Acórdão nº 01932/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelANA PAULA PORTELA
Data da Resolução25 de Março de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

O Centro Hospitalar de Setúbal, EPE, inconformado, recorre da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que, julgando parcialmente procedente a ação ordinária com vista à efetivação da responsabilidade civil extracontratual intentada por A……………… e B………………, por si e na qualidade de representante de seus filhos menores, C…………….. e D……………….., decidiu “…- absolver o réu E………………. do pedido; - condenar o Centro Hospitalar de Setúbal E.P.E. a pagar a título de indemnização por danos não patrimoniais, as seguinte quantias: • € 25.000 a C…………….

• € 25.000 a D…………….

•.€ 80.000 a título de indemnização por dano morte, a pagar na proporção de 1/2 a cada um dos autores C………………. e D……………., isto é, € 40.000 a C……………., e €40.000 a D……………..

- condenar o Centro Hospitalar de Setúbal E.P.E. a pagar aos autores C…………… e D………………., sobre aquelas quantias de €25 000, juros de mora, à taxa legal, desde a citação; - e condenar o Centro Hospitalar de Setúbal E.P.E. a pagar aos autores C……………… e D………………., sobre aquelas quantias de € 40.000, juros de mora, à taxa legal, desde o trânsito em julgado da presente sentença.” Conclui as suas alegações da seguinte forma: “A).- A sentença recorrida condenou o recorrente no pagamento de € 80.000,00 na proporção de 1/2 para cada um dos AA. por danos não patrimoniais decorrentes da morte de sua mãe considerando verificados todos os pressupostos do direito à indemnização.

B).- Dos factos dados como provados na sentença recorrida não resulta prova de que a morte da paciente tenha decorrido da inalação do dióxido de carbono e oxigénio que lhe foram ministrados.

C).- Resultando provado apenas que “Em consequência directa, necessária e adequada da indução de dióxido de carbono em quantidade excessiva (em vez de protoxido de azoto) a F……………… sofreu choque anestésico com paragem cardíaca, seguido de edema cerebral, este, consequência da acção directa tóxica do dióxido de carbono sobre as células e fluxo sanguíneo cerebral e de asfixia resultantes da paragem cardíaca.” “Que a deixou em estado de coma com sinais de sofrimento grave no sistema nervoso central.” D).- Factos que nenhuma prova constituem quanto à causa da morte da infeliz F……………., nem se a mesma foi consequência da inalação do dióxido de carbono e oxigénio, ou decorrente de qualquer outra circunstância, nomeadamente deficiência orgânica de que fosse portadora e determinasse tal desfecho, ou circunstância externa, infecção hospitalar, troca de medicamentos ou outra; E).- E demonstração de que a prova do nexo causal entre a inalação do dióxido de carbono e a morte da paciente não foi feita nos autos é o facto de no quesito 23º da base instrutória se perguntar “Tais lesões” (paragem cardíaca, edema cerebral, estado de coma com sofrimento no sistema nervoso central - quesitos 21º e 22°) “ vieram a causar, directa, necessária e adequadamente a morte da F…………….”, foi a resposta a tal quesito - “A F……………. foi transferida no dia 22 de Fevereiro de 1984 para o Hospital de S. José, em Lisboa, onde faleceu em 27 de Fevereiro de 1984.”, F).- E tal prova não resulta dos autos, nem deles poderia resultar, porquanto só através de produção de prova pericial a mesma poderia ser alcançada, ou através de autópsia o que não se verificou, ou mediante prova pericial por meio de exame aos registos clínicos e laboratoriais, que pudessem estabelecer uma relação directa entre a inalação do gás e o evento morte, o que nem sequer foi requerido.

G).- Não tendo sido produzida tal prova não é possível estabelecer a causalidade entre a inalação dos gases e a morte não estando provada a causa da morte.

  1. - Não se encontrando provado o nexo causal e o dano não pode a ação proceder tendo a sentença recorrida violado o art. 563° do Cod. Civil pelo que deve o R. ser absolvido do pedido.

    I).- Sem prescindir e por cautela de patrocínio, para eventualidade do não acolhimento do que deixou expendido, acresce que o valor indemnizatório definido na sentença relativamente ao dano vida se encontra exagerado sendo que o valor adequado à situação dos autos é o de € 60.000,00.

    J).- Deve assim ser reduzido para tal valor o dano moral decorrente da perda do direito à vida da F……………..

    L).- A sentença recorrida condena ainda o recorrente a título de danos morais decorrentes da perda de sua mãe no pagamento de € 25.000,00 a cada um dos AA. acrescidos de juros legais às taxas em vigor desde a citação.

    M).- Condenação que, segundo a sentença decorre do facto de não se “ter procedido” a qualquer atualização do montante peticionado.

    N).- Os AA. à data da propositura da ação em 26/6/1992 peticionaram 5.000.000$00 a que correspondem € 24.939,89 valor desadequado por excesso dos valores jurisprudencialmente acolhidos à época que se situariam nos 350.000$00 (€ 1745,79) O).- O Mmo juiz “a quo” não obstante consignar que não procedeu à actualização do valor peticionado, quando profere a sentença condenatória, o seu raciocínio, de forma implícita é de actualização para os parâmetros actuais do valor do dano, como resulta do texto da sentença e em consonância com a imposição do art° 566° n° 2 do Cod. Civil.

    P).- Acresce que o montante dos danos não patrimoniais são fixados equitativamente pelo Tribunal, e conforme entendimento dominante perfilhado pelo Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão de 30/10/2008 “se o montante de uma indemnização foi determinado através da equidade tem de se entender que esse quantitativo está atualizado”.

    Q).- Há, pois que concluir que o valor de € 25.000,00 foi atualizado na sentença, não havendo lugar a juros desde a citação.

    R).- Pelo que a condenação em juros desde a citação viola o art° 566° n° 2 do Cod. Civil, devendo revogar-se a sentença recorrida e em caso de condenação proferir-se condenação nos juros desde o transito da sentença, mantendo-se o valor do dano em €25.000,00.

    S).- Só assim não sendo se o valor do dano for fixado tendo em consideração o valor normal do ano de 1992 ou seja em €1745,79 acrescidos de juros desde a citação.

    T).- Ao decidir como decidiu, a sentença recorrida ao condenar o R. não se encontrando provado o nexo causal entre o facto e o dano violou o art° 563° do Cod. Civil pelo que deve ser dado provimento ao recurso e declarar a absolvição do R. do pedido.” Termina aduzindo que se assim se não entender, e sem prescindir, a sentença recorrida ao fixar o valor do dano morte em € 80.000,00, violou o artigo 496º do Código Civil, devendo equitativamente ser reduzido tal valor para € 60.000,00, e ao condenar em juros moratórios desde a citação sobre o dano moral, que fixou em € 25.000,00 a favor de cada um dos AA, violou o artigo 566°, n° 2, do Código Civil, pelo que alterando a sentença recorrida deve proferir-se condenação nos juros apenas desde o transito da sentença, caso se mantenha o valor do dano em € 25.000,00, ou fixar-se o valor do dano com referência à data da propositura da acção.

    Não foram apresentadas contra-alegações, tendo os ora recorridos, através do requerimento junto aos autos, a fls. 751, vindo desistir do recurso subordinado que interpuseram ao abrigo do disposto no nº 2 do artigo 682º do Código de Processo Civil (anterior redacção), a fls. 711 dos autos e, concomitantemente, pedir “…que seja negado provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo R. Centro Hospitalar de Setúbal e confirmada integralmente a douta decisão recorrida.” O digno Magistrado do Ministério Público junto deste Supremo Tribunal emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso jurisdicional (artigo 146º, nº 1, do CPTA).

    * Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    * MATÉRIA DE FACTO FIXADA NO TRIBUNAL (e aqui relevante): Especificação

  2. A…………… é mãe de F………………….

  3. C……………… e D………………, são filhos de F……………… e de B………………...

  4. F…………………… deu entrada no Hospital Distrital de Setúbal, no dia 17 de Fevereiro de 1984.

  5. E ali ficou internada com o objectivo de ser submetida, sob indicação do seu médico assistente, a uma intervenção cirúrgica do foro urológico - ureterolitomialombar - , por sofrer de litíase uretral à esquerda.

  6. F………………… foi sujeita a todos os exames necessários e objectivos e auxiliares de diagnóstico, estudados os seus resultados e elaborado o respectivo protocolo operatório, tendo em vista a aludida intervenção cirúrgica.

  7. A intervenção cirúrgica teve lugar no dia 20 de Fevereiro de 1984, pelas 12.15 na sala A do Bloco Operatório, do Hospital Distrital de Setúbal.

  8. Exerceu funções de médico cirurgião o Dr. G…………….. e de anestesista o Dr. E……………….., então assistente hospitalar de anestesiologia naquele estabelecimento hospitalar.

  9. No turno em que foi realizada a operação, a enfermeira H………………, tinha a seu cargo o exercício de funções “enfermeira circulante”, destacada para a sala A.

  10. A F…………….. faleceu em 27 de Fevereiro de 1984, com 24 anos de idade.

  11. O Dr. E……………. e a enfermeira H……………. foram demandados disciplinar a criminalmente.

  12. No domínio disciplinar ficou provada a sua actuação com falta de diligência e zelo a que se achavam obrigados como tudo consta dos respectivos processos disciplinares, mas, não viriam a efectivamente, ser sancionados por as penas aplicáveis terem sido abrangidas pela amnistia - artigo 1.º da Lei n°16/86 de 11 de Junho.

  13. No processo crime, o Dr. E…………….. e a enfermeira H…………….., foram acusados pela prática de um crime de homicídio por negligência, previsto e punido no artigo 126.° n.° 2 do Código Penal em processo que sob o n.° 577/89, correu seus termos pelo 4.° juízo, primeira Secção, do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal.

  14. Os Dr. E…………….. e a enfermeira H…………….., actuaram nas suas qualidades de “funcionários públicos” ao serviço do Hospital Distrital de Setúbal.

  15. Nos autos do processo correcional n° 577/88 que o M.P. moveu contra E…………….. e H…………….., foi proferida sentença homologatória de transação, que transitou em julgado, na qual, se estipulou o seguinte: “Aberta a audiência, pelas 14 horas, foi pedida a palavra pela ilustre mandatária da assistente...

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