Acórdão nº 2096/14.9T2SNT.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 22 de Outubro de 2015
Magistrado Responsável | ONDINA CARMO ALVES |
Data da Resolução | 22 de Outubro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I. RELATÓRIO CERDA ….., residente na Rua ……, intentou, em 28.01.2014, contra SALES ……, residente na Rua …….., acção declarativa, sob a forma de processo comum, através da qual pede a condenação do réu a pagar-lhe a quantia de € 39.223,23, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento.
Fundamentou a autora esta sua pretensão nos termos seguintes: 1. Foi casada com o R., tendo constituído ambos a sociedade por quotas com a designação Clínica Médica …., sociedade que mantiveram após o divórcio.
-
A sociedade tinha por objecto: Exploração de clínica médica. Formação profissional.
-
A A. exercia a actividade de trabalhadora, com a profissão de médica.
-
Na sua qualidade de único gerente, o R. contraiu empréstimos e encomendas que nunca pagou.
-
Já divorciados, em 06.11.2011, o R. acordou com a A., os termos do documento “Declaração de Dívidas” em que assume por si só o pagamento das dívidas enumeradas no mesmo, no valor total de € 12.901,51. – fls. 17 e 18.
-
Importância que o R. não pagou, levando a que a A., em seu nome e por conta, procedesse ao respectivo pagamento.
-
O R. não pagou os honorários a que a A. tem direito, como trabalhadora para a firma, referente ao período de Fevereiro de 2011 a Julho de 2012, no valor total de € 8.245,00. – fls. 19 a 21.
-
O R. não enumerou todas as dívidas da sociedade, não incluindo na referida “Declaração de Dívidas”, as seguintes dívidas: a) Empreitada de obras na Clínica, sita na Rua ……, no valor de € 12.000,00. – fls. 22 a 24.
b) Arrendamento comercial da Avenida ….., nº 44, em Lisboa, no valor de € 9.700,72, acrescido de honorários de advogado no valor de € 369,00, no total de € 10.069,72. – cfr. fls. 25.
c) Factura de Henry …., no valor de € 3.606,22. – fls. 26.
d) Livrança no valor de € 3.000,00, com vencimento em 11/12/2011, paga ao Banco Espírito Santo, S.A., no valor de € 4.750,00. – fls. 27.
e) Ao Instituto da Segurança Social: € 2.637,83. – fls. 28.
f) Contabilidade e Gestão…: € 2.042,85. – fls. 29 a 30.
g) Cessação e encerramento da firma Clínica: € 250,00. – fls. 31.
h) Factura de Plásticos ….. no valor de € 796,82. – fls. 32 e 33.
-
A A., em sede de encerramento de contas da firma, pagou às entidades atrás referidas a quantia de € 36.153,44 da responsabilidade da sociedade e que se repercute no património de ambos os sócios, aqui A. e R., montante de que é credora face ao mesmo, a que acrescem € 12.901,51, correspondente a uma dívida assumida pelo R. e € 8,245,00 referente a honorários de médica dentista, tudo no total de € 39.223,23.
Citado para a acção, em 06.08.2014, com a advertência de que a não contestação no prazo legal importava a confissão dos factos alegados, o réu não deduziu contestação.
Cumprido o disposto no artigo 567º, nº 2, do C.P.C., a autora apresentou alegações, após o que o Tribunal a quo proferiu decisão, em 26.03.2015, constando do Dispositivo da Sentença o seguinte: Nos presentes autos de acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, em que é A.
CERDA ……e R. SALES ……, atentos os factos provados e o direito expendido, julgo a acção totalmente improcedente, por não provada e, em consequência, absolvo o R. do pedido.
Inconformada com o assim decidido, a autora interpôs recurso de apelação, relativamente à sentença prolatada.
São as seguintes as CONCLUSÕES da recorrente: i. É fundamento específico da recorribilidade o facto de não ter sido aceite como prova cabal das dívidas do Réu / recorrido o documento "Declaração de Dívidas" em que o mesmo faz a assunção pessoal da dívida que bem sabe ser transmissível à Autora /recorrente e nunca pagou, obrigando esta a pagar em seu nome e por conta.
ii. Tal documento porque se reporta a dívidas transmissíveis á cônjuge e sócia com quota de 50% da sociedade Clínica Médica ….. como Arrendamento, Cobrança de livrança BES, emissão de cheques sem provisão e processo executivo promovido pelos serviços da Segurança Social, deverá ser suficientemente idóneo para conferir à Apelante /Autora o direito de regresso nos termos do artigo 524.2 do Código Civil iii. Sendo que só o pagamento daquelas dívidas em nome e por conta do recorrido constituía condição sine qua non para a sobrevivência da recorrente e respectiva família.
iv. Se bem que o património do Réu, aqui Recorrido, usufruiu um enriquecimento no valor de € 39.223,23 que foi pago pela aqui Recorrente em nome e por conta do Recorrido, que lhe deveria ser devolvido, v. Que lhe seja devolvida pelo menos a importância de € 9.901,51 a que alude o documento Declaração de Dívidas, em que o Recorrido assume a responsabilidade pessoal das mesmas, e que a Requerente foi obrigada a pagar em seu nome e por conta.
vi. Julgando-se procedente por provado o facto de a Recorrente ter pago as referidas dívidas, não por acto voluntário, mas por se tratar de dívidas transmissíveis quer entre cônjuges, quer entre sócios da sociedade constante dos autos.
vii. E provado o direito de regresso nos termos do disposto nos artigos 523.2 e 524.° do Código Civil Pede, por isso, a apelante, que seja dado provimento ao recurso e, em consequência, substituída a sentença recorrida, por outra que condene o réu a pagar à autora, pelo menos, a quantia de € 9.901,51, acrescida dos juros vencidos e vincendos, até integral pagamento.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. II. ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO Importa ter em consideração que, de acordo com o disposto no artigo 635º, nº 4 do Novo Código de Processo Civil, é pelas conclusões da alegação da recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Assim, e face ao teor das conclusões formuladas a solução a alcançar pressupõe a análise das seguintes questões: i) DA REAPRECIAÇÃO DA PROVA; ii) DA SUBSUNÇÃO JURÍDICA FACE À MATÉRIA APURADA E À PRETENSÃO FORMULADA PELA AUTORA *** III . FUNDAMENTAÇÃO A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida, com base nos documentos juntos aos autos, em conformidade com o disposto no artigo 568º, alínea d), do C.P.C., e por confissão, visto o réu, regularmente citado, não ter contestado, considerou provado o seguinte:1. A. e R. constituíram, em 25/09/2009, a sociedade por quotas com a designação Clínica Médica …., com sede na ……, com o capital social de € 5.000,00, cabendo a cada um dos dois sócios a quota de € 2.500,00, tendo por objecto: Exploração de clínica médica. Formação profissional, conforme Insc. 1, AP. 23, de 2009/09/25. – fls. 11 a 16.
-
A referida sociedade alterou a sua sede para a Rua ….., conforme Insc. 3 – AP. 24, de 2011/04/26.
-
Sales ….. exerceu o cargo de gerente único da sociedade, entre 25/09/2009, data da deliberação, até 02/02/2011, data da renúncia ao cargo, conforme Av. 1 – AP. 32 de 2011/02/07. – certidão de fls. 11 a 16.
-
Cerda ……, exerceu o cargo de gerente único da sociedade, desde 02/02/2011, data da deliberação, conforme Insc.2 – AP. 33, de 2011/02/07. – certidão de fls. 11 a 16.
-
A referida sociedade procedeu à sua dissolução e encerramento da liquidação, com aprovação das contas, em 2012/06/29, conforme Insc. 4 – AP. 103, de 2012/06/29, e rectificação pelo AV. 1 – OF. AP 103/29120629 – certidão de fls. 11 a 16.
-
O cancelamento da matrícula da sociedade foi efectuado em 2012/06/29, conforme Insc. 5 – OF. 1 da AP. 103, de 2012/06/29. –certidão de fls. 11 a 16.
-
Em 06/11/2011, o R. Sales ….., subscreveu o documento designado por...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO