Acórdão nº 2611/10.7TVLSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 11 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelTERESA ALBUQUERQUE
Data da Resolução11 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa I - A “Companhia de Seguros …, S A”, intentou acção declarativa de condenação com processo ordinário, contra V…, pedindo que seja declarada a anulabilidade da adesão do R. à apólice de seguro n.º 5683771.

Alega que no exercício da sua actividade seguradora celebrou com a Nova Rede um contrato de seguro, do Ramo Vida (Grupo), titulado por aquela apólice, destinado, entre o mais, a cobrir os riscos de invalidez dos mutuários de processos de concessão de crédito à habitação da Nova Rede, e que, em 26/2/2002, o R. apresentou à A. uma proposta de adesão à citada apólice, para garantia de processo de crédito à habitação a conceder no montante de € 349.160,00. A A. procedeu à análise do risco proposto com base na informação prestada e subscrita pelo R., que no questionário subscrito não referiu sofrer de doença, nomeadamente do foro psiquiátrico, não tendo nele mencionado que em 1995 e em 2001 recorreu a consultas de psiquiatria por apresentar sintomatologia depressiva. Refere que se estes factos tivessem sido declarados no momento da adesão, a patologia psíquica teria sido excluída da aceitação do seguro.

O R. contestou dizendo, em síntese, que as consultas a que a A. faz referência constituíram episódios ligeiros e banais, de significância nula, e que, quando aderiu ao seguro não padecia de qualquer doença, além de que uma pessoa com o quadro clínico alegado na PI nunca poderia ter uma ficha profissional como a dele. Mais refere que a psicose paranóide que o inabilitou profissionalmente só eclodiu entre 2005 e 2007 e foi diagnosticada em 2007, não se tratando do agravamento de uma situação clínica anterior, tanto mais que era sujeito a exames pela Medicina do Trabalho, nunca tendo sido detectado qualquer problema.

E deduziu reconvenção pedindo que a A. seja condenada a pagar: a) ao Banco …, o valor em dívida do empréstimo para a aquisição de habitação, à data do sinistro; b) a ele, R., o remanescente até esgotar o capital seguro de € 349.160,00; c) a ele, R., os juros cobrados pelo Banco … pelo capital emprestado entre a data do sinistro (data da reforma do R) e a data do pagamento da A. a essa entidade bancária, a liquidar em execução de sentença; d) os juros de mora desde 28/1/2010, data em que reclamou o pagamento à A. e esta se recusou a fazê-lo.

Alegou ter celebrado com a Banco… um contrato de seguro do ramo vida (grupo), titulado pela apólice n.º 5683771, destinado a cobrir os riscos de morte e invalidez dos mutuários de processos de concessão de crédito à habitação da Nova Rede, pelo capital fixo de € 349.160,00, e que em 2007 lhe foi diagnosticada psicose paranóide, doença incapacitante e que o levou à reforma por invalidez em Maio de 2009, com uma incapacidade permanente global de 85%, e que continua a pagar o empréstimo da casa, bem como os juros devidos pelo empréstimo.

Houve réplica, impugnando a A. o pedido reconvencional com os fundamentos já invocados na petição inicial.

Foi proferido despacho convidando a A. a esclarecer alguns aspectos da petição inicial, convite que aquela aceitou e a que o R. respondeu.

Foi elaborado despacho saneador e foi seleccionada a matéria de facto.

Realizado julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente, absolvendo o R. do pedido, e a reconvenção parcialmente procedente, condenando a A.: A - a pagar ao Banco … SA, do capital seguro, o montante em dívida no dia 01/07/10, do empréstimo para a aquisição de habitação contraído pelo R. a liquidar em incidente de liquidação, até ao limite de € 349.160,00; B - a pagar ao R. os juros do referido empréstimo, que o mesmo pagar desde a data da liquidação até ao pagamento pela A. ao BCP; C – a pagar ao R. os juros de mora à taxa legal, sobre o montante que vier a ser liquidado, desde a data da liquidação até integral pagamento.

II – Do assim decidido, apelaram A e R.

A – A A. concluiu as respectivas alegações nos seguintes termos: 1º - A prova produzida nos autos, quer a documental, quer a testemunhal, avaliada e interpretada globalmente pelo seu conjunto, conjugada entre si mesma revela que o M. Juiz a quo não considerou provados factos sobre os quais foi feita prova em audiência – que as respostas dadas no questionário clínico são essenciais para a decisão da Companhia aceitar ou não o contrato de seguro.

  1. - O mesmo é dizer que a matéria fáctica permite concluir por uma resposta positiva aos artºs 1º e 4º da douta BI. Que deve ser objeto de resposta positiva.

  2. - O caso dos presentes autos é abrangido pelo regime, então vigente, do artº 429º do Cód. Comercial, subordinado às consequências legais ali contempladas, mas também aos respectivos pressupostos de facto e direito; 4º - Está documentado nos autos que, à data do preenchimento e entrega do boletim de adesão (26/02/2002), o R. padecia já de perturbação ou doença e tomava medicação que ocultou à seguradora.

  3. – O Réu, quer nas respostas ao questionário anexo ao boletim de adesão, em 22/02/2002, quer nas do questionário do exame médico de, por si também subscrito, negou a existência de todas as perturbações do seu estado de saúde ou doenças, já diagnosticadas; como negou também que tinha tomado medicação.

  4. – Não cabe ao proponente decidir quais os factores que têm interesse para a análise de risco por parte do segurador, nem lhe é lícito ter como pressuposto que nos questionários são formuladas perguntas inúteis; 7º - Ao segurador cabe a faculdade de exercer o direito ao esclarecimento sobre as situações do estado de saúde declaradas, como legalmente e contratualmente lhe é conferido pelo artº 17º do Dec. Lei 176/95, de 26/7, e pela cláusula inserta na proposta de adesão; não pode é exercer tal faculdade em relação a situações ocultadas; 8º - E, de modo algum, lhe é exigível que investigue sobre a autenticidade das declarações do proponente; o contrato de seguro é formado com a confiança na boa fé implícita nas declarações negociais; 9º – O R. respondeu a perguntas concretas e especificamente colocadas nos questionários, não tendo declarado ou tendo prestado informação errada, sobre as doenças e perturbações do estado de saúde que o afetavam e das quais tinha pleno conhecimento e que lhe causavam sofrimento; 10º - A conduta do R. induziu a A. em engano, assim como, a impediu de realizar uma correcta avaliação sobre a “pessoa a segurar” e sobre a extensão dos riscos propostos; 11º – As declarações inexactas e/ou omitidas, por parte do R., viciaram a vontade negocial da Ré, influíam e influenciaram, no caso concreto, a decisão de aceitação do seguro proposto, bem como a fixação das estipulações do respectivo clausulado.

  5. – Por via disso, atento o disposto no artº 429º do Cód. Comercial e do artº 2º-4 das Condições Gerais da Apólice, o contrato de seguro documentado nos presentes autos é anulável, mormente, no que respeita à cobertura do risco de invalidez por doença.

  6. – Para que se verifique a anulabilidade do contrato não se exige que as declarações inexactas do R. tenham sido dolosas, bastando que tenham sido negligentes; 14º - O citado artº 429º Cod. Comercial também não exige como pressuposto da anulação a existência de nexo de causalidade entre os factos inexactos ou omitidos e o sinistro.

  7. – Em razão do exposto e de conformidade com a quase unanimidade da Jurisprudência, deve ser decretada a anulabilidade do contrato de seguro relativamente à adesão proposta pelo réu.

  8. - Deve pois ser declarada a anulabilidade da adesão da R. à apólice de nº 5683771 – tendo sido assim declarado procedente e provado o pedido da A. Apelante e improcedente por não provado o pedido reconvencional deduzido pelo R..

  9. - As respostas dadas ao questionário clínico que consta da proposta de seguro são essenciais para a seguradora poder avaliar o risco e determinar se pretende ou não celebrar determinado contrato de seguro e, em caso afirmativo, em que condições.

  10. – No caso dos autos, as declarações do R. foram fundamentais, mesmo determinantes para que a Companhia de Seguros possa aferir o nível de risco, baseado nas respostas ao questionário de saúde e, consequentemente, decidir se aceita ou não o risco.

  11. - O R., com a omissão dos diversos e relevantíssimos dados sobre o seu estado de saúde viciou a vontade da seguradora. Se a Apelante tivesse tomado conhecimento dos factos reais, nomeadamente que, um ano antes o R. tinha tido tratamento psiquiátrico e que tinha tomado Socian e Pacinone, não tinha aceite a cobertura de incapacidade permanente para doenças psiquiátricas, dado que, além do mais, os seus resseguradores não aceitam tal risco.

  12. - É evidente que o somatório de omissões cometidas pelo R. Apelado no preenchimento do questionário, sonegaram à seguradora importantes elementos que objetivamente eram susceptíveis de influenciar a representação do risco.

  13. - O R. Apelado, ao preencher o questionário de adesão, faltou à verdade e omitiu informação sobre o seu estado clínico e antecedentes que não podia ignorar, negou a existência de doença ou perturbação que não podia desconhecer com manifesta relevância para a avaliação do risco do seguro.

  14. - Se à Apelante tivesse sido dado conhecimento das consultas de psiquiatria e da medicação prescrita pelo psiquiatra ou lhe tivesse sido feita referência à existência ou pré-existência do neuroticismo depressivo não aceitaria a invalidez permanente no caso de doenças psiquiátricas.

  15. - A conduta do Apelado induziu a A. em engano, assim como, a impediu de usar aquela faculdade e de realizar uma correta avaliação sobre a “pessoa a segurar” e sobre a extensão dos riscos propostos; 24º- As declarações inexatas prestadas pela tomadora, viciaram a vontade negocial da Ré, influíram em abstrato e influenciaram, no caso concreto, a decisão de aceitação do seguro proposto, bem como, a fixação das estipulações do respetivo clausulado.

  16. - Por via disso, atento o disposto no art 429º do Cód. Comercial e do artº 24 das Condições Gerais da Apólice, o...

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