Acórdão nº 01285/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelPEDRO DELGADO
Data da Resolução25 de Março de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – Vem a Fazenda Pública interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade A……. – ……….., CRL, melhor identificada nos autos, contra a segunda avaliação efectuada ao terreno de construção inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 5690 da freguesia de Esmoriz, a qual foi atribuído o valor de € 270.950,00.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «A. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que considerou procedente a impugnação judicial deduzida pela ora recorrida contra a 2ª avaliação efectuada a um terreno para construção inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Esmoriz.

  1. O objecto do presente recurso cingir-se-á à questão da desconformidade ou não do “Decreto-Lei que criou o CIMI” com a “Constituição da República Portuguesa” (fls. 18 da sentença).

  2. O douto Tribunal a quo, sob a epígrafe “Da referência o valor de mercado — artigo 10.º n.º 11 da Lei 26/2003, de 30 de Julho” (fls. 12 da sentença), entendeu que: i) “O Decreto-Lei n. ° 287/03, de 12 de Novembro aprovou o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI,), Decreto-Lei esse que foi publicado ao abrigo da autorização legislativa concedida pela Assembleia da República através da Lei n.º 26/2003, de 30 de Julho”, tendo aquele Decreto-Lei de “obedecer aos princípios legais impostos pela Lei de Autorização legislativa que lhe está subjacente” (fls. 12 e 13 da sentença); ii,) “O artigo 10.º da Lei 26/2003, de 30 de Julho dispõe que: (...) 11 — A variação dos limites do coeficiente de localização a que se refere o n.º 10 será fixada em cada município tendo por referência os valores correntes de mercado” (fls. 13 e 15 da sentença); iii) Por sua vez, o artigo 42° do CIMI não faz qualquer referência à «baliza» estabelecida pelo critério «valor de mercado»”, além de que “da leitura ao supra referido Decreto-Lei [287/2003, de 12 de Novembro], resulta que nenhuma referência era feita ao critério «valor de mercado»” (fls. 16 e 17 da sentença); iv) No entanto, “apesar de não ter sido aparentemente excedida a Lei de Autorização Legislativa, a verdade é que o Decreto-Lei 287/2003, tal como foi aprovado, nenhuma referência faz ao critério «valor de mercado», fazendo, porém, referência a um outro critério, igualmente subjectivo e que consta da alínea d) do artigo 42.º do CIMI, qual seja “localização em zonas de elevado valor de mercado imobiliário” (fls. 17, in fine, da sentença); v) “Ora, ao não estabelecer como critério o «valor de mercado», o Decreto-Lei que criou o CIMI não foi emanado conforme uma leitura correcta da Constituição da República Portuguesa (CRP)” (fls. 18 da sentença).

    vi) “Assim sendo, é de proceder a presente impugnação e, sequentemente, mostra-se inútil apreciar as questões levantadas pela Impugnante” (fls. 18, in fine, da sentença).

  3. É contra este entendimento que a ora recorrente RFP se insurge, invocando erro de julgamento de direito.

  4. Trazendo à liça as normas em causa, temos que a Lei n.º 26/2003, de 30 de Julho, enquanto Lei de Autorização Legislativa ao abrigo da qual foi publicado o Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro contemplava, no seu artigo 10.º, diversas disposições sob a epígrafe “Valor patrimonial tributário dos prédios urbanos”, as quais encontram a necessária consagração no artigo 42.º do Código do IMI.

  5. As leis de autorização legislativa devem definir o sentido, a extensão e a duração da autorização, ou seja, fixam limites materiais ao exercício da autorização, não impondo uma transcrição ipsis verbis dos seus termos para o diploma “autorizado” — impõe, isso sim, limites materiais ao poder legislativo do Governo que, a serem ultrapassados, conduziriam à invocada inconstitucionalidade orgânica, por invasão da reserva de competência parlamentar.

  6. No entanto — e como até se deixou escrito na douta decisão ora posta em crise — “o Decreto-Lei ficou aquém da Lei de Autorização Legislativa, definindo esta os limites que o governo deve atender aquando da elaboração do Decreto-Lei emitido no seguimento da Lei que o autoriza para o efeito” (fls. 17 da sentença), pelo que inexiste qualquer inconstitucionalidade, orgânica ou material, imputável ao diploma autorizado por desrespeito à Lei de Autorização.

  7. Porém, logo que ultrapassada esta quaestio por parte do douto Tribunal a quo, encontra o mesmo novo obstáculo, desta feita — no seu entendimento — conducente à procedência da impugnação, ao sustentar que “apesar de não ter sido aparentemente excedida a Lei de Autorização legislativa, a verdade é que o Decreto-Lei 287/2003, tal como foi aprovado, nenhuma referência faz ao critério «valor de mercado», fazendo porém referência a um outro critério, igualmente subjectivo de valorização e que consta da alínea cl) do artigo 42. ° CIMI, qual seja a «localização em zonas de elevado valor de mercado imobiliário “ — consequentemente, “ao não estabelecer como critério o «valor de mercado», o Decreto-Lei que criou o CIMI não foi emanado conforme uma leitura correcta da Constituição da República Portuguesa”.

    I. No entanto, não se torna possível inteligir o motivo que conduziu à procedência da impugnação, nem as normas ou princípios constitucionais violados, tanto mais que, se atentarmos aos vícios passíveis de surgir ao nível dos diplomas emanados ao abrigo da respectiva Lei de Autorização (excesso de autorização, defeito de autorização por emissão após o termo do prazo fixado pela Lei de Autorização ou por ter incidido sobre uma matéria de competência reservada ou defeito de autorização resultante da falta de menção expressa, pelo Decreto-Lei da respectiva Lei de Autorização), o caso em apreço não encontra guarida em qualquer daquelas hipóteses — não existe inconstitucionalidade orgânica nem material.

  8. Resta, portanto, tentar descortinar o ou os motivos que conduziram o douto julgador a “criar a convicção de que assiste razão à impugnante”, por ter considerado que “o Decreto-Lei que criou o CIMI (...) não foi emanado conforme uma leitura correcta da Constituição da República Portuguesa”.

  9. Como vimos, o douto Tribunal, após uma perfunctória referência a uma “violação do princípio da igualdade”, basta-se com a formulação de um juízo conclusivo: “Assim sendo, é de proceder a impugnação”.

    L. Embora assistindo aos juízos o direito de fiscalização concreta relativamente a normas a aplicar a um determinado caso, não basta afirmar que uma determinada norma é inconstitucional, na medida em que ela deve ser efectivamente desaplicada na causa submetida à apreciação jurisdicional.

  10. In casu, o douto Tribunal a quo limita-se a proferir um conclusivo juízo de inconstitucionalidade (de uma norma? de um Decreto-Lei?), ficando em aberto a concreta questão da sua desaplicação — é que desaplicar impõe que sejam extraídas, de forma clara e precisa, consequências do juízo de inconstitucionalidade o que, com o devido respeito, não...

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