Acórdão nº 01879/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelCASIMIRO GONÇALVES
Data da Resolução28 de Janeiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1. A Fazenda Pública recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Tributário de Penafiel, julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A………….., Lda., contra o indeferimento do Recurso Hierárquico, nos termos dos arts. 95º n.ºs 1 e 2 d) da LGT, 76º n.º 2, 97º n.º 1 d) e 99º e ss. do CPPT na qual pediu que fosse declarado nulo o despacho proferido em 11/4/2005 pelo Chefe do Serviço de Finanças de Valongo, que tinha indeferido um pedido de não sujeição de sete prédios a C. Autárquica.

1.2. Termina as alegações formulando as conclusões seguintes: A. Ressalvado sempre o devido respeito, a Fazenda Pública discorda do julgamento que foi feito na sentença recorrida, em primeiro lugar, porque se pronuncia em excesso em relação ao objecto da Impugnação.

  1. Com efeito, a douta sentença recorrida infringe a delimitação imposta pelo princípio do dispositivo (artigo 660.º n.º 2 do CPC) à actividade do juiz, que na sua decisão teria de circunscrever-se ao thema decidendum definido pelas partes, embora livre na qualificação jurídica dos factos (artigo 664.º do CPC).

  2. Ora, a impugnação judicial, como os demais processos judiciais tributários, está submetida ao princípio do dispositivo de alegação das causas de pedir em que se funda o pedido (excepto quanto às questões referidas no artigo 175.º do CPPT), aos factos concretos que servem de fundamento ao efeito jurídico pretendido subsumíveis a qualquer das alíneas do artigo 99.º do CPPT, em que a Impugnante/Recorrida funda o pedido de ilegalidade da Liquidação.

  3. Assim, o Tribunal só conhece das causas de pedir invocadas na petição inicial, que não de outros factos jurídicos cujo conhecimento não se lhe imponha oficiosamente.

  4. De modo que, quer a invocação da ilegalidade da decisão final do recurso hierárquico por falta de audição prévia da Impugnante/Recorrida, quer a ilegalidade da liquidação de CA por violação dos princípios da decisão e celeridade, quer a falta de eficácia da liquidação do imposto por a liquidação de CA ter ocorrido em momento anterior à prolação da decisão do pedido de isenção, quer a ilegalidade da liquidação por ter subjacente a aplicação do n.º 6 do artigo 10.º do CCA, são causas de pedir distintas da ilegalidade da liquidação de CA decorrente da falta de audição prévia da Impugnante/Recorrida antes da liquidação e da decisão de indeferimento do pedido de não sujeição de CA.

  5. Na realidade, não é pela circunstância de a impugnante/Recorrida alegar diversas causas de ilegalidade da liquidação e do procedimento de recurso hierárquico, bem como da ineficácia da liquidação de CA, que o Tribunal pode, oficiosamente, conhecer da questão atinente à falta de audição prévia antes da liquidação do CA e do indeferimento do pedido de não sujeição de CA, quando tal não foi invocado na petição inicial.

  6. Outrossim, no capítulo II da sentença recorrida, denominado por Pressupostos Processuais, mais concretamente no penúltimo parágrafo da página 5, evidencia-se inclusive que não estão, nem estiveram em causa os despachos de indeferimento do requerimento formulado pela ora Impugnante.

  7. Muito embora o juiz seja livre em matéria de Direito, na qualificação jurídica dos factos, na determinação e na interpretação da lei aplicável, nos termos do disposto no artigo 664.º do CPC - ius novit curia - não se trata aqui de mera qualificação jurídica dos factos, mas da alteração ou mesmo alargamento das causas de pedir invocadas para outra que não é de conhecimento oficioso.

    I. Contudo, ao invés de apenas tirar as devidas conclusões quanto à preterição do direito de audição prévia no procedimento de recurso hierárquico, a sentença recorrida analisou igualmente as consequências da preterição do direito de audição prévia antes da liquidação da CA e do indeferimento do pedido de não sujeição de CA, J. tendo decidido pela anulação da supra citada liquidação de CA à luz de uma questão que não fora suscitada pelas partes, nem era de conhecimento oficioso, violando o disposto nos artigos 662.º nº 2 e 668.º n.º 1 al. d) do CPC e no artigo 125.º do CPPT.

  8. Pelo que, a análise de matérias não pretendidas pelo autor implica a violação do princípio da confiança e da tutela jurisdicional efectiva, em resultado de o juiz ter conhecido de questões de que não podia ter tomado conhecimento, L. incorrendo em irregularidade que afecta formalmente a sentença, como é o caso de uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender resolver questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) que acarreta a nulidade de sentença, nos termos do artigo 668.º n.º 1 al. d) do CPC e parte final do artigo 125.º n.º 1 do CPPT.

  9. Em segundo lugar, sem prescindir nem conceder do vício apontado em primeiro plano, para o caso de assim não se entender, e sempre com o maior respeito pelo labor jurisdicional do Tribunal a quo, a Fazenda Pública entende que aquele Tribunal fez uma errónea aplicação do direito à matéria de facto dada como provada, na medida em que a verificação de qualquer vício de forma no procedimento tributário, tal como é o caso da preterição do direito de audição prévia, não tem a aptidão de produzir quaisquer efeitos anulatórios sobre o acto de liquidação que o precede.

  10. E uma vez que a falta de audição prévia constitui um mero vício de forma do próprio procedimento, ela apenas poderá determinar a anulação da respectiva decisão de indeferimento.

  11. Aliás, é este o entendimento vertido no Acórdão do STA, de 16/06/04, proferido no recurso n.º 1877/03, onde se dispõe que tal vício poderá anular a decisão administrativa proferida na reclamação mas com tal efeito se quedará, podendo apenas conduzir, naquele primeiro aspecto, ao proferimento de nova decisão judicial, sanado o cometido vício procedimental mas nunca à anulação da liquidação igualmente impugnada - neste sentido vejam-se ainda os Colendos Acórdãos do STA de 15/10/2008, proferido no recurso n.º 0542/08 e de 25/06/2009, proferido no recurso n.º 0345/09.

  12. Acresce que, de acordo com o revogado artigo 18.º do Código da Contribuição Autárquica (CCA) a contribuição é liquidada anualmente, em relação a cada município, pelos serviços centrais da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, com base nos valores e aos sujeitos passivos constantes das matrizes em 31 de Dezembro do ano a que a mesma respeita.

  13. Com efeito, por a antiga CA (actual IMI) se tratar de imposto periódico - isto é, imposto que o contribuinte sabia que tinha de pagar todos os anos em certa data - cujo valor não sofria grandes oscilações, a lei nunca impôs a audição prévia do contribuinte antes da respectiva liquidação.

  14. Aliás, a lei sempre simplificou quer a liquidação, quer a cobrança desta espécie de imposto, ao ponto de determinar que se a Administração Fiscal não remetesse ao contribuinte a tempo a respectiva nota de cobrança de CA, este deveria inclusive solicitar à repartição de finanças da área da situação dos prédios uma 2.ª via dessa nota (cfr. antigo artigo 22º n.º 3 do CCA).

  15. E se a liquidação de CA fosse efectuada dentro do prazo normal, não carecia de notificação ao sujeito passivo, bastando o envio do documento de cobrança aludido nos artigos 22.º e 23.º do CCA para tornar a divida exigível (actuais artigos 119.º e 120.º do CIMI) - vide neste sentido, entre tantos outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 20/10/2010, proferido no recurso n.º 01089/09 e de 18/09/2008, proferido no recurso n.º 0300/08).

  16. Só havendo lugar a notificação da liquidação quando esta era feita fora do prazo legal ou era adicional.

  17. Obviamente, que esta simplificação de procedimentos decorre da própria estrutura e funcionamento deste tipo de imposto.

    V. Perante isto, nunca a liquidação de CA impugnada poderia ser anulada quer com fundamento na preterição do direito de audição antes da liquidação e do indeferimento do pedido de não sujeição apresentado pela Impugnante/Recorrente, verificando-se, pois, quanto a este aspecto, erro de julgamento de direito da sentença recorrida, determinante da sua revogação.

    Termina pedindo a procedência do recurso e a revogação da sentença recorrida.

    1.3. Contra-alegando, a recorrida A…………….., Lda., pugna pela confirmação do julgado recorrido e formula as conclusões seguintes: I. Sem prejuízo da A………….. reiterar todo o anteriormente invocado em sede de impugnação judicial, as contra-alegações de recurso limitar-se-á à questão decidenda aqui em crise, acima...

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