Acórdão nº 01704/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Dezembro de 2015

Magistrado ResponsávelDULCE NETO
Data da Resolução16 de Dezembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

A…………………, com os demais sinais dos autos, recorre da decisão que, no âmbito da «acção declarativa com processo sumário» que instaurou no TAF de Aveiro contra a Administração Tributária e contra o adquirente B……………. – com vista, essencialmente, ao reconhecimento do seu direito de preferência na alienação da quota-parte (1/2 indivisa) do prédio vendido na execução fiscal nº 3441200601042483 e apensos – julgou verificado o erro na forma de processo e determinou a anulação de todo o processado por inviabilidade de convolação na forma processual que se julgou adequada, isto é, em processo de reclamação previsto nos arts. 276º e segs. do CPPT.

1.1.

As alegações do recurso mostram-se rematadas com as seguintes conclusões I. A Sentença recorrida, na parte objecto do presente Recurso, não pode, salvo o devido respeito por opinião diversa, manter-se.

  1. A aqui Recorrente interpôs contra os aqui Recorridos a competente Acção Declarativa com Processo Sumário (Acção de Preferência) no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que correu os seus termos ao abrigo do Processo nº 285/13.2BEAVR.

  2. Tendo pedido o seguinte: · Fosse reconhecido à Autora o Direito de Preferência sobre o Prédio Urbano descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Santa Maria da Feira sob o nº 1876/20111127, substituindo-se o Adquirente pela Preferente na titularidade do direito que o mesmo adquiriu sobre a coisa objecto mediato do registo; · Fosse o Recorrido condenado a entregar o referido imóvel à Autora, livre e desocupado; e, · Fosse ordenado o cancelamento de todos e quaisquer registos que o Réu (Adquirente), haja feito a seu favor em consequência da compra do supra referido prédio e, bem assim, outras que este viesse a fazer, sempre com todas as demais consequências que ao caso couberem.

  3. Por sentença proferida em 15 de Julho de 2013, entendeu a Juiz ocorrer erro na forma de processo, uma vez que, segunda a mesma, “o meio processual adequado para apreciar a questão dos autos, designadamente a existência do invocado direito de preferência sobre um bem penhorado numa execução fiscal, é a reclamação prevista no artigo 276º do CPPT”.

  4. E, consequentemente julgou verificado o erro na forma do processo, tendo declarado a anulação do processado1 em face da inviabilidade da convolação, por à data em que foi apresentada a petição inicial se encontrar excedido o prazo para interpor a reclamação prevista no artigo 276º do CPPT.

  5. Atendendo à pretensão da Recorrente, supra descrita, é seu entendimento ser a “Acção de Preferência” o meio adequado para salvaguarda dos seus legítimos direitos e interesses.

    Isto porque, VII. A Recorrente é dona e legítima proprietária de 1/2 - em comum e sem divisão de partes - do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Santa Maria da Feira sob o nº 1876/20111127, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 1648.

  6. A outra metade do imóvel (em comum e sem determinação de partes) era propriedade de D…………., tendo sido penhorada ao abrigo da Execução Fiscal nº 3441200601042483 e Aps, que se encontra a correr os seus termos no Serviço de Finanças da Feira 2.

  7. Posteriormente, foi a Recorrente notificada de que havia sido ordenada a venda extrajudicial da quota-parte do imóvel penhorado e, bem assim, de quem havia sido nomeado como encarregado de venda.

  8. No entanto, não mais foi a Recorrente informada sobre o estado do Processo, em particular, no que respeita ao estado da venda, nem para poder exercer o direito de preferência que lhe assistia, na eventualidade de existirem interessados na 1/2 do imóvel que se encontrava para venda.

  9. E a verdade é que, tendo sido apresentada uma proposta por parte do ora Réu, veio a mesma a ser aceite pelo Serviço de Finanças da Feira 2, onde se encontra a correr a Execução Fiscal, tendo a competente escritura pública sido outorgada a 6 de Fevereiro de 2012, na qual interveio a Recorrida, na qualidade de vendedora e, o Recorrido, na qualidade de comprador.

    Ora XII. A compropriedade encontra-se regulada nos artigos 1401º e seguintes do Código Civil. Diz-se que há compropriedade, ou propriedade em comum, quando duas ou mais pessoas são simultaneamente titulares do direito de propriedade sobre a mesma coisa.

  10. O comproprietário, no que ao caso diz respeito, tem direito de preferência na venda da quota de qualquer um dos outros comproprietários.

  11. O Direito de Preferência, por sua vez, é um direito real de aquisição resultante de uma situação objectiva a que a lei atribui certos efeitos e nasce para a realidade jurídica no momento em que a situação objectiva legalmente definida se constata (cf. Acórdão do TRP de 01.06.1978 - in www.dgsi.pt) ou, na definição de Pires de Lima (in “Direitos Reais” 4ª edição, pág. 54) “o poder que tem o titular do direito de impor e fazer valer a existência do seu direito em relação a qualquer indivíduo que tenha constituído sobre a coisa um direito posterior direito real”.

  12. Este regime encontra-se hoje consagrado nos artigos 416º a 418º, 1409º e 1410º do Código Civil.

  13. E, segundo o nº 1 do artigo 1409º “O comproprietário goza do direito de preferência e tem o primeiro lugar entre os preferentes legais no caso de venda, ou dação em cumprimento, a estranhos da quota de qualquer dos seus consortes”.

  14. Segundo Pires de Lima e Antunes Varela (in “C. Civil Anotado”, 1972, V. III, p. 333) são “três os fins principais que justificam a concessão da preferência no caso especial da compropriedade: a) fomentar a propriedade plena, que facilita a exploração mais equilibrada e mais pacífica dos bens; b) não sendo possível alcançar a propriedade exclusiva, diminuir o número dos consortes; c) impedir o ingresso, na contitularidade do direito, de pessoas com quem os consortes, por qualquer razão, o não que iram exercer”.

    Depois, XVIII. Como escreveu o Prof. Alberto dos Reis (in “Processo de Execução” Vol. II, pág. 450), “Se a alienação em vez de ser feita em carta fechada ou arrematação for efectuada por negociação particular há-de proceder-se como se procede nas vendas particulares: o mandatário antes de fazer a escritura de venda deve oferecer a preferência aos respectivos titulares notificando-os ou avisando-os extrajudicialmente”.

  15. Por isso, muito embora o artigo 905º CPC nada preceitue sobre a necessidade de notificação aos titulares do Direito de Preferência tal não significa que nesta modalidade de venda não haja lugar a esta formalidade legal (cf. neste sentido, Acórdão do STJ de 09.07.1998 - in www.dgsi.pt).

  16. E, então, a ora Recorrente – na qualidade de comproprietária do imóvel supra identificado (em que ½ do imóvel foi objecto de venda em sede de execução fiscal) tem indiscutível legitimidade para exercer o Direito de Preferência em relação a 1/2 do imóvel adjudicado a B……………… XXI. A questão em apreço é, então, a de saber se a titularidade do direito de preferência (que assiste à Recorrente, na qualidade de Comproprietária) lhe dá a possibilidade ou se constitui fundamento legal para requerer a anulação da venda executiva.

  17. Ou se, ao invés, deverá a Recorrente exercer o seu direito através da acção de preferência, como veio a acontecer no caso sub judice.

  18. Perante a penhora do direito do executado ao bem indiviso, assiste aos comproprietários o direito de preferência na venda daquele, ao abrigo do disposto no citado nº 1 do artigo 1409º (cf. neste sentido, Acórdão do TRP de 11.10.2005 - in www.dpst.pt).

  19. Por isso, na venda judicial do direito ao bem indiviso, devem os restantes comproprietários ser notificados, na qualidade de titulares de um direito de preferência, do dia, hora e local aprazados para a abertura das propostas, a fim de poderem exercer o seu direito no próprio acto, se alguma proposta for aceite (artigo 892º nº 1 CPC).

  20. Isso mesmo resulta do artigo 249º, nº 7, do CPPT, segundo o qual “Os titulares do direito de preferência na alienação dos bens são notificados do dia e hora da entrega dos bens ao proponente, para poderem exercer o seu direito no acto da adjudicação”.

  21. O objectivo de proceder à(s) notificação(ões) nos termos previstos no nº 7 do artigo 249º (CPPT) é o de assegurar a estabilidade das vendas, por funcionar como um incentivo para potenciais compradores fazerem aquisições e a concorrência entre eles potenciar a obtenção de melhores preços (cf. neste sentido, Acórdão do TRG de 13.11.2008 - in www.dgsi.pt).

  22. Depois, ao impor aos titulares de direitos de preferência a obrigação de exercer os seus direitos no âmbito da execução fiscal, pretende-se resolver neste processo todas as questões respeitantes ao exercício de direitos de preferência e, bem assim, evitar que os adquirentes tenham de vir, posteriormente, a ser demandados em acções de preferência.

  23. Consequentemente, a falta de notificação dos titulares do direito de preferência tem a mesma consequência que a falta de notificação ou aviso prévio na venda particular (artigo 892º, nº 2 CPC), que é o de possibilitar-lhes a instauração de acção de preferência.

  24. Se, após a realização da venda, o preferente tiver sucesso na acção de preferência, passará a ocupar o lugar do comprador, devendo para isso pagar o preço e as despesas da compra (artigo 909º, nº 2, CPC), assistindo-lhe ainda o direito a pedir a anulação da venda com base nos fundamentos indicados na alínea a) do nº 1 do artigo 257º (CPPT), solicitar a entrega dos bens, contra o detentor, na própria execução (artigos 901º e 930º CPC) e, ainda, a requerer o levantamento da penhora e o cancelamento dos registos dos direitos reais que caducam (artigo 824º, nº 2, CC) - cf. neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, in “Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado”, II Vol., em anotação ao artigo 249º.

  25. Assim, o dever de notificar os titulares do direito de preferência determina que a sua omissão ou frustração lhes permita avançar com uma acção de preferência.

  26. Ou seja, a...

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