Acórdão nº 124/13.4PASVC.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 30 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelJO
Data da Resolução30 de Outubro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Nos presentes autos de recurso, acordam, em conferência, os Juízes da 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: No Tribunal judicial de S. Vicente, por sentença de 10/10/2013, constante de fls. 100/125, foram os Arg.

[1] JV...

, JS...

e JI...

, com os restantes sinais dos autos (cf. TIR[2], respectivamente, de fls. 21, 13 e16[3]), condenados nos seguintes termos: “…Face ao exposto decido:

  1. Condenar o arguido JV...

    , pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos art. 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alínea e) todos do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 5 (cinco) meses de prisão.

  2. Condenar o arguido JV...

    , pela prática de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, previsto e punido pelo art. 347.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de prisão.

  3. Efectuado o cúmulo das penas mencionadas em a) e b), condenar o arguido JV...

    , na pena de 3 (três) anos de prisão.

  4. Suspender a pena de prisão aplicada ao arguido JV... pelo período de 3 (três) anos de prisão, mediante regime de prova com base em Plano de Reinserção Social a elaborar pela Direcção-Geral de Reinserção Social, que deverá dar especial enfoque à inserção profissional do arguido.

  5. Condenar o arguido JS...

    , pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos art. 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alínea e) todos do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão.

  6. Condenar o arguido JS...

    , pela prática de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, previsto e punido pelo art. 347.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão.

  7. Efectuado o cúmulo das penas mencionadas em e) e f), condenar o arguido JS..., na pena de 5 (cinco) anos de prisão.

  8. Condenar o arguido JI...

    , pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos art. 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alínea e) todos do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão.

  9. Condenar o arguido JI...

    , pela prática de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, previsto e punido pelo art. 347.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão.

  10. Efectuado o cúmulo das penas mencionadas em h) e i), condenar o arguido JI...

    , na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão.

  11. Suspender a pena de prisão aplicada ao arguido JI... pelo período de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão, mediante regime de prova com base em Plano de Reinserção Social a elaborar pela Direcção-Geral de Reinserção Social, que deverá dar especial enfoque à inserção profissional do arguido.

  12. Condenar os arguidos nas custas e encargos do processo, fixando-se a taxa de justiça em 1 UC (uma unidade de conta), nos termos das normas constantes dos art. 513.º, n.º 1 e 514.º do Código de Processo Penal e art. 8.º, n.º 5 do Regulamento das Custas Processuais.

    …”.

    * Não se conformando, o Arg.

    JS...

    interpôs recurso da referida decisão, com os fundamentos constantes da motivação de fls. 130/138, com as seguintes conclusões: “…1 O arguido foi acusado e condenado, em processo sumário, pela prática de um crime de furto qualificado, que nos termos dos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alínea e) todos do Código Penal, prevê uma pena abstracta de 2 a 8 anos de pena de prisão; 2 Conforme Acórdão n.

    º 428/2013 do Tribunal Constitucional, de 15 de Julho de 2013, decidiu-se «julgar inconstitucional a norma do artigo 381º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na redacção introduzida pela Lei 20/2013, de 21 de fevereiro, na interpretação segundo a qual o processo sumário aí previsto é aplicável a crimes cuja pena máxima abstratamente aplicável é superior a cinco anos de prisão, por violação do artigo 322, n.ºs 1 e 2, da Constituição»; 3 Face à inconstitucionalidade da aplicação do processo sumário ao crime de furto qualificado, cuja pena máxima abstractamente aplicável é de 8 anos de prisão, a presente condenação é nula (insanável), como estatui a al. d) do artigo 119.º do Código do Processo Penal; 4 Devendo-se mandar repetir todo o processado nos autos; 5 Independentemente da nulidade invocada, que procede por provada, o arguido não praticou o Crime de resistência e coacção sobre funcionário, previsto e punido pelo artigo 347.º, n.º 1 do Código Penal; 6 O gesto de empunhar a navalha utilizado pelo arguido não pode ser considerado minimamente idóneo a atingir, de facto, a liberdade de acção do agente de autoridade em causa; 7 Nem constitui acção suficientemente constrangedora que pudesse (como não pode) levar ao agente policial FD..., e seu colega, a deixar de agir quando o seu dever era actuar; 8 Como refere vasta jurisprudência nacional, deverá, portanto, considerar-se importante o mal que, nas circunstâncias do caso concreto, susceptível ou adequado a fazer "dobrar" a vontade do ameaçado, segundo um critério objectivo- individual; 9 Apesar de estarmos perante um crime de perigo, exige-se para a sua consumação, enquanto crime material, que a acção violenta ou ameaçadora tenha atingido, de facto, o seu destinatário; 10 O que não aconteceu, pois bastou o Agente FD..., sozinho, para manietar facilmente o arguido; 11 As especiais qualidades dos agentes de autoridade intervenientes no caso em apreço, no que diz respeito à capacidade de cada um deles suportar/gerir pressões e determinadas situações de confronto, a actuação do arguido, que se traduz apenas em "empunhar uma navalha" e sendo algemado sem dificuldades, não é dotada de idoneidade suficiente para inviabilizar os actos funcionais acima concretizados, como o não foi.

    12 O comportamento do Arguido não se mostrou adequado a anular ou a dificultar de forma significativa a capacidade de actuação dos dois agentes da P.S.P. na ocasião em causa, tanto mais que estes possuem especiais qualidades no que diz respeito à capacidade de suportar pressões e estão munidos de instrumentos de defesa que não assistem ao cidadão comum.

    13 Em conclusão, o comportamento do arguido não preenche os elementos objectivos do crime de resistência e coacção sobre funcionário, por não integrar os contornos de violência e de ameaça grave que a norma incriminadora exige, devendo o arguido ser absolvido da prática do crime de resistência e coacção sobre funcionário.

    14 Na medida em que os agentes não sentiram constrangidos, nem foram impedidos, de exercer as funções inerentes aos deveres do cargo.

    Nestes termos e nos demais de Direito, que V. Exas. doutamente suprirem:

  13. Declarar nula (insanável) a condenação do arguido pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203.

    º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alínea e) todos do Código Penal, por inconstitucionalidade da norma do artigo 381º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na redacção introduzida pela Lei 20/2013, de 21 de fevereiro, na interpretação segundo a qual o processo sumário aí previsto é aplicável a crimes cuja pena máxima abstratamente aplicável é superior a cinco anos de prisão, por violação do artigo 32º, n.ºs 1 e 2, da Constituição, devendo-se mandar repetir todo o processado nos autos; e b) Ser absolvido o arguido pela prática do crime de resistência e coacção sobre funcionário, previsto e punido pelo artigo 347.º, n.º 1 do Código Penal, por não se verificarem preenchidos os elementos objectivos do tipo do crime.

    …”.

    * A Exm.ª Magistrada do MP[4] respondeu ao recurso, nos termos de fls. 147/160, com as seguintes conclusões: “… 1. O recurso interposto sobe nos próprios autos, imediatamente e tem efeito suspensivo do processo, cfr. artigos 406.°, n.° 1, 407.°, n.° 2, alínea a) e 408.°, n.° 1, alínea a), do Código de Processo Penal.

    1. No âmbito dos presentes autos o arguido JS... foi condenado pela prática de um crime de furto qualificado e de um crime de resistência e coacção sobre funcionário na pena única de 5 anos de prisão.

    2. Inconformado com a sentença, veio o arguido dela interpor recurso, alegando, em síntese, que (i) A sentença condenatória é nula, devendo repetir-se todo o processado, porquanto o arguido foi julgado em processo sumário pela prática de crime punível com pena de prisão superior a 5 anos, o que é inconstitucional, nos termos do Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 428/2013, de 15 de Julho de 2013; (ii) O gesto de empunhar uma navalha não preenche os elementos objectivos do crime de resistência e coacção sobre funcionário, pois não é adequada a anular ou dificultar de forma significativa a capacidade de actuação dos agentes de autoridade, por possuírem especiais qualidades no que diz respeito à capacidade de suportar pressões.

    3. O arguido apresentou a sua versão dos factos em audiência de julgamento, não tendo gozado da faculdade legal de beneficiar de prazo não superior a 15 dias para preparação da sua defesa, conforme previsto no artigo 383.°, do Código Penal e do qual foi informado, sendo que se encontrava devidamente representado por defensor.

    4. O julgamento comportou duas sessões de julgamento, por se ter considerado serem essas as necessárias, suficientes e adequadas à descoberta da verdade, tendo a Mma. Juiz de Direito redigiu a sua decisão final e procedeu à sua leitura ao arguido, não tendo aplicado pena de prisão superior a 5 anos.

    5. As provas produzidas em sede de audiência de julgamento que determinaram a decisão em crise, a serem reproduzidas em julgamento em sede de processo comum e perante tribunal Singular, com uso da faculdade prevista pelo artigo 16.°, n.° 3 do Código de Processo Penal, levariam, necessariamente, à condenação do arguido pelos crimes pelos quais foi acusado e tal como foi sentenciado pelo Tribunal a quo.

    6. Admitir a diminuição dos direitos de defesa do arguido perante um julgamento em processo sumário por um tribunal singular, seria admitir que o juiz por julgar só e se confrontar com provas evidentes e claras, se permita a não observar e fazer respeitar os elementares direitos de defesa do arguido.

    7. É do nosso entendimento que não foram violadas quaisquer...

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