Acórdão nº 01080/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelASCENS
Data da Resolução25 de Março de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – RELATÓRIO Porto Lazer — Empresa de Desporto e Lazer do Município do Porto, EEM, NIPC 507718640, com sede na Rua Bartolomeu Velho, n.º 648, no Porto, “tendo sido notificada do deferimento parcial da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação adicional de imposto do selo n.º 2010 6430000368 e contra a liquidação de juros compensatórios n.º 2010 00001102223, deduziu impugnação judicial.

Por sentença de 27 de Dezembro de 2012, o TAF do Porto julgou procedente a impugnação e anulou o acto impugnado.

Reagiu a Fazenda Pública interpondo o presente recurso cujas alegações integram as seguintes conclusões: A.

Vem o presente recurso interposto da douta sentença, por erro na aplicação do direito, ao julgar procedente a impugnação judicial e anular o acto tributário de liquidação adicional de imposto de selo.

B.

Na perspectiva da AT, ressalvado todo o respeito devido por melhor opinião, relevam para a decisão desta acção os conceitos de sujeito passivo directo e indirecto, por forma a demonstrar não ser verdade que a impugnante não é parte na relação jurídico-tributária, uma vez que a impugnante é o sujeito passivo directo na relação jurídica de imposto configurada, na qual, além do mais, se verifica uma situação de substituição tributária.

C.

O sujeito passivo é a pessoa ou entidade adstrita ao cumprimento das obrigações tributárias (principal e acessórias), podendo inserir-se os sujeitos que se encontram nesta situação em categorias distintas e heterogéneas, abarcando quer o próprio sujeito que aufere um rendimento ou efectua um acto de consumo, como qualquer terceiro que está obrigado a declarar rendimentos de outrem ou a efectuar retenção na fonte ou a liquidar e entregar imposto ao Estado que outrem tem o encargo de suportar.

D.

É possível efectuar as seguintes distinções analíticas, que permitem identificar mais claramente as situações envolvidas e recortar com nitidez o regime jurídico aplicável: > A pessoa que tem uma relação pessoal e directa com o facto tributário, em relação a quem se verifica determinado facto (v.g. a morte de um ascendente) ou é ela quem pratica determinado acto (v.g. um contrato) que constitui a base de um tributo, casos em que se utiliza a designação de “sujeito passivo directo”.

> Todo um conjunto de outras pessoas que, sem terem a referida relação pessoal e directa com o facto tributário, vão ainda assim, por motivos diversos, ser chamadas ao cumprimento de obrigações tributárias (normalmente relacionadas com outros), situações em que se utiliza a designação de “sujeito passivo indirecto” ² (Segue-se de perto Joaquim Freitas da Rocha em “Apontamentos de Direito Tributário (A relação jurídica Tributária)”. publicado pela Associação de Estudantes da Universidade do Minho (Aedrum), 2009.).

E.

O sujeito passivo directo é aquela pessoa ou entidade que tem uma relação pessoal e directa com o facto tributário, o sujeito passivo da relação jurídica tributária é quem tem uma conexão incindível com o respectivo facto constitutivo, em termos de se poder dizer que foi o primeiro e principal beneficiário das vantagens que a tributação visa atingir, sendo este (o sujeito passivo directo) que manifesta a capacidade contributiva que é o pressuposto da sujeição.

F.

No subgrupo de “sujeitos passivos indirectos” distinguem-se três categorias — os substitutos tributários, os sucessores tributários e os responsáveis tributários — aqui interessando apenas a substituição tributária, que se verifica quando, por imposição legal, a prestação tributária vai ser entregue ao Fisco não pelo sujeito que realizou o facto tributário, mas por um terceiro que com ele mantém relações especiais e que lhe vai exigir a quantia em causa, nos termos do art. 20° da LGT.

G.

Em grande parte dos casos a técnica financeira mediante a qual a substituição tributária se efectiva é a retenção na fonte, a qual significa que certos rendimentos ao serem pagos ou colocados à disposição, serão objecto de uma amputação a título de pagamento de tributo.

H.

Diferentemente do considerado e induzido pelo legislador (de forma redutora), pode existir substituição tributária sem que opere por retenção na fonte, como acontece nos casos em que determinada entidade está obrigada a liquidar o imposto incidente sobre outra e entregá-lo ao Estado (sem reter quantia alguma).

I.

Esta situação é a que se verifica no caso do imposto do selo, no âmbito do qual a liquidação deve ser efectuada pelos notários, conservadores e outras entidades, relativamente a actos em que intervenham, estando obrigados a entregar o valor respectivo ao credor tributário, conforme art. 23°, n° 1 e art. 41° do CIS.

J.

É neste contexto que se situa a liquidação de imposto de selo cuja legalidade vem questionada nos presentes autos, defendendo o impugnante que não é sujeito passivo do imposto de selo, mas sim o notário, pelo que a administração tributária, tendo concluído que, por erro não havia sido efectuada a liquidação do imposto devido pela operação, não lhe pode exigir o imposto directamente, como se do sujeito passivo se tratasse.

K.

Na liquidação do imposto de selo encontramo-nos perante um caso de substituição tributária que não opera por retenção na fonte, mas não é por isso que deixa de o ser, sendo o impugnante o sujeito passivo directo na relação jurídico tributária que se constituiu no momento da ocorrência do facto tributário, pelo que a liquidação impugnada deve manter-se.

Contra-alegou a ora recorrida Porto Lazer, apresentando as seguintes conclusões: 1. A parte legítima na relação jurídico-tributária em apreço é o sujeito passivo que, de acordo com a alínea a) do n.º 1 do artigo 2° do CIS, não pode deixar de ser o Notário.

  1. É imperioso concluir que a Administração Fiscal não podia exigir à PORTO LAZER, enquanto titular do interesse económico, o tributo que o sujeito passivo — o Notário —à revelia ou não da obrigação que sobre ele recai, não cuidou de liquidar.

  2. A liquidação adicional de Imposto do Selo dirigida à PORTO LAZER e aqui impugnada está ferida de invalidade, pelo que deverá a mesma ser anulada, com todas as consequências legais.

  3. Ao contrário do que procurou defender a Digna Representante da Fazenda Pública, é manifesto que não estamos aqui diante de um caso de substituição tributária sem retenção na fonte, nem a PORTO LAZER é um «sujeito passivo directo».

  4. No ordenamento jurídico português, e de acordo com o preceituado na lei, designadamente nos artigos 20.º e 34.º da LGT, «A substituição tributária é efectivada através do mecanismo da retenção na fonte do imposto devido» (cf. artigo 20°, n.º 2, da LGT) e «As entregas pecuniárias efectuadas por dedução nos rendimentos pagos ou postos à disposição do titular pelo substituto tributário constituem retenção na fonte» (cf. artigo 34.º da LCT).

  5. Ao Notário não competia deduzir uma qualquer quantia a um eventual rendimento da PORTO LAZER, pelo que a presente situação não configura, ao contrário do que alegou a Digna Representante da Fazenda Pública, uma qualquer substituição tributária.

  6. A interpretação/aplicação da lei que é efectuada, viola directamente a garantia constitucional de que «Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não hajam sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei», prevista no n.º 3 do artigo 103° da Constituição da República (sublinhado nosso).

    Termos em que deverá negar-se provimento ao recurso apresentado, mantendo-se a douta decisão recorrida que declarou a impugnação procedente e, consequentemente, a anulação da liquidação impugnada, com todas as consequências legais.

    O EMMP pronunciou-se emitindo o seguinte parecer: 1. A F. P. interpôs recurso no processo em que é impugnante “Porto Lazer”.

  7. Emitindo parecer: Em face do previsto nos artigos 2.º n.º 1 al. a), 3.º, 13.º n.º 4 do C.l.S., não é de excluir que a impugnante não seja ainda de considerar como sujeito passivo pelo menos no que respeita à transmissão de bens que também foi operada, apesar de genericamente se encontrar previsto na primeira referida norma ser sujeito passivo o notário e alguns outros intervenientes.

    Por outro lado, em face do que se encontra previsto no art. 18.º n.º 3 da L.G.T. pode ser sujeito passivo, quer o contribuinte directo, quer o substituto, quer o responsável tributário resulta ainda duvidoso que a impugnante não possa ser de considerar como contribuinte, sendo quem se encontra previsto que tenha de suportar realmente — como “encargo”, no dizer da lei — o seu pagamento.

    É certo que, segundo alguma doutrina, sendo a dívida de imposto do substituto ou responsável, o devedor principal é de entender como desonerado da obrigação.

    Contudo, não só a legitimidade da impugnante como responsável subsidiária resulta do previsto no art. 8.º n.º 2 do C.P.PT., como pelo menos, segundo certa doutrina contribuinte directo é ainda o beneficiário que tem ainda de suportar o imposto ¹ (J. Casalta Nabais, de Direito Fiscal, 7.ª ed. Almedina, 2012, p. 244; C.P.P.T. Anotado e Comentado, do cons. Jorge Lopes de Sousa, na 6.ª ed. 2011, Áreas Ed., vol. I, p. 117; Leite de Campos, Benjamim Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, em LGT Anotada e Comentada, 4.ª ed. 2012, p. 186.).

    Crê-se que tal é ainda assim de entender à míngua de jurisprudência conhecida que sobre a questão se tenha já expressamente pronunciado.

    Com efeito, a interpretação que a F.P. defende é a mais princípio da capacidade contributiva que, tal como consagrado no art. 4.º n.º 1 da L.G.T., deve levar a considerar que “os impostos assentam essencialmente na capacidade contributiva revelada, nos termos da lei”, sendo nesse aspecto de relevar ainda o que se encontra previsto no dito art. 3º.

    Por outro lado, é certo que, embora em data posterior aos factos veio a ser previsto no dito art. 2.º, pela Lei n.º 64-A/08, de 31-12, que, “não obstante o...

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