Acórdão nº 01531/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução03 de Fevereiro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 564/07.8BELRS 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada “A…………….., S.A.” (adiante Impugnante ou Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida contra o indeferimento do pedido de revisão da liquidação de sisa que lhe foi efectuada com referência à aquisição de dois prédios na sequência da caducidade da isenção prevista no art. 11.º, n.º 3, do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações (CIMSISD) por não ter destinado os prédios à revenda, como tinha declarado aquando da aquisição.

1.2 O recurso foi admitido, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações, que rematou com conclusões do seguinte teor (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.

): «1.º Considerando que: I) Conforme se deu como provado, no facto n.º 4 de fls. 149, foi atribuída utilidade turística prévia a um hotel edificado nos prédios a que se refere o facto n.º 1; II) Consta de fls. 17 o despacho prévio de utilidade turística, bem como no documento de fls. 116 a 199 o despacho de utilidade turística a título definitivo; III) A concessão de tal benefício fiscal implica, de modo automático, a isenção de SISA em face do disposto no artigo 20.º, n.º 1 do DL 423/83, sendo esta uma lei especial em face do então CIMSISD.

IV) O facto da recorrente ter inicialmente declarado que os prédios em causa se destinavam a revenda, não impede que, dentro do prazo de isenção, seja atribuída outra finalidade, à qual a lei prevê idêntico benefício de ISENÇÃO DE SISA, como é, no caso, do EBF, que prevalece sobre qualquer outra disposição em contrário.

  1. O benefício fiscal do tipo, cujo conceito legal, resulta do disposto no artigo 2.º do “EBF”, que considera que é a medida de carácter excepcional instituída para defesa de interesses públicos extrafiscais e que se consideram superiores aos da própria tributação que impedem, não pode por isso ser posto em causa com a norma do artigo 16.º, do Código de Sisa então em vigor.

    VI) O facto do artigo 16.º do CIMSISD prever o afastamento do regime de isenção, naquele caso em concreto, não pode ser interpretado de forma isolada e sem ter em conta a unidade do ordenamento jurídico antes tendo de ser conjugado de acordo com as regras da hermenêutica jurídica e enquadradas com outras normas, designadamente aquelas que o EBF (DL 423/84), prevêem para quem beneficia da utilidade turística prévia – como foi o caso, nos termos do disposto no art. 11.º da LGT e do artigo 9.º, do CC, que a M.ª juiz não seguiu.

    VII) Da articulação das normas jurídicas aplicáveis, teriam as mesmas de ser analisadas no seu conjunto, integradas entre si e não afastar ou desconsiderar – como foi o caso, as normas do “EBF”, para de tal modo, julgar improcedente a impugnação, numa decisão que, com o devido respeito não salvaguardou os interesses que o EBF visou criar, sobrepondo-se designadamente, a outros tributos como acima se referiu e que não foi tido em conta na decisão “sub judice”.

    VIII) Tendo em vista a R. decisão recorrida, mesmo que se considerasse ser devido o imposto de SISA, o que por mera hipótese de raciocínio se coloca, deveria a R. decisão considerar também, o direito AUTOMÁTICO da recorrente ao benefício de igual valor que o “EBF” lhe atribuiu, operando-se em consequência, a compensação dos valores para, se chegar a idêntico resultado da inexigência legal do imposto reclamado quanto à SISA por dela estar a recorrente isenta em face do benefício fiscal atribuído.

    IX) Sendo, tal como se decidiu nos acórdãos deste Tribunal com os números 0783/09 de 2.12.2009 e 0935/09 de 10.2.2010, entre outros, aquele benefício fiscal é de aplicação automática verificados que sejam os legais pressupostos, como é o caso.

  2. Consequentemente, da prova que no Tribunal “a quo” se considerou provada, a consequência jurídica a extrair de tais factos deveria ter sido a de julgar a impugnação apresentada por provada, por ser “s.m.o.”, o corolário lógico e legal, naquele vai vem silogísticos entre os factos e o direito.

    XI) Tal como se considerou no acórdão acima transcrito “os benefícios fiscais são medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes, e que sejam superiores aos da própria tributação que impedem (artigo 2.º/1 do EBF).

    XII) Tal como refere o legislador no preâmbulo do DL 38/94 de 8 de Fevereiro, referindo que se trata de um privilégio fundamental, o de contribuir efectiva e plenamente para a tutela de interesses públicos extrafiscais de relevância superior ao da tributação que limitam – princípio esse plenamente assumido no DL 423/83 que é tido por diploma fundamental como instrumento adequado à prossecução da política de turismo de extrema relevância para o País.

    XIII) Prevalecendo, no caso, o regime do “EBF”, como norma especial que concedeu o benefício automático da SISA pela atribuição da utilidade pública à unidade hoteleira construída nos prédios a que se refere o facto n.º 1, ficando assim afastado o regime normal do CIMSISD então em vigor.

    2.º O entendimento extraído da R. decisão recorrida da norma do artigo 20.º n.º 1 do DL 423/83 de 5 de Dezembro, viola os princípios constitucionais contemplados no artigo 2.º, 20.º n.º 4, 103.º n.º 2, 165.º n.º 1 alínea “i” e 104.º n.º 2 da CRP, tendo designadamente em vista as expectativas do cidadão comum que acredita na certeza e segurança jurídica das normas que o Estado produz, na igualdade dos cidadãos perante a lei, da justiça social e na igualdade de oportunidades e ainda o princípio da legalidade previsto no artigo 103.º da norma fundamental que com o devido respeito se violou.

    3.º No entendimento da recorrente, a R. decisão recorrida, violou o disposto no artigo 21.º, n.º 1 do DL 423/83 e bem assim o disposto no artigo 9.º do CC e art. 11.º da LGT ao não interpretar as normas jurídicas envolvidas na questão “sub judice”, de forma adequada, afastando, ilegalmente, o EBF – norma especial que se sobrepõe, no caso, ao CMISSD que criou o tributo reclamado indevidamente pela Fazenda Nacional no caso em concreto, que ilegalmente afastaria o regime especial que criou e atribuiu o estatuto de utilidade turística ora em causa.

    Em face do exposto, e, perante as conclusões apresentadas, se requer: 1. A revogação da R. decisão, com as legais consequências; 2. Que se reconheça à recorrente o direito ao benefício fiscal que o estatuto de utilidade turística do Hotel lhe atribuiu, de forma automática, nos termos do artigo 20.º n.º 1 do DL 423/83, tal como este Egrégio Tribunal tem considerado designadamente nos arestos citados».

    1.3 Não foram apresentadas contra alegações.

    1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento. Isto, após identificar a questão a dirimir como sendo «a interpretação e aplicação efectuadas do art. 16.º do C.I.M.S.S.D.

    », com a seguinte fundamentação: «[…] É o art. 16.º n.º 1 do C.I.M.S.I.S.D., em que se prevê que a isenção se extinga no caso de aos prédios adquiridos para revenda ser dado destino diferente, ou não serem revendidos dentro do prazo de três anos ou o terem sido novamente para revenda, com o preenchimento das condições ocorre condição resolutiva da isenção concedida.

    É certo que, após a vigência do Estatuto de Benefícios Fiscais aprovado pelo Dec.-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho, foi mantida a aplicação do previsto no Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, com as devidas adaptações.

    E desde logo foi previsto no art. 2.º n.º 1 do E.B.F. que os benefícios fiscais são medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes e que sejam superiores aos da própria tributação que impedem, não havendo razões para aplicar este último diploma ao caso dos autos com base em ter ocorrido a declaração de utilidade turística.

    Com efeito, é ainda requisito da isenção previsto no mesmo que o prédio tenha sido adquirido com destino à «instalação» de empreendimento turístico, conforme previsto na segunda parte do n.º 1 do art. 20.º do dito Decreto-Lei n.º 423/83, pelo que não basta que tenha sido declarada a utilidade turística.

    Tal o entendimento tido recentemente em vários acórdãos proferidos pelo S.TA. a propósito da aplicação da isenção de imposto de sisa, ainda que noutro circunstancialismo, conforme consta dos próprios acórdãos citados pela recorrente, de 23-1-13 e 12-2-04, respectivamente, proferidos nos recursos n.ºs 968/12 e 972/13, acessíveis em www.dgsi.pt.

    E conforme aí se fundamenta, com base no previsto no art. 9.º n.º 2 do C. Civil, não é de aplicar a lei quando não se tem na sua letra um mínimo de correspondência ainda que imperfeitamente expresso.

    Acresce que a aplicação do previsto art. 16.º n.º 1 do C.I.M.S.I.S.D. de modo a abranger um destino como o da declaração de utilidade turística, implica o recurso à analogia, o que se mostra impedido pelo art. 10.º do dito E.B.F.

    Não são, assim, de reconhecer as inconstitucionalidades que a recorrente assaca ao entendimento tido na sentença recorrida».

    1.5 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos.

    1.6 A questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber se a sentença fez correcto julgamento ao considerar que a AT não incorrera em vício de violação de lei ao liquidar sisa à ora Recorrente relativamente à aquisição de dois prédios, por considerar que, nos termos do art. 16.º do CIMSISD, tinha caducado a isenção com vista à revenda prevista no n.º 3 do art. 11.º do mesmo Código e que, contrariamente ao que sustenta a Recorrente, não pode beneficiar da isenção prevista no art...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT