Acórdão nº 3902/13.0JFLSB-N.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DO CARMO FERREIRA
Data da Resolução08 de Outubro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam em conferência na 9ª.Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa: I. RELATÓRIO.

M..., arguido nos autos supra e ali devidamente identificado, não se conformando com o despacho que lhe indeferiu a arguição de nulidades (de 24/6/2015) e irregularidades que invocara sobre anteriores despachos (de 5/2/2015 e 3/6/2015), onde se determinava o adiamento ao acesso aos autos, pelo período de 3 meses, a vigorar até 4/5/2015 e a prorrogação do prazo do acesso aos autos por mais um ano, a contar do dia 4/6/2015, vem do mesmo interpor recurso.

Juntou as motivações que constam de fls. 2 a 48 destes autos, da qual constam as conclusões que vão transcritas: 1) O presente recurso versa sobre dois Despachos, proferidos pelo JIC, que apreciaram os requerimentos apresentados pelo ora Recorrente na sequência da notificação do Despacho de fls. 12533 e ss., que determinou o segundo adiamento de acesso aos autos, nos termos do artigo 89.°, n.° 6, in fine, CPP.

2) Tratam-se (i) do Despacho de fls. 13584 e ss., mediante o qual o Juiz a quo indeferiu a arguição de nulidade dos Despachos de fls. 7901 e 7902 e de 12533 a 12535 (que, respetivamente, haviam determinado a primeira e segunda prorrogações do adiamento de acesso aos autos pelo Arguido), e (ii) do Despacho de fls. 13316 e ss., através do qual o Mm.° Juiz de Instrução Criminal desconsiderou a arguição de irregularidade do já referido Despacho de fls. 12533 a 12535 ("Despacho Recorrido (irregularidade)").

3) Salvo o devido respeito por melhor opinião, é entendimento do ora Recorrente que não assiste razão ao Meritíssimo JIC, já que por um lado e em primeira linha, os pedidos de adiamento de acesso aos autos, feitos ao abrigo do artigo 89.°, n.° 6, CPP, foram extemporâneos, o que determinou ipso iure a publicidade interna do processo, e porque, por outro lado, sempre se dirá que foram preteridas as garantias de defesa do ora Recorrente ao não lhe ter sido notificada a Promoção do Ministério Público que antecedeu a segunda prorrogação de acesso aos autos.

4) É ainda entendimento do Recorrente que ao contrário do que é sustentado nos despachos em recurso, no caso em apreço não poderia ter havido prolongamento do período de duração do segredo de justiça para além dos prazos máximos de inquérito previstos no artigo 276.° CPP (artigo 89.°, n.° 6, CPP), uma vez que tal não foi requerido dentro dos prazos estabelecidos para o efeito: saber: (i) o pedido e concessão da primeira prorrogação do segredo de justiça, nos termos do artigo 86.°, n.° 6, do CPP, não respeitou o prazo de conclusão do inquérito e (ii) o pedido e concessão da segunda prorrogação do segredo de justiça, nos termos do artigo 86.°, n.° 6, in fine, do CPP, não ocorreu dentro dos três meses do primeiro adiamento do acesso aos autos.

5) Entende, pois, o Recorrente, que, nos presentes autos, o prazo máximo do presente inquérito terminou no dia 13.11.2014, mas o requerimento do Ministério Público, bem como o subsequente Despacho do Juiz de Instrução Criminal de fls. 7901 e s. (atinentes ao primeiro adiantamento de acesso aos autos pelo período de 3 meses) tiveram lugar, apenas, em inícios de Fevereiro de 2015.

6) Desta forma, porque o primeiro adiamento de acesso aos autos não foi decido antes de 13.11.2014, a partir de tal data o segredo de justiça interno do processo cessou ipso lure.

7) O artigo 86.°, n.° 1, CPP refere que «[o] processo penal é, sob pena de nulidade, público, ressalvadas as exceções previstas na lei», pelo que qualquer acto processual que contrarie o sobredito (como o foi o Despacho de fls. 7901 e s.) será irremediavelmente cominado com o vício de nulidade.

8) Nestes termos, o Despacho Recorrido (nulidade) deve ser considerado ilegal, sendo, por isso, revogado, reconhecendo-se, assim, a nulidade do Despacho de fls. 7901 e s., nos termos e para os efeitos do artigo 86.°, n.° 1, e 89.°, n.° 6, CPP, e, em consequência, a nulidade do Despacho de fls. 12533 e ss., nos termos e para os efeitos do artigo 122.°, n.° 1, CPP, tudo redundando numa única conclusão: deve ser reconhecida a publicidade interna do processo.

9) Nem se diga, porque não procede, que a tal desfecho obsta o Despacho de fls. 12533 e ss. (despacho mediante o qual foi decidido o segundo adiamento de acesso aos autos, nos termos do artigo 89.°, n.° 6, in fine, CPP), porquanto o prazo para requerer e declarar o segundo adiamento de acesso aos autos também não foi respeitado.

10) A declaração de especial complexidade do processo que tenha lugar depois de requerido o adiamento de acesso aos autos nos termos do artigo 89.°, n.° 6, CPP (como sucedeu in casu) – precisamente porque o prazo de inquérito já se considera terminado (artigo 89.°, n.° 6, ab intio, CPP) – não tem o poder de alargar prazo do segredo interno, como se de uma nova prorrogação deste se tratasse.

11) Nos temos da Lei, o que seria válido para prorrogar o acesso aos autos, tendo em conta o específico momento processual, seria um Despacho como aquele que consta de fls. 12533 e ss., i.e., concebido ao abrigo do artigo 89.°, n.° 6, in fine, CPP.

12) Sucede, porém, que no caso em apreço, o Despacho de fls. 12533 apenas teve lugar no dia 03.06.2015, ou seja, cerca de 2 meses depois do termo do prazo de 3 meses correspondente ao primeiro adiamento de acesso aos autos (determinado pelo Despacho de fls. 7901 e s.), o que, também por força da assinalada extemporaneidade, determinou a quebra ipso lure do segredo de justiça interno do processo.

13) Entende ainda o Recorrente que, de todo o modo, isto é, mesmo atribuindo ao Despacho que decretou a especial complexidade do processo um valor indevido, o Despacho de fls. 12533 e ss. e a Promoção que o antecedeu seriam sempre extemporâneos e o segredo interno do processo sempre estaria quebrado, pois os mesmos tiveram lugar ao fim de 18 meses desde o início do inquérito, quando nunca poderiam ter lugar depois de ultrapassado o prazo de 12 meses.

14) Nestes termos, não pode deixar de reconhecer-se, também por este via, a ilegalidade do Despacho Recorrido (nulidade) e, por conseguinte, a nulidade do Despacho de fls. 12533 a 12353, nos termos e para os efeitos dos artigos artigo 86.°, n.° 1, e 89.°, n.° 6, CPP, devendo ser imediatamente reconhecida a publicidade interna do processo.

15) Subsidiariamente entende o Recorrente ser ilegal o Despacho de fls. 13316 e ss., através do qual o Mm.° Juiz de Instrução Criminal desconsiderou a arguição de irregularidade do Despacho de fls. 12533 a 12535 ("Despacho Recorrido (irregularidade) oportunamente arguida pelo Recorrente.

16) Ilegalidade essa que deriva da circunstância de não ter sido o Recorrente notificado da Promoção do Ministério Público que antecedeu tal Despacho de fls. 12533 a 12535, em violação direta das suas garantias de defesa (artigos 20.°, n.° 4, 32.°, n.°s 1 e 5, ambos da CRP e artigo 6.° da CEDH).

17) Em causa está, designadamente, a violação do direito de audição (artigo 61.°, n.° 1, al. b), CPP), do direito ao contraditório (artigo 32.°, n.°s 1 e 5, CRP e artigo 6.° § 1, CEDH) e do direito de igualdade de armas (artigo 20.°, n.° 4, 32.°, n.°S 1 e 5, CRP e artigo 6.° § 1, CEDH) que assistem ao Recorrente, pelo simples facto de o mesmo assumir a posição processual de Arguido.

18) A ideia de processo equitativo (20.°, n.° 4, CRP e 6.° CEDH) foi completamente ignorada, assim como foram desrespeitados os ditames constitucionais vertidos nos artigos 202.°, n.° 1 e 2, CRP e 204.° CRP.

Nestes termos e nos demais de Direito cujo douto suprimento de V. Exas. se invoca, deverá presente recurso ser julgado procedente, e em consequência: a) Deverá o Despacho Recorrido (nulidade) ser revogado, porque ilegal, reconhecendo-se a nulidade dos Despachos de fls. 7901 e s. e de fls. 12533 e ss. (ou, subsidiariamente, apenas deste último), nos termos e para os efeitos do artigo 86.°, n.° 1, 89.°, n.° 6, e 122.°, n.° 1, CPP, sendo de imediato reconhecida a publicidade interna dos presentes autos; Ou, caso assim não se entenda, b) Deverá o Despacho Recorrido (irregularidade) ser revogado, porque ilegal, reconhecendo-se a irregularidade do Despacho de fls. 12533 e ss., nos termos e para os efeitos do artigo 123.° CPP.

*** Na resposta do Mº.Pº., cujas motivações constam de fls. 51 a 70, o Mº.Pº conclui como vai transcrito: 1. O art.° 276º do Código de ProcessoPenal consagra diferentes prazos máximos de inquérito consoante quer o tipo de crimes, quer a existência de declaração de especial complexidade do processo, quer a existência de arguidos sujeitos a medidas de coacção privativas da liberdade; 2. O recorrente interpreta erradamente as regras de contagem do prazo de inquérito com arguidos presos, pretendendo fazer retroagir o início da contagem do prazo à data em que o inquérito passou a correr contra pessoa determinada, data na qual nenhum dos suspeitos tinha sequer sido constituído arguido; 3. O recorrente pretende ver aplicado um prazo que parte do pressuposto de haver arguidos presos a uma fase processual em que sequer não havia ainda sequer arguidos constituídos; 4. Para a correcta interpretação da norma tem que se atender à circunstância da tramitação processual não ser estática, sendo progressivamente marcada por factos processuais novos que, inevitavelmente, alteram os pressupostos iniciais de contagem do prazo máximo de inquérito; 5. O art.° 276º, n.° 4, do Código de Processo Penal regula o início da contagem do primeiro prazo aplicável ao inquérito, mas não o início da contagem dos prazos que vierem a ser definidos em função das vicissitudes do processo, designadamente a circunstância de vir a ser aplicada a medida coactiva privativa da liberdade ou ser declarada a especial complexidade dos autos; 6. Por esse motivo, o art.° 276°, n.° 4, do Código de Processo Penal estabelece um ponto de partida genérico, apenas admitindo que não se inicia a contagem do prazo enquanto o Inquérito correr contra desconhecidos; 7. Após a ocorrência de um novo pressuposto...

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