Acórdão nº 0833/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Outubro de 2015
Magistrado Responsável | ISABEL MARQUES DA SILVA |
Data da Resolução | 21 de Outubro de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - Relatório -1 – Da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 5 de Fevereiro de 2015, que, no recurso de contra-ordenação interposto por A……………….. contra decisão de aplicação de coima por falta de pagamento de taxa de portagem, anulou a decisão administrativa que condenou a arguida e ordenou a remessa dos autos à Autoridade Administrativa – Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia – 3, para que proceda à apensação dos processos de contra-ordenação ou organize um único processo, do qual resulte a aplicação de uma coima única, interpuseram recurso para este Supremo Tribunal o Ministério Público e a Fazenda Pública, rematando as respectivas alegações de recurso com as seguintes conclusões: 1.1 Recurso do Ministério Público: 1ª. No processo de contra-ordenação tributária, por força do disposto no art. 3.º b) e 81.º do RGIT, remetidos os autos ao tribunal competente e apresentados ao juiz pelo MºPº, nos termos do artº 62º do RGCO o juiz ou não aceita o recurso nos termos do art. 63.º do RGCO, ou o decide, em conformidade com o art. 64.º do RGCO.
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Nos termos do artº 25º do CPP – aplicável por força do art. 3.º b) do RGIT e 41.º, n.º 1 do RGCO, há conexão de processos quando o mesmo agente tiver cometido várias contra-ordenações e para todas elas organiza-se um só processo ou procede-se à apensação de todos no caso de terem sido instaurados vários – art. 29º 1 e 2 do CPP.
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A falta de apensação dos processos de contra-ordenação pela autoridade administrativa não integra qualquer das nulidades elencadas no art. 118.º e 119.º do CPP porque estas, com excepção do emprego da forma de processo especial fora dos casos previstos na lei, não são aplicáveis ao processo de contra-ordenação.
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Assim, face ao teor do art. 118.º n.º 1 e 2 do CPP, porque não está expressamente cominada a falta de apensação como nulidade, o acto é irregular.
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Uma vez que os autos comprovam a existência de uma situação de conexão subjectiva de processos, que estão todos na fase do julgamento, nada impede que se proceda agora à sua apensação, nos termos dos artigos 24º nº 2 e 25º do CPP, àquele que respeitar à contra-ordenação determinante da competência por conexão nos termos do art. 29.º n.º 2 do CPP proferindo-se depois o despacho previsto no art. 64.º do RGCO (cfr., neste sentido, Ac STA de 04.03.2015, proc. n.º 01396/14) 6.ª Esta parece ser a melhor solução a dar ao caso sendo certo que será ela a única que pode beneficiar a recorrente. Pelo facto do Tribunal estar vinculado ao princípio da proibição da “reformatio in pejus” previsto no art. 72º-A do RGCO pelo que não poderá aplicar uma coima superior à aplicada pela autoridade administrativa.
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O mesmo pode não ocorrer se for mantida a anulação da decisão recorrida pois a autoridade administrativa, na determinação da medida da coima nos termos do art. 7.º da Lei 25/2006 de 30 de Junho, pode vir a aplicar uma coima de valor superior 8.ª Uma vez que no âmbito do RGIT vigora o regime do cúmulo material das penas, a pena única é a que resultar da soma de todas as coimas concretas 9.ª A decisão recorrida, ao anular a decisão que aplicou a coima e ao determinar a remessa dos autos à autoridade administrativa para apensação dos processos e aplicação de uma coima única, violou por erro de interpretação o disposto nos artigos 63.º e 64.º do RGCO, 3º b) e 81.º do RGIT e, 24º nº 2 e 29º do CPP 10.ª O presente recurso é admissível nos termos do art. 73.º n.º 2 do RGCO, por tal se afigurar manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito e a promoção da uniformização das decisões judiciais e das autoridades administrativas.
Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida e substituída por outra que determine o prosseguimento dos autos com a identificação de todos os processos de contra-ordenação instaurados contra a arguida, remetidos a juízo e que se encontram na mesma fase processual e, determinando a sua apensação, com prolação de decisão nos termos do art. 64.º do RGCO, como é de lei e JUSTIÇA 1.2 Recurso da Fazenda Pública: QUESTÃO PRÉVIA – Requerimento (art. 74.º, n.º 2 do RGCO) A.
Vem o presente recurso interposto da sentença que decidiu pela existência de uma questão prévia que obsta ao conhecimento da causa e, em consequência, decidiu “anular a decisão administrativa” que condenou o(a) arguido (a), “ordenando a remessa dos presentes autos à Autoridade Administrativa (…) para que proceda à apensação dos processos de contra-ordenação ou organize um único processo, do qual resulte a aplicação de uma coima única”, o qual se circunscreve à questão de direito da anulação da decisão administrativa, apreciada pelo douto Tribunal a quo.
B.
Para assim decidir, considerou o Tribunal a quo, em síntese que, “impunha-se à Autoridade Administrativa que organizasse um único processo administrativo ou procedesse à apensação dos processos que se encontrassem na mesma fase, para efeitos de aplicação de uma coima única – nos termos do supra referido artigo 25.º do Regime Geral das Infracções Tributárias”, concluindo que a omissão destes procedimentos e operações determinam a anulação da decisão administrativa.
C.
Quanto à anulação da decisão administrativa determinada pelo douto Tribunal a quo, entende a Fazenda Pública, salvo melhor opinião, que não pode proceder o argumento expendido na douta decisão a quo, não se conformando a Fazenda Pública com a mesma e considerando que tal decisão judicial padece de erro de direito, urgindo assim, a promoção da uniformização da jurisprudência face ao inerente perigo de repetição e desigualdade na aplicação entre os diversos tribunais tributários de 1ª instância, tudo nos termos do disposto no art. 83° do RGIT, em conformidade com o art. 73°, n° 2 do RGCO, aplicável por força da alínea b) do art. 3° do RGIT - cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 07-11-2012, proc. 0704/12; Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 17-01-2007, proc. 01124/06 (in www.dgsi.pt).
D.
A questão da legalidade da apensação e da subsequente anulação da decisão por falta de realização do cúmulo material não é pacífica, aliás, como já constatou o Venerando Supremo Tribunal Administrativo nos recentes acórdãos nºs 074/15, de 11-03-2015, n.º 01557/14 de 11-03-2015 e 01396/14 de 04-03-2015, nos seguintes termos: “Este Supremo Tribunal tem conhecimento, por dever de ofício, que a questão que aqui vem colocada, e outras semelhantes, se colocam, e virão a colocar-se, em centenas ou milhares de processos que já se encontram pendentes nos TAFS e outros ainda que se encontram na fase procedimental administrativa, pelo que, havendo a necessidade premente de definir o direito aplicável a todas a estas situações, sendo certo que nos vários Tribunais se tem decidido de forma diferente, com esse fundamento admite-se o recurso que nos vem dirigido, nos termos do artigo 73º, nº 2 do RGIMOS – in Ac. STA n.º 074/15, de 11-03-2015.
E.
O recurso que se pretende interpor ao abrigo do n.º 2 do art. 73º do RGCO, ex vi art. 3.º, alínea b) do RGIT, respeitando a uma questão que não é pacífica na jurisprudência, configura-se como manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito por forma a garantir a eficácia do princípio da igualdade dos cidadãos nesta questão, visando-se assim alcançar a sua uniformidade e estabilidade no nosso ordenamento jurídico, pelo que o seu conhecimento realiza interesses de ordem pública, motivo pelo qual, desde já se requer a sua admissão, conforme disposto nos n.ºs 2 e 3 do art. 74º do RGCO.
QUESTÃO PRINCIPAL F.
Quanto à legitimidade da Fazenda Pública para interpor o presente recurso, importa ter em conta que, com a proposta de Lei nº 496/2012, de 10 de...
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