Acórdão nº 145/13.7TMLSB.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 30 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelANA LUSA GERALDES
Data da Resolução30 de Outubro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I – 1. M...Instaurou acção de divórcio sem consentimento do outro cônjuge contra:N...Pedindo o divórcio.

Alegou, para tanto, que A. e R. contraíram casamento em 11/7/1992, porém, durante os anos de casamento o R. por diversas vezes agrediu física e psicologicamente a Autora. Daí que esta, na sequência de uma agressão ocorrida no início de Janeiro de 2012, saiu de casa com o filho e não pretende retomar a vida em comum com o R.

Como causa de divórcio invoca a separação de facto há mais de um ano e a ruptura em definitivo da vida comum.

  1. Foi efectuada tentativa de conciliação, a qual se frustrou. E o R. contestou, argumentando, em síntese, que ambos continuam a viver juntos e que foi a Autora que saiu de casa sem ter havido qualquer discussão ou agressão, porquanto reencontrou, ao fim de todos estes anos, colegas da sua antiga escola, com quem passou a conviver e a sair de casa, fazendo vida de solteira.

    Razão pela qual a acção deve ser julgada improcedente.

  2. Realizada a audiência de julgamento foi proferida sentença na qual o Tribunal “a quo” julgou a acção improcedente, não decretando o divórcio, nem pondo termo ao casamento celebrado entre a Autora e o Réu.

  3. Inconformada a Autora Apelou, tendo formulado, em síntese, as seguintes conclusões: 1.

    A sentença recorrida merece censura quer quanto à matéria de facto quer quanto à aplicação do direito 2.

    Quanto à matéria de facto o Tribunal “a quo” deu erradamente como provado (nº 21 da sentença recorrida) que “O réu sustenta o agregado familiar, composto pela autora réu e filho, pagando todas as suas despesas, cuidando da sua alimentação, fazendo o almoço e o jantar e preparando as suas refeições” e, por outro lado, deu erradamente como não provado os seguintes factos, que constam sob os números 9, 10 e 11, na sentença recorrida: “O filho de A. e R. tem problemas psicológicos, o que contribuiu para a decisão da A. regressar a casa; - Não há da parte da A. o propósito de retomar a vida em comum com o R.; - A. e R. fazem vidas completamente separadas”.

  4. Porque foram incorrectamente julgados, como resulta claramente da prova testemunhal, deverá o Venerando Tribunal “ad quem” proferir decisão que venha a considerar não provado o facto constante no nº 21 da sentença recorrida (dado como provado) e por outro lado os constantes nos nºs 9, 10 e 11 (dados como não provados), passem a provados.

  5. A factualidade vertida nos autos e considerada na sentença recorrida, a que acrescem as alterações ora preconizadas, conduzirá necessariamente à conclusão que Recorrente e Recorrido estão separados de facto há mais de um ano, situação que constitui fundamento de divórcio nos termos do art. 1781º, alínea a), do CC, conforme alegado pela ora Recorrente no seu requerimento de divórcio.

  6. Com efeito, é reconhecido pelo Tribunal “a quo” que à data da interposição da acção, 23/01/2013, se encontrava verificado o fundamento do divórcio, ou seja, a separação de facto há mais de um ano, pois foi dado como provado que a Recorrente saiu de casa no dia 2 de Janeiro de 2012, tendo regressado no dia 1 de Agosto de 2013 (vide nºs 18 e 20 dos factos provados).

  7. Errou o Tribunal “a quo” quanto ao alegado “regresso” da Recorrente a casa e às consequências deste, e quando entendeu que “Nestes termos, houve uma separação de facto por mais de um ano, mas que terminou com o regresso da A. a casa em Agosto de 2013, o que não permite a verificação do fundamento previsto na al. a) do art. 1781º do CC.” 7.

    Face ao que o art. 1782º do CC esclarece dever ser entendido por separação de facto, verificada esta há mais de um ano, era necessário apurar se os cônjuges voltaram à comunhão de vida ou se algum deles ou ambos mantêm o propósito de não a restabelecer, pois como é jurisprudência unânime e é reconhecido na própria sentença recorrida, a unidade residencial ou habitacional não é suficiente para concluir pela comunhão de vida entre os cônjuges.

  8. Para que o pedido de divórcio improcedesse, o regresso da A. à casa, tinha que significar o restabelecimento da comunhão de vida do casal e esta efectivamente não aconteceu e, pelo menos a A./Recorrente, não pretende restabelecer essa comunhão, razão pela qual prosseguiu com o divórcio.

  9. O regresso a casa da Recorrente justificou-se, como resulta da prova, com o facto desta estar desempregada, e não poder custear uma renda e por causa do filho e a pedido deste.

  10. O que a prova produzida demonstra é que os cônjuges, Recorrente e Recorrido, fazem vidas separadas, como se casados não fossem. A Recorrente passa grande parte dos dias e noites em casa dos pais, convive e sai com os amigos sem ser acompanhada pelo Recorrido. Não comparecem a festividades juntos, nomeadamente às consideradas de família; não são vistos juntos pelos familiares, nem existe comunhão de leito entre os mesmos. Esta situação resulta dos depoimentos de A..., minuto 3’58”, minuto 12’53, J..., minuto 8’56” e M..., minuto 20’53” 11.

    É jurisprudência unânime que a residência em comum dos cônjuges não é facto suficiente para concluir que existe entre os mesmos comunhão de vida. Vide, entre outras, a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa no processo 1783/06.0TMLSB.L1-7, datada de 13-09-2011, consultável em http://www.dgsi.pt/jtrl.: “I – É certo que, por via de regra, à separação corresponderá a habitação em residências diferentes, todavia, nada impede que, apesar de habitarem na mesma casa, não exista comunhão de vida entre os cônjuges, designadamente, por não tomarem refeições em comum e dormirem deliberadamente em apartamentos separados, como se casados não fossem.” 12.

    Ou a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Évora, no processo 550/10.0TMSTB.E1, datada de 14-11-2013, consultável em http://www.dgsi.pt/jtre: “II – A separação de facto pelo período de um ano consecutivo como fundamento de divórcio previsto na al. a), do art. 1781º, do Código Civil, exige, em primeiro lugar, a verificação de um elemento objectivo, constituído pela falta de vida em comum dos cônjuges, a que acresce um elemento subjectivo, que consiste no propósito, da parte de ambos os cônjuges, ou de um deles, de não restabelecer a comunhão de vida matrimonial”.

  11. Nos presentes autos, comprovado que os cônjuges estiveram a residir separados mais de um ano, o facto da Recorrente ter voltado à casa de morada de família não significa a interrupção dessa separação, porquanto o regresso não teve por finalidade restabelecer a vida em comum com o Recorrido, mas foram outras circunstâncias que determinaram o seu regresso.

  12. Encontra-se preenchido e verificado o elemento objectivo a que alude o acórdão supra referido, tal como se encontra verificado o elemento subjectivo, dado que a A./Recorrente não pretende restabelecer a comunhão de vida com o Recorrido, como resulta logo do facto de prosseguir com o divórcio 15.

    A sentença recorrida viola, assim, as previsões dos artigos 1781º alínea a) e 1782º do Código Civil.

  13. Termos...

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