Acórdão nº 0793/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelASCENS
Data da Resolução13 de Janeiro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – RELATÓRIO A………….., SGPS, SA, contribuinte n.° ……….., com demais sinais nos autos, vem deduziu impugnação judicial do indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada junto da Administração Fiscal, relativa aos actos de fixação da matéria tributável, relativos ao exercício de 2002.

Por sentença de 5 de Abril de 2011, o Tribunal Tributário de Lisboa, julgou a impugnação parcialmente procedente e, em consequência, condenou a Fazenda Pública na anulação do acto impugnado, na parte relativa à correcção respeitante a donativos à Fundação Portugal África, absolvendo, no mais, a Fazenda Pública do pedido.

Reagiu a ora recorrente A………………, SGPS, SA, interpondo o presente recurso cujas alegações integram as seguintes conclusões:

  1. A sentença recorrida julgou parcialmente improcedente a impugnação judicial apresentada pela ora RECORRENTE, mantendo na ordem jurídica os actos de fixação da matéria tributável praticados, respectivamente, em 5 de Setembro de 2006 e em 6 de Dezembro de 2006, pelo Senhor Director de Serviços de Inspecção Tributária, e pelo Senhor Chefe de Divisão da mesma Direcção de Serviços, nos valores de € 14.985.469,67 e de € 1.359.677,30, e que traduzem as diversas correcções efectuadas pela Administração tributária ao resultado fiscal declarado pelo GRUPO A…………… com referência ao IRC do exercício de 2002.

  2. A Administração tributária acresceu ao resultado líquido do GRUPO A…………, os montantes de € 61.472,40 - referente à suposta subavaliação de proveitos decorrente da inexistência de remuneração pela emissão, por parte da RECORRENTE, de cartas de conforto em benefício das sociedades participadas B…………., SA e C……….., S.A.R.L., - e, bem assim, o valor de €1.221.865,59 - relativo à inexistência de remuneração pela prestação de garantia pessoal atípica, alegadamente prestada pela RECORRENTE nos contratos de mútuo celebrados pela participada A………….. FINANCIAL OPERATIONS BV.

  3. Em qualquer dos casos, a Administração tributária concluiu que a inexistência de remuneração pelas obrigações assumidas pela RECORRENTE violava o princípio de Plena Concorrência previsto no artigo 58.° do CIRC, devendo, por isso, ser acrescido, como proveito desta, o valor correspondente a tal remuneração, fixada de acordo com o método do preço comparável de mercado. Para esse efeito, a Administração considerou como comparável o valor suportado pela RECORRENTE com as garantias bancárias que solicitou a instituições financeiras para suspensão de diversos processos de execução fiscal em que é executada.

  4. Todavia, nas situações acima indicadas, a posição assumida pela RECORRENTE, constitui prática incluída na actividade própria dos accionistas (cf. previsto no § 7.9 do Relatório da “OCDE - Princípios aplicáveis em matéria de Preços de Transferência destinados às Empresas Multinacionais e às Administrações Fiscais”), uma vez que, quer a subscrição de tais documentos, quer a assumpção da responsabilidade solidária num contrato de mútuo cuja beneficiária é uma sociedade participada, foram realizadas para prosseguir vantagens para ambas as sociedades, visando o desenvolvimento da actividade da empresa participada e, simultaneamente, a rendibilidade do investimento financeiro da empresa participante.

  5. A exigência de remuneração nestas situações apenas iria originar um desequilíbrio entre os benefícios obtidos por ambas as sociedades com tal actividade e potenciar, para além do mais, o desenvolvimento destas práticas por razões meramente fiscais, permitindo, precisamente, a transferência de resultados entre sociedades.

  6. Acresce que as obrigações de garantia assumidas pela ora RECORRENTE, na qualidade de sociedade dominante - com sede em território português - de um grupo de sociedades sujeito ao Regime especial de tributação dos grupos de sociedades, traduzem a mera reprodução do regime legal já aplicável nas situações em apreço. Com efeito, é à lei pessoal de determinada sociedade que se deve recorrer para determinar o regime jurídico que lhe é aplicável, pelo que, é evidente que a RECORRENTE se encontra sujeita ao regime de responsabilidade solidária previsto no artigo 501.° do Código das Sociedades Comerciais, independentemente da localização geográfica das sociedades dominadas.

  7. Ao considerar que o disposto no artigo 501.° do Código das Sociedades Comerciais não seria aplicável nas situações em apreço, por as sociedades participadas não terem sede em território nacional, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento. Aliás, tal entendimento, (pelo menos relativamente à responsabilidade por dívidas das participadas B………….., SA, com sede em Espanha, e A……………. FINANCIAL OPERATIONS BV, com sede na Holanda) implicaria o reconhecimento de uma discriminação injustificada de credores residentes noutro Estado-Membro, cujos créditos não estariam, assim, garantidos pelo património da sociedade accionista em virtude da mera localização, em Estado-Membro distinto, da sociedade participada, contrariando, assim, os princípios da não discriminação e da liberdade de estabelecimento revisto no artigo 49.° do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia) e sendo, por consequência, inconstitucional, por violação do artigo 8.° da Constituição da República Portuguesa.

  8. As correcções acima indicadas são, ainda, ilegais por ter sido indevidamente utilizado como “comparável” a remuneração decorrente da emissão de uma garantia bancária. Com efeito, contrariamente ao que foi entendido pelo Tribunal a quo, a remuneração pela prestação de uma garantia bancária não é a adequada para fixar a remuneração pela emissão de cartas de conforto, nem pela assumpção da posição de garante no contrato de mútuo, uma vez que uma empresa independente só estaria disposta a retribuir a emissão deste tipo de declarações por parte da RECORRENTE se o credor depositasse, num caso e noutro, a mesma confiança em termos de cobrança dos seus créditos — o que não sucede.

  9. A natureza de garantias acessórias e causais reconhecida às cartas de conforto — assemelhando-se, portanto, a uma fiança - não investe quem as emite na obrigação de responder imediatamente pela dívida garantida sem o benefício de excussão prévia. Por outro lado, quer no caso das cartas de conforto, quer no caso da responsabilidade assumida no contrato de mútuo em apreço, a RECORRENTE mantém o direito de negar o pagamento com fundamento na inexistência, nulidade ou prescrição da dívida, não implicando, consequentemente, em qualquer dos casos, a assumpção — com a respectiva remuneração — dos riscos assumidos por entidade emitente de uma garantia bancária.

  10. Acresce que a RECORRENTE, na qualidade de sociedade gestora de participações sociais, encontrar-se-ia legalmente impossibilitada, por não revestir a natureza de instituição financeira, de emitir qualquer garantia bancária — nos termos da alínea b) do n.° 1 do artigo 4.° e artigo 8.° do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei nº 298/92, de 31 de Dezembro -, o que é suficiente para infirmar a invocada comparabilidade.

  11. A Administração tributária acresceu também ao resultado do GRUPO A……….. o valor de € 7.925.702,07, por entender que para efeitos do cálculo das mais e menos-valias apuradas no exercício de 2002 - pela RECORRENTE e pela participada A………. INTERNACIONAL, SA - no âmbito da transmissão das participações na D……………. foi indevidamente utilizado o coeficiente de desvalorização da moeda referente ao ano de 1997, ao invés do relativo ao ano de 1998.

  12. Tais participações tinham sido adquiridas na sequência de uma operação de fusão por incorporação, realizada no exercício de 1998, de sociedades anteriormente detidas RECORRENTE e pela participada A……… INTERNACIONAL, SA, tendo o GRUPO A…………. considerado que era aplicável a esta operação o regime estabelecido nos artigos 62.° e seguintes do CIRC (na redacção à data em vigor), o que, no entender da Administração tributária, não era possível, em virtude de as sociedades participantes na mesma operação não terem sede em território nacional.

  13. Sucede que a desconsideração dos coeficientes de desvalorização monetária aplicados, com fundamento na não sujeição da operação de fusão por incorporação ao regime estabelecido nos artigos 62.° e seguintes do CIRC, não foi acompanhada da correcção do valor de aquisição da participação no capital da D……………. S.A. Ora, se a Administração tributária entendeu que o regime de neutralidade fiscal não era aplicável à operação de fusão por incorporação vertente, deveria ter também extraído as restantes implicações daí resultantes, procedendo, em conformidade, à correcção - prévia - do custo de aquisição das participações alienadas de acordo com o valor de mercado das participações anuladas à data da fusão por incorporação.

  14. Não tendo sido esse o procedimento, a correcção em apreço é ilegal, por não ter sido acompanhada das operações necessárias à correcta correcção do lucro tributável do GRUPO A…………. com fundamento no citado artigo 62.° do CIRC, obrigação a que a Administração tributária se encontrava subordinada por força dos princípios da legalidade, da verdade material e da proporcionalidade (cf. artigo 55.° da LGT, 5.° e 6.° e 7.° do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária).

  15. Todavia, a sentença recorrida manteve a correcção contestada, invocando, para o efeito, que à data da fusão, o valor de realização desta correspondia ao valor por que os elementos tinham sido inscritos na contabilidade, uma vez que o regime legal em vigor à data a tal impunha.

  16. No entanto, a actual redacção do artigo 46.°, n.° 3, alínea d), do CIRC, segundo a qual “d) Nos casos de fusão ou cisão, o valor de mercado dos elementos do activo imobilizado transmitidos em consequência daqueles actos”, resultou de uma alteração aparentemente qualificada de mero “aperfeiçoamento técnico”, como se extrai do preâmbulo do...

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