Acórdão nº 1776/10.2TVLSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 30 de Outubro de 2014
Magistrado Responsável | EDUARDO JOSE OLIVEIRA AZEVEDO |
Data da Resolução | 30 de Outubro de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa A propôs esta acção declarativa de condenação com processo ordinário contra B, e C.
Pediu a condenação destes no pagamento, a título de indemnização por danos patrimoniais da quantia de 30.240,00€ e por danos não patrimoniais a quantia de 15.000,00€.
Alegou, em síntese: residindo e sendo usufrutuária do 7º Dtº do prédio do condomínio réu, no dia 03.05.2008 entrou num dos elevadores do prédio e após seleccionar esse andar e ao fazer o elevador a sua ascensão, parou no andar seleccionado e abriu as respectivas portas; quando ia sair, tendo já uma perna de fora e outra ainda dentro, o elevador continuou, subitamente, a subir e por isso caiu desamparada no patamar desse andar; o elevador imobilizou-se cerca de 20 a 30 cm acima do patamar, estando a lingueta disparada e as portas abertas; na sequência de tal auxílio foi recebeu internamento hospitalar; e em razão da queda, de que os RR são responsáveis, sofreu os prejuízos patrimoniais e não patrimoniais dos quais pretende ressarcimento.
Os RR contestaram.
O 1ºR, em súmula, alegando: tomou conhecimento da ocorrência do acidente em 22.05.2008; cada um dos elevadores do prédio tem apenas uma porta e a abertura da mesma é manual e não automática, não sendo mecanicamente possível depois de aberta a porta do elevador, o mesmo ser accionado e retomar a sua marcha; se o elevador se imobilizar a cerca de 20 ou 30 cm acima do nível do patamar, por qualquer deficiência técnica, não é possível proceder-se à abertura da porta sem o recurso a chave própria, mas se a abertura da porta já tiver sido feita na zona de aproximação ao piso e - incorrectamente - com o elevador em andamento, então um acidente como o descrito na petição é possível; o elevador encontrava-se em boas condições de funcionamento e o seu estado de conservação impedia a ocorrência de acidentes como o descrito; a reduzida mobilidade da A é derivada da sua idade ou de outras quedas que sofreu devido a tal idade; e, por isso, o acidente ocorrido à A foi de sua inteira responsabilidade e do mesmo não resultaram os danos que invoca, tendo actuado com diligência e não sendo responsável pelo ocorrido.
A 2ªR, genericamente, alegando: nos termos do contrato que celebrou com o 1ºR obrigou-se a conservar os dois elevadores instalados no edifício, os quais, face à sua antiguidade, necessitam de ser remodelados, o que tem vindo a propor a esse R; em 20.08.2008, os elevadores foram inspeccionados pelo IEP, no âmbito das inspecções periódicas a que rotineiramente são sujeitos, não tendo tal entidade detectado qualquer deficiência que justificasse a ocorrência, de onde decorre que a vem cumprindo o contrato que celebrou com o 1ºR e sem reparos; e quanto à imobilização da cabine, e em elevadores deste tipo, é normal existirem discrepâncias – para mais ou menos – na sua imobilização ao piso, com folgas permitidas de alguns centímetros, sendo que o episódio dos autos se ficou a dever à manobra da A e à sua utilização inapropriada do elevador.
Pediu então a intervenção principal da D associada aos RR.
A A replicou mantendo a sua posição inicial.
A D foi chamada como interveniente principal, associada dos RR.
Igualmente contestou, alegando, nomeadamente: celebrou com a 2ªR um contrato de seguro de responsabilidade civil, através do qual se transferiu a responsabilidade decorrente da actividade de assistência e manutenção de elevadores da mesma; não se verificou qualquer incumprimento por parte da 2ªR, nem tão pouco qualquer violação dos deveres legais ou contratuais que para ela derivassem do acordo de manutenção do elevador; não existia nexo causal entre o acidente e a actividade dessa R, pelo que não se lhe pode imputar qualquer responsabilidade; e a A não titula nem justifica os danos alegados.
Elaborou-se despacho saneador altura em que fixou-se o valor da causa e seleccionaram-se os factos assentes e a base instrutória, não tendo sido deduzida reclamação.
Realizada audiência de discussão e julgamento, decidiu-se a matéria de facto sem que também reclamação houvesse.
Proferida sentença, em 19.02.2013, julgou-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenaram-se os RR e a Interveniente, solidariamente, entre si, a pagarem à A, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, a quantia de 9.300,94€, absolvendo-se as mesmas do demais peticionado.
Os RR recorreram, sendo que a Interveniente aderiu ao recurso da 2ªR, recursos admitidos como apelação, com subida imediata, nos autos e efeito meramente devolutivo.
O 1º R extraiu as seguintes conclusões: (…) De facto, as RR. continuam a entender que não podem ser responsabilizadas pelo episódio dos autos (que, reitere-se, ninguém presenciou, ninguém viu, ninguém sabe…), e pugnam para que V. Exas. as absolvam, finalmente, da parte em que ainda vêm condenadas.
As verbas condenatórias surgem porque o Mmo. Juiz a quo, tendo por base os factos provados sob os nºs 2 e 23, entendeu que o desnível de «20 a 30 cm», existente entre a cabine e o patamar, decorreria da ilicitude e da culpa das RR., pois não deveria ser superior a 5 cm, e daí deverem ser responsabilizadas pelo episódio dos autos.
É precisamente em face deste entendimento que a aqui recorrente, Condomínio, recorre: Pugnando, por um lado, pela alteração das respostas dadas aos artigos 2º, 3º, 4º, 5º, 23º, 24º, 25º, 26º, 27º e 28º da Base Instrutória que, se alteradas, levam a uma decisão diversa daquela de que se recorre; E pugnando, por outro lado, pela não verificação, in casu, de dois dos pressupostos da responsabilidade civil, a ilicitude e a culpa, levando de todo o modo – e só por esse facto –a decisão diversa da recorrida.
Elaborada a Base Instrutória sem que fossem apresentadas reclamações, à A., aqui recorrida, cabia provar os artigos 1º a 5º, e à 1ª R. Condomínio, aqui recorrente, os artigos 22º a 28º.
Em face desses artigos em prova, o Mmo. Juiz a quo entendeu por bem sintetizar os artigos 2º, 3º, 4º e 5º de prova da A., e os artigos 23º e 24º de prova da recorrente, dando-lhes uma resposta única de «provado apenas», e que passou para a sentença recorrida sob facto provado nº 2.As verbas condenatórias surgem porque o Mmo. Juiz a quo, tendo por base os factos provados sob os nºs 2 e 23, entendeu que o desnível de «20 a 30 cm», existente entre a cabine e o patamar, decorreria da ilicitude e da culpa das RR., pois não deveria ser superior a 5 cm, e daí deverem ser responsabilizadas pelo episódio dos autos.
Esse facto assente acoplado (pela união dos artigos 2º, 3º, 4º e 5º de prova da A., e dos artigos 23º e 24º de prova da recorrente) condicionou sem mais o desfecho da decisão de que se recorre, tendo afastado o Mmo. Juiz a quo toda a prova testemunhal e documental feita pontualmente, artigo a artigo, pois que na verdade, cada facto analisado de per si e individualmente, seguramente levaria a outro entendimento daquele sufragado, como se fez por demonstrar.
Também os artigos 26º, 27º e 28º da Base Instrutória, que mereceram respostas de «não provado», se invertidas reforçam e corroboram o entendimento da recorrente, 1ª R., quanto ao episódio dos autos, levando à sua desresponsabilização (e bem assim dos demais sujeitos passivos nos autos).
Desde logo, o julgador a quo, não relevou a seguinte factualidade, amplamente tratada nas diversas sessões da audiência de discussão e julgamento, a saber: Os elevadores continuam a funcionar, nesta data, servindo diariamente centenas de pessoas, em centenas de viagens, e sem acidentes, continuando a 2ª R. a conservá-los e a servir a recorrente, como contratado; O IEP, em 2008 como hoje, não imobilizou os elevadores nem suscitou qualquer “cláusula” relativamente a qualquer eventual discrepância verificada na imobilização das cabines ao piso – e imediatamente após o episódio dos autos, o elevador nº 1 ficou a funcionar, sem a intervenção da 2ª R. em sede de avaria.
Esta factualidade, só por si, demonstra que a entidade inspectora considera a instalação segura e autoriza o seu funcionamento diário, hoje, volvidos quase cinco anos do episódio dos autos, desresponsabilizando a recorrente e a 2ª R., com todas as legais consequências.
Alegou a 2ª R. que – art. 26º da Base Instrutória – «Para repor a cabine ao piso, havendo um desnível de 20 a 30 cm, terá de ser manuseado o travão da casa das máquinas».
Ora, em face dos depoimentos das testemunhas ouvidas a este propósito, e estando assente que «após o acidente o elevador foi reposto em movimento pela colocação das linguetas no respectivo lugar» (facto assente nº 15), o desnível não podia ter sido aquele de 20 a 30 cm, pois sendo esse o desnível, só os técnicos da 2ª R. podiam – na casa das máquinas e chamados para o efeito – repor o elevador em funcionamento, o que, como se sabe, não aconteceu.
Depois, alegou a 2ª R. – art. 27º da Base Instrutória – «Com este desnível a A. teria de se baixar para passar na porta do patamar”.
Pelo que a resposta a este artigo da Base Instrutória, ainda que não fosse de «provado», deveria ter sido a de «provado apenas» que a A. não podia ter deixado de se aperceber que a parte superior da porta do patamar estava muito próxima do seu campo visual imediato, com as legais consequências.
Finalmente, alegou a A. – art. 28º da Base Instrutória – «A A. abriu a porta da cabine sem que esta estivesse imobilizada».
Registe-se que é a própria A. quem, na versão por si apresentada do episódio dos autos, nos artigos 3º e 4º da Base Instrutória, refere a dinâmica do sucedido quando alega o seguinte: Artigo 3º – «Quando a A. ia a sair, tendo já uma perna de fora e outra ainda dentro o elevador continuou a subir»; Artigo 4º – «Em virtude dessa subida, a A., caiu desamparada no patamar do 7º andar, tendo sido projectado para impulsão da subida».
Quanto mais não fosse, se é a própria A. quem refere que a cabine não estava imobilizada, o art. 28º tinha de ter sido dado como provado, de novo com as legais...
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