Acórdão nº 01198/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução12 de Fevereiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 785/11.9BEALM 1. RELATÓRIO 1.1 A…………….. e mulher, B……………. (a seguir Impugnantes ou Recorrentes) recorrem para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pelo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que, julgando verificada a excepção de inimpugnabilidade, por não ter sido dado cumprimento ao disposto no art. 97.º, n.º 2, do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA), absolveu a Fazenda Pública da instância na impugnação judicial por aqueles deduzida contra as liquidações oficiosas de IVA que lhe foram efectuadas ao abrigo do disposto no art. 88.º daquele Código, com referência aos períodos de Janeiro de 2007 a Dezembro de 2008.

1.2 O recurso foi admitido, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo e os Recorrentes apresentaram a motivação do recurso, que remataram com conclusões do seguinte teor (Porque usaremos o itálico na transcrição, as partes que no original estavam em itálico surgem aqui em tipo normal, a fim de se respeitar o destaque que lhes foi concedido pelos Recorrentes.

): « 1. O presente recurso deve desde logo proceder porque a proibição prevista no n.º 2 do artigo 97.º do CIVA pressupõe uma “situação de normalidade”, i.e., que o contribuinte se tenha registado enquanto tal para efeitos de IRS (ou de IRC) e IVA, e que, dentro dos prazos legais, não tenha apresentado as declarações periódicas a que está obrigado.

  1. Ora, ao contrário do defendido na douta sentença recorrida, a situação nos autos não se enquadra nessa previsão.

  2. De facto, as liquidações oficiosas de IVA (cuja impugnabilidade se discute) decorreram do facto da Administração Fiscal, na sequência da respectiva acção inspectiva, ter registado oficiosamente o impugnante marido no cadastro fiscal na categoria B do IRS nos anos de 2005 a 2008, o que terá produzido efeitos em sede de IVA, embora posteriormente à data em que as declarações periódicas de IVA deveriam ter sido apresentadas, com efeitos retroactivos a 01.01.2005.

  3. Inscrição oficiosa essa que foi impugnada pelos ora recorrentes, em sede de impugnação judicial que corre termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada sob o n.º 1109/10.8BEALM da 2.ª Unidade Orgânica.

  4. Mal se entenderia, face ao exposto, que o impugnante marido fosse “obrigado” a aceitar tal inscrição para poder impugnar judicialmente os actos de liquidação oficiosa de IVA em apreço, i.e., fosse “forçado” a reconhecer a existência de uma actividade empresarial tido por ele, que o sujeitasse ao regime de IVA, e consequentemente, o sujeitasse ao cumprimento das obrigações acessórias inerentes ao mesmo (entregar as declarações periódicas em falta ou, caso não concordasse com o valor de IVA apurado, as declarações de substituição, modelo C, indicando os valores correctos “ainda que iguais a zero”) para poder reagir a tais actos de liquidação oficiosa.

  5. Pelo que, in casu, entender que não foi dado cumprimento ao n.º 2 do artigo 97.º do CIVA é claramente coarctar aos impugnantes o seu direito de defesa contra situações que afectam a sua esfera jurídica, uma vez que, como sucede na situação em apreço, não dispõem de outra forma de atacar a ilegalidade praticada, em virtude de uma evidente “impossibilidade prática” de entrega das declarações, de substituição, modelo C, indicando os valores correctos “ainda que iguais a zero”, referidas na douta sentença recorrida.

  6. Para além disso, o processo tributário apresenta-se como um contencioso pleno ou de tutela jurisdicional efectiva, o que significa que o contribuinte pode defender as suas posições jurídicas em todas as situações em que a sua esfera jurídica se encontre afectada, como sucede no presente caso, e não dispõe de outra forma de atacar a ilegalidade praticada.

  7. Com efeito, tanto o n.º 1 do artigo 9.º, como o n.º 1 do artigo 95.º ambos da LGT, constituem uma concretização da garantia constitucional a uma tutela jurisdicional eficaz e efectiva dos direitos e interesses legalmente protegidos conferida pelo n.º 4 do artigo 268.º da CRP, a qual inclui, designadamente, o reconhecimento desses direitos ou interesses, a impugnação de quaisquer actos tributários ou relativos a matéria tributária que os lesem, independentemente da sua forma, a determinação de actos administrativos legalmente devidos e a adopção de medidas cautelares adequadas.

  8. Ora, uma interpretação da norma do n.º 2 do artigo 97.º do CIVA, cingindo-se simplesmente à letra da lei, em detrimento de uma interpretação casuística da mesma, i.e. sem tomar em consideração a “inscrição oficiosa” do impugnante marido no cadastro fiscal na categoria B do IRS nos anos de 2005 a 2008, bem como a impugnação judicial da mesma, como fez a douta decisão recorrida, enferme de inconstitucionalidade por violação da garantia constitucional conferida pelo n.º 4 do artigo 268.º da CRP, concretizada no n.º 1 do artigo 9.º e n.º 1 do artigo 95.º da LGT, inconstitucionalidade essa que aqui se invoca com todas as legais consequências.

  9. O aludido n.º 2 do artigo 97.º do CIVA deveria, pois, no caso vertente, ser interpretado tendo presente a situação “peculiar” de inscrição oficiosa do impugnante marido no cadastro fiscal na categoria B do IRS nos anos de 2005 a 2008, tendo a mesma, inclusivamente, sido impugnada judicialmente pelos impugnantes, ora recorrentes, por não se conformarem com ela, e, tendo presente tal realidade, ser reconhecido àqueles o direito de reacção contenciosa contra as liquidações sindicadas, sem a obrigatoriedade de entrega das declarações de substituição (ainda que iguais a zero) das declarações periódicas de IVA como requisito prévio para a sua impugnação contenciosa.

    Termos em que, Deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequências, revogada a sentença recorrida nos moldes acima referidos, em virtude do que dever ser ordenado o prosseguimento dos autos de impugnação para apreciação da questão de fundo».

    1.3 A Fazenda Pública não contra alegou.

    1.4 Recebidos neste Supremo Tribunal Administrativo, os autos foram com vista ao Ministério Público, e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja declarada a incompetência em razão da hierarquia, com a seguinte fundamentação: «1. As conclusões das alegações delimitam o âmbito e o objecto do recurso (art. 684.º n.º 3 CPC/art. 2.º al. e) CPPT).

    As 3.ª, 9.ª e 10.º conclusões enunciam facto não contemplado no probatório da sentença (com apreciação expressamente recusada pelo tribunal cf. fls. 149) do qual os Recorrentes pretendem extrair consequência jurídica relevante: - inscrição oficiosa do impugnante marido no cadastro fiscal categoria B de IRS (anos 2005 a 2008).

    Neste contexto o recurso não tem por exclusivo fundamento matéria de direito sendo o STA-SCT incompetente, em razão da hierarquia, para o seu conhecimento e competente o TCA Sul-SCT (arts. 26.º al. b) e 38.º al. a) ETAF 2002; art. 280.º n.º 1 CPPT).

  10. Os interessados poderão requerer, oportunamente, o envio...

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