Acórdão nº 0743/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DO CÉU NEVES
Data da Resolução29 de Julho de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO Os Municípios de Coimbra, Penacova, Condeixa-a-Nova e Góis, intentaram a presente providência cautelar, de suspensão de eficácia, de “actos administrativos contidos no Decreto-Lei nº 92/2015 de 29 de Maio”, com pedido de decretamento provisório contra o Conselho de Ministros e contra os Ministros de Estado e das Finanças, do Ambiente, Ordenamento do Território e da Energia.

Peticionam, a final a suspensão de eficácia: a) «i) Do acto administrativo que extingue a A………, S.A., concessionária do sistema multimunicipal de captação, tratamento e abastecimento de água do baixo Mondego-Bairrada – cfr. artº 4º, nº 2, nº 3 e nº 4; ii) Do acto administrativo que constitui a sociedade B………. S.A. – cfr. artº 4º, nº 1; iii) Do acto administrativo que extingue o actual sistema multimunicipal do Baixo Mondego-Bairrada – cfr. artºs 2º, nº 2 e 4º, nº 4; iv) Do acto administrativo que cria o sistema multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento do centro Litoral de Portugal- cfr. artº 1º, nº 1; v) Do acto administrativo que extingue o contrato de concessão do sistema multimunicipal de captação, tratamento e abastecimento de água do baixo Mondego-Bairrada celebrado entre o Estado e a sociedade A……… – artº 2º, nº 7; vi) Do acto administrativo que decide a celebração de um novo contrato de concessão relativo a esse sistema multimunicipal criado – artº 1º, nº 2, 9º e 10º; vii) Do acto que convoca a Assembleia Geral da sociedade A……….para o dia 30 de Junho, pelas 17.00h».

Mais requerem: b) «Contra os Ministros de Estado e das Finanças, do Ambiente, Ordenamento do Território e da Energia, o pedido de intimação a que se abstenham de celebrar o contrato de concessão do sistema referido em vi) da alínea anterior».

Indicam contra interessados que se mostra identificados nos autos.

* Por despacho da Relatora, datado de 18 de Junho de 2015, foi decidido rejeitar liminarmente as providências cautelares peticionadas dada incompetência da jurisdição administrativa para conhecer do objecto dos autos, de acordo com a al. a), do nº 2, do artº 4º do ETAF, que exclui do âmbito desta jurisdição a apreciação de litígios que visem a impugnação de actos praticados no exercício da função política e legislativa.

Os requerentes cautelares, inconformados, apresentaram a presente reclamação para a Conferência formulando as seguintes conclusões: «a) Os actos cuja suspensão se requer nos autos são actos individuais e concretos, imediatamente exequíveis, praticados em exclusiva concretização de normas legais, os quais relativamente a elas nada inovam; b) São assim actos praticados num desempenho de função secundária do Estado, a função administrativa: c) A normação com carácter inovador na matéria dos sistemas multimunicipais é estabelecida pelos Decreto-lei nº 319/84, 294/94 e 92/2015; d) E são estes diplomas que os actos cuja suspensão se requer executam e concretizam, nada inovando relativamente a eles; e) O despacho reclamado contém uma petição de princípio por dar como provado o que pretende provar, visto não proceder a qualquer demonstração da razão pela qual tais actos seriam inovadores; f) O despacho reclamado erra quando qualifica os actos requeridos nos autos como sendo da função legislativa por entender que seriam, apesar de individuais e concretos, inovadores, o que se afirma visto que, conforme resulta da presente reclamação, tais actos não contêm pinga de inovação, limitando-se a executar, sem nenhuma autonomia, o regime jurídico relativo aos sistemas multimunicipais previamente existente, estabelecido pelos citados Decreto-lei nºs 319/94, 294/94 e 92/2015; g) O Decreto-lei nº 92/2015, na interpretação que lhe dá o despacho reclamado é inconstitucional por violação do disposto nos artigos 62º e 18º, nº 3 da Constituição, por conter, nessa interpretação, normas da função legislativa individuais e concretas que lesam direitos fundamentais análogos – o que é proibido constitucionalmente; h) O Decreto-lei nº 92/2015, na interpretação que lhe é dada pelo despacho reclamado viola o disposto no artº 20º da Constituição porque de tal interpretação resulta a insusceptibilidade de as medidas e as decisões nele contidas serem sindicadas judicialmente, apesar de serem manifestamente prejudiciais para os seus destinatários e ilegais; i) O despacho reclamado é tirado em violação directa do disposto no artigo 268º/4 da Constituição que reconhece aos interessados a possibilidade de impugnarem qualquer acto administrativo independentemente da sua forma, sendo, nessa mesma medida, inconstitucional naquela interpretação; j) O Decreto-lei nº 92/2015 é ainda e uma vez mais naquela interpretação, inconstitucional por violar a autonomia municipal consagrada constitucionalmente nos artigos 237º e segs da Constituição e organicamente inconstitucional por violar o disposto no artigo 165º, nº 1, alínea q) da Constituição».

* Notificados os requeridos, veio o Conselho de Ministros defender a manutenção da decisão do despacho reclamado, tendo concluído da seguinte forma: «I. As normas do decreto-lei em apreço não são determinadas por qualquer quadro normativo pré-existente, encerrando, ao invés, uma definição primária dos objetivos e meios a adotar com vista à prossecução direta dos valores jurídicos e interesses coletivos constitucionalmente acolhidos. Da circunstância de não contrariar outros atos legislativos anteriores, imbuídos da mesma filosofia e dos mesmos objetivos gerais de política legislativa, não decorre qualquer relação de subordinação face a estes, constituindo antes um reflexo necessário e perfeitamente normal da unidade e coerência da política legislativa e do direito. Ainda que o Decreto-Lei nº 92/2013, de 11 de julho, tenha lançado as linhas gerais que norteiam a reorganização dos sistemas multimunicipais, não se pode dizer que ele tenha esgotado a decisão política primária. Assim, os comandos em crise decorrem claramente da função política-legislativa, e não da função administrativa; II.

Os comandos em crise poderão, porventura, qualificar-se como “lei-medida”, pois encerram prescrições de ordem geral, que se não esgotam com o resultado que pretendem alcançar por si só. São orientados, pois, por um princípio geral e objetivos mais vastos, que não se esgotam no diploma em questão. Mesmo nesse caso, revestem indubitavelmente natureza materialmente legislativa, pelo que o conhecimento das ilegalidades ou inconstitucionalidades de que hipoteticamente padecessem sempre extravasaria...

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