Acórdão nº 1477/11.4TJLSB.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Março de 2015
Magistrado Responsável | ALEXANDRINA BRANQUINHO |
Data da Resolução | 26 de Março de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
ACORDAM DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA Banco .... veio interpor recurso da sentença proferida na acção que intentou contra A..., J... e E..., respectivamente, viúva e pais de V....
Nesta acção, que segue forma especial de harmonia com o disposto no Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, a autora, ora apelante, pede a condenação dos réus, ora apelados, no pagamento da quantia de € 5.013,96 (cinco mil e treze Euros e noventa e seis cêntimos) de capital, acrescida de € 891,44 (oitocentos e noventa e um Euros e quarenta e quatro cêntimos), de juros vencidos até 31 de Agosto de 2011 e de € 35,66 (trinta e cinco Euros e sessenta e seis cêntimos) de imposto de selo sobre estes juros e ainda os juros que, sobre a dita quantia de € 5.013,96 (cinco mil e treze Euros e noventa e seis cêntimos) se vencerem, à taxa anual de 18,28% desde 1 de Setembro de 2011 até integral pagamento, bem como o imposto de selo que, à referida taxa de 4% sobre estes juros recair e, ainda, no pagamento das custas, procuradoria e mais legal.
Para o efeito, a autora alega que emprestou €5.000,00 a V..., entretanto falecido, quantia que se destinou à compra de um veículo automóvel, e que seria paga pelo mutuário em 60 prestações mensais, cada uma no montante de €119,38.
A 19.ª prestação e seguintes não foram pagas – acrescenta a autora – daí que agora demande os herdeiros do mutuário.
*** Regularmente citados, apenas a ré A... contestou, dizendo, em síntese, que é viúva de V..., falecido no dia 6 de Agosto de 2013 em consequência de um enfarte agudo do miocárdio.
A par da celebração do contrato de mútuo – continua a ré A... – seu marido celebrou um outro – seguro de vida Banco … – com A O ..., assumindo esta por virtude de tal contrato, o risco de morte e de invalidez total e permanente da pessoa segura que, no caso, era V....
O prémio relativo a esse seguro era pago directamente à autora que era a tomadora do seguro – acrescenta a ré – que diz, ainda, nunca ter sido interpelada para proceder ao pagamento das prestações, ou alguma vez ter recebido qualquer declaração de resolução do contrato em causa.
Após troca de correspondência, a seguradora declinou a sua responsabilidade – remata a ré.
*** A ré suscitou o incidente de intervenção principal provocada da Seguradora que foi indeferido por ter sido entendido que a forma de processo não contempla aquele tipo de incidente.
*** Concluído o julgamento, a 1.ª instância julgou provados os seguintes factos: 1. A Autora BANCO ... é uma sociedade financeira para aquisições a crédito.
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No exercício da sua actividade comercial, a Autora e V... celebraram um acordo escrito datado de 18 de Fevereiro de 2009, denominado de “CONTRATO DE MÚTUO” com o n.º 911173, em que consta, nomeadamente, das condições específicas: “CONDIÇÕES DO FINANCIAMENTO Preço a contado: 5,000.00 € Desembolso inicial: 0.00 € Montante financiamento relativo ao objecto financiado: 5,000.00€ (…) Montante total do financiamento: 5,000.00 € (5000.00) Data de vencimento da 1.ª prestação: 10/03/2009 Data de vencimento da última prestação: 10/02/2014 Número de prestações: 60 Periodicidade: MENSAL Montante de cada prestação: 119.38€ (Ao montante indicado acresce 1.50 € por cada cobrança realizada) Valor total das prestações: 7,162.80€ Taxa nominal de juros, fixa ao longo de todo o período do contrato: 14.281% TAEG: 18.880% .
PROTECÇÃO Seguros de vida (alínea a) da cláusula 13.ª): Prémio Mensal de Seguro e Vida de V...: 1.25€ O(s) Mutuário(s) ao assinar(em) este contrato declara(m) estar de boa saúde, não sujeito(s) a controlo médico regular por doença ou acidente, ocorrido nos últimos 12 meses. ” 3. Noutra folha, e com a assinatura do Réu, encontram-se as seguintes cláusulas: “CONDIÇÕES GERAIS (…) 8. MORA E CLÁUSULA PENAL O(s) Mutuário(s) ficará(ão) constituído(s) em mora no caso de não efectuar(em), aquando do respectivo vencimento, o pagamento de qualquer prestação.
A falta de pagamento de uma prestação na data do respectivo vencimento, implica o imediato vencimento de todas as restantes, incluindo os juros remuneratórios e demais eventuais encargos incorporados no montante de cada prestação mencionada nas condições particulares.
Em caso de mora, e sem prejuízo do disposto no número anterior, incidirá sobre o montante em débito, e durante o tempo da mora, a título de cláusula penal, uma indemnização correspondente à taxa de juro contratual acrescida de quatro pontos percentuais, bem como outras despesas decorrentes do incumprimento, nomeadamente uma comissão de gestão por cada prestação em mora.”.
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Foi acordado que a importância de cada prestação deveria ser paga por via de transferência bancária a efectuar, na data estabelecida para cada uma das referidas prestações.
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No âmbito do acordo celebrado, a Autora entregou para aquisição da viatura de marca Renault, com o modelo Clio 1.2, matrícula 14-17-RZ a importância de € 5.000,00 (cinco mil Euros).
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Não foi paga a 19.ª prestação e seguintes, vencida a primeira em 10 de Setembro de 2010.
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V... faleceu, no estado de casado com A..., no dia 6 de Agosto de 2010.
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O empréstimo reverteu em proveito comum do casal.
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V... deixou como seus únicos herdeiros, a sua mulher A... e seus pais J... e E....
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V... faleceu na sequência de um enfarte agudo miocárdio.
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Paralelamente ao contrato de mútuo, V... celebrou um contrato de seguro vida com a seguradora A O...
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Através do contrato de seguro, a seguradora assumiu a cobertura de risco morte da pessoa segura e a cobertura de Invalidez Total e Permanente.
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Nos termos do aludido contrato celebrado entre Autora e V... – cláusula 13.ª, alínea a) – foi estabelecido que “Por efeito deste contrato e durante toda a sua vigência, o primeiro e segundo mutuário, caso este(s) tenha(m) subscrito conforme condições específicas, desde que à data da sua celebração não exceda os 70 anos, goze(m) de boa saúde e não esteja(m) sob controlo médico regular devido a doença ou acidente, beneficie(m) de uma apólice de um Seguro de Vida ou de um Seguro de Acidentes Pessoais, subscrito pelo Banco, pela qual, o capital vincendo em dívida à data dessa ocorrência, ficará(ão) integralmente saldadas, nas situações de (…)”.
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O prémio relativo a esse seguro era pago directamente ao Autor.
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A seguradora foi escolhida pelo Autor.
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Nem o marido da Ré, nem a Ré tiveram qualquer contacto directo com a seguradora.
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De acordo com o contrato de seguro, o tomador do seguro é o Autor e a T...
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Após troca de correspondência, a seguradora declinou a sua responsabilidade.
*** A 1.ª instância decidiu a acção conforme segue: «A questão que cabe resolver nos presentes autos, é a da admissibilidade ou não da pretensão da Autora, isto é, saber se esta pode ou não exigir dos Réus os montantes peticionados a título de capital e de juros.
Em face da factualidade apurada pode concluir-se que a Autora e V... celebraram entre si um contrato de mútuo.
O mútuo é o contrato pelo qual uma das partes (mutuante) empresta a outra (mutuário) determinada quantia em dinheiro, ou outro coisa fungível, ficando esta obrigada a restituir-lhe outro tanto, do mesmo género ou qualidade (artigo 1142.º do Código Civil).
Trata-se igualmente de um contrato de crédito sob a forma de mútuo tal como vem definido no artigo 2.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei nº 359/91, de 21 de Setembro, sendo-lhe aplicável o regime previsto em tal diploma legal.
Sendo um empréstimo bancário e porque tende a realizar lucros sobre o numerário, o mútuo em causa é sempre remunerado.
No caso dos autos, é inegável que sendo a Autora um Banco, o mútuo é oneroso.
Em virtude do contrato, ficou V... obrigado ao pagamento das prestações do mútuo, ou seja, o reembolso da quantia mutuada acrescido dos juros remuneratórios.
Devido ao seu falecimento, as prestações acordadas não foram pagas.
Invoca a Ré A... que face à subscrição do seguro de vida as prestações devem considerarem-se saldadas à data da morte do seu marido.
Está em causa a questão de saber se tendo...
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