Acórdão nº 01447/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelCARLOS CARVALHO
Data da Resolução18 de Junho de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

RELATÓRIO 1.1. “A…………………” [doravante «A…………» representada pela B……………….., SA], devidamente identificado nos autos, instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto [«TAF/P»] a presente ação administrativa especial contra “MUNICÍPIO DO PORTO” peticionando, pela motivação inserta na petição inicial, que fosse “anulado o despacho do Sr. Vereador do Pelouro do Urbanismo e da Mobilidade da CMP, proferido em 19.01.2006, que deferiu o pedido de licenciamento de operação de loteamento a que corresponde o Proc. n.º 12.636/03, na parte que decidiu que a operação urbanística deve prever áreas destinadas a espaços verdes e de utilização coletiva e de equipamentos de utilização coletiva e o A. obrigado a proceder à sua cedência ou a pagar ao Município uma compensação pela não cedência e défice”.

1.2.

O «TAF/P», por acórdão de 29.11.2010, julgou a ação totalmente improcedente, absolvendo o R. do pedido.

1.3.

O A., inconformado, recorreu para o TCA Norte o qual, por acórdão de 15.06.2012, negou provimento ao recurso jurisdicional, confirmando o julgado recorrido.

1.4.

Invocando o disposto no art. 150.º do CPTA o mesmo A., inconformado com o acórdão proferido pelo TCA Norte, interpôs, então, o presente recurso jurisdicional de revista [cfr. fls. 373 e segs.], apresentando o seguinte quadro conclusivo que se reproduz: “...

  1. ) O presente recurso de revista é interposto do douto Acórdão do TCAN, proferido em 15.06.2012, …, que julgou improcedente o recurso jurisdicional que havia sido interposto do Acórdão do TAF do Porto, de 29.11.2010, …, que negou provimento à ação administrativa especial proposta pelo A. A………….., ora Recorrente, contra o R. Município do Porto e pela qual se impugnou o despacho do Exmo. Sr. Vereador da CMP, Dr. C………………, proferido em 19.01.2006 e exarado sobre a INF/259/06/DMGUI, que deferiu o pedido de licenciamento de operação de loteamento a que corresponde o Proc. n.º 12.636/03, na parte em que decidiu que a operação loteamento destinada a equipamento coletivo, no caso um hospital, está obrigada a prever e a ceder áreas destinadas a espaços verdes e de utilização coletiva e de equipamento de utilização coletiva e a pagar ao Município uma compensação pela não cedência.

    O douto Acórdão ora recorrido, manteve a decisão da 1.ª instância, por considerar que não se verifica a violação da Portaria n.º 1136/2001, dos arts. 2.º, n.º 1, al. q) e 42.º do RMUE (Regulamento Municipal de Urbanização e Edificação do Porto) e dos arts. 43.º e 128.º, n.º 3 do RJUE, pois entende que a classificação do hospital como equipamento coletivo não afasta a necessidade de previsão de áreas destinadas a espaços verdes e de utilização coletiva e a equipamentos coletivos e, na sua falta, ao pagamento de compensação, uma vez que um hospital privado, assim como um colégio privado e um lar de terceira idade privado, «Não deixam, pois, de ter natureza de serviços ou até de comércio, pois, apesar da utilização coletiva, não deixam de ter por objeto uma atividade lucrativa». (sublinhados nossos); 2.ª) A questão fundamental que se submete ao Venerando STA como objeto do recurso de revista, consiste em saber se, à luz do disposto nos arts. 43.º e 128.º, n.º 3 do RJUE, na Portaria n.º 1.136/2001, de 25.09. e dos arts. 2.º, n.º 1, al. q) e 42.º do RMUE, uma operação de loteamento (no caso, emparcelamento de 2 prédios num só lote) destinada à implantação de um hospital privado, que é qualificado como equipamento coletivo, está sujeita à obrigação de previsão de áreas destinadas a espaços verdes e de utilização coletiva e a equipamentos coletivos e, na sua falta, ao pagamento de compensação, à semelhança do que sucede com as operações de loteamento para edifícios destinados a serviços ou comércio.

    (…) 4.ª) Na douta decisão ora recorrida, o Tribunal a quo entendeu que: i. o teor do art. 43.º do RJUE e da Portaria n.º 1.136/2001 não permite afastar a obrigatoriedade da previsão de áreas destinadas a espaços verdes e de utilização coletiva, infraestruturas viárias e equipamentos de utilização coletiva mesmo no caso de a operação de loteamento se destinar à instalação de um equipamento coletivo, como é um hospital; ii. e que no caso do hospital privado, este deve prever áreas de acordo com os parâmetros definidos para os serviços, pois, não obstante ser um equipamento coletivo, não deixa de ter natureza de serviços, porque tem «por objeto uma atividade lucrativa» (vide supra 9. e 10.).

  2. ) Como resulta dos autos e é reconhecido pelas decisões judiciais proferidas, o hospital privado é um equipamento coletivo, tendo sido expressamente qualificado pela CMP como «equipamento urbano» no Pedido de Informação Prévia e como «equipamento de saúde» nas informações técnicas e no alvará de loteamento, pelo que o facto de revestir a natureza de equipamento coletivo afasta a obrigação, constante do n.º 1 do art. 43.º do RJUE, de previsão de áreas para espaços verdes e de utilização coletiva, infraestruturas viárias e equipamentos de utilização coletiva e, em consequência, da sua cedência ou, no caso de não cedência, do pagamento de uma compensação nos termos do n.º 5 do art. 44º do RJUE.

    E ainda que se admitisse que o art. 43º do RJUE permite, de uma forma genérica, a exigência de previsão de áreas para os fins referidos nas operações urbanísticas destinadas a equipamentos coletivos, sucede que a Portaria n.º 1.136/2001, que define os parâmetros de dimensionamento na falta de definição em plano municipal de ordenamento do território e que foi aplicada ao caso concreto, ao abrigo do n.º 3 do art. 128.º do RJUE, não prevê os parâmetros para este tipo de operações urbanísticas, na medida em que o hospital, ainda que privado, não é um edifício de serviços (vide supra 12. a 14.).

  3. ) Os equipamentos coletivos correspondem a edificações onde se localizam atividades destinadas à prestação de serviços de interesse público imprescindíveis à qualidade de vida das populações, promovendo essa mesma qualidade de vida e assegurando a otimização do acesso à cultura, à educação e à formação, à justiça, à saúde, à segurança social, ao desporto e ao lazer, conforme resulta do art. 17.º, n.º 1 do RJIGT e da densificação efetuada pela Portaria n.º 1.136/2001 (vide supra 15.).

  4. ) A obrigação constante do n.º 1 do art. 43.º do RJUE, de as operações de loteamento (bem como as demais operações urbanísticas que sejam qualificadas como de impacto semelhante ou com impacte urbanístico relevante, cfr. arts. 57.º, n.º 5 e 44.º, n.º 5 do RJUE) preverem áreas destinadas a espaços verdes e de utilização coletiva, infraestruturas viárias e equipamentos de utilização coletiva, visa «a obtenção de um adequado ordenamento do território, em especial, na sua vertente de racionalização da ocupação da urbe», e tem o seu fundamento e explicação no quadro normativo em que a mesma se insere, em especial as normas constitucionais, a Lei de Bases da Política de Ordenamento o Território e de Urbanismo (LBPTOU) e o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão territorial (RJIGT) (vide supra 16. e 17.).

  5. ) Com efeito, o legislador pretende cumprir as normas da constituição que lhe impõem, por um lado, o dever constitucional de promover o «correto ordenamento do território», tendo em vista uma correta localização das atividades, nos termos dos arts. 9.º, al. e) e 66.º, n.º 2, al. b) da CRP, e por outro, de tal tarefa ser levada a cabo com respeito ao Princípio da Igualdade e ao direito de propriedade, consagrados nos arts. 13.º e 62.º da CRP, à luz dos quais a imposição de restrições ao exercício do direito de propriedade está sujeita a exigência de equidade ou proporcionalidade.

    Daqui decorre que os encargos que sejam impostos pela realização das operações urbanísticas, como a previsão (e cedência) de áreas para fins coletivos, contribuindo para a criação de espaços verdes e de utilização coletiva, infraestruturas e equipamentos coletivos, devem ser proporcionais e equitativos, de modo a que todos contribuam para a criação e manutenção de espaços de interesse coletivo, promovendo o correto ordenamento do território e a qualidade de vida na urbe, em medida compatível com o impacto urbanístico da operação urbanística, que depende da sua dimensão e dos usos previstos (vide supra 18.).

  6. ) Num segundo plano, surgem os fins, princípios e objetivos que a LBPTOU definiu para a ordenamento do território e para a ocupação, a utilização e transformação solo, nos seus arts. 3.º, 5.º, 6.º e 14.º, n.º 1, entre os quais assumem particular importância para a matéria em análise, a distribuição equilibrada das funções de habitação, trabalho, cultura e lazer (art. 6.º, n.º 1, al b)), a qual implica que a programação, a criação e a manutenção dos equipamentos coletivos sejam realizadas considerando as necessidades específicas das populações, as acessibilidades e a adequação da capacidade de utilização (art. 6.º, n.º 2). No mesmo sentido, art. 18.º, n.º 2, al. a) do RJIGT (vide supra 19.).

  7. ) Considerando o enquadramento a nível constitucional e da LBPOTU, o legislador procurou criar um conjunto de regras que garantissem um adequado ordenamento do território, com uma correta distribuição e localização das várias funções e atividades económicas, bem como a existência de infraestruturas, equipamentos coletivos e espaços verdes, tendo para tanto previsto no domínio do ordenamento do território existem várias normas no RJIGT (das quais se destacam os arts. 17.º, 18.º, 19.º, 70.º, als. g) e h), 85.º, n.º 1, als. e) e f), 88.º, als. b), c) e f), e 91.º, n.º 1, als. c) e i)) e no que respeita à disciplina das operações urbanistas o art. 43.º do RJUE, sendo assim evidente que o seu objetivo é garantir que a realização de operações de loteamento promova o equilíbrio na distribuição e localização das várias funções urbanas, assegurando-se um desenho urbano racional e harmonioso, orientado por imperativos de...

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