Acórdão nº 0624/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelANA PAULA PORTELA
Data da Resolução09 de Julho de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

A fls 644 e 645 vem a contra-interessada A………… e B………… Lda arguir a nulidade do acórdão proferido neste autos por omissão de pronúncia quanto ao recurso por si interposto ou, subsidiariamente, a entender-se estar em causa uma irregularidade, requerer a supressão da mesma.

Para tanto alega que não foi considerado e conhecido o recurso por si interposto do acórdão do TCAS.

Estipula-se no art.º 615º do novo CPC, sob a epígrafe de “Causas de nulidade da sentença”, que: “1 - É nula a sentença: ...d) Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento...” Em conjugação com este o art. 608º nº 2 do novo CPC dispõe que: “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação exceptuadas aquelas cujas decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras” E, qual o sentido da palavra “questões”? Ora, jurisprudência e doutrina têm entendido que há que distinguir “questões” de “razões” (ou seja, argumentos), e que a falta de apreciação de todos os motivos indicados, não constituem causa de nulidade de sentença ou acórdão.

Conforme resulta deste preceito e do art. 660º nº 2 do anterior CPC o tribunal deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras – ver neste sentido o Ac. STJ de 25/09/2003 - Proc. n.º 03B659).

Como diz o Prof. M. Teixeira de Sousa (in: “Estudos sobre o novo Processo Civil”, Lex, Lx 1997, págs. 220 e 221) é “... corolário do princípio da disponibilidade objectiva (art. 264.º, n.º 1 e 664.º 2ª parte) …” o que “… significa que o tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os pedidos formulados por elas, com exceção apenas das matérias ou pedidos que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se tornar inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões.

(...) Também a falta de apreciação de matéria de conhecimento oficioso constitui omissão de pronúncia …”. sendo questões “... todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que requerem decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais de ordem geral e os pressupostos específicos de qualquer ato (processual) especial, quando realmente debatidos entre as partes …” (cfr. Prof. A. Varela in RLJ, Ano 122º, pág. 112) e não podem confundir-se “... as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com as razões (de facto ou de direito), os argumentos, os pressupostos em que a parte funda a sua posição na questão …” (cfr. Prof. Alberto dos Reis in: “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V, pág.

E, efetivamente, a reclamante tem razão já que ocorre uma absoluta omissão de julgamento sobre o recurso por si interposto.

É que a reclamante havia interposto recurso do acórdão do TCAS prolatado nos autos e que veio a ser anulado, tendo em sua substituição vindo a ser proferido outro.

Na verdade, a fls 524 e seguintes, é anulado o referido acórdão sobre o qual a reclamante havia interposto recurso, tendo de imediato sido elaborado outro acórdão nos seguintes termos: “Porque saiu com lapso o anterior acórdão, que omitiu o recurso das C-I, passa-se a emitir novo acórdão, assim suprindo a nulidade ocorrida:...” Na sequência deste novo acórdão vem a aqui reclamante, a fls 552, “requerer que o recurso já interposto suba e seja apreciado, requerendo-se a ampliação do seu âmbito aos fundamentos subjacentes à nova decisão.” Ora, no acórdão deste STA aqui em causa não se teve em consideração este requerimento que faz estender ao novo acórdão o recurso já deduzido relativamente a acórdão anterior entretanto anulado.

Pelo que, o acórdão reclamado é nulo, o que se declara.

*1.O MUNICÍPIO DO SEIXAL e A………… e B…………, S.A. vêm interpor recurso de revista para este STA ao abrigo do art. 150º do CPTA do Acórdão do TCAS que negou provimento ao recurso da decisão do TAF de Almada que concedeu provimento à ação Administrativa Especial de Pretensão Conexa com ato administrativo, que o Ministério Público propôs contra o Município do Seixal, e indicando como contra-interessadas C…………, S.A. (substituída pela sociedade B…………, S.A., por ter ocorrido a sua fusão) e A………….

1.1. O Município do Seixal conclui as suas alegações da seguinte forma: “1.ª Versando o presente processo sobre a interpretação do conceito de “área do terreno a lotear” ínsito no art. 4º do Regulamento do Plano Diretor Municipal (PDM) do Seixal e na subsequente aplicação dos índices urbanísticos de verde integral, de utilização bruta e de utilização líquida previstos no art. 20º do mesmo instrumento de gestão territorial, resulta inequivocamente demonstrada, nos termos da jurisprudência pacífica do STA, a relevância prática da questão em apreciação e o seu interesse objectivo, para efeitos de garantia de uniformização do direito, atenta a virtualidade de se repetir num número indeterminado de casos em que se proceda (ou já se tenha procedido) à aplicação do mesmo PDM, que ultrapassa largamente os limites da situação singular em apreço nos autos (cfr. Ac. STA de 05/11/2013, Proc 1422/13).

  1. Verificam-se, assim, claramente os pressupostos estabelecidos no art. 150° do CPTA, pelo que deve o presente recurso excepcional de revista ser admitido e, em consequência, ser apreciada a questão de fundo por esse Venerando Supremo Tribunal.

  2. O Regulamento do PDM do Seixal não proíbe expressamente a possibilidade das áreas integradas em solo rural serem cedidas para espaços verdes no âmbito de operações de loteamento.

  3. O critério adoptado no RPDM do Seixal para a aplicação dos índices urbanísticos de verde integral, de utilização líquida e de utilização bruta tem em conta a concreta localização do prédio a lotear, assim se justificando que os diferentes índices para cada UNOP atendam à totalidade da área dos prédios a lotear (já assim não seria defensável se os índices fossem iguais para todas as UNOP’s).

  4. O conceito de “área do terreno a lotear” previsto no Regulamento do PDM do Seixal abrange todo o prédio objecto da operação de loteamento; caso o prédio se situe parcialmente em área não urbanizável, os índices urbanísticos de verde integral e de utilização bruta a aplicar em cada unidade operativa de planeamento e gestão (UNOP) têm necessariamente de considerar a área total do prédio a lotear, pois é a única interpretação possível do Regulamento do PDM do Seixal no sentido de conciliar e separar a aplicação dos índices de utilização bruta e de utilização líquida.

  5. Com a consagração de dois índices diferentes, a aplicar consoante a área a lotear se situe integralmente na categoria de ÁREA DE EXPANSÃO URBANA (aplicando-se, neste caso, o Índice de Utilização Bruto) ou abranja mais categorias e classes de espaços (caso em que o Índice de Utilização Líquido é aplicável apenas à área a lotear inserida na ÁREA DE EXPANSÃO URBANA), a opção de planificação procurou assegurar uma solução equitativa no âmbito de cada uma das UNOP.

  6. Se assim se não entender, como resulta da tese perfilhada no acórdão do Tribunal a quo, que defende que a área de terreno que se situe em solo não urbanizável não pode ser considerada como área de terreno a lotear, nas situações em que a operação se concretiza em terrenos totalmente localizados em solo urbano, o índice de utilização líquida anula totalmente o índice de utilização bruta.

  7. A operação de loteamento licenciada não atribui índice de construção fora da área urbana, tal como delimitada no PDM, pelo que, ao contrário do decidido pelo Tribunal recorrido, não se verifica in casu nenhuma violação do art. 41° do RJUE.

  8. Se a própria lei prevê a possibilidade das áreas integradas em solo rural serem cedidas para espaços verdes em operações de loteamento, nomeadamente áreas integradas em REN ou na elaboração de Planos de Urbanização, não se vislumbra como pode contestar-se a interpretação e aplicação do PDM do Seixal no mesmo sentido, desde sempre perfilhada pelo Município recorrido nos actos de licenciamento de operações de loteamento.

  9. A decisão recorrida assenta numa errada interpretação e aplicação do art. 41° do RJUE, porquanto a proibição ínsita nesta norma visa evitar a constituição de lotes para construção em solos rurais; contudo, não impede, como no caso em apreço nos autos, a concretização da operação de loteamento num prédio que, apenas em resultado da aplicação das regras de um instrumento de gestão territorial, ficou parcialmente localizado fora do perímetro urbano; aquilo que importa garantir é que a parte do prédio aí localizada respeite o regime de ocupação definido no PDM.

  10. O acórdão recorrido padece de incorrecta interpretação e aplicação do direito no que respeita à interpretação do conceito de “área do terreno a lotear” ínsito no art. 4° do Regulamento do Plano Director Municipal do Seixal e à subsequente aplicação dos índices urbanísticos previstos no art. 20° do mesmo instrumento de gestão territorial; ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, os actos administrativos de licenciamento da operação de loteamento em apreço nos autos não violaram aquelas normas regulamentares, pelo que não padecem de nulidade por pretensa violação do disposto nos arts. 41° e 68°/a) do RJUE.

  11. Os índices urbanísticos a aplicar a cada uma das UNOP’s, foram definidos no RPDM do Seixal no exercício do princípio da discricionariedade de planificação da Administração.

  12. O Tribunal a quo procedeu ao reexame dos actos administrativos de licenciamento do loteamento, substituindo-se ao Município recorrido no exercício da função materialmente administrativa, perfilhando uma interpretação que reputou como mais conveniente, mas que não é inequívoca, pelo que não é susceptível de sancionar como nulos os...

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