Acórdão nº 01355/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução07 de Maio de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. Relatório 1. A………., LDA., intentou, contra a ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA [AR], esta acção administrativa de contencioso pré-contratual pedindo a declaração de nulidade, ou a anulação, do «Relatório Final da Fase de Avaliação» e respectivo «Despacho de Adjudicação», relativos ao «Concurso Limitado por Prévia Qualificação GARIP/2014/02», lançado com vista à adjudicação de serviços de fornecimento contínuo de viagens e alojamentos à AR, publicitado pelo «Anúncio nº 356/2014» [publicado no Diário da República, II Série, nº 18, de 27.01.2014]. Pede, ainda, que sejam declarados nulos ou anulados todos os demais actos que, tendo por base aquele relatório e despacho, tenham sido ou venham a ser praticados pela AR em sede do mesmo concurso público.

    Durante a pendência da acção, e a solicitação da autora, o objecto da mesma foi alargado ao Acordo-Quadro entretanto celebrado entre a AR e as sociedades nela demandadas como contra-interessadas, ou seja, a «B………., SA, a C………, LDA, e a D………, SA», todas identificadas nos autos [doravante apenas B……, C…… e D……].

    1. Foram juntas contestações pela demandada AR e pelas contra-interessadas B…… e C…….. Todas impugnaram as razões apresentadas pela autora para justificar a declaração de nulidade ou a anulação dos actos visados na acção, e, a AR, suscitou ainda a «intempestividade» da sua interposição em juízo.

    2. No despacho saneador esta questão prévia foi julgada improcedente, e, uma vez dispensada produção de prova pessoal, a acção prosseguiu para alegações.

    3. Alegou a autora, a ré, e as contra-interessadas B……. e C……..

    4. A autora culmina as suas alegações da forma seguinte: A) A referência na proposta da autora de que «o desconto global incidirá sobre o valor total da factura, excluindo taxas de aeroporto e taxa de serviço», como a mesma procurou explicar e demonstrar, subsumiu-se a um mero lapso, já que o anexo de onde consta tal referência corresponde a um formulário tipo utilizado na autora; B) Na realidade, e como também mencionado em tal anexo, o desconto incidiria sobre o valor total da factura, sem eliminação de itens facturados do cálculo do desconto global a efectuar; C) Nem a autora, nem a entidade demandada detectaram tal lapso, já que esta última, numa primeira fase, aceitou e avaliou a proposta da autora; D) Como a entidade demandada reconhece, num primeiro momento a mesma admitiu a proposta da autora, classificando-a em 2º lugar – ver «Relatório Final da Fase de Avaliação», de 08.09.2014, ponto 6, junto com a contestação; E) Tal lapso foi, por isso, completamente desconsiderado pela entidade demandada no momento da avaliação das propostas; F) Não é verdade, por isso, que a falta de correspondência entre a vontade real e a declarada na proposta da autora não fosse evidente, como a entidade demandada pretende fazer crer; G) Desde logo, atendendo ao teor integral da proposta e à impossibilidade prevista no «Programa do Procedimento», ora junto pela entidade demandada, de apresentar propostas variantes –ver respectiva cláusula 11ª; H) Como pode, por isso, a entidade demandada alegar que os termos e condições em que o desconto foi submetido à concorrência tornam impossível a avaliação da proposta da autora relativamente às dos outros concorrentes - ver artigo 26º da contestação -quando a entidade demandada aceitou e avaliou a proposta da autora! I) O lapso na proposta da autora era evidente e manifestamente compreensível como um engano, podendo facilmente concluir-se não se tratar da vontade real da autora, nem corresponder ao sentido da proposta entendida como um todo; J) Tanto assim foi que, como a própria entidade demandada reconhece - veja-se o artigo 23º da contestação - a autora foi a única concorrente a incluir as taxas de aeroporto e serviço na fórmula de apuramento do desconto a efectuar, o que corrobora mais o facto de se ter tratado de um mero lapso; K) Facto que a autora tentou explicar e corrigir, assim que se apercebeu de tal situação; L) A desconsideração do lapso em causa não torna a proposta da autora mais competitiva, apenas a torna conforme com a sua vontade real; M) Não há recurso a premissas diversas nas propostas, nem pode constituir um impedimento à comparabilidade e avaliação da proposta da autora, face às propostas dos restantes concorrentes, quando uma única proposta, por mero lapso, considera um critério que é contraditório com o «Caderno de Encargos»; N) Procura a entidade demandada, agora, justificar a falta de consideração de tal explicação com base no princípio de intangibilidade das propostas, previsto no artigo 72º do Código dos Contractos Públicos; O) Princípio que, como qualquer outro, não é absoluto e deve ser compatibilizado, com recurso a critérios de razoabilidade, com os restantes interesses em presença; P) Como seja o princípio da igualdade e da não discriminação; Q) Tratando-se de um mero lapso, podia inclusive ter a entidade demandada feito uma correcção oficiosa, como a mesma confessa no artigo 35º da contestação; R) Pelo que, não pode a entidade demandada, depois de confessar tal ideia, vir alegar que o esclarecimento da autora foi prestado fora de prazo, esclarecimento esse, segundo a entidade demandada, perfeitamente inócuo e que nunca relevaria, inexplicavelmente, na formação da sua convicção, como a mesma reconhece no artigo 62º da contestação; S) Não houve qualquer intenção de introduzir elemento novo na proposta apresentada, de modo a influir na respectiva avaliação, avaliação essa que, refira-se, já havia sido feita pela entidade demandada; T) Como a própria entidade demandada reconhece - nos artigos 50º e seguintes da sua contestação - foram solicitados esclarecimentos a outros concorrentes, inclusive no que concerne à periodicidade do desconto a aplicar, os quais deveriam ter sido juntos, na íntegra, com o processo de concurso, já que integram o mesmo, nos termos do artigo 84º do CPTA; U) Pelo que, não se concebe como a situação da proposta apresentada pela autora seria diferente desta, ao ponto de não justificar também um pedido de esclarecimento, uma vez que se refere, não à periodicidade, mas ao âmbito do desconto; V) Como já demonstrado no articulado inicial, e aqui reiterado, a opção pela exclusão da proposta da autora beneficia alguns concorrentes em detrimento dos demais e revela-se violadora dos princípios da transparência e da livre concorrência, princípios fundamentais a qualquer procedimento de concurso público, previstos no artigo 1º, nº 4, do CCP; W) A referida violação, às normas do CCP e CRP, teve origem no facto de ter sido dada a oportunidade a determinados concorrentes de apresentarem respostas a pedidos de esclarecimentos e rectificações às propostas apresentadas; X) Oportunidade que foi subtraída à autora; Y) Na verdade, os princípios de legalidade, justiça, igualdade, transparência e imparcialidade, inerentes a qualquer procedimento concursal público e previstos no artigo 1º, nº 4, do CCP, devem nortear toda e qualquer fase de formação do contrato; Z) A exclusão da proposta da autora, para além de um tratamento discriminatório, poderá configurar, por isso, uma violação do dever de prossecução do interesse público, uma vez que subtrai, em violação das regras concursais, da comparação entre propostas, a proposta da autora; AA) A qual pode ser, inclusive, a mais adequada ao interesse público; BB) Como já dito, até ao momento em que foi detectado o referido lapso, a proposta da autora encontrava-se classificada em 2º lugar; CC) Criando na mesma a expectativa legítima de que iria ser alvo de adjudicação dos serviços a contratar pela entidade demandada; DD) Por todo o exposto, e por tudo o que já foi alegado em sede de articulado inicial, entende a autora que a acção deverá proceder.

    5. A ré AR termina as suas alegações com o seguinte quadro conclusivo: A) Estabelecem os artigos 10º, nº 1, alínea f), do «Programa do Concurso», e 2º, alínea f), do «Convite», que as propostas dos concorrentes devem incluir o desconto global a incidir sobre o valor da facturação semestral. Não admitem, por outro lado, as ditas peças a apresentação de propostas variantes [ver artigo 11º do Programa e 3º do Convite] antes obrigam a entidade adjudicante a excluir todas as propostas que não cumpram os parâmetros aí fixados [ver artigo 16º, nº 4, alínea b), do Programa do Concurso, e 8º, nº4, alínea b), do Convite]; B) A proposta apresentada ao abrigo da alínea f) do artigo 2º do «Convite» pela concorrente autora, ao oferecer um desconto global de 3% no valor total da facturação incidente «sobre o valor da factura [semestral], excluindo taxas de aeroporto e taxa de serviço» desrespeitava as especificações constantes do «Programa do Concurso» e do «Convite», pois que em nenhuma dessas peças era admitida a eliminação de quaisquer parcelas facturadas do cálculo do desconto global a efectuar; C) Tal proposta, para além de violar os termos e condições em que o item referido no artigo 2º, alínea f), do «Convite» foi colocado à concorrência, não permitia a sua avaliação em comparação com as propostas apresentadas pelos demais concorrentes, uma vez que as taxas de aeroporto e de serviço, para além de variáveis, assumem um valor bastante significativo na composição do preço das viagens; D) A proposta apresentada pela autora violou, portanto, também a exigência de comparabilidade das...

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