Acórdão nº 01413/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. Relatório 1. A……………, identificada nos autos, interpõe recurso de revista do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte [TCAN], de 12.09.2014, que concedeu provimento ao recurso interposto por B……….. [contra-interessada], revogou a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga [TAF] na parte pertinente, e indeferiu o pedido de suspensão de eficácia do acto do «Secretário de Estado da Saúde», de 02.11.2012, que autorizou a abertura, acompanhada da transferência de localização, da Farmácia ……….., de que a contra-interessada era titular, para a freguesia de …………, concelho de Guimarães.

    Conclui assim as suas alegações de revista: A) Nos termos do artigo 150º, nº1, do CPTA, das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, «excepcionalmente», recurso de revista quando: Esteja em causa uma questão de importância fundamental, pela sua relevância jurídica ou social, ou a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito; B) No caso em apreço, a recorrente entende que se verificam estes dois requisitos a propósito de duas questões distintas que foram decididas pelo tribunal «a quo»: - Intempestividade do recurso interposto pela contra-interessada; - Existência de prejuízos de difícil reparação; C) A questão jurídica tem natureza processual, e a sua resolução implica operações jurídicas complexas, na medida em que está em questão a articulação de dois regimes processuais distintivos: o processo administrativo e o processo civil. Em que medida as normas do direito processual civil podem ser aplicadas no processo administrativo e quais as alterações ou adaptações que aquelas normas devem sofrer? D) Por outro lado, esta questão jurídica tem grande capacidade de expansão de controvérsia. No futuro, em inúmeros processos, poderá ser colocada a questão da aplicabilidade do artigo 638º, nº7, do CPC, ao processo administrativo. Por este motivo, é de fundamental importância que este Venerando Tribunal decida, desde já esta questão, dando indicações seguras a todos os sujeitos processuais sobre o modo de contagem do prazo de recurso; E) Quanto à questão da existência de prejuízos de difícil reparação, a recorrente não pretende que seja apreciada matéria de facto [que entende que esta já está fixada pelo tribunal a quo], mas pretende apelar a critérios jurídicos ou normativos de concessão de providências cautelares. Em dois casos muito semelhantes com o caso em apreço [embora não haja uma total identidade dos factos que possa resultar num recurso de oposição de julgados] o Tribunal Central Administrativo Norte decidiu que se justificavam prejuízos de difícil reparação e concedeu a suspensão de eficácia [documentos nºs 1 e 2]; F) Não é admissível que questões semelhantes sejam resolvidas de modo distinto; G) No caso em apreço, existe um manifesto e grosseiro erro de apreciação dos requisitos de concessão da providência, nomeadamente, quanto aos prejuízos de difícil reparação. Esse erro manifesta-se pelo facto de o TCAN ter ignorado por completo os factos dados como provados. O TCAN parte de factos alegados, mas não provados, para concluir que os prejuízos que a requerente da providência poderá sofrer poderão ser reparados no futuro; H) Não é possível a aplicação do artigo 638º nº7 ao contencioso administrativo. Sem conceder, esta norma deveria ser objecto de adaptação e o prazo ser reduzido a metade nas providências cautelares. É manifesto que caducou o direito ao recurso da contra-interessada; I) Nos termos do artigo 120º, nº1 alínea b), para que uma providência cautelar seja concedida é necessário que haja «fundado receio de constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal»; L) Os danos sofridos, como foi alegado e provado pela então requerente e ora recorrente, são muito mais do que danos pecuniários, consubstanciados em perda de clientela difícil de apurar e na perda de oportunidade de concorrer a concurso público para atribuição de um novo alvará de farmácia. Aliás, em casos semelhantes, o TCAN decidiu que existiam, prejuízos de difícil reparação [ver documentos nºs 1 e 2 juntos]; M) Apesar dos factos provados, o TCAN partiu de factos alegados não provados para concluir que os prejuízos patrimoniais sofridos pela requerente serão facilmente determináveis. Ainda que esta conclusão fosse correcta, o tribunal «a quo» contraria esta suposta determinabilidade dos prejuízos, por perda de clientela, ao afirmar que estes podem dever-se a uma grande variedade de factores e não apenas à abertura de uma nova farmácia. Se a perda de clientela e os prejuízos patrimoniais que advirão deste facto podem dever-se a inúmeros factores, como é possível afirmar-se que o prejuízo da requerente da providência será reparável no futuro? N) Por outro lado, existe a possibilidade de se gerar uma situação de facto consumado, na impossibilidade de reconstituição da situação actual hipotética em caso de procedência da acção principal; O) Quanto à ponderação dos interesses em presença dispõe o artigo 120º, nº2, do CPTA:«Nas situações previstas mas alíneas b) e c) do número anterior, a adopção da providência ou das providências será recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados, em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências»; P) Os requeridos da presente providência não demonstraram a existência de danos decorrentes da adopção da providência [ver factos provados].

    Termina pedindo a admissão da revista, e a revogação do acórdão recorrido.

    1. A recorrida, e contra-interessada nos autos, contra-alegou concluindo assim: A) Este recurso foi interposto como recurso de revista, havendo antes de mais, a necessidade deste tribunal proceder à apreciação preliminar sumária da verificação in casu dos respectivos pressupostos da sua admissibilidade, ex vi do nº5 do artigo 150º do CPTA; B) Decorre inequivocamente do nº1 do artigo 150º do CPTA a excepcionalidade do recurso de revista, sendo a sua admissibilidade condicionada por um critério qualitativo de que «esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito»; C) Esta exigência decorre, antes de mais, do facto de este recurso funcionar como uma válvula de segurança do sistema e não como uma instância generalizada do recurso; D) A intervenção do STA só se justificará em matérias de maior importância, sob pena de se generalizar a revista, o que, se acontecesse, não deixaria de se mostrar desconforme com os aludidos juízos tidos em vista pelo legislador; E) No caso ora em apreço é por demais evidente que as questões que a recorrente coloca não se revelam de importância jurídica ou social fundamental ou que a admissibilidade do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito; F) Estes princípios assumem ainda maior relevo e importância em matéria de providências cautelares pois que se trata de regulação provisória da situação, destinada a vigorar apenas durante a pendência do processo principal, pelo que a intervenção de um meio excepcional não é conforme com a precariedade da definição jurídica já efectuada em duas instâncias jurisdicionais; G) Nos processos cautelares está em causa, essencialmente, a ponderação e valoração da matéria de facto, para determinar a solução dada ao litigio, sendo certo que, o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova [artigo 150º, nº4, do CPTA]; H) Pretende a recorrente, em primeira análise, ver reapreciada nesta sede a questão por si suscitada quanto à alegada intempestividade do recurso apresentado pelo aqui recorrida, junto do TCAN [fundamento que improcedeu junto deste], nos exactos termos aí requeridos; I) A questão da aplicabilidade da Lei Processual Civil aos recursos jurisdicionais proferidos pelos Tribunais Administrativos, e no que para o caso interessa, a regra prescrita pelo artigo 638º, nº7, do CPC, é uma questão por demais enraizada na prática processual administrativa, na doutrina e na jurisprudência, conclusão a que aliás se chega sem grande esforço exegético; J) A decisão recorrida, concisa mas assertivamente, deu resposta à problemática levantada; K) É questão inequívoca e pacífica na doutrina e na jurisprudência vigente que no contencioso administrativo é aplicável a norma do artigo 638º, nº7, do CPC, de acordo com a qual, se o recurso tiver por objecto a reapreciação de prova gravada, o prazo para alegações é acrescido em 10 dias; L) A esse respeito, é clara a letra da lei, quando diz o artigo 140º do CPTA que «os recursos ordinários das decisões jurisdicionais proferidas pelos tribunais administrativos regem-se pelo disposto na lei processual civil, com as necessárias adaptações [...] sem prejuízo do estabelecido na presente lei...

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