Acórdão nº 2470/08.0TVLSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 01 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelOLINDO GERALDES
Data da Resolução01 de Outubro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


I – RELATÓRIO J, Lda., com sede em Caminha, instaurou, em 5 de setembro de 2008, na então 11.ª Vara Cível da Comarca de Lisboa (Instância Central de Lisboa, 1.ª Secção Cível, Comarca de Lisboa), contra R, S.A.

, com sede em Setúbal, ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, pedindo que a Ré fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 871 414,99, acrescida de juros à taxa legal vencidos desde a citação até efetivo e integral pagamento.

Para tanto, alegou em síntese, ter celebrado com a R., em 1993, um contrato de distribuição de produtos, com exclusividade, ao qual aquela pôs termo unilateralmente e sem justa causa, em 6 de maio de 2008; esse contrato tem cláusulas nulas e foi resolvido sem o pré-aviso necessário de dois anos; e tem direito a ser indemnizada e a receber ainda a quantia de € 7 778,67, correspondente ao saldo da conta-corrente mantida até à cessação do contrato.

Citada a Ré, contestou a ação, alegando que o contrato foi celebrado em 2 de dezembro de 2004, impugnando o alegado direito de indemnização. Em reconvenção, pediu que a A. fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 806 781,35, acrescida dos juros que se vencerem até integral pagamento e abster-se de usar, de imediato, quaisquer sinais distintivos quer da R., quer das marcas The Coca-Cola Company.

Para o efeito, alegou a falta de pagamento de mercadoria fornecida (€ 52 209,21) e o direito a ser indemnizada pela utilização abusiva dos sinais distintivos das marcas da The Coca-Cola Company.

Replicou a A., concluindo pela improcedência da reconvenção.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, com gravação, foi proferida, em 12 de março de 2015, sentença que, julgando a ação e a reconvenção parcialmente procedentes, condenou apenas a Ré a pagar à Autora, a título de indemnização pelos danos patrimoniais decorrentes da ilícita resolução do contrato e pela clientela, a quantia a liquidar ulteriormente, e a Autora a pagar à Ré a quantia de € 52 209,21, acrescida de juros, à taxa legal fixada para as dívidas de que são titulares sociedades comerciais, e abster-se de usar nas faturas e viaturas sinais distintivos das marcas comercializadas pela Ré.

Inconformada com a sentença, recorreu a Autora e, tendo alegado, formulou essencialmente as seguintes conclusões: a) Existem factos suficientes para se fixar o montante das indemnizações reconhecidas, quer a título de lucros cessantes (€ 200 000,00), quer de clientela (€ 234 169,85).

b) O contrato de concessão pesava entre 75,13 % a 83,32 % da atividade da A. concessionária.

c) Não faz sentido “deduzir os custos que (a A.) não suportou por não ter efetuado essas vendas”.

d) Só a utilização do critério do lucro ou margem de comercialização bruta pode compensar equitativamente a A.

e) A decisão sobre juízos de equidade passa invariavelmente pela atendibilidade da capacidade económica das partes, constituindo a R. um potentado económico, enquanto a A. está reduzida praticamente à indigência, tanto que se viu obrigada a encerrar as portas.

f) Na sentença, apesar de peticionados, nada se proferiu a respeito dos juros moratórios, sendo nula a sentença (art. 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC).

g) Tem direito a tais juros de natureza comercial, pelo atraso no pagamento das indemnizações (arts. 804.º a 806.º do CC) Pretende a Autora, com o provimento da apelação, a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que fixe a indemnização por lucros cessantes na quantia de € 200 000,00 e a indemnização de clientela na quantia de € 234 169,85, acrescidas dos juros de mora à taxa legal fixada para os juros comerciais vencidos desde a citação até efetivo e integral pagamento.

Também inconformada com a sentença, recorreu ainda a Ré, que, tendo alegado, formulou em resumo as seguintes conclusões: a) A prova produzida permitiria responder de forma negativa aos factos vertidos nos quesitos 23.º, 31.º, 32.º, 44.º, 38.º da base instrutória.

b) A resposta afirmativa aos quesitos 70.º, 72.º e 73.º da base instrutória deve ser alterada.

c) Quando o principal resolve ilicitamente o contrato de concessão comercial, o distribuidor não pode pretender ser indemnizado no montante das remunerações que supostamente iria receber até ao final do contrato, porquanto tal configura um dano contratual positivo, o qual não tem cobertura legal.

d) Por isso, não é devido o pagamento dos lucros cessantes decorrentes da resolução do contrato antes do termo do mesmo.

e) Mesmo sem a reapreciação de facto requerida, não se encontram reunidos os pressupostos para que possa ser conferida a indemnização de clientela.

Pretende a Ré, com o provimento da sua apelação, a revogação da decisão recorrida.

Contra-alegaram ambas partes, no sentido da improcedência do recurso contrário.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

Nos recursos interpostos, para além da impugnação da decisão relativa à matéria de facto, está em discussão a indemnização por lucros cessantes e a indemnização de clientela, a sua liquidação, por extinção do contrato de concessão comercial, e os juros moratórios referentes a tais indemnizações.

II – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. Pela 1.ª instância, foram dados como provados os seguintes factos:1. A A. dedica-se à comercialização de diversos tipos de produtos alimentares, entre os quais se incluem águas, Rrantes e outros tipos de bebidas.

  1. A R. tem por objetivo a produção e/ou a comercialização de Rrantes da gama de produtos da companhia multinacional The Coca-Cola Company, com sede nos Estados Unidos.

  2. A R. é a única entidade em Portugal a produzir e/ou a comercializar essa gama de produtos.

  3. A R. produz e/ou comercializa os produtos que ostentam, nomeadamente, as marcas Coca-Cola, Fanta, Sprite, Aquarius, Nestea e outras.

  4. Em ordem a organizar a distribuição e comercialização dos seus produtos, de forma a executar a sua política comercial, a R. possui uma estrutura de intermediação, a rede de distribuidores, apta a fazer a colocação dos seus produtos no mercado de consumo.

  5. Esta rede de distribuidores caracteriza-se pela celebração de um conjunto de contratos de distribuição, concebidos de uma forma uniforme e associando a R. a uma pluralidade de distribuidores, cada um dos quais responsável pela distribuição dos produtos da R. numa área geograficamente delimitada.

  6. A distribuição dos produtos da R. no território nacional é levada a cabo por empresas independentes e estranhas a ela, especializadas em razão da sua aptidão técnica e comercial e vulgarmente designadas por “distribuidores”.

  7. A R. tem, pelo menos, 25 distribuidores, a cada um dos quais conferiu a distribuição dos seus produtos numa área geográfica determinada.

  8. A A. foi distribuidora da R. nos concelhos de Viana do Castelo, Ponte de Lima, Caminha, Vila Nova de Cerveira, Valença, Melgaço, Ponte da Barca, Monção, Paredes de Coura e Arcos de Valdevez.

  9. J distribuiu produtos fabricados e comercializados pela R. entre os anos de 1993 a 1998.

  10. Por acordo das partes, desde 1 de janeiro de 1998 até 2004, a posição contratual ocupada por J passou a sê-lo por João e José Filhos de J, Lda.

  11. A A. foi constituída em 18 de março de 2004.

  12. Em 2 de dezembro de 2004, A. e R. reduziram a escrito o acordo entre ambas celebrado, que denominaram de contrato de distribuição no qual consignaram seguinte: “(…) Considerando que: A) A R produz e/ou comercializa Rrantes da gama de produtos de The Coca-Cola Company; B) Que no âmbito dessa atividade, pretende a R assegurar uma mais completa e eficaz cobertura da distribuição em todo o País, para tanto recorrendo à contratação de distribuidores que, no desempenho dessa sua atividade e em estreita colaboração e coordenação com a R, servem uma mesma filosofia comercial, seja em termos de apresentação do produto no mercado, na colaboração em campanhas promocionais e, de um modo geral, no relacionamento com os clientes das marcas que distribui; C) Para defesa da qualidade dos produtos a distribuir, e respetiva imagem junto do público consumidor, é exigível que se mantenha uma estreita colaboração com o Distribuidor e um permanente intercâmbio de informações adequadas do mercado; D) Que o Distribuidor se encontra implantado na área em que irá atuar e que nela pretende distribuir os produtos da R, atividade para a qual se considera apetrechado em meios humanos e equipamentos; E) A área geográfica, previamente definida, em que irá actuar o Distribuidor, em conformidade com os preceitos contidos nas cláusulas que se seguem, é a que se encontra definida no Anexo I ao presente contrato e que dele faz parte integrante, é estabelecido o presente contrato de distribuição, que se regerá pelo disposto nas cláusulas seguintes e pela legislação nacional e comunitária aplicável: Cláusula 1.ª (Âmbito do Contrato) 1. Pelo presente contrato, a R acorda com o Distribuidor confiar a este a distribuição dos seus produtos, na área de contrato definida no Anexo 1 a este contrato e que dele faz parte integrante, produtos estes que são os que igualmente se mostram identificados na Tabela de Preços (Anexo 2 a este mesmo contrato e que dele faz parte integrante). 2. O Distribuidor poderá subcontratar a distribuição dos mesmos produtos a Terceiros, em parcelas do território concedido nos termos do número anterior, desde que: a) obtenha para o efeito, caso a caso, autorização prévia e expressa da R; b) assegura que a sub-distribuição se realize com comprimento das mesmas obrigações assumidas pelo Distribuidor neste contrato, respondendo o Distribuidor perante a R pelo incumprimento do Sub-Distribuidor. Cláusula 2.ª (Área do Contrato) Entende-se por área do contrato, tal como territorialmente definida no Anexo I, a região geográfica onde o Distribuidor irá desenvolver a sua atividade e relativamente à qual, no entanto, a R não concede o direito de exclusivo a favor do Distribuidor, podendo, em consequência, aí nomear outro ou outros Distribuidores para exercício da mesma actividade, do que avisará, por...

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