Acórdão nº 01911/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Março de 2015
Magistrado Responsável | FRANCISCO ROTHES |
Data da Resolução | 18 de Março de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Recursos jurisdicionais da sentença proferido no processo de impugnação judicial com o n.º 50/10.9 BEPRT 1. RELATÓRIO 1.1 No Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto foi proferida sentença que decidiu a impugnação judicial deduzida pela sociedade denominada “A……., S.A.”(adiante Impugnante) contra a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), na parte correspondente aos juros moratórios e na qual, face aos pedidos de anulação da liquidação dos juros de mora e do reconhecimento do direito da Impugnante a juros indemnizatórios, foi proferida decisão nos seguintes termos: «[…] julgo: • Procedente a Impugnação quanto à fixação de juros indemnizatórios:• Improcedente quanto ao restante. Custas pela Fazenda Pública – artigo 446.º, n.º 1 do CPC».
1.2 Recorreram dessa sentença para o Supremo Tribunal Administrativo a Fazenda Pública e a Impugnante e os recursos foram admitidos, para subirem imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
1.3 A Impugnante apresentou alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «1. O presente recurso visa obter a revogação da douta sentença, atrás referida, na parte em que a mesma não anulou, como foi pedido na petição da impugnação judicial, a liquidação de juros de mora liquidados na quantia de € 37.591,18.
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De facto, como foi alegado naquela peça processual, a notificação daquela liquidação não indica uma só razão de facto ou de direito que justifique tal liquidação, o que constitui ilegalidade por inobservância de, entre outros, o disposto no art. 36.º, n.º 2, do CPPT e no art. 77.º, n.ºs 1, 2 e 6, da LGT.
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A douta sentença recorrida, embora refira que “...considera o Tribunal que assiste razão à Impugnante, uma vez que das mesmas [das notificações a que aludem os factos, A) B) e C) dados como provados], não é possível percepcionar os montantes sobre que incidem, os respectivos prazos, o resultado obtido”, e acrescentando que “Assim sendo, seria procedente a presente impugnação, por clara falta de fundamentação da liquidação em causa”, o certo é que decidiu pela não anulação da liquidação em causa, por entender que “a falta de fundamentação que inquinava a liquidação impugnada, deixou de existir”, porque tal liquidação “foi revogada parcialmente nos termos do artigo 112.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, tendo sido efectuado novo cálculo e constando desse novo cálculo todos os itens necessários ao cabal esclarecimento da Impugnante”, sendo que “A revogação parcial foi devidamente notificada à Impugnante, mostrando-se que a fundamentação constante do parecer que antecede o despacho de revogação parcial permite à Impugnante apreender os concretos “factos donde ela emerge”.
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A recorrente, não pode aceitar este entendimento do Meritíssimo Juiz de 1.ª Instância.
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Na verdade, o acto administrativo que levou a ora recorrente a impugnar a liquidação dos juros de mora a que deu lugar, não continha (não contém) a fundamentação legalmente exigida, como, de resto, face ao que se transcreveu, a douta sentença recorrida reconhece.
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Como refere Jorge Lopes de Sousa in Código de Procedimento e Processo Tributário, 6.ª Edição, 2011, anotado e comentado, Áreas Editora, Volume I, em anotação ao art. 37.º, pág. 350, “A existência de uma notificação válida é condição da eficácia do acto notificado em relação ao seu destinatário, pois «os actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados» (art. 36.º n.º 1, do CPPT)”.
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Por outro lado, a dita revogação parcial não representa, nem “fundamentação sucessiva” nem “ratificação-sanação”.
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Não representa “fundamentação sucessiva” visto que, como referem Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa na sua Lei Geral Tributário, anotada e comentada, 4.ª edição, 2012, Encontro da Escrita, em anotação ao art. 77.º, a pág. 678, “… só se poderá aceitar a fundamentação sucessiva se, por um lado, os elementos invocados não sejam posteriores à prática do acto e não sejam elementos que não tenham [sido] considerados pelo seu autor ao praticá-lo e, por outro lado, se essa fundamentação é levada ao conhecimento dos destinatários a tempo de não prejudicar o seu direito de impugnação contenciosa”.
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Não representa “ratificação-sanação”, dado que esta, como ensina o Autor e Ob. cit., Volume II, anotação ao art. 112.º, pág. 248, “A ratificação-sanação é o acto pelo qual o órgão competente decide sanar um acto anulável antes praticado, mantendo o seu conteúdo decisório, mas suprindo as ilegalidades formais ou procedimentais que o viciam, assim transformando um acto ilegal noutro válido perante a ordem jurídica”, visto que a revogação parcial em causa não foi decidida pelo mesmo órgão que praticou o acto tributário do qual decorreram os juros de mora impugnados e, para além, disso, surge tão-só no âmbito da apreciação a que alude o art. 112.º do CPPT.
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Isto considerado e não obstante a mencionada revogação parcial sobre a qual, aliás, a impugnante, quando dela notificada, manifestou expressamente a vontade de que a impugnação prosseguisse os seus normais termos, tem de concluir-se que a douta sentença recorrida devia ter decidido pela anulação da liquidação dos juros de mora em apreço, o mesmo é dizer, devia ter julgado a impugnação totalmente procedente.
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Como não foi assim que decidiu, a douta sentença recorrida violou, entre outros o disposto nos arts. 36.º, n.º 1, do CPPT, e 77.º da LGT.
Nestes termos, deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, a douta sentença recorrida deve ser revogada e substituída por outra que julgue a impugnação totalmente procedente».
1.4 A Fazenda Pública apresentou alegações, que resumiu no seguinte quadro conclusivo (As notas que no original estavam em rodapé serão transcritas no texto, entre parêntesis rectos.
): «A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou a presente impugnação procedente “quanto à fixação de [parte dos] juros indemnizatórios”2 [2 Importa salientar que, não obstante da decisão proferida a final (“V – Dispositivo”, resulte que “julgo: [p]rocedente a impugnação quanto à fixação de juros indemnizatórios”, o certo é que do mesmo dispositivo resulta ainda que a decisão tomada tendo em conta todo o exposto na fundamentação da sentença, face à expressão “[p]elo exposto”, pelo que se constata que a impugnação apenas foi procedente quanto à fixação de parte dos juros indemnizatórios] e “[i]mprocedente quanto ao restante”, não se conformando a Fazenda Pública com a sua exclusiva condenação em custas, atendendo a que a causa de pedir e aos pedidos formulados pela impugnante, como decorre do sentido decisório, não procederem na íntegra.
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Insurge-se a impugnante contra a liquidação de IRC, na parte correspondente aos juros de mora liquidados, no montante de € 37.591,18, com fundamento na falta de fundamentação de tal acto tributário, peticionando, a final, a anulação da totalidade da liquidação de juros de mora liquidados, bem como o direito a juros indemnizatórios sobre o valor impugnado.
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Na pendência dos presentes autos, veio a liquidação impugnada a ser parcialmente revogada pela administração tributária (AT), mantendo-se em dívida o montante de € 24.041,71.
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Quanto ao pedido de anulação da liquidação por falta de fundamentação, a douta sentença de que ora se recorre considerou a presente impugnação improcedente, julgando procedente parte do pedido de pagamento de juros indemnizatórios 3 [3 Calculados sobre a diferença do valor impugnado e o valor resultante de revogação parcial (€ 13.549,47), contados desde o pagamento indevido e até à data da emissão da respectiva nota de crédito].
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Entendeu o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo que “a presente acção não é totalmente [im]procedente apenas pela revogação parcial efectuada pela Administração Tributária no âmbito do artigo 112.º do CPPT e, por conseguinte, as custas do processo são inteiramente da...
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