Acórdão nº 1601.11.7TVLSB.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DO ROS
Data da Resolução27 de Janeiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa 1.

“CS, Lda.” instaurou contra “TA ..., Unipessoal Lda.” a presente ação declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a condenação da ré: - A reconhecer a validade da resolução contratual feita pela autora; - A pagar-lhe a quantia de EUR 63.183,78.

Para tanto, alega, em síntese, que: Em 23 de Julho de 2007, celebrou com a ré um contrato de “franchising”.

Em momento anterior ao da celebração do contrato, a ré entregou à autora um estudo económico de viabilidade do negócio, nos termos do qual, embora a título previsional, se previa a obtenção de determinados resultados. Contudo, a realidade revelou-se distinta da prevista no dito estudo, não só por não revelar quer a consistência comercial, quer a originalidade do conceito de negócio, anunciadas no estudo, desconformidade que a ré não podia desconhecer.

Por outro lado, a ré cobrava à autora royalties sobre os descontos feitos pela autora aos clientes, em clara violação do estabelecido no contrato.

Neste contexto, e com fundamento em incumprimento das obrigações contratuais por parte da ré, a autora, em 8 de Julho de 2011, resolveu o contrato.

Em consequência da extinção do contrato, a autora alega ter direito a ver reposta a situação em que estaria se não tivesse sido celebrado o contrato, e, por isso, a reaver o que pagou à ré o equivalente ao denominado «direito de entrada» (EUR 30.000,00), bem como o valor que despendeu em publicidade (EUR 5.715,00) e no pagamento de royalties (EUR 16.377,00), o que totaliza EUR 52.092,00, bem como os juros de mora vencidos desde a data do respectivo pagamento à ré, bem como dos que se vencerem até integral pagamento, ascendendo os já vencidos a EUR 14.049,12.

Porém, como a autora se encontra devedora à ré de EUR 2.957,34, a título de royalties, deve este montante ser compensado com o alegado crédito da autora. Consequentemente, deve a ré ser condenada a pagar à autora a apurada diferença, isto é, a quantia de EUR 63.183,78.

  1. A ação foi contestada, tendo sido deduzida reconvenção, em que se pede a condenação da autora a pagar à ré, a título de indemnização por danos causados em consequência da violação de cláusula de não concorrência, a quantia que vier a ser liquidada posteriormente. Pede-se ainda a condenação da autora como litigante de má-fé, em indemnização não inferior a EUR 10.000,00.

  2. Replicou a autora, pedindo a improcedência do pedido reconvencional.

  3. Realizado o julgamento, foi proferida sentença que, julgando improcedente quer a ação, quer a reconvenção, absolveu ambas as partes dos respectivos pedidos.

  4. Inconformada, apela a autora e, em conclusão, diz: 1. A recorrente não concorda com a resposta que o Tribunal a quo deu ao quesito vertido sob o n.º 11 da B.I. que o considerou não provado.

  5. Com efeito, com a resposta afirmativa ao aludido quesito pretendia a Recorrente demonstrar que a Recorrida “não desconhecia por experiência própria do negócio, que o que constava do estudo de viabilidade apresentado à Autora era irreal”.

  6. Ora, ao invés do que da motivação apresentada pelo Tribunal a quo, a Recorrente considera que aquele facto consta provado uma vez que a prova testemunhal demonstra, no que respeita ao volume de faturação, (i) já existirem à data do estudo outras unidades franchisadas em funcionamento; (ii) que o reporte de faturação dessas unidades à Recorrida é mensal; e que (iii) à data existiam desvios entre a previsão da faturação aposta no estudo de viabilidade e o que na realidade faturavam.

  7. Para tanto impunha-se a consideração dos testemunhos prestados por AL, RP e CR.

  8. Ora, ao invés do que consta da motivação apresentada pelo Tribunal a quo, a Recorrente considera que aquele facto está provado, uma vez que, dos autos consta que o apregoado período de atividade de 11 meses não corresponde à realidade, sendo inferior.

  9. Ora, ao invés do que se encontra na motivação apresentada pelo Tribunal a quo a Recorrente considera que aquele facto está provado, uma vez que, dos autos consta que o custo com a rubrica professores absorve valores superiores ao previsto no estudo de avaliação e, se o custo com professores representa, de uma forma transversal a qualquer unidade, um encargo superior a 40% do volume de negócios, é impossível que, conhecendo a Recorrida o seu negócio, não pudesse saber que a indicação de um valor igual ou inferior a essa percentagem não traduz a realidade.

  10. Ora, ao invés do que se encontra na motivação apresentada pelo Tribunal a quo a Recorrente considera que aquele facto está provado, uma vez que, dos autos consta que no estudo de viabilidade está expresso que tem de existir um serviço de coordenação escolar que é constante, em tempo, e por isso de custo fixo, não obstante a dimensão da unidade empresarial, mas o tempo necessário à coordenação de serviços escolares aumenta em função do volume de atividade o que importa um custo variável em função do tempo necessário a essa atividade.

  11. Tendo em conta o conhecimento da Recorrida quanto à irrealidade das estimativas de faturação, sendo as mesmas muito menores do que o projetado no estudo de viabilidade, e a existência de uma variação inversamente proporcional entre o volume de faturação e os anos necessários à amortização do investimento, o quesito n.º 12 terá, salvo melhor opinião que ser considerado Provado ao invés do que decidiu o Tribunal a quo.

  12. A Recorrente não concorda com a resposta que o Tribunal a quo ofereceu aos quesitos vertidos sob os nºs 16.º, 17.º, 19.º e 20.º da Base Instrutória que os considerou não provados.

  13. Com efeito a Recorrida pelo contrato de franchising encontra-se obrigada, in casu, a fornecer à Recorrente um acervo informativo, secreto e substancial e que constitui a mais-valia adquirida pelo Franqueado, o que se designa por “Saber Fazer”.

  14. É nos Manuais "TA", apenas fornecidos à Recorrente após a formalização do negócio, que se deve plasmar todo o aludido acervo informativo que constitui o “Saber-Fazer” que potenciará uma posição de destaque no mercado das atividades de acompanhamento de estudos.

  15. Ora, os manuais operativos fornecidos caracterizam-se por serem um repertório de conceitos avulsos, onde não se identifica qualquer acervo de conhecimento fornecido pela Recorrente que seja por um lado desconhecido e, por outro, diferenciador e potencie uma mais-valia do franchisado perante a concorrência.

  16. Realidade que é corroborada pelos testemunhos de RP, TS, MI e de AB.

  17. Com efeito, o Tribunal a quo julgou incorretamente os factos ao considerar que dos referidos manuais não existe qualquer evidência da inexistência de um caracter inovador da franquia e a valorar testemunhos de quem se limitou a repetir as ideias plasmadas no referido Manual Operativo.

  18. Tendo presente as alterações às respostas à matéria de facto apresentadas supra, a análise e soluções do plano jurídico não podem deixar de divergir das propugnadas pelo Tribunal a quo.

  19. No que diz respeito à ilícita aplicação de royalties sobre descontos na faturação do Recorrente resulta claro que: (i) apenas com o acordo do franqueador poderão os preços receber qualquer modificação (ii) tendo em conta que o desconto é uma forma de modificar o quantum no preço de um bem ou serviço; (iii) e que a Recorrida recebe a faturação mensal da Recorrente; nunca a Requerida teria direito a aplicar royalties sobre os descontos efetuados uma vez que nunca impediu a Recorrente de os efetuar, anuindo tacitamente.

  20. Ora, a aplicação de royalties aos descontos, in casu, e ao invés do que consta da motivação apresentada pelo Tribunal a quo, não tem qualquer cobertura contratual.

  21. Destarte, recebendo a Recorrida a faturação mensal da Recorrente, nunca a mesma poderia aplicar os royalties sobre os descontos efetuados uma vez que nunca impediu a Recorrente de os efetuar, anuindo tacitamente e beneficiando do fomento de vendas que tais campanhas implicam. Ora a aplicação royalties aos descontos, in casu, não tem qualquer cobertura contratual, nem racionalidade no âmbito dos objetivos comerciais das partes, sob pena de ter de se considerar nula outra interpretação a dar a essa norma contratual, vide cl.ª 15.ª n.º 4, que fosse no sentido de entender que os “descontos suportados pelo franqueado” implicasse a manutenção do direito do Franqueador cobrar royalties sobre valores não faturados pelo Franqueado.

  22. Pois, nesse entendimento que repudiamos de entender previsto no contrato o direito a cobrar royalties sobre descontos, colocar-se-ia o Franqueador na posição leonina de por um lado beneficiar do esforço de fomento de faturação criado pelo Franqueador, e sem contribuir com o que que quer que fosse ainda ganhar em duplicado, ou seja mantendo o direito de faturar royalties como se não existissem descontos e aumentando a faturação a titulo de royalties à medida que a faturação do franqueador aumentasse à custa de pratica de menor preço.

  23. Por último, a Recorrente considera que a alteração da resposta à matéria de facto determina que, na aplicação do direito, a resolução do contrato que promoveu para lá de eficaz é lícita, o que implica a condenação da Recorrida em todos os pedidos.

  24. Não foram apresentadas contra alegações.

    [1] 7.

    Cumpre apreciar e decidir se deve ser alterada a decisão de facto e se, em face dessa alteração, deve ser julgada procedente a pretensão indemnizatória, nos termos peticionados pela recorrente.

  25. É a seguinte a factualidade dada como provada: 1. A Autora dedica-se à atividade de realização de atividades pedagógicas, acompanhamento e orientação escolar. (alínea A da matéria assente) 2. A Ré dedica-se à atividade pedagógica. (alínea B da matéria assente) 3. A Ré, identificada como «franqueador», acordou com a autora, identificada como «franqueado», conforme consta do documento epigrafado «contrato de franchising», datado de 23 de Julho de 2007, cuja cópia é fls. 26 a 34 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual se destaca...

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