Acórdão nº 01810/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelPEDRO DELGADO
Data da Resolução17 de Fevereiro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – A Autoridade Tributária e Aduaneira inconformada com a decisão do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), proferida no processo nº 69/2013, que julgou parcialmente procedente a liquidação de IRC, referente ao exercício de 2005, no montante de € 3.383.085,45 e respectivos juros compensatórios no valor de € 311.721,72, vem nos termos do artigo 25º, nº 2, 3 e 4 do Decreto Lei nº 10/2011 de 20 de janeiro, interpor recurso para o Pleno deste Tribunal, por estar em oposição com o acórdão do STA proferido em 11 de fevereiro de 2009, no âmbito do processo nº 862/08.

2 - A recorrente veio apresentar a fls. 2/23 alegação tendente a demonstrar alegada oposição de julgados, formulando as seguintes conclusões: «A) Vem o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência, interposto da decisão arbitral proferida no processo n.º 69/2013-T CAAD, que correu termos no Tribunal Arbitral constituído no âmbito do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), que julgou procedente o pedido de pronúncia arbitral, na parte que aqui nos interessa, de reconhecimento como custo os incorridos com a transmissão de prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares entre entidades relacionadas entre si, dado o entendimento de que o conceito de “partes de capital” ínsito no artigo 23.°/7 do CIRC não engloba a figura de prestações suplementares; B) Com efeito, a decisão arbitral recorrida colide com o Acórdão, já transitado em julgado, do Supremo Tribunal Administrativo, de 11/02/2009, no âmbito do processo n.º 0862/08 (Acórdão Fundamento), encontrando-se irremediavelmente inquinado do ponto de vista jurídico, por errada interpretação do artigo 23°/7 do CIRC; C) Na decisão recorrida, o Tribunal Arbitral sufragou a interpretação de que a transmissão onerosa de partes de capital — quando esteja em causa a transmissão de prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares — deverá ser aceite como custo, ainda que a transmissão ocorra entre entidades com relações especiais, ao abrigo do disposto no art.23°/7 do CIRC.

D) Sobre esta questão pronuncia-se o Acórdão Fundamento em sentido totalmente oposto, ao concluir, no caso, que não poderão ser considerados como concorrendo para a formação do lucro tributável as variações patrimoniais negativas quando resultem de relações entre entidades com relações especiais entre si, nos termos do disposto no artigo 23.°/7 do CIRC; E) Demonstrada está uma evidente contradição entre a decisão recorrida e o Acórdão Fundamento, quanto à interpretação e aplicação do artigo 23.º/7 do CIRC, isto é, uma manifesta contradição sobre a mesma questão fundamental de direito que importa dirimir, mediante a admissão do presente recurso e, consequentemente, anulação da decisão recorrida, com substituição da mesma por novo Acórdão que, definitivamente, decida a questão controvertida (n.º 6 do artigo 152.° do CPTA); F) A infração a que se refere o n.º 2 do artigo 152.º do CPTA, consiste num erro de julgamento expresso na decisão recorrida, na medida em que o Tribunal Arbitral adotou uma interpretação da referida norma do CIRC em patente desconformidade com o quadro jurídico vigente; G) Todavia, ficou devidamente demonstrado que a linha de raciocínio adotada é ilegal por violação expressa do disposto no referido artigo 23.º/7 do CIRC, bem como do artigo 11.º/2 da LGT, recurso do ramo de direito de onde provém o conceito “partes de capital”; H) O conceito de “partes de capital” utilizado no CIRC e no EBF tem a sua origem não no direito societário, mas sim no direito contabilístico; I) É perfunctória a análise efetuada pela decisão recorrida no que concerne ao elemento histórico, nomeadamente quando se socorre da alteração da redação do pretérito artigo 42.º/3 do CIRC, efetuada pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de dezembro, para justificar a exclusão das prestações acessórias do teor do conceito de “partes de capital” ínsito no pregresso artigo 23.º/7 do CIRC, que, recorde-se, não sofreu qualquer modificação no exato ano de 2005; J) É perfunctória, pois não se pode defender que somente por que a redação do pretérito artigo 42.º/3 do CIRC foi modificada, tal modificação de foro lexical passa a permitir que se interprete o conceito de “partes de capital”, conceito ínsito no artigo 23.º/7 do CIRC, como excluindo as prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares; K) Por fim, este entendimento da Recorrida é ainda suportado por recurso ao elemento teleológico, ou seja, por recurso à “mens legis”, uma vez que ser desprovida de sentido interpretar que o legislador tenha querido arredar a figura das prestações suplementares do conceito de “partes de capital”, ínsito no pretérito artigo 23.º/7 do CIRC, ao mesmo tempo que o integra no conceito de “partes de capital”, ínsito no pretérito artigo 42.º/3 do CIRC; L) Assim sendo, o entendimento de que o conceito de “partes de capital”, patente na redação do artigo 23.º/7 do CIRC, não engloba a figura das prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares, só a erro de julgamento pode ser imputado.

Termos em que deve o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência ser aceite e posteriormente julgado procedente, por provado, sendo, em consequência, nos termos e com os fundamentos acima indicados, revogada a decisão arbitral recorrida e substituída por outro Acórdão consentâneo com o quadro jurídico vigente.» 3 – A entidade recorrida não apresentou contra alegações.

4 – O Exmº Procurador Geral Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo emitiu parecer, com a seguinte fundamentação, que, na parte relevante, se transcreve: (….) É, antes de mais, de apreciar se estão reunidos os requisitos de que depende existir contradição de julgados, conforme previsto nos artigos 25.º n.º 3 do R.J.A.M.T. e 152.º n.º 2 do C.P.T.A..

A questão de direito em oposição foi enunciada como sendo relativa à seguinte questão fundamental de direito: se os custos suportados com a transmissão onerosa de partes de capital social para uma sociedade com ela relacionada podem ou não ser considerados como custos ou perdas nos termos do disposto no art. 23.º n.º 7 do CIRC.

E foi invocada a identidade do decidido quanto a “prestações acessórias” sob a forma de “prestações suplementares”, e ser relativamente a tal que seriam ou não se considerar custos.

Ainda que ao tempo dos factos constantes quer da decisão arbitral, quer do acórdão fundamento, essas realidades fossem objeto de um mesmo tratamento contabilístico, as mesmas obtinham enquadramento, diverso, nos artigos 209.º e 210.º do CSC, de que ressalta haver diferenças significativas quanto a vencerem ou não juros e serem objeto ou não de restituição a final.

E sobre as primeiras se pronunciou o acórdão fundamento e sobre as segundas, especificamente, a decisão do tribunal arbitral.

Assim sendo, não ocorre identidade que determine a contradição entre julgados, nos termos dos artigos 25.º n.º 3 do R.J.A.M.T. e 152.º n.º 2 do C.P.T.A..

O recurso é de julgar findo por acórdão a proferir pelo Pleno — cfr., ainda, artigo 27.º n.º 1 al. b) do E.T.A.F..

Concluindo: É de julgar findo, por acórdão a proferir pelo Pleno da secção.» 5 – Colhidos os vistos dos Excelentíssimos Juízes Conselheiros Adjuntos, cumpre apreciar em conferência do pleno da secção.

6 – Na decisão arbitral recorrida encontram-se fixados os seguintes factos: a) A Requerente é a sociedade dominante de um grupo de sociedades; b) Na sequência de uma acção de inspecção externa, realizada em 2009, foram efectuadas correcções técnicas ao lucro tributável declarado, entre as quais as seguintes: 1º) Realizações de Utilidade Social, no montante de € 467.800,69, a que corresponde o imposto e juros compensatórios nos valores de € 127.721,28 e de € 11.693,08; 2º) Transmissão de Prestações Suplementares, no montante de € 11.923.318,97, a que corresponde o imposto e juros compensatórios de € 3.255.364,16 e € 300.028.63, respectivamente; c) A correcção relativa a “Realizações de utilidade social” foi baseada nas seguintes considerações que constam do Relatório da Inspecção (documento n.º 6, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido) O sujeito passivo contabilizou na conta 64700027— Seguro de doença grupo o valor de €560.088.78 relativo ao valor líquido (prémio bruto deduzido da comparticipação dos trabalhadores) despendido com o prémio de seguro de saúde, relativo a funcionários, reformados e viúvas.

Desse valor, não acresceu ao lucro tributável, nomeadamente ao campo 206 do quadro 07 da declaração de rendimentos Modelo 22, a importância de €467.800,69, relativa à parte do prémio de seguro de saúde pago pela empresa para os cônjuges, filhos e ascendentes dos trabalhadores e dos reformados, bem como das viúvas e dos seus filhos e ascendentes.

De acordo com o nº 4 do artigo 23º do CIRC, excepto quando estejam abrangidos pelo disposto no artigo 40º, não são aceites como custo os prémios de seguros de doença e de acidentes pessoais, bem como as importâncias despendidas com seguros e operações do ramo "vida", contribuições para fundos de pensões e para quaisquer outros regimes complementares de segurança social que não sejam considerados rendimentos de trabalho dependente, nos termos da primeira parte do nº 3 da alínea b) do nº 3 do artigo 2º do CIRS.

Atendendo à natureza dos custos em análise, não podem os mesmos ser enquadrados no disposto no n.º 1 do artigo 40.º do CIRC por não se tratarem de encargos com a manutenção facultativa de creches, lactários, jardins-de-infância, cantinas, bibliotecas e escolas, bem como de outras realizações de utilidade social, como tal reconhecidas pela Direcção-Geral dos Impostos.

Por outro lado, de acordo com o nº 2 do artigo 40.º do CIRC, podem ser considerados como custo do exercício até ao limite de 15% das despesas com o pessoal escrituradas a título de remunerações, ordenados ou salários, os encargos...

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