Acórdão nº 4790/05.6TCLRS.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 09 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelMARIA ADELAIDE DOMINGOS
Data da Resolução09 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 1.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa I – RELATÓRIO CV e AM intentaram ação de simples apreciação, sob a forma de processo ordinário[1], contra Herança Indivisa de FM representada por Hermínia de JM, na qualidade de cabeça-de-casal e herdeira, pedindo que, com a procedência da mesma, fosse proferida decisão no sentido de reconhecer que: 1.“O direito de crédito, proveniente da venda da quota da sociedade «SAS, Lda.», art. 3º da pi, era um bem comum que fazia parte do acervo hereditário da mãe dos AA., sendo a herança desta quanto a este bem, correspondente a €10.474,76, a cujo valor, nas quotas-partes que se vierem a definir, estes teriam direito, devidamente actualizado, como se o tivessem aplicado, i.e., investido, correspondendo à data de Junho de 2005, a €69.586,90;” 2. “Também da parte que caberia ao pai dos AA. (€13.966,35), quer como meeiro (€10.474,76), quer como herdeiro (€3.491,59), cujo valor actualizado à data de Junho de 2005, corresponderia a €139.173,89 no aludido direito de crédito, têm direito os AA. à respectiva quota-parte que lhes pertença em termos sucessórios (2/3, i.e.

, €92.782,59), e porque assumiu a natureza de bem próprio para a R., não pode esta mear, mas tão somente herdar;” 3.“À actualização deve proceder-se tendo em conta a tabela de reembolso para os certificados de aforro, série A, tendo em consideração a data de constituição do crédito (Maio de 1985) e a data em que vier a ser reconhecido e integrado na massa hereditária das heranças a partilhar por óbito dos pais dos AA.;” 4.“O direito a que venham integrar a massa hereditária a partilhar, os montantes constantes das contas existentes em nome de: - MHM e FM, pelo menos desde Maio de 1984, no Banco P, Banco C, ou qualquer outro Banco, devidamente actualizados, nos mesmos termos e que vierem a ser apurados;” 5.“Uma vez que os direitos supra referidos foram integrados totalmente no património do pai dos AA, pela sua satisfação deve responder a herança deste;” 6.“A quota de Esc. 3.600.000$00/€17.956,72, no capital da sociedade AB, Lda, subscrita pelo pai dos AA. em 19 de Novembro de 1992, é, também ela, um bem próprio do pai dos AA, não tendo esta direito a qualquer meação”.

Para fundamentarem a sua pretensão, alegaram, em síntese, a sua qualidade de filhos e herdeiros de FM, falecido em 16/09/2002, e da primeira esposa deste, MHM, falecida em 21/06/1985, com quem era casado em regime de comunhão geral de bens.

Mais alegam que seu pai voltou a casar em 09/01/1987, com a ré HM, no regime de comunhão de adquiridos.

Defendem que têm direito a ver declarado que o direito de crédito proveniente da venda das quotas da sociedade SAS, Ld.ª, de que seu pai era titular, realizada em 07/05/1985, consubstanciado em 28 letras de câmbio, integrou o património comum daquele e da sua então mulher, MHM, porquanto a entrega dos títulos de crédito ao seu falecido pai em pagamento das aludidas quotas ocorreu ainda em vida da mãe dos autores, e só após a morte desta teve lugar o seu endosso.

Mais sustentam os autores que o seu pai adquiriu, em agosto de 1985, já após a morte da mãe daqueles, mas antes de contrair matrimónio com a ré, uma quota na sociedade AB, Ld.ª, o que veio a permitir que o mesmo, mais tarde, viesse a participar no aumento de capital realizado, o que, no seu entender, se integra na previsão do disposto no artigo 1722.º, n.º1, alínea c), do Código Civil, devendo essa quota correspondente ao aumento de capital ser considerada bem próprio do de cujus.

Aduzem ainda que o pagamento da subscrição em causa fora realizado mediante entrega de um cheque sacado de conta bancária da exclusiva titularidade do falecido até 16/01/99, a qual era provisionada com as poupanças dos seus pais e quantias provindas da sociedade AB, Ld.ª, tendo, por este motivo, também a aquisição da quota origem em bens próprios daquele.

Também alegam que integra o acervo hereditário por morte de sua mãe o montante constante das contas existentes em nome daquela ou do seu falecido pai pelo menos desde Maio de 1984.

Contestou a ré por impugnação, alegando, em suma, que o valor do desconto das letras destinou-se ao pagamento de dívidas do casal constituído pelos progenitores dos autores e que, com a parte sobrante, o seu falecido marido adquiriu a quota da sociedade AB, Ld.ª, pelo valor de 400.000$00 (€1.995,19), aceitando que tal valor seja um bem próprio do falecido.

Já o aumento de capital foi realizado na pendência do matrimónio com o falecido pai dos autores, pelo que é um bem comum do casal.

Quanto às contas bancárias, à data do seu casamento com o pai dos autores, a conta n.º 0520721 apresentava um saldo de 277.928$00 (€1.386,30).

No mais, impugna o alegado, pugnando pela improcedência da ação e absolvição do pedido.

Foi realizada audiência preliminar, conforme consta de fls. 216 e, posteriormente, proferida decisão parcial quanto ao mérito da causa, nos termos que constam de fls. 222-225 (datada de 09/03/2012), já transitada em julgado, com o seguinte teor: “…julga-se improcedente o pedido formulado de que “venham a integrar a massa hereditária os montantes constantes das contas existentes em nome de FM e de MM e de HM, no Banco P., Banco C, ou qualquer outro Banco, devidamente actualizados, nos mesmos termos e que vierem a ser apurados.”[2] Foi proferido despacho de saneamento e condensação da causa, com elaboração da matéria de facto assente e da base instrutória.

Realizado o julgamento, foi proferida, em 18/09/2013, a sentença junta a fls. 304-313, que decidiu do seguinte modo: " …o Tribunal decide julgar a ação parcialmente procedente, por parcialmente provada e, em consequência: 1 – Declara os títulos de crédito consubstanciados em 28 letras no valor de 150.000$00/€748,20, cada, entregues a FV como forma de pagamento do preço da transmissão da quota detida na sociedade «SAS, Lda», bem comum do casal constituído por este e por MHM tendo, nessa medida, integrado a herança deixada por esta à data da sua morte, ocorrida em 21 de junho de 1985.

2 – Declara constituir bem próprio de FM as quotas por este adquiridas em 28 de agosto de 1985, no valor nominal de cento e cinquenta mil escudos e no valor nominal de duzentos e cinquenta mil escudos, no mesmo ato unificada num única quota no valor nominal de quatrocentos mil escudos, da sociedade «AB, L.da», e, bem assim, a quota de três milhões e seiscentos mil escudos resultante da escritura pública de cessão de quotas e aumento de capital celebrada pelos sócios da empresa «AB, Lda», nos termos constantes do documento junto a fls. 53 e segs., mediante o reforço de nove milhões de escudos em numerário, em 19 de novembro de 1992, sem prejuízo da eventual compensação devida ao património comum, no que concerne ao valor correspondente ao aumento de capital.

3 – Julga improcedente o mais peticionado e não abrangido pela decisão proferida a fls. 222 e segs.” Inconformados, apelaram os autores e a ré, apresentando as conclusões de recurso que abaixo se transcrevem.

A ré também apresentou contra-alegações.

Conclusões da apelação dos autores: I- A sentença proferida não conheceu integralmente dos pedidos formulados pelos AA. na sua p.i., designadamente, o seguinte: - Uma vez que os direitos supra referidos foram integrados totalmente no património do pai dos AA. , pela sua satisfação deve responder a herança deste.

II- A decisão errou ao não proceder à actualização do valor do direito de crédito reconhecido e na escolha das normas aplicáveis: Dos factos: - Desconsiderou a decisão que houve sonegação, apropriação e fruição de bens indevida pelo pai dos AA., ou seja deslocação patrimonial de um património comum, para um património pessoal e depois integração noutro património comum, constituído com a R., em prejuízo dos AA.; - Que se não fora os AA . terem interposto a presente acção, prévia à instauração do inventário, não veriam reconhecidos os bens como pertencendo ao acervo hereditário; - Que os bens deviam ter integrado património hereditário desde 21/06/85 e que pelos actos dolosos do pai dos AA., continuados pela R., tal não sucedeu, após o decesso daquele e que os AA. só vêem reconhecido o seu direito em 2013.

- Que o poder aquisitivo dos bens que faziam parte do acervo hereditário, correspondentes a 28 letras no valor de € 748,20, cada, no total de € 20.949,51, é um valor irrisório à data em que foi proferida a sentença, 18/09/2013, comparativamente só com a actualização de acordo com o índice de preços.

- Que a decisão de não actualizar e remeter os AA., novamente, para uma acção, constitui denegação de justiça, quando o tribunal dispõe de todos os elementos necessários à correcta e justa decisão; Do direito: -Não se trata de uma obrigação pecuniária, strictu sensu, nascida da celebração de um contrato, como contraprestação de bens ou serviços, esta sim sujeita ao princípio nominalista, ínsito no artº 550 do Código Civil.

- Atenta a não declaração dos bens, em sede de processo de imposto sucessório, a sua apropriação pelo pai dos recorrentes, permite aos AA. solicitar, em sede de inventário, que o Pai e depois do seu falecimento, por decorrência, a R., não viessem a beneficiar desses mesmos bens – artº 2096 do Código Civil; - Tendo o direito de crédito se consubstanciado numa correspondente quantia de dinheiro, coisa fungível, o artº 1271 do Código Civil, prescreve que o possuidor de má fé está obrigado a entregar os frutos que a coisa produziu até ao termo da posse e responderia, pelo valor daqueles que um proprietário diligente poderia ter obtido, ao rentabilizá-lo – Restituir o poder aquisitivo que a mesma representa, aferido à data da restituição.

- A não integração na massa hereditária de um direito de crédito (em substituição dos títulos de crédito), sem ser actualizado, implica o enriquecimento sem causa de quem se apropriou indevidamente de património, com o inerente empobrecimento dos AA., e como última beneficiária a R., alheia à relação...

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