Acórdão nº 1617-11.3TJLSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 22 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA TERESA PARDAL
Data da Resolução22 de Outubro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam do Tribunal da Relação de Lisboa: I-RELATÓRIO.

G…, Lda intentou contra Condomínio… acção declarativa com processo sumário, alegando, em síntese, que acordou com o réu realizar-lhe trabalhos de recuperação e manutenção do edifício e, já durante a execução da obra, verificou-se a necessidade de trabalhos a mais no valor de 11 015,33 euros incluindo IVA, conforme orçamento que o réu aceitou, adjudicando os referidos trabalhos a mais, que vieram a ser efectuados pelo autor, nos termos da factura que emitiu e que devia ter sido paga em 13/12/2010, mas que o réu não pagou. Concluiu pedindo a condenação do réu a pagar-lhe a quantia de 11 015,33 euros, acrescida de juros legais já vencidos no montante de 1 637,29 euros e de juros vincendos até integral pagamento.

O réu contestou alegando que a autora lhe executou trabalhos nas fachadas e cobertura que foram integralmente pagos, não tendo sido encomendados ou autorizados quaisquer trabalhos a mais, que vão impugnados, os quais, se foram realizados, foram por conta e risco da autora, já que o réu só teve conhecimento da pretensão da autora e da respectiva factura numa reunião em Fevereiro de 2011, em que o gerente da autora não conseguiu apresentar qualquer documento com a autorização ou aprovação das obras em causa, dizendo que havia tratado de tudo telefonicamente com uma familiar do falecido gerente da sociedade administradora de condomínio, não tendo porém o réu aceitado a situação e sendo certo que não é devido o preço reclamado pela autora, nos termos do artigo 1214º do CC.

Concluiu pedindo a improcedência da acção. A autora respondeu alegando que é impossível que o réu desconheça que as obras em causa foram efectuadas e que a familiar do gerente da administração do condomínio com quem foram tratados os trabalhos era o braço direito da administração, que assim tinha conhecimento da situação, não sendo aplicável o artigo 1214º, que pressupõe uma alteração das obras feita por iniciativa do empreiteiro, para além de que, mesmo que não tivesse havido adjudicação, sempre seriam aplicáveis os artigos 1211º e 883º do CC, cabendo ao Tribunal fixar o preço das obras. Saneados os autos, procedeu-se a julgamento, no decurso do qual foi proferido despacho que decidiu que FT…, condómina do 3º andar esquerdo do condomínio réu e oferecida por este como testemunha, estava impedida de depor nessa qualidade por força do artigo 496º do CPC, devendo fazê-lo na qualidade de parte, o que aconteceu. Findo o julgamento, foi proferida sentença que julgou procedente a acção e condenou o réu a pagar à autora a quantia de 11.015,33 euros acrescida de juros de mora desde a citação.

* Inconformado, o réu interpôs recurso e alegou, formulando as seguintes conclusões: 1. A Douta sentença recorrida julgou incorrectamente pontos de facto e não aplicou correctamente as normas de Direito.

  1. As respostas à matéria de facto dada como provada estão mal fundamentadas, remetendo-se nestas para os documentos de fls. 16, 17 e 18, para se dar como provado coisa diferente do que nestes consta.

  2. Diz-se que se acolhe o depoimento de todas as testemunhas, mas depois não se acolhe de facto os depoimentos destas, tendo se desvalorizado, em absoluto, o depoimento das testemunhas do R., tendo tal acontecido quanto à matéria de facto dada como provada nos pontos 2° a 8°, e tendo, do mesmo modo, dado, erradamente, como não provados, os factos 11°, 12°,13°, 15°, 16°, 18°, 19°, 21°, 22° e 23° de “factos não provados", em que se deu resposta diferente daquilo, como resultou da prova gravada produzida.

  3. Com efeito, não pode o ora Recorrente aceitar a posição do Tribunal a quo no que respeita à matéria de facto dada como provada, sobrevalorizando-se, aí, o depoimento da testemunha IF… que, não só revelou não ter credibilidade, como se verificou, ao longo de todo o seu depoimento, que está em litígio com a firma representante do R. e, até, tem um interesse directo na causa, bem como, também, demonstrou uma grande falta de isenção, assim se concluindo que este depoimento não pode ser valorizado.

  4. Na verdade, aquele depoimento poderá revelar, inclusive, aquilo que a doutrina apelida de “mentira maliciosa", dolosa, já que pessoa sabe que está a mentir, fá-lo deliberadamente, com o propósito de enganar e prejudicar terceiros ou, pelo menos, com a consciência de que os poderá prejudicar, pelo que deveria o Tribunal a quo ter desconsiderado tudo o que esta declarou e, desse modo, não se sendo dando como provado todos os factos que a A. e ora Recorrida alegou e, assim, improcedendo a pretensão desta.

  5. De igual modo, atenta a demais prova produzida pela A., não conseguiu esta provar que todos os reclamados trabalhos a mais, e que constam de treze itens do orçamento em apreço, foram realizados, limitando-se as testemunhas a responder a alguns meros exemplos de trabalhos a mais, sem que fossem interrogadas em relação a cada um dos vários itens que compõem o dito orçamento.

  6. A testemunha AF…, limitou-se a depor quanto aos trabalhos que correspondem às alíneas b], d] e i] do 2° facto da matéria dada como provada, fazendo referências genéricas quanto a essas obras e com a preocupação de realçar que se tratavam de trabalhos “a mais" que tinham a ver com a obra principal, como referiu quanto à necessidade de “substituição de barrotes" para que se efectuasse a impermeabilização de muros - que têm a ver com a obra contratada (inicial] - embora falasse, também, de infiltrações e desentupimentos em que intervieram de emergência, nada mais dizendo ou atestando quantos aos demais (dez) trabalhos que reclama a A..

  7. Por sua vez, a testemunha ML…, questionada pela A. quanto a, e só, alguns exemplos de trabalhos a mais, declarou, basicamente, e sempre com a mesma preocupação de relacionar os reclamados trabalhos com a obra principal, que tinha havido intervenção relativamente aos identificados nas alíneas a], b], d] e i] do facto 2° da matéria de facto dada como provada.

  8. Assim, nada foi dito, aflorado e, muito menos confirmado, pelas testemunhas da A., nem estas foram, sequer, interrogadas, quantos aos demais reclamados trabalhos, não tendo sido produzida qualquer outro tipo de prova que permitisse inferir e, por essa via, dar como provado, que todos os trabalhos a mais e que estão relacionados em treze alíneas no orçamento junto aos autos tenham, e todos eles, sido realizados.

  9. Não tendo sido prestado um único testemunho que tenha declarado que os trabalhos que constam do dito “orçamento do email de 30/11/10" foram, e todos, realizados! 11. Os únicos documentos juntos pela A., e que respeitam ao referido orçamento e à factura, foram expressamente impugnados pela R., e ora Recorrente na sua contestação, quer no que respeita ao teor do mesmo, quer negando ter conhecimento prévio destes, não tendo sido feita prova contrária em juízo.

  10. O Tribunal a quo desconsiderou toda a prova produzida pelo R., e ora Recorrente, tendo, não só optado por não valorar os documentos juntos por este com a sua contestação - carta dos mandatários da A. dirigida aos condóminos e a resposta da R. a estes - e que provam ou, no mínimo, indiciariam que alguns dos reclamados trabalhos não foram, garantidamente, efectuados, bem como de que não foi o R. interpelado quanto ao ora reclamado, como, ainda, não foi tida em conta a prova testemunhal apresentada em como alguns desses trabalhos não foram, nem podiam ter sido executados, bem como que alguns deles são duplicações da mesma intervenção e, até, dos anteriormente executados e pagos relativos à designada empreitada inicial.

  11. De facto, a testemunha do R., AC…, declarou que, no âmbito da vistoria por si efectuada ao prédio, constatou que algumas das reclamadas obras não foram, sequer, realizadas, como é o caso das relativas à reparação e impermeabilização de caleiras por baixo do telhado e dos muretes de cobertura.

  12. Esta testemunha, empreiteiro de construção civil e que trabalha há cerca de quinze anos com a representante do ora Recorrente, conhecendo bem o prédio em causa por aí ter vindo a realizar diversas obras, também declarou ter verificado, nessa vistoria, que alguns dos reclamados trabalhos a mais estavam em duplicação, como é o caso da dita “reparação e impermeabilização de caleiras por baixo do telhado" com a referida “reparação e impermeabilização dos muretes da fachada de tardoz“ .

  13. Pelo que, o Tribunal a quo não poderia dar como provado, como deu, que todos aqueles trabalhos foram realizados quando, reafirme-se, não o foram, nada tendo sido dito e, muito menos, confirmado pelas testemunhas apresentadas pela A. quanto a esses supra identificados trabalhos a mais - correspondentes às alíneas c], e], f], g] h], j]m] e n] do 2° facto da matéria de facto provada - nem foi prestada mais qualquer tipo de prova para esse efeito, incumbindo à ora Recorrida o ónus de produzir essa prova, nos termos do disposto no artigo 342° do CPC, o que não conseguiu fazer, não tendo, sequer e como seria expectável, questionado as suas testemunhas sobre cada um dos 13(treze] “trabalhos a mais reclamados".

  14. Não cabendo, como é o caso, ao R., e ora Recorrente fazer prova em contrario desses factos, que não se enquadram no âmbito do regime previsto no artigo 344° do Código Civil, sempre teria o pedido da Autora que improceder, por não provado.

  15. Assim, o douto Tribunal a quo nunca poderia ter dado como provado que todos os reclamados trabalhos foram realizados, por ausência notória de produção de prova, quer testemunhal, quer documental, sendo que os documentos juntos aos autos nada infirmam e, muito menos, comprovam quanto ao que aqui se discute, posto o que, mesmo que se admitisse, o que, à cautela e por mero dever de patrocínio se pondera, sem conceder, que tais testemunhos teriam sido isentos, credíveis, completos e elucidativos, só poderiam, no limite, dar como provados os trabalhos que foram objecto de prova testemunhal, os quais, como acima referido, cingiram-se às alíneas...

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