Acórdão nº 2200/11.9TVLSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 30 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelEDUARDO AZEVEDO
Data da Resolução30 de Abril de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa … propôs acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra ….

Pediu que se declarasse ser a legítima possuidora do veículo de marca Mercedes, modelo ML, com a matrícula … e se condenasse a restitui-lo, em bom estado de conservação e em perfeitas condições, no prazo de 30 dias contados da notificação da sentença, e no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso na devolução do veículo, à razão de 200,00€ por dia, nos primeiros 60 dias e de 600,00€, por dia, após esse prazo, da quantia de 48.966,59€ correspondente à soma dos custos em que incorreu com o mesmo (rendas de locação, desde Janeiro de 2010, opção de compra no final do contrato, seguro, imposto de circulação e revisão) no valor de 34.266,59€ e dos tidos com meios de transporte alternativos, em valor não inferior a 700,00€, mensais, dos quais se encontra já vencido o valor de 14.700,00€, de indemnização pela privação de uso do veículo, no valor de 15.000,00€, de juros vencidos e vincendos, calculados sobre estes dois valores globais, até efectivo e integral pagamento, bem como de uma indemnização correspondente à desvalorização sofrida pelo veículo em razão da sua imprudente utilização pelo R, calculada nos termos do artº 661º, nº 2 do CPC.

Alegou, em síntese: o R foi seu administrador, com funções executivas, desde 22.01.1991 até 04.01.2012; em 02.07.2007 celebrou um contrato de locação financeira tendo por objecto o citado veículo, pelo valor de 75.206,61€, o qual se destinou às funções do R; pagou no âmbito do contrato 98.046,45€; o R entrou de baixa médica em Janeiro de 2010, estando impossibilitado de se deslocar da habitação, vindo a culminar com a sua reforma por invalidez absoluta em Maio de 2010; disso só foi notificada em Janeiro de 2011; em Outubro de 2010 solicitou a devolução do veículo, necessário à respectiva actividade, e em Novembro seguinte o R informou que se manteria na sua posse, invocando que mesmo era de função e tinha direito a ele enquanto se mantivesse no cargo; em Janeiro de 2011, no termo do mandato, a autora deliberou não reconduzir o R no cargo e reiterou o pedido de devolução do veículo, o que o R recusou, invocando direito de retenção por ter créditos sobre si, o que não acontece; o veículo, ainda na posse do R mas conduzido por outrem, veio a intervir em acidente de viação em 21.01.2011, sofrendo danos; o veículo foi usado de forma intensiva pelo R o que o desvalorizou; o seu uso é abusivo desde Janeiro de 2010, dado que o R pediu a reforma e sabia que não ia regressar às funções; e a conduta deste causou-lhe prejuízos, agindo aquele de má-fé e em abuso de direito.

O R contestou, altura em que reconveio, pedindo a condenação no pagamento da quantia de 116.443,08€, acrescida de montante a liquidar em execução de sentença relativa a despesas de representação e de transporte e de juros vencidos e vincendos, e, em súmula, alegando: devem-lhe honorários, gratificações e despesas de representação, tendo, por isso, direito de retenção sobre o veículo nos termos do artº 755º, nº 1, alª c) do CC; o mesmo foi-lhe atribuído não para o exercício das suas funções executivas de administrador mas para o exercício de toda a actividade e para uso pessoal, fazendo parte da sua retribuição e das suas regalias enquanto administrador; só lhe foi comunicada a reforma por invalidez absoluta em 14.01.2011, cujo valor ilíquido é de 3.565,81€ e com efeitos desde então; apenas estaria obrigado a devolver o veículo em 04.01.2011, a partir do qual não foi reconduzido no cargo de administrador; a A, desde, pelo menos, Janeiro de 2010, tinha conhecimento da dívida a si e da natureza da mesma e o valor do veículo não é superior; deixou de utilizar o veículo ainda em Dezembro de 2010, quando o entregou na oficina para realização da respectiva revisão e nestas circunstâncias ocorrendo o acidente, que foi comunicado de imediato à seguradora e à locadora; o veículo não foi reparado por indicação expressa da A; como contrapartida do desempenho das funções de administrador auferia anualmente de remuneração base 86.136,00€ (7.178,00€ x 12), de gratificação 35.890,00€, de subsídio de férias e de Natal 14.356,00€ e de despesas de representação 7.500,00€; foi acordado entre as partes que além da remuneração mensal seria paga, nos meses de Janeiro de cada ano, um prémio, no valor correspondente ao quíntuplo da remuneração mensal, pagamento que sempre foi efectuado desde 2003; além disso, foi acordado entre as partes o pagamento da diferença entre a remuneração e a quantia paga a título de baixa pela segurança social; e, em 11.01.2010 entrou em situação de baixa médica, sendo a A devedora além do mais, de 71.780.00€ relativa a gratificação, de 30.307,08€ de diferença de remunerações (tendo recebido a título de subsídio de doença o valor global de 51.450,72€) e de 14.356,00€ de subsídio de férias e Natal.

A A replicou, ampliando o pedido, mantendo a sua posição inicial e impugnando a reconvenção.

O R triplicou.

Tal ampliação de pedido não foi admitida.

Proferiu-se despacho saneador, altura em que foram fixados os factos assentes e a base instrutório de que não houve reclamação.

Efectuou-se audiência de julgamento.

Proferiu-se sentença, em 04.04.2014, na qual se decidiu a matéria de facto, julgando-se a acção parcialmente procedente, condenou-se o R a restituir à A, sua proprietária e possuidora, o referido veículo, no prazo de 30 dias, sob pena de, não o fazendo em tal prazo, pagar a título de sanção pecuniária compulsória, a quantia diária de 100,00€ até à efectiva entrega, a pagar à A a quantia de 450,00€ por mês, desde Fevereiro de 2010 até à restituição do veículo, acrescida de juros à taxa legal de 4%, desde a citação (10.11.2011) sobre o montante já vencido nessa data e até integral pagamento, e de juros, à mesma taxa, sobre o valor mensal que posteriormente à citação se foi vencendo, contados desde o último dia de cada um dos respectivos meses, a quantia de 23.000,00€ a título de indemnização pela desvalorização do veículo, absolveu-se o R, no mais, do pedido, julgou-se improcedente a reconvenção e absolveu-se desta a A.

O R recorreu da sentença, recurso admitido como apelação, com subida nos autos, imediatamente e efeito devolutivo.

Extraiu as seguintes conclusões: (…) 11. Na sentença, da qual ora se recorre foi proferida decisão da matéria de facto, a qual se impugna parcialmente, por erro na apreciação da prova; (…) 13. A questão a decidir nos presentes Autos, parece-nos, salvo m.o., a de analisar, perante a prova documental e testemunhal produzida e o direito aplicável, se o Réu Reconvinte, aqui Apelante tinha os créditos que alega sobre a A. Reconvinda e, tendo-os, se os invocou legitimamente, exercendo assim o direito de retenção do veículo, para garantia de pagamento dos mesmos.

  1. Num segundo momento, haverá que apreciar se o Réu Reconvinte foi o causador dos danos de privação do veículo e de desvalorização do mesmo, e do montante em que veio a ser condenado a pagar à A. Apelada.

  2. Dado a prova produzida e o direito aplicável, infra alegadas, o Réu reconvindo conclui o presente recurso, infra, requerendo seja revogada a douta sentença sob recurso, designadamente e também quanto à decisão proferida, parcialmente, sobre a matéria de facto e que, em consequência, seja julgada improcedente a acção, por não provada, e julgada procedente a reconvenção, porque provada, pelas razões e fundamentos de factos e de direito de seguida expendidos.

  3. Dos factos provados resultou claramente que o veículo em causa nos Autos foi atribuído ao Réu por este ser Administrador da mesma, desde a Constituição desta em 22 de Janeiro de 1991 até 4 de Janeiro de 2011 (Facto provado 2 e facto 83).

  4. A Ré apenas pediu a entrega do carro pela primeira vez, por carta datada de 2.11.2010 (Cfr. facto 17 provado).

  5. Não obstante, a Meritíssima Julgadora a quo vem condenar o Réu Reconvinte a pagar à A. Reconvinda a quantia de 450€ mensais desde Fevereiro de 2010. Ou seja, mesmo referente ao período em que a devolução do carro não tinha sido pedida ainda pela A. ao Réu e no período em que o Réu ainda era Administrador da A, que o foi até 4 de Janeiro de 2011.

  6. Pelo que o erro na apreciação da prova e aplicação do direito é notório e deverá ser corrigido.

  7. Quanto à desvalorização do veículo em 23.000€, cuja culpa foi imputada ao Réu não podemos concordar; 21. O Réu Reconvinte não poderá ser julgado responsável pela mesma, dado que resultou provado que foi a nova Administração da A. que proibiu a reparação do veículo, apesar do mesmo estar coberto por um seguro de responsabilidade civil por danos próprios e da respectiva seguradora ter aprovado a sua reparação e ter ordenado a mesma. (Facto 92 julgado provado e respectiva impugnação com transcrição do depoimento do gestor do sinistro).

  8. Pelo que não se verifica o requisito do nexo de causalidade adequada, necessário à imputação do dano ao Réu Reconvinte, tendo em conta que os requisitos da Responsabilidade Civil teriam de estar preenchidos, conforme alegados infra e não estão.

  9. Por isso, se o veículo se desvalorizou foi por exclusiva vontade da própria A. Reconvinda e não por factos imputáveis ao Réu, aqui Apelante, pelo que deverá a sentença sob recurso ser revogada, também nesta parte, e o A. absolvido da respectiva condenação.

  10. O Réu Apelante impugna a decisão relativa à matéria de facto, por padecer a mesma de erro de julgamento do Tribunal a quo, o que faz nos termos do disposto no artigo 640.º do NCPC e requer, em consequência, nos termos do disposto o artigo 662.º do NCPC, a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto julgada Provada e sobre a matéria julgada não provada, dado que a prova produzida em audiência de julgamento impõe uma decisão diversa daquela que o Tribunal a quo, proferiu sobre a matéria de facto que julgou provada e que julgou não provada.

    (…) 26. Por outro lado...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT