescinde de um recebimento.

    A anulação da dívida não equivale a uma redução do lucro, pois este continua influenciado positivamente pelo respectivo proveito.

    Como é sabido não é utilizada a «óptica de caixa», sendo irrelevantes para o lucro tributável os recebimentos e pagamentos (artigo 18.º do CIRC).

    Portanto, parece certo que não estamos perante um custo fiscal nos termos para os efeitos do disposto no CIRC.

    A situação poder-se-ia, eventualmente, enquadrar no disposto no artigo 39.º do CIRC, desde que verificados os respectivos pressupostos.

    O certo é que a recorrente não juntou ao procedimento de liquidação nem ao processo judicial quaisquer documentos que possam comprovar a verificação desses pressupostos, nomeadamente, a falência da devedora, sendo certo que lhe cabia o ónus da prova, atento o estatuído no artigo 74.º da LGT.

    De facto, é ao contribuinte e não à AT que cabe demonstrar os custos que suportam para obter os proveitos, sendo certo que no caso em análise, só a recorrente está em condições de convencer que lhe não foi possível cobrar os créditos que detém sobre outrem.

    1 [1 Acórdão do STA de 2006.06.22 – P. 0177/05, disponível no sítio da Internet www.dgsi.pt].

    [(Pensamos que terá ocorrido lapso na indicação do número do processo e na data do acórdão: apesar do Procurador-Geral Adjunto indicar o acórdão proferido em 2006.06.22 no processo n.º 0177/05 (que não encontramos nas bases de dados), por certo queria referir-se ao acórdão proferido em 22 de Fevereiro de 2006, no processo n.º 1077/05.

    )] É certo que, nos termos do disposto nos artigos 266.º/1 da CRP e 55.º e 58.º da LGT a AT deve realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material.

    Todavia, essa obrigação não significa que ela tenha o ónus da prova desses factos, pois só a insuficiência probatória de factos constitutivos dos direitos invocados pela AT é valorada processualmente contra ela.

    2 [2 Lei Geral Tributária, anotada e comentada, 4.ª edição 2012, pág. 488, Diogo Leite de Campos, Benjamim Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa] Ora, conforme resulta do probatório (fls. 26 do RIT) a AT cumpriu o ónus da prova da correcção efectuada, ao demonstrar que, no caso em análise não se trata de um desconto de preço, mas sim de uma anulação parcial de dívida e, como tal, não consubstancia um custo fiscal, nos termos e para os feitos do disposto no artigo 23.º do CIRC.

    Em sede de direito de audição prévia, tentando justificar a contabilização desse alegado custo, veio a recorrente referir a iminente falência do cliente, tendo a AT sustentado que a recorrente não juntou qualquer documento judicial comprovativo da falência, pelo que não se poderia enquadrar a situação no artigo 39.º do CIRC, como, anteriormente, já havia...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT