Acórdão nº 0867/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução29 de Setembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA: A…………………….., S.A. intentou, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada (doravante TAF), contra o Município do Seixal, acção de contencioso pré-contratual pedindo (1) a anulação da deliberação proferida pela Câmara Municipal do Seixal que excluiu a sua proposta ao concurso público para fornecimento de refeições em refeitórios escolares para o ano de 2016 e adjudicou o referido fornecimento à contra-interessada B……………… L.da e (2) a condenação do Município (a) a abster-se de celebrar o contrato com esta contra-interessada ou a anulação do mesmo se ele, entretanto, tiver sido celebrado, (b) a admitir a proposta que apresentou e a (c) a adjudicar-lhe o objecto do mencionado concurso, celebrando com ela o correspondente contrato.

Tal acção foi julgada improcedente, julgamento que o TCA Sul confirmou.

É deste Acórdão que vem esta revista na qual foram formuladas as seguintes conclusões: I.

Vem o presente recurso de revista interposto do Acórdão do TCA Sul, de 5/05/2016, que julgou improcedente o recurso jurisdicional interposto pela recorrente do Despacho e Sentença de 24/02/2016 do TAF de Almada, que dispensou a prova testemunhal requerida e julgou improcedente a acção de contencioso pré-contratual destinada a anular a decisão do recorrido de exclusão da proposta da recorrente do concurso público para fornecimento de refeições em refeitórios escolares.

II.

Na presente revista suscitam-se as seguintes questões: 1) CONSTANDO DOS DOCUMENTOS QUE INTEGRAM A PROPOSTA REFERÊNCIA EXPRESSA E ESCRITA AOS ELEMENTOS EXIGIDOS PELAS PEÇAS CONCURSAIS CUJA ALEGADA FALTA GEROU A SUA EXCLUSÃO E OFERECENDO O CONCORRENTE PROVA TESTEMUNHAL EM ACÇÃO DE CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL POR SI INTENTADA, PODE O TRIBUNAL PRESUMIR, SEM OUVIR A REFERIDA PROVA, QUE O CONTEÚDO DA PROPOSTA NÃO CUMPRE OS REQUISITOS EXIGIDOS PELAS ALUDIDAS PEÇAS? 2) INTEGRA A PREVISÃO DA ALÍNEA B) DO N.° 2 DO ARTIGO 70° DO CCP, DETERMINANDO A SUA EXCLUSÃO, A OMISSÃO, NA PROPOSTA, DE TERMOS OU CONDIÇÕES RELATIVOS A ASPECTOS DA EXECUÇÃO DO CONTRATO NÃO SUBMETIDOS À CONCORRÊNCIA? OU SÓ INTEGRA ESTA PREVISÃO A APRESENTAÇÃO DE TERMOS OU CONDIÇÕES DESCONFORMES COM O EXIGIDO NAS PEÇAS CONCURSAIS? III. As questões suscitadas são susceptíveis de se repetir num número elevado de casos futuros; IV.

Sendo fundamental que o Supremo Tribunal Administrativo se pronuncie sobre as mesmas para uma maior previsibilidade do direito; V.

Estando, por conseguinte, preenchidos os pressupostos da admissibilidade da revista previstos no artigo 150.º/1 do CPTA.

VI.

Os documentos que integram a proposta da A…………. fazem referência expressa e escrita aos termos/condições exigidos; VII.

Mas o tribunal a quo concluiu, sem ouvir a prova testemunhal oferecida, que a proposta era omissa quanto aos termos/condições exigidos; VIII.

A prova testemunhal serviria, não para suprir qualquer falha nos documentos como sustenta o tribunal o quo (falha que não se verifica atento o exposto na conclusão VI) mas para aferir se as referências expressas e escritas constantes dos documentos que integram a proposta permitem concluir no sentido de que o conteúdo dos documentos preenche os requisitos exigidos, estando, desse modo, asseguradas as finalidades que se pretende que sejam atingidas.

IX.

As testemunhas da A……….. poderiam ter esclarecido que a circunstância de determinados elementos estarem em falta num documento mas presentes noutro documento da proposta não põe em causa a segurança alimentar e a inocuidade dos produtos que se pretende atingir com a exigência concursal em apreço já que o que releva é que ambos os documentos são tidos em consideração pelos colaboradores da A……… que implementam o sistema HACCP nas escolas e, consequentemente, os requisitos exigidos são efectivamente aplicados.

X.

As testemunhas da A………….. poderiam ter esclarecido em que consiste o módulo «apoio psicopedagógico e comportamental» que integra o plano de formação inicial e contínua e que o mesmo, tendo como público-alvo todos os colaboradores, é ministrado ao pessoal de apoio às refeições pelo que a formação deste pessoal na vertente pedagógica pretendida pelo Município do Seixal está assegurada pela proposta da A………… XI.

Em suma, face às referências expressas e escritas aos requisitos exigidos nos documentos que integram a proposta da A………… o tribunal a quo não podia ter concluído, sem ouvir a prova testemunhal, pela falta de preenchimento dos requisitos exigidos.

XII. Ao fazê-lo, cometeu o tribunal um erro de julgamento, violando o princípio do inquisitório (cf. artigo 411.º do CPC).

XIII.

E violou ainda os princípios da concorrência e da proporcionalidade.

XIV. Constituindo a exclusão de uma proposta uma restrição da concorrência, sempre haveria que aferir se tal exclusão é adequada, necessária e equilibrada (cf. Acórdão do TCA Norte, de 22/04/2010, proferido no processo 01327/09.1BEPRT, disponível em www.dgsi.pt) XV. E não aplicar cegamente a norma que prevê a exclusão, sem olhar a tais princípios, como fez o tribunal a quo.

XVI. Importa verificar qual o objectivo da norma concursal que prevê o termo/condição e verificar, no caso concreto, se tal objectivo está ou não assegurado pela proposta que foi apresentada. Se a resposta for negativa, a exclusão da proposta revelar-se-á adequada, necessária e equilibrada. Se a resposta for positiva, então a exclusão da proposta será inadequada, desnecessária e desequilibrada e, consequentemente, violadora dos princípios da concorrência e da proporcionalidade.

XVII.

A segurança alimentar não é posta em causa pelo facto de os requisitos que deviam constar do Mapa de Controlo de Recepção da Mercadoria constarem do Plano de Monitorização; XVIII.

Porque o que releva é que os mesmos constam da proposta da A……………..

XIX. E, estando patentes na proposta, significa que a A…… assegura a respectiva aplicação no fornecimento de refeições; XX. Assegurando-se, pois, a finalidade visada com a imposição daqueles requisitos.

XXI. O plano de formação inicial e contínua prevê um módulo de «apoio psicopedagógico e comportamental» cujos público-alvo são todos os colaboradores, incluindo, por isso, o pessoal de apoio aos alunos.

XXII.

Pelo que a formação do pessoal de apoio aos alunos na componente pedagógica está assegurada.

XXIII.

A proposta da A………. assegura, pois, as finalidades visadas com a imposição dos requisitos.

XXIV.

E, estando as finalidades das normas concursais asseguradas, a exclusão da proposta da A……. revela-se desadequada, desnecessária e desproporcionada, XXV. E, como tal, violadora do princípio da concorrência e da proporcionalidade.

XXVI.

O tribunal a quo fez uma abordagem meramente formal, sem cuidar de aferir, tal como o imponham os princípios da concorrência e da proporcionalidade, se a finalidade que a entidade adjudicante pretendia atingir com a exigência dos requisitos estava ou não assegurada com a proposta da A…… e se, em consequência, a sua exclusão se mostrava ou não adequada, necessária e equilibrada. Aferição para a qual era necessário ouvir a prova testemunhal indicada.

XXVII.

Violou, pois, o tribunal a quo os princípios da concorrência e da proporcionalidade.

XXVIII.

Concluindo-se, pois, pela não verificação da alegada falta de cumprimento dos requisitos exigidos pela proposta da A…………… XXIX.

O artigo 70.º n.º 2 do CCP, na sua al.ª a), comina com a exclusão as propostas que não apresentam atributos e, na sua al.ª b), as propostas que apresentam atributos que violem os parâmetros base ou termos ou condições que violem aspectos de execução do contrato a celebrar não submetidos à concorrência.

XXX. Assim, se uma proposta não apresentar algum termo/condição então, relativamente à mesma, não se verificará nenhuma causa de exclusão legalmente prevista (cf. neste sentido, o douto Acórdão do TCA Sul de 12-08-2011, proferido no processo 07691/11, o Acórdão do TCA Norte de 22-05-2015, proferido no processo 01972/14.3BEBRG, disponíveis em www.dgsi.pt e Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos e Outros Procedimentos de Contratação Pública, Almedina, 2011, pág. 932) XXXI.

Os elementos exigidos no ponto 4., n.º 2, alíneas e) e g) do programa não constituem atributos mas termos/condições, ou seja, aspectos não submetidos à concorrência.

XXXII.

O Tribunal a quo considerou que os documentos apresentados pela A……….. para efeitos das alíneas e) e g), do número 2., do ponto 4 do programa eram omissos quanto aos termos/condições exigidos nessas disposições concursais e entendeu estar preenchida a alínea b) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP; XXXIII.

Cometeu, pois, o tribunal a quo um erro de julgamento já que, ainda que essa omissão se verificasse, essa situação não configuraria causa de exclusão, designadamente, a prevista na alínea b) do n.º 2 do artigo 70° do CCP, disposição que, assim, foi violada pelo tribunal a quo.

O Município do Seixal contra alegou tendo formulado as seguintes conclusões: 1.

O acórdão recorrido procedeu a correcta interpretação e aplicação do direito aos factos assentes nos presentes autos, pelo que não merece censura, devendo ser integralmente confirmado, com as legais consequências.

  1. A proposta que a recorrente apresentou ao procedimento de contratação pública lançado pelo Município recorrido foi indevidamente instruída e violou o disposto nas peças daquele procedimento. Trata-se de matéria de facto assente e que foi objecto de apreciação pelas anteriores instâncias.

  2. Não parece estar subjacente ao espírito do legislador subsumir uma situação de violação do disposto nas peças de um procedimento de contratação pública no conceito de questão de relevância jurídica e social fundamental previsto no n.º 1 do art. 150.º do CPTA para justificar a interposição do recurso excepcional de revista.

  3. A recorrente insiste na questão da discordância sobre a decisão tomada no processo da dispensa da produção da prova testemunhal, a qual também não é passível de conhecimento em sede de...

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