Acórdão nº 01473/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelCASIMIRO GON
Data da Resolução20 de Janeiro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na formação preliminar (a que se refere o nº 1 do art. 150º do CPTA) da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1.

A…………, advogado em causa própria e com os demais sinais dos autos, vem interpor recurso de revista excepcional, nos termos do artigo 150º do CPTA, do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte em 14/7/2015, no processo que aí correu termos sob o n.º 1226/14.5BEPRT.

1.2.

Termina as alegações formulando as conclusões seguintes: 1º - É jurisprudência pacífica do STJ e STA, decorrente da leitura do art. 6º n° 3 do C.S.C., que a lei não define o que é “justificado interesse próprio” conforme jurisprudência citada e opinião doutrinária; 2º - É o órgão da administração da Sociedade que manifesta a sua vontade interna e externa que melhor define o interesse próprio da Sociedade; 3º - O meio legal de expressão e manifestação da vontade Societária através da sua A.G. é a acta da A.G., onde se corporizam as actuações internas e com efeitos externos.

  1. - As actas provam sem margem para equívocos que existiu real manifestação de interesse na prestação da garantia pela Sociedade B………… Lda. ao seu gerente com plenos poderes através da relação de domínio da Sociedade C………… Lda. detida maioritariamente pelo recorrente.

  2. - O recorrente não pode ser considerado outrem para efeitos dessa relação de benefício através de garantia prestada por ser órgão de ambas as Sociedades.

  3. - E não se pode esquecer que sobre os valores que a Administração Fiscal pretende ver garantidos, não correspondem, de forma alguma à dívida dos sujeito passivo, antes constituem a base para a tributação, no caso de as acções de impugnação não virem a ser declaradas procedentes, o que, convictamente se espera não aconteça.

  4. - Decorre do exposto que o sujeito passivo - recorrente -, está a ser vítima de um erro em que anda a Administração Fiscal, como aliás, já foi decidido na Impugnação quanto ao IVA.

Termina pedindo que o acórdão recorrido seja revogado e modificada a interpretação normativa do artigo 6º do C.S.C., que se propõe nos seguintes termos: «Integra a ressalva do segundo segmento do artigo 6º do C.S.C. a prestação da garantia hipotecária voluntária, a favor do seu gerente por dívida deste quando esta Sociedade é detida por outra Sociedade, na qual o gerente devedor é o sócio-gerente maioritário e que obteve deliberação concordante nas A.G. de ambas as Sociedades, autorizando a prestação das garantias.» 1.3.

Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4.

O Ministério Público emite Parecer, nos termos seguintes: «1. O presente recurso de revista vem interposto do douto acórdão do TCA Norte de 14/07/2015, de fls. 475 e segs., ao abrigo do disposto no artigo 152º do CPTA e 279º, n° 1, alínea b) e nº 2, do CPTA - cfr. requerimento de fls. 523.

Nos termos do art. 150º, nº 1, do CPTA, das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo, "quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental" ou "quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito".

A jurisprudência do STA, interpretando o comando legal, tem reiteradamente sublinhado a excepcionalidade deste recurso, referindo que o mesmo só pode ser admitido nos estritos limites fixados neste preceito. E como a mesma jurisprudência tem realçado, trata-se não de um recurso ordinário de revista, mas antes, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei n.ºs 92/VIII e 93/VIII, de uma «válvula de segurança do sistema» que apenas deve ser accionada naqueles precisos termos.

Ora, no caso concreto dos autos afigura-se-nos que esses requisitos não mostram reunidos.

Desde logo importa referir que o Recorrente não cumpriu o ónus de especificar qualquer fundamento pertinente que possa ser subsumível a qualquer dos requisitos definidos pela lei. Com efeito, o Recorrente limitou-se a identificar a questão jurídica e classificá-la como de "primordial importância" e "de manifesto interesse para a fixação de jurisprudência".

Conforme se alcança do acórdão recorrido, o TCA Norte confirmou a sentença de 1ª instância considerando, para além do mais, que «o Recorrente não fez prova do "justificado interesse próprio" da sociedade garante na prestação de garantia, pelo que a recusa de aceitação em garantia das hipotecas dos prédios propriedade da sociedade... por este fundamento não enferma de ilegalidade, nem a sentença que no mesmo sentido o entendeu incorreu no erro de julgamento que lhe vem assacado».

O conceito de "justificado interesse próprio" previsto no nº 3 do artigo 6º do Código das Sociedades Comerciais é um conceito indeterminado, que necessita de densificação, mas tal facto não é só por si suficiente para justificar a intervenção do STA, como órgão de cúpula da jurisdição administrativa e tributária.

Por outro lado o Recorrente limita-se a contestar a interpretação que as instâncias fizeram do citado normativo, não lhe assacando qualquer erro grosseiro nessa interpretação. E não resulta demonstrado que essa interpretação seja objecto de divergência nas instâncias que importe clarificar e uniformizar.

Afigura-se-nos, assim, que o recurso não deve ser admitido.» 1.5.

Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS 2.

No acórdão recorrido acolheram-se os factos provados constantes do Probatório da sentença, nos termos seguintes:

  1. Em 11/02/2010, foi instaurado contra o Reclamante, no Serviço de Finanças de Vila do Conde, o processo de execução fiscal n° 19011201001005952, por dívidas de I.R.S.

    do ano de 2006 e juros, ascendendo a quantia exequenda ao montante de € 449.872,82. – Fls. 5 e 6.

  2. Foi constituída hipoteca legal sobre os prédios urbanos da freguesia de ……, artigos n.ºs 5206 e 6292, propriedade do Reclamante, para garantia da dívida em cobrança no referido P.E.F., determinada por despacho de 23/02/2010 da Chefe do Serviço de Finanças de Vila do Conde. – Fls. 11 a 39.

  3. Em 15/03/2010, o Reclamante apresentou requerimento no Serviço de Finanças a solicitar a fixação do valor da garantia. – Fls. 40.

  4. O Serviço de Finanças fixou o valor da garantia a prestar em € 582.165,31. – Fls. 42 a 45.

  5. Para efeitos de garantia do referido P.E.F., o Reclamante apresentou as seguintes hipotecas voluntárias constituídas pela sociedade “C………… Lda.”: - em 08/07/2010 sobre os prédios urbanos inscritos sob os artigos n.ºs 1567 e 1568, da freguesia de ………; - em 03/02/2011 sobre o prédio rústico sito no lugar de ………, freguesia de ……… inscrito sob o artigo n.º 80 e sobre o prédio urbano sito na Rua ………, freguesia de ……… inscrito sob o artigo n.º 4431; - em 02/05/2012 sobre o prédio rústico sito na freguesia de ……… inscrito sob o artigo n.º 345 e sobre o prédio rústico sito em ………, freguesia de ………, concelho de Silves, inscrito sob o artigo n.º 74. – Fls. 5 a 65, 95 a 101, 140 a 145.

  6. A A.T. procedeu à avaliação dos prédios referidos nas alíneas anteriores, tendo concluído, sucessivamente, que o valor já prestado era insuficiente, notificando, sucessivamente, o Reclamante para efectuar reforços da garantia. – Fls. 66 a 87 verso, 102 a 110 verso, 128 a 130, 147 a 152, 185 a 190.

  7. Em 12/07/2012, o Reclamante apresentou neste T.A.F. Impugnação judicial das liquidações de I.R.S. de 2005 e de 2006, processo que corre termos sob o n.º 1844/12.6BEPRT. – Fls. 155 a 183 e facto de conhecimento oficioso deste T.A.F. (consulta ao S.I.T.A.F.).

  8. Em 07/01/2013, foi constituída hipoteca voluntária pela sociedade “B…………, Lda.”, sobre os seguintes prédios inscritos na matriz predial urbana da freguesia de ………: artigos n.º 2076, 2078,2079 e 2080. – Fls. 203 a 210.

  9. Em 04/03/2013, o Reclamante apresentou requerimento dirigido ao Serviço de Finanças com o seguinte teor: A…………, NIF ………, residente na E. N. ……, n° ……, da freguesia de ………, do concelho de Vila do Conde, notificado no âmbito do processo de execução em referência, vem informar o seguinte: Conforme o solicitado o Requerente em seu nome e da firma C………., pediu ao Banco Espírito Santo, com quem, praticamente trabalha em exclusividade, a caução ou seguro-caução para servir de garantia com vista à suspensão das execuções pendentes relativamente às liquidações de IVA e IRS dos anos de 2005 e 2006.

    A resposta a esse pedido acaba de receber, e que junta, mas a resposta não só é negativa como o seu custo seria insuportável.

    Além disso, o Requerente requereu a avaliação do prédio inscrito na matriz sob o artigo P1092, da freguesia de ………, e o valor atribuído é de 383.190,00 euros (trezentos e oitenta e três mil, cento e noventa euros), como se vê da cópia extraída dos Serviços de Finanças.

    Além disso, por cautela e por sugestão do Serviço de Finanças de Vila do Conde, prevendo que as reclamações apresentadas relativamente aos valores a considerar pelo Serviço de Finanças não poderiam surtir efeito, o Requerente constituiu nova hipoteca sobre os prédios quer da C……… LDA., quer da B………, LDA., ambas outorgadas e justificada a autorização nos termos do artigo 6º n° 3 do Código das Sociedades Comerciais, autorização extensiva a todas as hipotecas já constituídas a favor da Direcção de Finanças, como se pode verificar das escrituras e certidões de Registo Predial e, também, das actas de justificação a que alude o citado artigo 6º n° 3 do Código das Sociedades Comerciais.

    Assim, entende o Requerente que não podendo constituir a caução ou seguro-caução pelas razões expostas, os valores absurdos, e no seu entender irreais, que constam das execuções, estão garantidos com milhões de euros.

    E a esses valores absurdos só ainda pendentes porque, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto não tem dado resposta às impugnações, acarretando um esforço económico brutal, mas indevido e injusto como se vai revelar, sem esquecer o stress...

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