Acórdão nº 1599/13.7 TVLSB.L1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 25 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelPEDRO BRIGHTON
Data da Resolução25 de Novembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA : I – Relatório 1- A A. MC intentou contra “EL – EL, U, Ldª” e GB a presente acção especial de tutela de personalidade, pedindo a condenação dos R.R. : -A retirar os livros que se encontrem no mercado ; -Que sejam os R.R. impedidos de continuar a comercializar os livros, aliená-los, reproduzi-los ou exibi-los com a capa em questão ; -Que sejam os R.R. proibidos de, para a finalidade visada pela obra ou qualquer outro fim, utilizar qualquer fotografia da A. ; -Que se condenem os R.R. a pagar uma sanção pecuniária compulsória de 5.000 € por cada dia de atraso no cumprimento da decisão que venha a ser tomada.

2- Foi designado dia para a audiência.

3- No início desta, os R.R. apresentaram contestação, onde defendem a improcedência da acção.

4- Procedeu-se ao julgamento com observância do legal formalismo.

5- Foi proferida Sentença a julgar a acção improcedente por não provada, constando da respectiva parte decisória : “Pelo exposto, julgo improcedente a presente acção e, consequentemente, absolvo os RR. dos pedidos.

Custas pela A..

Notifique”.

6- Desta decisão interpôs o A. recurso de apelação, para tanto apresentando a sua alegação com as seguintes conclusões : “i) O Artº 79º do Código Civil, que, no seu nº 1 encerra a regra fundamental a respeito do direito à imagem, proibindo a exposição, reprodução ou o lançamento no comércio do retrato dessa pessoa sem o consentimento dela, sendo, por essa regra basilar que deverá recortar-se e interpretar-se todo o regime em causa; ii) As excepções previstas no nº 2 do Artº 79° do Código Civil, e que definem as situações em que o consentimento será dispensado, deverão, face a essa natureza excepcional, ser interpretadas restritivamente; iii) O consentimento é dispensado quando o retrato seja enquadrado em imagem de lugares públicos, mas, “só cabem neste ponto, situações em que o objecto principal do retrato seja o lugar público mas nele se inclua de modo marginal ou acessório, o retrato de uma pessoa” (David de Oliveira Festas, “Do Conteúdo Patrimonial do Direito à Imagem”, pag. 282); iv) A mesma interpretação deverá ser feita nas situações que dispensam o consentimento em que os factos tenham decorrido publicamente, pois, “só há dispensa do consentimento da pessoa para o seu retrato quando este seja enquadrado no retrato de facto público” (David de Oliveira Festas. obra citada, pag. 283); v) Por outro lado, e ainda com relevo para estes autos, admite-se a desnecessidade de consentimento quando a pessoa retratada tenha notoriedade ou o tenha o cargo que desempenhe, mas “não há justificação para dispensar o consentimento da pessoa para o aproveitamento económico da sua imagem pelo simples facto de ser uma figura pública ou de desempenhar um cargo notório” (David de Oliveira Festas, obra citada, pag. 279) e “tanto a notoriedade da pessoa retratada como o enquadramento público não justificam, sem mais, a liberdade de divulgação do retrato, havendo sempre que ponderar, caso a caso, se estão verificadas as razões de valor informativo que estão na base da liberdade de divulgação da imagem da pessoa notória ou da pessoa enquadrada em lugar público...” Ac. STJ de 2001.11.08 CJ/STJ, IX, 2001, tomo III, pag. 113 e sgts.); vi) Deste modo, aos Apelados, face às regras que presidem ao ónus da prova, caberia ter demonstrado que a inserção do retrato da Apelada na capa da obra em questão foi feita por razões de interesse informativo, mas, da matéria que resultou provada a única que poderia eventualmente ter relevância para a demonstração da matéria da excepção é aquela que consta dos pontos l0., 11. e 18. do relatório ele facto constante da douta decisão; vii) E dela não resulta existir interesse informativo em medida tal que seja susceptível de permitir a restrição ao direito de personalidade da Apelante; viii) Nem sequer resulta, atendendo a que a obra em causa tem 242 páginas (Documento nº 2 junto com a contestação) e que a Apelante apenas nele vem referida nos excertos reproduzidos no ponto 11. do relatório de facto constante da decisão de facto, que para o eventual interesse informativo atinente a essa obra fosse necessário reproduzir a imagem daquela na capa; ix) Com efeito, ainda que existisse colisão entre os dois direitos em questão, ambos com igual dignidade constitucional, sempre deveriam, nos termos do Artº 335° do Código Civil, ceder ambos os titulares na medida do necessário para todos produzam o seu efeito sem maior detrimento para ambas as partes; x) Aliás, como ensina Capelo de Sousa, “A colisão de direitos de personalidade de tipo diferente despoleta muitas vezes os dualismos indivíduo e sociedade (...) em casos de colisão de direito de liberdade de expressão e de direito de intimidade da vida privada a prevalência de um ou de outro desses direitos depende do tipo e das intensidades dos interesses concretos juridicamente tutelados presentes em cada situação da vida real” (“O Direito Geral de Personalidade”, pag. 546) e é manifesto atento aquilo que se apontou que as necessidades informativas que presidiram à obra em questão não tornavam essencial que na sua capa fosse reproduzido o retrato da Apelante; xi) Ainda que pudesse entender-se que a situação “sub judice” estaria dentro da excepção prevista no nº 2 do Artº 79° do Código Civil, sempre seria de aplicar o nº 3 dessa disposição; xii) E haverá que atentar na forma como foi concebida a capa do livro em questão e que está descrita nos pontos 5. a 8. do relatório de facto constante da douta decisão; xiii) É evidente que o título da obra e a forma como este está inserido na capa, como se fosse um rótulo aplicado às pessoas retratadas, os dizeres constantes do subtítulo, em que as palavras fortes são “interesses, influências e benefícios”, são atentatórios da honra da Apelante; xiv) Por outro lado, e tendo em conta o que decorre do ponto 9. da decisão de facto, nessa capa são reproduzidas fotografias de pessoas que estão envolvidas em processos crimes ou situações menos a inserção da fotografia da Apelante no conjunto com essas, indicia imediatamente a sua ligação a situações semelhantes àquelas; xv) Aliás, a colocação de tais pessoas na capa em questão - que têm vindo a ser bastamente referidas na comunicação social – tem um evidente interesse comercial para os Apelados, pois, mais facilmente o público em geral adquire uma obra onde, tanto quanto parece, se dissecarão situações com contornos pouco claros e até criminais, do que outra em que apenas se trate colocações em cargos empresarias: xvi) Todo o conjunto da capa é absolutamente escusado para a finalidade a que pretensamente se destinada a obra: a enumeração de dados acerca da colocação de políticos ou ex-políticos em cargos em empresas a que tenham acedido por via dessa carreira política.

xvii) E todo o conjunto da capa é atentatório da honra da Apelante, tanto mais que, como decorre dos pontos 13. e 14. do relatório de facto teve elevada exposição pública; xviii) Para aferir o prejuízo do direito de imagem, haverá que ter e conta também a forma como essa imagem é difundida, sendo manifestamente diverso um artigo de opinião num jornal de um livro publicamente colocado no mercado; xix) A demonstração do prejuízo da Apelante encontra-se demonstrado nos autos, nos pontos 14. a 16. da decisão de facto e como tal sempre a presente acção deverá proceder.

Termos em que, deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença, e julgando-se procedente a acção com o que se fará Justiça”.

7- Os R.R. apresentaram contra-alegações com as seguintes conclusões : “A. O presente recurso versa somente sobre matéria de direito, pese embora não contenha os requisitos previstos no nº 2 do artigo 639º do CPC, pretendendo a Recorrente a revogação da sentença proferida, considerando que a acção deveria ter sido considerada procedente; B. Os pontos 5 e 6 da matéria dada como provada, referem que na capa da obra em crise, foram reproduzidas fotografias de nove pessoas, sendo que a fotografia da Recorrente encontra-se no canto superior direito, e no meio dessa capa, por cima das fotografias e de modo transversal, encontra-se uma faixa onde é reproduzido o título “Os Privilegiados” e nome do seu autor; C. E, sob o ponto 7 da matéria dada como provada, consignou-se que no canto inferior da capa, encontra-se destacada a expressão “como os políticos e ex-políticos gerem interesses, movem influências e beneficiam de direitos adquiridos”; D. A obra é um relato de factos verdadeiros e objectivos, cuja sinopse, bem consigna e foi considerada sob o ponto 18 da matéria dada como provada, que ilustra o teor e finalidade da obra; E. A utilização da imagem da Recorrente, que é uma figura pública, não carece de autorização ou consentimento, nos termos do disposto nº 2 do artigo 79º do CC, porque no caso, justificava-se a sua utilização pela notoriedade, pelo cargo que ocupou e ocupa, por ser com finalidade didácticas ou culturais e por estar enquadrada em factos de interesse público; F. Tal utilização não se enquadra nas circunstâncias previstas no nº 3 do artigo 79º do CC, pois dela não resultou prejuízos para a honra, reputação ou simples decoro da Recorrente, conceitos que não se verificam, pelo simples facto desta, alegadamente, se ter sentido humilhada e vexada; G. “No acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 28.04.2009, relativo à divulgação numa obra de ficção de factos biográficos da vida de uma afamada artista, considerou-se existir, quanto às personalidades que gozam de notoriedade “um interesse legítimo por parte do público em conhecer quer os aspectos públicos da sua vida, quer os de cariz privado que possam ser a expressão da actividade pública”. No mesmo sentido, cf. o acórdão do mesmo Tribunal, de 15.03.2007 - in Alberto Arons de Carvalho, António Monteiro Cardoso e João Pedro Figueiredo, Direito da Comunicação Social, Texto, 3ª edição, pag. 381; H. É facto público e notório, que...

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