Acórdão nº 01678/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelANA PAULA PORTELA
Data da Resolução07 de Julho de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo I - RELATÓRIO 1. A…………, identificado nos autos, vem interpor recurso para uniformização de jurisprudência, nos termos do art. 152º, nº1, do CPTA, do Acórdão de 1.10.2015 deste STA que concedeu provimento ao recurso do acórdão do TCAN, de 17.05.2013, que revogara a decisão de 1ª instância proferida pelo TAF do Porto de 24.1.2014, que por sua vez julgara improcedente a ação administrativa especial por si interposta contra a OA de declaração de nulidade do Acórdão do Conselho de Deontologia do Porto, de 9.1.2009, que o havia condenado ao pagamento de uma pena de multa de 10.000€.

Para tanto refere que: “1. (...) Excecionalmente o Supremo Tribunal Administrativo decidiu aceitar apreciar recurso do questionar da legitimidade de uma multa de €10.000,00 em processo disciplinar, não obstante a subscrição unânime do Acórdão tirado no Tribunal Central Administrativo Norte que dava inteira razão ao impugnante, declarando a nulidade do ato praticado pela Ordem dos Advogados.

  1. (...) 5. A questão fundamental de direito que então e agora está em apreciação é a de saber se existe infração disciplinar quando não há ilicitude do comportamento, por não existir dever de obediência a ordem emitida por órgão incompetente.

  2. Pelo que é o conceito de infração disciplinar e a exigência da ilicitude para que aquela exista e a possibilidade de sanação por via judicial do vício de incompetência do órgão administrativo que praticou o ato administrativo, que em tal acórdão se discute e se tenta decidir.

  3. De um modo tão infeliz contudo que a uniformidade de jurisprudência que se procurou nem no seio do próprio coletivo o consenso foi atingido, já que tal magistralidade pretendida apenas o voto de vencido proferido pelo Conselheiro Alberto Oliveira o revelou.

  4. O acórdão em si constituindo distinta interpretação, se não antagonismo, com jurisprudência há muito e repetidamente fixada pelos Tribunais Administrativos Superiores, ao consagrar da desnecessidade da ilicitude de qualquer comportamento para que exista infração disciplinar e de que um órgão incompetente pode definir um comportamento que se violado constitui desobediência, que era e é o que está em discussão nos presentes autos e recurso.

  5. (...) 12. Os sempre Venerandos Juízes Conselheiros subscritores do acórdão, ao entenderem que ao caso é aplicável o artigo 86° dos seguintes estatutos da Ordem dos Advogados, já igualmente revogados, o estabelecido pela Lei 15/2005, e que este seria taxativo na declaração de incompatibilidade, negam ao impugnante a possibilidade de invocar os seus direitos adquiridos ao abrigo de legislação anterior, considerando a incompatibilidade como absoluta, e insuscetível de qualquer exceção.

  6. Decidindo ignorar a existência, frequente e não rara, de tais exceções no seio e por iniciativa da própria O.A. em relação a múltiplas situações em concreto, como igualmente consta do processo, 14. Mais entendendo que a infração seria a de não autossuspendido a sua inscrição, renunciando ao seu direito adquirido de exercer ambas as profissões.

    O acórdão fundamento 14. Colocada a questão na necessidade da existência de ilicitude do comportamento para que exista infração disciplinar não faltam os acórdãos do próprio STA que a exigem, tão fundamental e arreigada está tal pressuposto, de que não existe pena sem lei prévia “nulla poena sine lege”, decorrência aliás do princípio da legalidade que, esse, está por detrás de todos os acórdãos do STA.

  7. E entre todos escolhe-se o descrito no site da dgsi.pt sob o descritivo 017986, Acórdão do STA, 1ª Subsecção do CA, em que foi relator o Conselheiro Dr Simões Redinha, datado de 28.06.1990, e que a respeito da aplicação de uma pena em processo disciplinar, invoca tal princípio, sendo sintético e suficiente curial no ponto III que se transcreve: “III - No direito disciplinar vigora o princípio da legalidade das penas (“nulia poena sine lege”).” 16. Em tal acórdão exige-se o respeito pelo princípio da legalidade na aplicação da pena disciplinar, exigindo lei prévia que determine a ilicitude do comportamento e que defina a sua sanção, estabelecendo que uma sanção não precedida de lei prévia que a proíba não deve ser aplicada.

  8. A entidade que aplicou a pena de 10 mil euros de multa fê-lo por ter considerado o exercício simultâneo de duas profissões durante mais de vinte anos à data da decisão, sem que o impugnante tivesse auto suspendido a sua inscrição.

  9. Bem sabendo, até porque o Conselho de Deontologia do Porto já lhe tinha aplicado uma sanção disciplinar de censura por tal facto em 2005, sem que tivesse recorrido da mesma.

  10. Entendeu agora o Acórdão recorrido que a sanção ora em pedido de anulação foi aplicada ao impugnante o teria sido porque quando saiu a Lei 15/2005 não autossuspendeu por sua iniciativa a sua inscrição como advogado, considerando que tal lei assim o determinava tal lei que consagrava de forma “óbvio e claríssimo” incompatibilidade das duas profissões.

  11. (...) 26. Durante mais de 15 anos então e atualmente durante mais de 25 anos já, o impugnante exerceu ambas as profissões, sem que a Ordem dos Advogados tivesse declarado a situação de incompatibilidade através do único órgão então competente.

  12. Que sabendo de tal exercício não promoveu a declaração, nem suspendeu o impugnante na sua inscrição como Advogado, podendo-o fazer.

  13. E quando entendeu, em processo de 2010 decidido em 2013, o Conselho de Deontologia do Porto apreciar tal prática, limitou-se a considerar tal situação como censurável, nada mais promovendo, desde logo não diligenciando pela declaração de incompatibilidade pelo órgão competente para tal.

  14. Não existindo deliberação da Ordem dos Advogados a considerar a situação de incompatibilidade em relação ao impugnante, e entendendo este que lhe assistia o direito adquirido na legislação anterior de poder exercer as duas profissões, à semelhança do que se passava e passa, em idênticas situações de dupla profissão genericamente consideradas incompatíveis, o impugnante não estava impedido de o fazer.

  15. Não existia à data de 2005, data da promulgação da Lei 15/2005 qualquer situação de incompatibilidade que tivesse sido pessoal e casualmente determinada em relação ao impugnante, pelo que nos termos do artigo 81° da Lei 15/2005, este tinha adquirido o direito a exercer ambas as profissões. (...).

  16. Entendendo o impugnante deter tais direitos, não lhe competia a obrigação de se autossuspender considerando-se em situação de incompatibilidade.

  17. Porque não o estava.

  18. E ainda hoje não se encontra o impugnante em situação de incompatibilidade, já que nunca a Ordem dos Advogados o decretou e /ou suspendeu a sua inscrição, podendo-o fazer.

  19. Limitando-se em 2013 e no processo recorrido a aplicar uma multa por alegada desobediência, quando nenhuma situação de ilicitude se verificava.

  20. Só existiria ilegalidade por exercício em situação da incompatibilidade se tal tivesse sido determinado até 2005 pela Ordem dos Advogados, o que não foi.

  21. O impugnante a partir daí usufruía de direitos adquiridos consagrados pela própria Lei que definia as incompatibilidades relativas.

  22. Não havia lei anterior que lhe fosse, ou seja ainda, aplicável e que o impeça de exercer ambas as profissões. (...).

  23. Pelo que o impugnante em nada desobedeceu a qualquer ordem, ou a qualquer preceito legal que o obrigasse a autossuspender-se.

  24. Pelo que ao aplicar a multa em apreço nos presentes autos a O.A. aplicou uma sanção disciplinar sem respaldo em qualquer lei, em qualquer ordem legitima que tivesse dado ao impugnante e a que este devesse obediência.

  25. Pelo contrário, a inércia consciente da O.A. ao durante mais de vinte anos ter tido conhecimento da prática da dupla profissão ao não decretar a incompatibilidade e ao não suspender ou cancelar a sua inscrição, mesmo depois de bem saber que o impugnante não o faria de moto próprio, criou a convicção, reconheceu implicitamente ao impugnante o direito a tal exercício.(...) 51. Pelo que não existindo desrespeito nem à lei nem a ordem legítima de para quem tal tivesse autoridade por a ter emitida nos termos legais, falta à pretensa infração disciplinar um dos seus elementos essenciais, a ilicitude, e a punição em tais condições constitui uma violação ao princípio da legalidade, expresso aqui pela expressão de nullum poena sine lege”.

  26. Princípio que está expressa e suficientemente definido no acórdão fundamento e na extensíssima doutrina e jurisprudência dos tribunais, e consagrado sem qualquer equivocidade no sistema legal nacional, incluindo naturalmente na própria C.R.P., no que respeita às leis penais, artigo 29°, que se aplicava à...

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