Acórdão nº 2317/11.0TVLSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 17 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelEDUARDO AZEVEDO
Data da Resolução17 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa … e … propuseram acção declarativa com processo ordinário contra “…Lda”.

Pediram: a condenação da R a eliminar o defeito alegado, no prazo de 30 dias, procedendo à execução das obras constantes no orçamento e findo tal prazo a pagar a quantia de 50,00€ por cada dia de atraso na execução ou, em alternativa, proceder ao pagamento de 15.814,31€, valor das obras; a condenação da R a pagar o montante que terão de despender com alojamento no decurso das obras, em montante não inferior a 1.500,00€, as despesas tidas com o exame acústico, no valor de 553,50€, bem como, a título de danos morais, valor nunca inferior a 20.000,00€; e subsidiariamente, caso se verifique a inviabilidade da eliminação do defeito, a redução do negócio em quantia não inferior a 29.000,00€.

Alegaram, em síntese: a R construiu e vendeu-lhes a fracção identificada nos autos, onde residem e aquando da compra e negociações garantia que a fracção apresentava uma qualidade acima da média, nomeadamente a nível construtivo; após a aquisição e só depois de as demais fracções terem sido ocupadas detectaram que se ouviam ruídos de intensidade anormal não compatível com insonoridade exigida para aquele tipo de construção, o que denunciaram à R em 2007 e que respondeu que tal só ocorria devido a não ser total a ocupação do imóvel; tal obrigou, ainda assim, à mudança da caixilharia com o que despenderam 7.500,00€; os barulhos foram intensificados em 2010 com a ocupação, o que os levou a interpelar a R em 2011, tendo esta apenas assumido que tal decorria do barulho anormal produzido pelos vizinhos; solicitaram um exame acústico no qual se concluiu por falta de isolamento nalgumas das divisões e exigiram a reparação à R, mas sem sucesso; o custo para o isolamento da sua fracção é no valor de 15.814,31€ e as obras implicam a sua saída e do agregado familiar da fracção, com custos nos termos peticionados; a situação, designadamente, perturba-os no sono e tranquilidade, o que se tem repercutido a nível profissional e académico, bem como familiar; e, por isso, devem ser ainda ressarcidos a título de danos morais.

A R contestou, em súmula, excepcionando a caducidade do direito dos AA e alegando: no quarto do casal não existe qualquer desconformidade a nível acústico e se existir na sala não é compatível com o tipo de obras que os AA exigem, devendo ser apenas proporcionais a esta divisória; e nem as obras se prendem com a desconformidade alegadamente verificada, nem se verificam os pressupostos dos demais pedidos, quer patrimoniais, quer morais.

Os AA replicaram respondendo à excepção e mantendo a sua posição inicial.

Foi proferido despacho saneador, relegando-se o conhecimento da excepção de caducidade para a decisão final e fixando-se os factos assentes bem como a base instrutória, sem que reclamação houvesse.

Os AA ampliaram o pedido, que foi admitido, pretendendo: no pedido formulado em 1) do petitório se preveja a condenação da R a eliminar o defeito, no prazo máximo de 30 dias, designadamente procedendo á execução das obras enumeradas no orçamento junto, bem como à substituição e isolamento do pavimento da sua e das fracções com ela confinantes, mantendo o demais pedido neste ponto; e, além do valor orçamentado de 15.814,31€, com vista à eliminação do defeito, que a R proceda ainda ao pagamento das demais quantias necessárias a tal fim, que se vierem a apurar em sede de liquidação de sentença.

Efectuou-se audiência de julgamento.

Proferiu-se sentença, em 13.01.2014, pela qual se decidiu a matéria de facto e condenou-se a R a pagar aos AA “o valor a liquidar e correspondente à desvalorização concreta do imóvel decorrente do defeito acústico, circunscrito à suíte em 1 dB e à sala em 6 dB, aferindo-se o valor da fracção tendo por base esse defeitos e condenando a ré a pagar a diferença entre o valor da fracção pago pelos AA e o valor da fracção tendo em conta o defeito acústico provado”, assim como o valor de 553,50€, acrescido de juros desde a citação e até integral pagamento, á taxa legal, consequentemente, absolvendo-se a mesma do demais peticionado contra si.

A R e os AA recorreram, estes subordinadamente, recursos admitidos como apelação, com subida nos autos, imediatamente e efeito devolutivo.

A R extraiu as seguintes conclusões: (…) e) No que concerne aos alegados ruídos ouvidos pelos ora Apelados, constantes do ponto 6. da matéria dada como "Provada" pela douta Sentença há que ter em conta que, conforme consta do Relatório Pericial, "tais ruídos são resultado na "normal vivência" dos vizinhos"; f) Concluindo a Senhora Perita que as referidas desconformidades [obtidas na sala do 4.° B (sala de estar dos ora Apelados) e na suite do 4.° B (quarto dos Apelados)] resultam "(...) não só do isolamento sonoro deficiente de alguns elementos de construção (neste caso os elementos de separação horizontal) como do forte isolamento sonoro das paredes exteriores que reduzindo o ruído residual no interior propicia uma melhor audição/identificação dos sons da vizinhança"; g) Sendo que, conforme apurado pela Senhora Perita Eng. ,,, nomeada, bem como pela prova produzida naqueles autos, os valores verificados nomeadamente na suíte e na sala da fracção dos ora Apelados se devem: (i) ao forte isolamento exterior da fachada, fruto da substituição de toda a caixilharia e janelas pelos AA. (conforme alegado no art. 15.° da P.I.), bem como, (ii) aos elementos de separação horizontal, no que concerne ao pavimento da fracção do 5.° B, decorrente da alteração do pavimento pelo morador daquela fracção para mármore; h) Resultando da douta Sentença, no que respeita à substituição da caixilharia das janelas da fracção dos AA.: “(...) o que é certo é que com tal actuação potenciaram a percepção ruídos"; i) Por seu turno, no que respeita aos elementos de separação horizontal, no que concerne ao pavimento da sala do 5.° B, resulta da douta Sentença: "A testemunha …, engenheiro civil que acompanhou a obra do imóvel e reparações no pós-venda, referiu a qualidade da construção e a forma como o piso do 5° B foi colocado e ainda que este é de mármore, sendo os demais de soalho flutuante, possibilidade concedida aos compradores, dado que a maioria das aquisições foram feitas em planta. O mesmo foi confirmado pelo projectista …"; j) Sendo que, e provada tal alteração de pavimento por parte do morados do 5.° B, Senhor …, deverá ainda, face aos esclarecimentos prestados pela Senhora Perita Eng. .., resultar inequívoco que a desconformidade do valor de ruído na sala dos AA. advém do facto de o piso do 5.° B ser de mármore (cfr. esclarecimentos prestados pela Senhora Perita, quando refere “(…) o mármore é diremos, a pior das soluções em termos de isolamento sonoro ou ... imperceptível... percussão”); k) Ou seja, decorrendo dos depoimentos prestados (tendo ainda sido essa a convicção do Tribunal a quo) que a alteração de pavimento flutuante para um pavimento em mármore foi da iniciativa do morador da fracção do 5.° B, Senhor …, resultará evidente, s.m.o. que doutamente os Venerandos Juízes Desembargadores doutamente suprirão, que aquela alteração/substituição não pode ser imputável à ora Apelante, enquanto construtora daquele prédio dado que tal se deveu a uma exigência do comprador; l) Por seu turno, no que respeita à substituição da caixilharia por parte dos AA., importa confrontar o depoimento da testemunha …, Engenheiro especialista em acústica, quando refere que o facto de haver um grande isolamento da fracção do exterior (adveniente da alteração das caixilharias) se dá o fenómeno denominado de "mascaramento" do som, sendo que o "(.,.) aumentando o isolamento deixamos de ouvir o ruído do exterior e passamos a ouvir mais o ruído do interior"; m) Nestes termos, e tendo a MMa. Juíza do Tribunal a quo concluído que "nem o pedido de reparação nem o pedido do valor da reparação podem proceder", haveria que, "aferir qual a solução que poderá responder ao direito dos AA.", tendo sido apenas nesta fase que a Justiça se frustrou.

  1. Ora, tendo a MMa. Juíza do Tribunal a quo concluído que não poderia ser assacada à Apelante a responsabilidade na alteração do pavimento do 5.° B (de flutuante para mármore), nem podendo ser ordenada a "reparação" daquele pavimento dado que estamos perante um terceiro que não é parte na acção (sendo que tal buliria com o direito de propriedade daquele vizinho), bem como que a alteração da caixilharia por parte dos AA. impediu o "mascaramento" dos ruídos, e não tendo sido peticionada pelos Apelados a resolução do contrato, considera que "restaria apenas a redução do preço, e ainda a norma que lhes permite ser indemnizados nos termos gerais - art. 1222.° e 1223.° do CC"; o) Sucede que, tal desvalorização do imóvel, ainda que a conceder, não poderá ser imputável à ora Apelante dado que o previsto no Projecto de Construção e sugerido aos compradores da fracção é um pavimento flutuante, bem como a caixilharia original a qual a maioria dos moradores ainda mantém; p) Notando que para a aplicação deste instituto de "redução do preço", previsto no âmbito das empreitadas, pressupõe-se a existência de um defeito, causado pelo empreiteiro (por culpa sua); q) Nestes termos e de forma a Apelante Responsabilizada civilmente, torna-se necessária que a existência dos defeitos seja imputável à conduta do empreiteiro (ou seus colaboradores) a título de culpa, existindo, em certos casos presunção de culpa por parte do empreiteiro; r) Ainda assim, e admitindo que o dono de obra beneficie da presunção da existência dos defeitos, nos termos do art. 799.° n.° 1 do C.C., há que apurar se tal presunção foi ilidida pela ora Apelante, a qual bastará demonstrar que o cumprimento defeituoso não procede de culpa sua; s) Tecidas tais considerações, dúvidas não subsistem que, in casu, tal presunção de culpa foi ilidida pela ora Apelante dado que resultou provado que tais desconformidades acústicas se deveram: (i) ao...

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