Acórdão nº 0704/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelASCENS
Data da Resolução11 de Maio de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – RELATÓRIO A……………….., S.A. com os demais sinais dos autos, veio deduzir impugnação judicial contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa por ela apresentada contra o acto de autoliquidação de IRC referente ao exercício de 2008.

Por sentença de 20 de Dezembro de 2013, o TAF de Sintra julgou procedente a impugnação Judicial e anulou a liquidação em crise.

Inconformada com o assim decidido, reagiu a representante da Fazenda Pública, interpondo o presente recurso com as seguintes conclusões das alegações: «I) A sentença ora recorrida determinou, na sua parte decisória, a anulação da liquidação colocada em crise. Tal não só vai para além do pedido formulado pela Impugnante como determinaria a devolução por parte desta dos montantes reembolsados pela AT na sequência da autoliquidação efectuada pela Impugnante.

II) Afigura-se-nos assim que deverá nesta parte ser rectificada a sentença, de molde a determinar a correcção da autoliquidação nos termos peticionados, e não a anulação da liquidação na sua totalidade, ou seja determinando o reembolso do valor de € 5.309,14.

III) No caso concreto, contudo não se verificam, as condições de que depende o pagamento de juros indemnizatórios por parte da Administração Tributária, previstas no art. 43° da LGT IV) Como resulta do n.º 2 do artigo 43° da LGT, se o erro praticado pelo contribuinte tiver na sua base orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas, haverá lugar a juros indemnizatórios a favor daquele, por se considerar que a responsabilidade na entrega de imposto em excesso cabe à AT por ter emitido orientações sem correspondência com a legislação vigente.

V) No caso dos presentes autos, em que se está perante um erro na autoliquidação praticado pelo próprio contribuinte, erro esse derivado exclusivamente da aplicação de uma norma que se veio posteriormente a considerar inconstitucional, e em que não está em causa o cumprimento de quaisquer instruções administrativas genéricas da AT, nem esta teve qualquer intervenção no âmbito dos seus poderes de autoridade no apuramento do Imposto a entregar pelo contribuinte, não se vislumbra como se pode integrar a pretensão indemnizatória formulada pelo contribuinte no âmbito do disposto no artigo 43° da LGT.

VI) Até porque, nos termos do artigo 111º n.º 2 b) do CPPT, a administração fiscal, na qualidade de órgão da Administração Pública, não tem competência para decidir da não aplicação de normas relativamente às quais sejam suscitadas dúvidas de constitucionalidade.

VII) Com efeito, nos termos do artigo 266°, n.º 2 da CRP, os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei, diferentemente do que sucede com os Tribunais que, nos termos do disposto no artigo 266°, n.º 2 da CRP, estão impedidos de aplicar normas inconstitucionais sendo-lhes atribuída a competência para a fiscalização difusa e concreta da conformidade constitucional.

VIII) A sentença recorrida, ao assim não entender, apresenta-se ilegal por desconformidade com os preceitos acima assinalados, não merecendo por isso ser confirmada.

Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser considerado procedente o recurso e revogada a douta sentença recorrida, no que concerne à condenação no pagamento de juros indemnizatórios rectificada de molde a determinar a correcção da autoliquidação nos termos peticionados, e não a anulação da liquidação na sua totalidade, como é de Direito e Justiça.» Foram apresentadas contra alegações, a fls. 233/241 dos autos pela sociedade recorrida, com o seguinte quadro conclusivo: « A. O segmento decisório da sentença do Tribunal a quo não necessita de ser retificada, uma vez que resulta — com mediana clareza — do mesmo que o ato tributário impugnado foi anulado, não na sua totalidade, mas na medida em que foi colocado em crise.

  1. Com efeito, compulsado o teor do segmento fáctico-jurídico da sentença, é clarividente que o thema decidendum se encontra cingido à sujeição dos encargos dedutíveis declarados pela ora Recorrida a uma tributação autónoma superior à devida e legalmente admissível, pelo que resulta também claro que o comando decisório se cinge àquela parte.

C.

Quanto aos juros indemnizatórios, nem a circunstância de estar em causa nos autos um ato de autoliquidação constitui um óbice ao pagamento daqueles juros ao abrigo do preceituado no artigo 43.º da LGT, nem tão-pouco poderá sustentar-se a inexistência de erro imputável aos serviços com fundamento na adstrição da Administração Tributária ao cumprimento da lei e no facto de estar na base da ilegalidade do ato de autoliquidação impugnado a inconstitucionalidade material de uma norma.

D. A este respeito pronunciou-se já por diversas vezes este Supremo Tribunal no sentido de o dever de obediência da Administração Tributária à lei compreender todas as fontes normativas (de quanto resulta um dever de obediência, prima facie, à Constituição da República Portuguesa, enquanto Lei Fundamental do Estado) e de o direito do contribuinte a juros indemnizatórios, atenta a função reparadora dos mesmos em face de uma atuação ilegal da Administração Tributária, estar dependente apenas da existência de um comportamento ilegal por parte da Administração Tributária de quanto resultem prejuízos para o contribuinte, como sucedeu no caso sub judíce.» O EMMP pronunciou-se emitindo parecer no sentido da total improcedência da presente impugnação e, em consequência, pela manutenção do julgado.

2 – FUNDAMENTAÇÃO O Tribunal “a quo” deu como provada a seguinte factualidade: A) A Impugnante preencheu o Campo 365 do Quadro da sua declaração periódica de rendimentos (Modelo 22) referente ao exercício de 2008 com o valor de € 11.880,52, o qual inclui o montante de € 11.490,59, correspondente à tributação autónoma aplicada sobre os encargos a que se referem os n°53 e 4 do artigo 81º do CIRC. (Doc. nº 1 junto à PI.) E) No dia 16.02.2011, a Impugnante deduziu reclamação graciosa da autoliquidação a que alude a al. A) do probatório, requerendo a anulação parcial da mesma, nos seguintes termos e fundamentos: “(...) determinando em consequência, a correcção da autoliquidação referente ao exercício de 2008 e o reembolso do valor que resulta da diferença de aplicação, aos encargos dedutíveis relativos a despesas de representação e aos encargos dedutíveis relativos a despesas de representação e aos relacionados com viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, motos ou motociclos, incorridos entre 1 de Janeiro e 5 de Dezembro de 2008, das antigas taxas de tributação autónoma em substituição das novas taxas de tributação autónoma, o qual ascende a € 5.809,74 (cinco mil trezentos e nove euros e setenta quatro cêntimos).” (Doc. fls. 4/3 do processo de reclamação graciosa apenso).

C) No dia 14.09.2011, por despacho da Directora de Finanças Adjunta da Direcção de Finanças de Lisboa foi a reclamação graciosa a que alude a al. B) do probatório indeferida. (Doc. fls. 120/122 do processo de reclamação graciosa apenso).

D) Em 19.09.2011, a Impugnante foi notificada do despacho a que alude a al. C) do probatório. (Doc. fls. 125/127 do processo de reclamação graciosa apenso).

F) Em 27.09.2011, deu entrada neste tribunal a petição inicial que originou os presentes autos. (cfr. carimbo aposto a fls.3 dos autos).

3 – DO DIREITO A decisão recorrida para conceder provimento à impugnação expressou a seguinte fundamentação de direito que se apresenta por súmula: I. RELATÓRIO A……………………., S.A., nif ……………, com sede na ……….. — ……….. em ………., Cascais vem deduzir impugnação judicial contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra o acto tributário de autoliquidação de IRC referente ao exercício de 2008.

Alega brevitais causa: - que a redacção do artigo 81° do CIRC, dada pela Lei n.º 64/2008 de 5/12, não deve ser considerada aplicável relativamente aos encargos suportados entre 1 de Janeiro e 5 de Dezembro de 2008, e que deve ser aplicada, no seu lugar, a redacção anterior, invocando o principio constitucional de não retroactividade da lei fiscal previsto no n°3 do artigo 103° da Constituição da República Portuguesa.

Conclui, pedindo a anulação do acto de indeferimento impugnado, determinando, em consequência, a correcção da autoliquidação referente ao exercício de 2008 e à devolução do montante de €5.309,74 acrescido de juros indemnizatórios.

A FAZENDA PÚBLICA apresentou contestação defendendo-se por impugnação, pugnando pela improcedência dos autos.

(…) III. SEGMENTO FÁCTICO (…) IV. SEGMENTO FÁCTICO-JURÍDICO A Impugnante não se conformando com o sentido da decisão (indeferimento expresso) que recaiu sob a reclamação graciosa deduzida contra o acto de autoliquidação de IRC do exercício de 2008, vertida na declaração de rendimentos Modelo 22, dela vem deduzir impugnação.

As partes nos articulados apresentados, identificaram, e bem que a questão que importa apreciar e consequentemente decidir é a de saber, se a norma contida no artigo 5°, n° 1 da Lei n° 64/2008, de 5 de Dezembro, que determinou a produção de efeitos desde 1 de Janeiro de 2008 do disposto no artigo 1°-A da mesma Lei, o qual alterou o artigo 81.º do CIRC, agravando de 5% para 10% a taxa de tributação autónoma incidente sobre os encargos com viaturas ligeiras de passageiros e despesas de...

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