Acórdão nº 512/14.9YRLSB-A-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 30 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelROQUE NOGUEIRA
Data da Resolução30 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: 1 – Relatório.

  1. moveu acção arbitral necessária contra Z.., apresentando petição inicial, onde formula os seguintes pedidos: «Deverá a Demandada ser condenada a abster-se de, em território português, ou com o objetivo de comercialização nesse território, importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer os medicamentos genéricos contendo como principio ativo o B.,enquanto a EP52670B e correspondente CCP 131 estiverem em vigor.

    Mais deve ser a Demandada condenada a não transmitir a terceiros as AIM identificadas no artigo 54° desta petição, até à referida data de caducidade do direito ora exercido.

    Requer-se, ainda, que, nos termos do artigo 829-A do Código Civil, seja a Demandada condenada a pagar uma sanção pecuniária compulsória de valor não inferior à média diária de vendas do medicamento T. no mercado português, por cada dia de atraso no cumprimento da condenação que vier a ser proferida nos termos acima requeridos, atendendo que a média anual de vendas do medicamento T. no mercado português ascende a € 9.629.096,00 (nove milhões, seiscentos e vinte e nove mil e noventa e seis euros)».

    Citada a demandada, a mesma contestou, designadamente por excepção, alegando que os seus pedidos de AIM foram por si apresentados em 30/5/12, tendo sido publicados na página electrónica do I. no dia 21/6/2006, nos termos e para os efeitos do art.15º-A, do DL nº176/2006, de 30/8.

    Mais alega que a presente acção arbitral foi desencadeada pela demandante por carta enviada no dia 5/7/13, embora datada de 5/7/12.

    Alega, assim, que se verifica a caducidade do direito de acção da demandante, pois que a presente acção arbitral foi instaurada quase um ano depois do decurso do prazo legal de 30 dias estabelecido para o efeito no art.3º, nº1, do citado DL, o qual terminara em 23/7/12.

    Contestou, ainda, a demandada por impugnação e, a final, concluiu que deve ser julgada procedente a invocada excepção de caducidade do direito de acção e que deve a presente acção ser julgada totalmente improcedente, absolvendo-se a demandada de todos os pedidos formulados pela demandante.

    Entretanto, a S., Ld.ª, sucedeu à sociedade Z. na qualidade de demandada, tendo aderido à contestação desta.

    Após resposta da demandante, entendeu o Tribunal Arbitral que, uma vez que a procedência da excepção invocada implica a absolvição da demandada dos pedidos, cumpria decidir tal excepção, e, conhecendo dela, concluiu pela sua improcedência, determinando o prosseguimento dos ulteriores termos da arbitragem.

    Inconformada, a demandada interpôs recurso daquela decisão, o qual não foi admitido, mas, tendo a recorrente reclamado do respectivo despacho, foi a reclamação deferida, pelo que o processo subiu a esta Relação.

    Produzidas as alegações e colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

    2 – Fundamentos.

    2.1. Na decisão recorrida consideraram-se provados os seguintes factos:

    1. Os pedidos de AIM's de medicamentos genéricos contendo a substância ativa designada por "B. mono-hídratado", nas dosagens de 62,5 mg e 125 mg, na forma farmacêutica de comprimido revestido por película e que têm por referência o medicamento "T.", foram publicados na página eletrónica do I. no dia 21 de junho de 2012; b) A presente arbitragem foi desencadeada pela Demandante por carta expedida em 5 de julho de 2013; c) As AIM's em causa na presente arbitragem foram concedidas pelo I. em 31 de outubro de 2013.

    2.2. A recorrente remata as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. O presente recurso de apelação vem interposto da decisão arbitral constante do despacho n.º 2 proferido em 13 de Março de 2014, que julgou improcedente a excepção de caducidade do direito de acção da Recorrida.

    1. O prazo de 30 dias que se encontra estabelecido no artigo 3.°, nº l, da Lei n.º 62/2011, de 12 de Dezembro, contado da publicitação na página electrónica do I. de um pedido de autorização ou registo de introdução no mercado de medicamentos genéricos, nos termos previstos no artigo 15º-A, do Decreto-Lei n.° 176/2006, de 30 de Agosto, é o prazo que o interessado que pretenda invocar o seu direito de propriedade industrial dispõe para intentar a acção arbitral.

    2. O prazo para a propositura de acções é um prazo de caducidade de origem legal, nos termos do disposto no artigo 298.º, n.° 2, do Código Civil, e o interessado, ao intentar a acção arbitral, está a exercer um direito potestativo, visando a caducidade, precisamente, o exercício dos direitos potestativos.

    3. A consequência de não intentar a acção arbitral dentro do prazo de 30 dias que se encontra estabelecido para o efeito no artigo 3.°, n.° l, da Lei n.º 62/2011, de 12 de Dezembro, é a perda do direito de intentar a acção arbitral, ou seja, a caducidade do direito de acção.

    4. A presente acção arbitral tem por objecto os dois pedidos de AIM de medicamentos genéricos contendo a substância activa «B. mono-hidratado», nas dosagens de 62,5mg e 125 mg e na forma farmacêutica de comprimido revestido por película, apresentados pela sociedade Z. . no dia 30 de Maio de 2012 e publicitados na página electrónica do I. no dia 21 de Junho de 2012, nos termos e para os efeitos do artigo 15.°-A, do Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de Agosto 6. A presente acção arbitral foi intentada pela Recorrida por carta enviada à sociedade Z. . no dia 05 de Julho de 2013, embora tal carta esteja datada de 05 de Julho de 2012, ou seja, quase um ano depois do decurso do prazo de 30 dias estabelecido para o efeito no artigo 3.°, nº1, da Lei n,° 62/2011, de 12 de Dezembro, o qual terminara no dia 23 de Julho de 2012.

    5. A consequência de a presente acção arbitral não ter sido intentada pela Recorrida dentro do prazo de 30 dias que se encontra estabelecido para o efeito no artigo 3.º, n.° l, da Lei n.º 62/2011, de 12 de Dezembro, é a perda do direito da Recorrida de intentar a presente acção arbitral, ou seja, a caducidade do direito de acção da Recorrida.

    6. A decisão recorrida ao ter julgado improcedente a excepção de caducidade do direito de acção da Recorrida, violou o disposto no artigo 3.º, n.º l, da Lei n.° 62/2011, de 12 de Dezembro, e nos artigos 298.º, n.º 2, 328.°, 329º e 331º, n.ºl, do Código Civil, padecendo, assim, de manifesto erro de julgamento da matéria de direito.

    2.3. A recorrida contra-alegou, concluindo nos seguintes termos: A. O presente recurso deve ser indeferido liminarmente, uma vez que a decisão sob recurso - que decidiu apenas não ter caducado o direito de acção da Demandante, não se pronunciando sobre o mérito da causa, nem tendo absolvido a Demandada do pedido - é irrecorrível autonomamente, podendo apenas ser impugnada no recurso que venha a ser interposto da sentença final a proferir nesta acção, conforme estipula o artigo 644°, n.° 3, do C.P.C.

  2. Já depois de instaurada a presente acção, designadamente em Fevereiro de 2014, a Demandada, aqui, Apelante iniciou a comercialização do seu medicamento genérico B., pelo que a ameaça de violação dos direitos de propriedade industrial da Apelada, resultantes da sua Patente e do CCP, deixou de ser eminente para passar a ser uma realidade consumada, tendo a Demandante instaurado, por apenso a esta acção, uma providência cautelar destinada a impedir a continuação de tal violação.

  3. É absolutamente errada a interpretação que a Demandada, aqui Apelante, faz do texto da Lei n.° 62/2011, de 12 de Dezembro, no sentido de que o incumprimento do prazo de 30 dias concedido à Demandante para instaurar a presente acção tem como consequência a caducidade do seu direito de acção.

  4. Se entendêssemos, como o faz a Apelante, que foi criado um novo prazo de caducidade das patentes, então, tal limitação violaria de forma clara e inequívoca a Directiva 2004/48/CE (denominada Directiva Enforcement) - que estabelece uma tutela efectiva e uniforme dos direitos de propriedade industrial na União Europeia - e o ADPIC/TRIPS (Acordo Sobre os Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados com o Comércio, assinado em 1994 e administrado pela Organização Mundial do Comércio) e, mais importante, a Constituição da República Portuguesa, designadamente os artigos 42° e 62° da "CRP", que tutelam, respectivamente, os direitos intelectuais e a propriedade privada.

  5. A Lei 62/2011, de 12 de Dezembro deve, assim, ser interpretada em consonância com o Direito Transnacional e á luz da Constituição da República Portuguesa, tendo sido, seguramente, essa a intenção do legislador.

  6. Focando-se exclusivamente no artigo 3°, n.° 1 da Lei 62/2011, de 12 de Dezembro, a Apelante, pura e simplesmente, ignora o disposto no artigo 2º da referida Lei, que impõe uma arbitragem necessária relativamente aos litígios nos quais estejam em causa medicamentos de referência e medicamentos genéricos, sendo que a presente acção enquadra-se perfeitamente nesta previsão legal.

  7. Veja-se, em sentido oposto ao defendido pela Apelante - e, assim, no mesmo sentido da decisão recorrida -, a recente sentença arbitral de 11 de Fevereiro de 2014, proferida por Paula Costa e Silva, Manuel Oehen Mendes e Evaristo Mendes, no Processo Arbitral 3/2013, destinado a dirimir o litígio entre as Demandantes D. Ltd e E. e as Demandadas R. e T., a qual, no que à questão aqui em apreço respeita, perfilhou o entendimento de que, por um lado, decorrido o prazo de 30 dias, as empresas titulares de patentes continuam a dever recorrer à acção arbitral, porque esta é necessária, já não ao abrigo do artigo 3° da Lei 62/2011, de 12 de Dezembro, mas atendendo ao disposto no artigo 2° da mesma lei e, por outro lado, ainda que a acção seja instaurada ao abrigo do referido artigo 3º depois do prazo de 30 dias, a mesma deverá prosseguir nos termos de referido artigo 2°, por uma questão de economia processual, não fazendo sentido impor às Demandantes a instauração de uma nova acção arbitral.

  8. Toda a jurisprudência recente sobre a questão em apreço, quer do Tribunal da Relação de Lisboa, quer...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT