Acórdão nº 0516/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS CARVALHO
Data da Resolução13 de Julho de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

RELATÓRIO 1.1.

A…………, devidamente identificado nos autos, intentou no Supremo Tribunal Administrativo ação administrativa especial contra o CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO [doravante «CSMP»], impugnando e pedindo que fossem declaradas nulas, ou apenas anuladas, as deliberações do Secção Disciplinar do «CSMP» de 12.07.2013 e de 24.09.2013 e do Plenário do «CSMP», de 03.12.2013, através das quais foi decidido aplicar-lhe a pena disciplinar de 150 dias de suspensão de exercício e a sua transferência para a comarca de ………. Mais peticiona que, no uso do poder-dever ínsito no art. 71.º do CPTA, se imponha ao R. “… a título de vinculações a observar na emissão do ato devido, que subsuma a conduta do Autor a figura de negligência inconsciente e lhe aplique uma pena de multa, de medida a ponderar de acordo com as circunstâncias atenuantes e agravantes dadas como provadas, suspensa na sua execução”.

1.2.

Citado o R. veio o mesmo a apresentar contestação, inserta a fls. 179 a 199 dos autos, no âmbito da qual arguiu a inimpugnabilidade das deliberações da Secção Disciplinar do «CSMP», de 12.07.2013 e de 24.09.2013, devendo, em consequência, ser absolvido da instância e, bem assim, contraditou no mais os fundamentos da presente ação administrativa, concluindo pela sua improcedência.

1.3.

Notificado para se pronunciar sobre a questão da inimpugnabilidade invocada pelo R. na sua contestação [cfr. fls. 202/203] veio o A. a sustentar, a final, que a deliberação tomada pelo Plenário do «CSMP» incorpora as deliberações que o R. entende serem inimpugnáveis pelo que os vícios assacados a estas estendem-se e inquinam aquele ato, não sendo pelo facto de o A. não os ter invocado nos meios graciosos de que fez uso, que tais ilegalidades ficam sanadas ou deixam de poder ser apreciadas pelo Tribunal, pelo que conclui como na petição inicial [cfr. fls. 204 a 206].

1.4.

Subsequentemente apenas foi proferido despacho a determinar a notificação das partes para produzirem alegações escritas nos termos e para os efeitos do disposto no art. 91.º, n.º 4, do CPTA, sendo que apenas o R. o veio fazer culminando-as com o seguinte quadro conclusivo, que se reproduz [cfr. fls. 208/210 e fls. 211 e segs.

]: “… 1.ª - As deliberações da Secção disciplinar são atos inimpugnáveis, porque delas cabe reclamação necessária para o Plenário do CSMP, nos termos dos artigos 27.º, alínea f) e 29.º n.º 5 do Estatuto do Ministério Público (EMP); 2.ª - E essa reclamação necessária tem efeito suspensivo, nos termos do artigo 163.º, n.º 1 do Código do Código de Procedimento Administrativo (CPA), donde resulta que dos atos reclamados nenhuma lesão imediata de direitos ou interesses legítimos resultou para o autor; 3.ª - Conforme se afirma em síntese no citado acórdão de 01.08.2007 (proc. n.º 567/07), constituindo jurisprudência pacífica: «das deliberações da Secção Disciplinar do CSMP cabe reclamação necessária para o Plenário do mesmo Conselho nos termos do artigo 29.º n.º 5 do EMP, só cabendo recurso das decisões do Plenário nos termos do artigo 33.º daquele Estatuto»; 4.ª - A inimpugnabilidade das deliberações da Secção Disciplinar do CSMP de 12 de julho de 2013 e de 24 de setembro de 2013 constitui uma exceção dilatória insuprível prevista no artigo 89.º n.º 1 alínea c) do CPTA, que obsta ao prosseguimento do processo e conduz à absolvição da instância (nessa parte) nos termos do artigo 576.º n.º 2 do Código de Processo Civil; 5.ª - Não ocorreu qualquer vício de fundamentação do impugnado acórdão do Plenário do CSMP de 3 de dezembro de 2013, pois nele são expostas, de forma objetiva, clara, suficientemente desenvolvida e coerente, as razões por que se considerou adequada e necessária a aplicação ao autor, tanto da pena disciplinar de 150 dias de suspensão de exercício de funções, como da transferência para a Comarca de ………; 6.ª - Por isso, não existe qualquer ininteligibilidade ou impossibilidade lógica do objeto da decisão punitiva, nem esta enferma de qualquer outro vício na sua fundamentação, pelo que nem é nula nos termos do artigo 133.º, n.ºs 1 e 2, alínea c) do CPA, nem tão pouco é anulável nos termos dos artigos 123.º, n.ºs 1, alínea d) e 2, 124.º e 135.º do mesmo Código, sendo de todo improcedente a alegação do autor nesse sentido; 7.ª - Também não assiste razão ao autor na sua alegação de que ocorreu a violação do princípio ne bis in idem, e nem sequer essa questão foi tratada na impugnada deliberação do Plenário do CSMP de 3 de dezembro de 2013, porque o ora autor não a suscitou na reclamação que deduziu do acórdão da Secção Disciplinar; 8.ª - De qualquer modo, salienta-se que no Relatório Final elaborado pelo Senhor Inspetor, depois no acórdão da Secção Disciplinar do CSMP, e por último no acórdão do Plenário do CSMP, esteve sempre patente uma grande preocupação de não punir o autor por factos que já tivesse sido punido no âmbito do anterior processo disciplinar; 9.ª - Por isso, os factos apurados no processo disciplinar que antecedeu a punição confirmada pelo acórdão do Plenário do CSMP, foram rigorosamente aqueles que o autor praticou posteriormente, pelo que, não ocorreu o pretenso vício de violação do princípio ne bis in idem consagrado no artigo 29.º n.º 5 da CRP, gerador de nulidade, nem ocorreram os pretensos vícios de erro nos pressupostos e violação de lei, geradores de anulabilidade, por pretensa punição do autor pela prática de factos já anteriormente punidos; 10.ª - O acórdão impugnado também não enferma de erro nos pressupostos e vícios de violação de lei, com consequente erro na qualificação jurídica dos factos, pois o autor não tem razão quando questiona o facto de se ter considerado que praticou 8 infrações dolosas, nem quando questiona o facto de se ter considerado que praticou 24 infrações com negligência grosseira; 11.ª - Os factos relativos ao dolo que fundamentam a decisão punitiva são justamente os mesmos que já constavam do Relatório Final do processo disciplinar e o autor nem sequer os questionou na reclamação do acórdão da Secção Disciplinar que deduziu para o Plenário do CSMP, e que foi apreciada e indeferida pelo impugnado acórdão do Plenário do CSMP de 3 de dezembro de 2013; 12.ª - O autor tinha perfeito conhecimento dos prazos de prescrição procedimento criminal nos inquéritos de que era titular, bem como da obrigatoriedade para os magistrados do Ministério Público de comunicar superiormente todos os casos de prescrição do procedimento criminal que ocorressem; 13.ª - E justamente por isso, refugiou-se na falta de indícios quando era evidente a sua existência, ou deduziu acusação por crimes prescritos, quando o conhecimento da prescrição, enquanto matéria de exceção que obsta ao prosseguimento do procedimento criminal, precede logicamente a apreciação da existência ou não existência de indícios; 14.ª - Assim, da conduta do autor, apreciada à luz das regras da experiência comum, resulta com toda a segurança que agiu com o propósito de ocultar as prescrições do procedimento criminal, portanto, agiu com dolo; 15.ª - Com efeito, conforme se considerou no douto acórdão desse Supremo Tribunal Administrativo de 10.01.2011, processo n.º 1214/09, num caso idêntico de prescrição do procedimento criminal, que «é de considerar dolosa a conduta do magistrado que teve presente a existência de um sério risco de as suas condutas omissivas terem consequências negativas para a imagem do Ministério Público e anteviu a possibilidade de produção de danos patrimoniais e morais irreparáveis para os ofendidos e vítimas dos crimes que pudessem prescrever, para além do eventual prejuízo para o Estado derivado de pedidos de indemnização, e, apesar disso, decidiu reiteradamente abster-se de atuar de forma a cumprir plenamente o dever profissional de despachar atempadamente os processos a seu cargo»; 16.ª - Os factos provados no processo disciplinar traduzem-se em atrasos de meses e anos em elevado número de processos, muitos referentes a situações de crimes graves, reiterados no tempo, pelo que o autor conhecia perfeitamente o significado dos seus atos e previa as respetivas consequências, designadamente a prescrição do procedimento criminal ocorrida nos vários processos; 17.ª - Por isso, não ocorreu o pretenso vício de violação de lei e de erro nos pressupostos, nem no acórdão da Secção Disciplinar, e muito menos no acórdão do Plenário do CSMP, que nem sequer se pronunciou sobre essa matéria, por não lhe ter sido submetida na reclamação do autor que apreciou e decidiu; 18.ª - Relativamente à punição do autor pela prática de 13 infrações a título de negligência grosseira, também não pode merecer acolhimento a pretensão do autor de serem qualificadas essas infrações em concurso aparente, como uma única infração continuada; 19.ª - Pois no caso dos autos nem ocorreu a mesma solicitação exterior, nem a culpa do autor alguma vez pode considerar-se diminuída, antes se devendo considerar agravada pelo acumular das infrações, pelo que estamos perante um caso nítido de pluralidade de infrações, numa relação de concurso real; 20.ª - Portanto, não se verificaram os pretensos vícios de erro nos pressupostos e violações de lei que o autor atribui à decisão punitiva, donde resulta intocável a punição do autor pelas indicadas infrações a título de dolo e de negligência grosseira, que justificam e tornam, absolutamente necessária a pena disciplinar que lhe foi aplicada; 21.ª - E por isso, não ocorreu qualquer violação do princípio da culpa e da proporcionalidade, que o mesmo é dizer que não ocorreu qualquer violação dos artigos 1.º e 266.º CRP e 5.º n.º 2 do CPA; 22.ª - Também não ocorreu qualquer erro de interpretação e aplicação das normas de que resulte violação do princípio da culpa e da proporcionalidade, e a pena disciplinar aplicada ao autor é ajustada, e necessária e proporcional à gravidade e consequências da sua conduta violadora dos...

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