Acórdão nº 01101/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelANA PAULA LOBO
Data da Resolução15 de Junho de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

RECURSO JURISDICIONALDECISÃO RECORRIDA – Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra . 06 de Maio de 2015.

Julgou a impugnação: a) parcialmente improcedente, por parcialmente não provada, na parte relativa ao proveito omitido em 2009, no valor de 650,00€, mantendo a liquidação de IRC do mesmo ano, nesta parte; b) parcialmente procedente, por parcialmente provada, anulando as liquidações de IRC dos anos de 2009 (na parte restante) e 2010 e respetivos juros compensatórios.

Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: O Representante da Fazenda Pública, no processo de impugnação n.º 535/14.8BECBR em que foi proferida sentença que julgou procedente a impugnação em referência, na parte que diz respeito às correcções à matéria tributável em sede de IRC relativas ao exercício de 2010 – por métodos directos no montante de € 2.870,00 e métodos indirectos no montante de € 45.000,00 – da qual resultou a matéria tributável corrigida para o ano de 2010 de € 68.779,37, veio dela interpôr o presente recurso, tendo, para esse efeito formulado, a final da sua alegação, as seguintes conclusões: 1 – A douta sentença julgou procedente a impugnação em referência, na parte que diz respeito às correcções à matéria tributável relativas ao exercício de 2010, estando em causa a questão da eventual ilegalidade do procedimento inspectivo, por incumprimento do despacho que determinou o alargamento do âmbito da ação inspectiva e que foi comprovadamente conhecido pela impugnante.

2 - A douta sentença recorrida entendeu que, no caso sub judice “… as correções introduzidas à matéria coletável declarada para o ano de 2010 estão inquinadas pela incompetência dos inspetores tributários ou por preterição de formalidade legal essencial, devendo ser anulada a correspondente liquidação de IRC, conforme peticionado, restando prejudicado o conhecimento dos demais vícios que lhe vêm imputados.”.

3 - Com base na interpretação efectuada pela Mmª Juíza do Tribunal a “quo” dos efeitos da aplicação do art. 47° do RCPIT o qual sob a epígrafe "Consequências da falta de credenciação" estatui que «É legítima a oposição aos atos de inspeção com fundamento na falta de credenciação dos funcionários incumbidos da sua realização».

4 - De cuja leitura extrai que a oposição aos actos de inspecção, entendido como verdadeiro direito de resistência, não deve ser considerada “a única consequência legal da falta de credenciação”, mas também que esta falta consubstancia uma “incompetência dos inspetores tributários ou, no mínimo, a preterição de formalidade legal essencial que, nos termos do Art. 99.° do CPPT, constitui vício invalidante dos atos tributários em geral e fundamento de impugnação.” 5 - Porém, salvo o devido respeito, não pode a Fazenda Pública concordar com tal interpretação e aplicação do citado normativo legal.

6 – Como se constata dos autos, foi dado cumprimento ao estipulado nos artigos 14º e 15º do RCPIT, não ocorrendo, portanto qualquer vício que possa inquinar o procedimento de inspecção de âmbito geral e parcial que visou a impugnante relativamente aos anos de 2009 e 2010, respectivamente.

7 - A formalidade de prolação de despacho fundamentado a alargar o âmbito da inspecção neste procedimento e a sua notificação ao contribuinte tem em vista, além do mais, que este fique ciente do âmbito desse acto e possa cooperar com a inspecção como a lei dispõe nos termos dos seus art.ºs 9.º e 48.º e segs do RCPIT, em ordem a apurar a sua situação tributária real, nos termos do art.º 63.º da LGT.

8 – A alegada falta do despacho (que não ocorre), ainda assim, não influiria no resultado final da inspecção, nem, verdade seja dita, em qualquer momento do procedimento ou na impugnação, tal é invocado.

9 - À impugnante foi pedida toda a colaboração para o apuramento da verdade, não tendo, apesar de notificada para tal, exercido o seu direito de audição relativamente ao apurado no projecto de relatório da inspecção.

10 - No entanto na decisão de que se recorre é levantada a questão da eventual falta de credenciação dos inspectores tributários e dos seus efeitos nos actos por estes praticados.

11 - Desde logo a abordagem feita à norma do artº 47º do RCPIT parte do princípio de que o legislador teria dito menos do que pretendia. O que fica por comprovar já que não se encontra, nem é invocada, uma correspondência verbal mínima que permita esta interpretação extensiva, com o sentido de que se manteria, ad aeternum, a preterição de formalidade essencial invalidante dos actos praticados.

12 - Sendo certo que ao intérprete se exige a integração sistemática da norma interpretada, tendo em conta a unidade do sistema jurídico, não é menos verdade que o Supremo Tribunal Administrativo tem vindo, de forma constante, a considerar que as formalidades procedimentais previstas em lei sendo, em princípio, essenciais, se degradam em meras irregularidades, nos casos em que, apesar da sua deficiência, foi atingido o fim que a lei pretendia.

13 - A impugnante prestou a sua colaboração com a fiscalização nesse âmbito alargado sem jamais haver colocado em causa a falta de tal despacho ou a sua extensão alargada. Não tendo, em qualquer fase do procedimento, colocado em causa os actos dos inspectores tributários. Nem em sede de impugnação, pois nesta só se refere à ilegalidade (reitera-se, não existente!) resultante da alegada inexistência de despacho e da sua notificação prévia, só daqui resultando a alegada falta de credenciação.

14 - Em todo o caso, o que se discute e pretende ver decidido são os efeitos de uma eventual falta de credenciação.

15 - O artº 47.º do RCPIT, já citado, estatui que a falta de credenciação de funcionários para a prática de actos de inspecção tributária tem como consequências a legitimação da oposição do visado aos actos que se pretendem praticar.

16 - Entende a Mmª Juiz que a norma deve ter uma interpretação extensiva, no sentido de que não deve ser considerada “a única consequência legal da falta de credenciação”, mas também que esta falta consubstancia uma “incompetência dos inspetores tributários ou, no mínimo, a preterição de formalidade legal essencial que, nos termos do Art. 99.° do CPPT, constitui vício invalidante dos atos tributários em geral e fundamento de impugnação.” 17 - Com todo o respeito que merece este entendimento, não o acompanhamos, pelo contrário. Entendemos que quando o legislador optou por esta redacção da norma e no prudente balanço que se lhe impõe entre os direitos e deveres que impendem sobre a actuação de Administração e Administrados, pretendeu suficiente a oposição dos visados à prática dos actos, sem o que a actuação da Administração ficaria validada, degradando-se em formalidade não essencial qualquer vício formal da credenciação.

18 – Vai neste sentido a decisão tomada em 10.07.2012, no processo 33/2012-T, do CAAD, disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/, no qual foi árbitro presidente e relator o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa e que se debruça especificamente sobre a regularidade do procedimento de inspecção e de que antes se cita a parte relevante.

19 - Destarte, é entendimento da Fazenda Pública que a douta sentença na parte recorrida não poderá manter-se, sendo imperioso que se conclua pela improcedência parcial da impugnação judicial, por não estar a liquidação ora em apreço ferida de ilegalidade, sendo que esta por ser legal, deverá manter-se na ordem jurídica.

Pelo exposto e com mui douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada a sentença recorrida como é de inteira JUSTIÇA O Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido do provimento do recurso.

A Sentença recorrida considerou provados os seguintes factos: A. No dia 23.05.2012 foi emitida a ordem de serviço n.º OI201200716, nos termos da qual foi determinada a realização de procedimento de inspeção externa à impugnante, de âmbito parcial em sede de IRC, relativamente ao exercício de 2009 – fls. 1 do p.a.

B. A Ordem de Serviço referida na alínea antecedente foi assinada pelo TOC da impugnante no dia 06.06.2012, como se constata a fls. 1 do p.a.

C. No dia 11.09.2012, o mesmo TOC assinou o documento de fls. 2 do p.a..

D. No documento referido na alínea antecedente dava-se a conhecer que a Ordem de Serviço n.º OI201200716, notificada em 06.06.2012 era alterada, «com os seguintes fundamentos: De acordo com a análise efectuada, constatou-se que houve necessidade de alargar o âmbito da acção para a recolha de elementos de terceiros», ali também se fazendo constar que o procedimento inspetivo incidia sobre os exercícios de 2009 e 2010 sendo de âmbito geral, quanto ao primeiro, e parcial, quanto ao segundo.

E. No âmbito da ação inspetiva acima mencionada foi elaborado o relatório final de fls. 21 a 32 do p.a., do qual se destaca o seguinte: «(…) 4 - Descrição sucinta das conclusões da acção de inspecção Na análise efectuada aos períodos de 2009 e 2010 dado os factos descritos no ponto III e IV, a contabilidade não permite comprovar e quantificar directa e exactamente a matéria tributável de imposto sobre o rendimento, pelo que se propõe a sua determinação por métodos indirectos, nos termos dos art.s 57° do CIRC, com os cálculos apresentados no ponto V do presente relatório.

Propõe-se assim a correcção de €52.372,50 (7.372,50+45.000,00) e de €47.870,00 (2.870,00+45.000,00) à matéria colectável declarada, tendo em conta as correcções meramente aritméticas propostas no ponto III e as indiretas proposta no ponto IV, respetivamente em 2009 e 2010, passando assim o lucro tributável: (…) É ainda proposta a correcção de 10.485,04 euros às tributações autónomas de IRC no ano de 2009, conforme descrição no ponto III.2 do relatório.

II - Objectivos, âmbito e extensão da acção de inspecção 1 - Credencial e período em que decorreu a acção Em cumprimento da ordem de serviço número 01201200716 de 23/05/2012, para o ano de 2009, efectuou-se um procedimento...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT