Acórdão nº 01403/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Janeiro de 2016
Magistrado Responsável | MARIA BENEDITA URBANO |
Data da Resolução | 14 de Janeiro de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1. A……………..
, S.A., devidamente identificada nos autos, intentou no TAF de Sintra, contra o Município de Sintra, “acção administrativa comum para efectivação da responsabilidade civil das pessoas colectivas, sob a forma ordinária”, pedindo a condenação daquele município ao pagamento de uma indemnização de € 220.905, 04, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação e até efectivo e integral pagamento.
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A Recorrente apresentou alegações, concluindo, no essencial, do seguinte modo: “1ª Com o presente recurso de revista pretende a Recorrente obter uma melhor aplicação do direito, bem como obter pronúncia sobre uma questão de elevada relevância jurídica, cuja complexidade é elevadíssima e não foi até agora exaustivamente tratada seja pela jurisprudência, seja pela doutrina.
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A questão em causa nunca foi apreciada pelo STA e a nível de segunda instância existem apenas dois acórdãos contraditórios (o ora recorrido e um outro do TCA-N de finais de 2011) pelo que a criação de uma posição jurisprudencial mais estável sobre esta temática fundamenta o recurso em causa.
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A questão levada a juízo pelo Recorrente prende-se com o alcance da indemnização a arbitrar em caso de adjudicação ilegal no âmbito de um concurso de empreitada de obras públicas.
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A Recorrente considera que o acórdão recorrido violou normas de natureza substantiva.
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O presente recurso preenche os requisitos previstos no nº 1 e no nº 2 do artigo 150º do CPTA, pelo que se encontra em condições de ser recebido na apreciação liminar sumária prevista no nº 5 do mesmo normativo.
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O acórdão recorrido incorreu numa nulidade na medida em que não se pronunciou sobre uma alteração à matéria de facto peticionada pela Recorrente, nulidade esta que pode ser suprida pelo STA dado se tratar de factos incontroversos e não contestados.
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A questão a decidir nos presentes autos não é igual, do ponto de vista factual, à do Acórdão do Pleno do STA, e que o acórdão recorrido invoca no sentido da defesa da tese jurídica que aplicou. 8ª O acórdão recorrido decidiu não arbitrar uma indemnização relativa aos lucros cessantes ou interesse contratual positivo alegando tratar-se aqui de um caso de responsabilidade civil pré-contratual, em que a indemnização se cinge ao interesse contratual negativo.
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A situação dos autos reporta-se a uma adjudicação que veio a ser considerada ilegal por decisão judicial, e da qual resulta que o adjudicatário deveria ter sido excluído e, como a Recorrente ficou posicionada em segundo lugar, o concurso seria por si vencido.
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À data da prática do facto ilícito, consubstanciado na deliberação de adjudicação, vigorava o D.L. nº 48051, de 21.11.1967, que exige para o funcionamento da responsabilidade civil extracontratual do Estado a verificação dos requisitos comummente exigidos: facto ilícito, culpa, dano e nexo de causalidade (sem prejuízo da jurisprudência ter considerado que quanto ao dolo/culpa não era necessária a sua prova ao lesado, em face de norma comunitária nesse sentido).
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A Recorrente entende que estes quatro requisitos se mostram provados: o facto ilícito e a culpa resultam da decisão judicial pela qual se anulou a adjudicação; o dano resulta provado nos autos; o nexo de causalidade também ficou provado.
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É quanto à extensão do dano que a Recorrente se insurge, porquanto considera que não se tratar aqui de um caso de responsabilidade pré-contratual e, por conseguinte, não haver lugar à ponderação do interesse contratual positivo e negativo, mas antes ao dano emergente e ao lucro cessante.
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O dano emergente são os custos sofridos pela Recorrente com a sua apresentação a concurso e o lucro cessante o benefício que deixou de obter em face de um acto ilegal que violou lei expressa.
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Ao não atribuir este dano à Recorrente, violou o acórdão recorrido o disposto no artigo 483º do CCiv e o disposto nos artigos 2.º, 4.º e 6.º do D.L. n.º 48051, de 21.11.1967.
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Sem prescindir quanto ao alegado anteriormente, considera a Recorrente que o caso subjudice não pode ser decidido com base no diploma legal em causa, porquanto desde 14.10.2004 que, por acórdão do TJCE, se considerou que o mesmo violava as directivas comunitárias vigentes sobre a matéria e por isso não podia ser mais aplicável.
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A consequência da prolação do acórdão em causa é a aplicação directa das Directivas que disciplinam esta matéria, por força do primado do Direito Comunitário sob as normas nacionais, tudo isto no seguimento do acórdão do TJCE SIMMENTHAL de 09.03.1978.
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Em termos de direito comunitário, a obrigatoriedade de atribuição de indemnizações aos lesados por adjudicações ilegais em matéria de contratação pública resulta do artigo 2°/c) da Directiva 89/665/CEE, de 21.12.1989, que estabelece o seguinte: “Conceder indemnizações às pessoas lesadas por uma violação”.
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A doutrina e a jurisprudência comunitária classificam a indemnização a conceder nestes casos como sendo um meio de tutela jurisdicional alternativo à correcção da ilegalidade e que assume um carácter dissuasor e sancionador de práticas ilegais.
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Esta ideia – que contraria a nossa teoria da responsabilidade civil extracontratual – implica que o julgador nacional tem de abandonar o instituto da responsabilidade civil e adoptar o conceito comunitário, como de resto resulta do primado deste direito, conforme previsão do artigo 8º/nº 3 da CRP.
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Tendo presente que a proposta do Recorrente ficou classificada em segundo lugar e que o adjudicatário deveria ter sido excluído, por via do direito comunitário, designadamente o já citado artigo 2°/c) da Directiva citada, a Recorrente tem igualmente direito a uma indemnização que cubra os lucros que deixou de obter e que resultam provados no artigo 32º da sentença.
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Em defesa da tese ora propugnada alega-se ainda que a nova lei de responsabilidade civil extracontratual do Estado/pessoas colectivas públicas previu em norma especial a responsabilidade civil em casos iguais ao que aqui se discute, remetendo para os pressupostos da lei comunitária, o que permite concluir que se afasta do regime da responsabilidade pré-contratual.
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Este diploma – por ser anterior aos factos - não pode ser aplicado, a menos que seja considerado lei interpretativa, o que se nos afigura possível já que este novo diploma pretendeu dar resposta a dúvidas crescentes da jurisprudência e a adequar-se à lei comunitária.
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Aplicando-se esta lei, e por força da remissão da mesma para a lei comunitária, e tendo presente o entendimento doutrinário e jurisprudencial, deverá arbitrar-se indemnização que cubra os lucros cessantes.
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Mesmo que se entenda não ser a nova lei aplicável, pode a mesma servir de auxílio na interpretação da lei comunitária, e até da lei anteriormente vigente – caso se considere ser a mesma aplicável, por mera cautela –, tendo a doutrina evoluído a sua posição no sentido de que provando o lesado que seria o adjudicatário e que o acto de adjudicação foi ilegal, tem direito a indemnização pelo interesse contratual positivo.
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Ao não decidir neste sentido, violou o acórdão recorrido o artigo 2°/c) da Directiva 89/665/CEE de 21.12.1989. 26ª O acórdão do TCA-NORTE a que se aludiu concede indemnização pelos lucros cessantes no caso do autor do processo judicial ter sido prejudicado pelo acto ilegal e provar que seria o adjudicatário, o que igualmente sucedeu com a Recorrente.
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Embora este acórdão defenda tratar-se de responsabilidade pré-contratual, associada a normas comunitárias, não deixa de verificar o preenchimento do nexo de causalidade, prejuízo e facto ilícito, como a Recorrente o fez, chegando a um resultado igual.
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Em acórdão do ano 2011, o STA concedeu indemnização a um concorrente em concurso público apenas pela chance de poder vir a ser adjudicatário, pelo que por maioria de razão terá de se fixar indemnização pelos lucros cessantes quando o concorrente prove que seria ele o adjudicatário caso o acto ilegal não tivesse sido praticado.
TERMOS EM QUE deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se o acórdão recorrido e proferindo-se outro que condene o Recorrido a pagar à Recorrente o montante global peticionado, assim se fazendo toda a JUSTIÇA”.
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O recorrido contra-alegou, e, quanto ao mérito da causa, concluiu, no essencial, assim: “
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Com a interposição do presente recurso de revista, a Recorrente pretende obter uma melhor aplicação do direito sobre a questão de determinação do dano ressarcível em caso baseado em ilegalidade do procedimento pré-contratual de concurso publico.
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Esta questão foi já amplamente discutida pelo S.T.A., que sempre tem admitido o ressarcimento do dano correspondente ao interesse contratual negativo (designadamente quanto às despesas de participação no concurso), excluindo a indemnização correspondente ao interesse contratual positivo, isto é, aos lucros cessantes do contrato. – V. Av. do S.T.A. de 23/09/2003; Ac. do S.T.A...
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